Em lançamento de filme que co-protagoniza, Letícia Lima critica os clichês na representação de subúrbio e evangélicos


Em “Nas Ondas da Fé”, filme de Felipe Joffily, Letícia Lima vive Jéssika, uma funcionária de salão de cabeleireiro que tem a vida transformada quando o marido, Hickson (Marcelo Adnet), vira comunicador de uma rádio evangélica. Num filme que objetiva retratar os protestantes de forma não estereotipada, Letícia reconhece que ela própria, por vezes, os observava de forma controversa. Nascida em Três Rios (RJ), atriz vê em sua cidade natal muito do subúrbio. Ainda sobre o longa, ele também se dispõe a mostrar a importância do rádio enquanto plataforma de comunicação e não a vê-lo de forma obsoleta. E, coincidentemente, o segmento evangélico responde por uma grande parte da audiência do segmento

*Por Vitor Antunes

Letícia Lima é uma das protagonistas de “Nas Ondas da Fé“, filme de Felipe Joffily, roteirizado por Lusa Silvestre e com argumento de Marcelo Adnet. Este último vive Hickson, um técnico de informática que trabalha com telemensagens e tem como sonho transformar-se em radialista. Em razão do sucesso enquanto comunicador radiofônico, o personagem de Adnet transforma-se em pastor, razão pela qual enriquece e torna-se famoso. Ainda que seja um filme de humor, e também verta críticas à mercantilização da religiosidade, a proposta da equipe é retratar os evangélicos de maneira respeitosa. Segundo a atriz, o objetivo é “não estereotipar a fé. Eu consegui, com esse projeto, descobrir que a fé nada tem a ver com as instituições, mas passa por um outro lugar, especialmente quando faz parte do dia a dia daquelas pessoas. (…) O filme não sublinha o subúrbio entendendo-o como engraçado”.

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Marcelo Adnet e Letícia Lima em cena de “Nas Ondas da Fé” (Foto: Peter Wrede)

FORA AO CLICHÊ!

Segundo seus realizadores, “Nas Ondas da Fé” é um dos primeiros trabalhos a trazer, com protagonismo, a fé evangélica. É o que Letícia Lima reitera. Segundo a atriz, “o tema foi escolhido por Marcelo Adnet e Lusa Silvestre por ser um assunto tabu. Não é uma temática costumeiramente abordada e geralmente enxergarmo-la de maneira estereotipada, com distanciamento”.

A parte elitista do Brasil costuma encaixar no clichê a fé protestante, quando entende que seus membros todos usam exclusivamente roupas compridas e excessivamente comportadas. Na verdade trata-se de uma religião segmentada, não é uma coisa só. O filme mostra isso – Letícia Lima

Letícia prossegue em sua observação, dizendo que os evangélicos “são pessoas como quaisquer outras, não são apenas religiosos, esta é apenas uma característica deles. Estão aí, no “corre”, precisando ganhar a vida, pagar as contas. O longa me colocou num lugar muito novo por que eu também tinha esse olhar mais estereotipado para com eles”, confessa.

A fita pode ser observada não apenas como um longa que se propõe a não estereotipar uma religião, mas, também, a discutir criticamente o uso mercantil da fé, especialmente quando esta, a serviço da ganância e da corrupção, acaba se desvirtuando dos ensinamentos de Deus. Em alguns momentos no filme, há referências, ainda que sutis, a pessoas reais. Segundo Silvestre, o único personagem inteiramente ficcional é aquele vivido por Adnet.

Personagens de Letícia Lima e Marcelo Adnet em “Nas Ondas da Fé”. A família muda de vida com o sucesso de um programa radiofônico evangélico (Foto: Peter Wreder/Divulgação)

Nas Ondas da Fé” é mais um investimento de Letícia Lima no cinema. Trata-se do quarto longa lançado por ela em 2022. Em 2012, Lima projetou-se no cenário artístico nacional quando compôs o elenco do “Porta dos Fundos“, um dos maiores canais de humor do YouTube. Em 2016 entrou para o elenco do seriado “Vai que Cola”, como a personagem Gabi. Letícia é presença bissexta na TV aberta. Quanto às novelas, fez “Amor de Mãe” e “A Regra do Jogo“.

Letícia Lima a contrário é nascida no interior do estado do Rio de Janeiro, na cidade de Três Rios – distante em cerca de 125km da capital. Naquela cidade fora eleita Miss Três Rios, em 1995. Fala-nos ela que sua terra natal tem muito a ver com o subúrbio carioca. “Eu cresci numa casa muito parecida com a da Jessika, com esse convívio que ela tem. Acho que o grande bacana do filme é que ele não faz piada com o subúrbio, não o coloca num lugar estereotipado onde a região é utilizada para se fazer piada. O filme não sublinha o subúrbio entendendo-o como engraçado”.

Letícia Lima observa similaridade entre o subúrbio carioca e a sua cidade natal, Três Rios (RJ) [Foto: Leo Franco/AgNews]

NAS ONDAS DO RÁDIO

Além da questão protestante, “Nas ondas da Fé” traz o rádio como a um protagonista. A contrário da crença geral, o segmento não entrou em baixa por por conta do streaming ou dos podcasts, ao contrário. Segundo o Kantar IBOPE Media aponta, o formato é consumido por 83% da população brasileira, levando-se em conta as 13 regiões pesquisadas pela empresa. Ainda segundo o órgão, 3 a cada 5 ouvintes escuta rádio diariamente e por, ao menos 4 horas. Há ainda, uma grande parcela que o consome através da Internet. Todavia, aqueles que o escutam pelo equipamento de som, equivalem à maior parcela dos ouvintes, 83%.

Marcelo Adnet vive um comunicador em “Nas Ondas da Fé”. O rádio ainda é muito forte no Brasil (Foto: Divulgação)

Em 2022 celebrou-se os 100 anos da primeira transmissão de rádio no Brasil. Em 1923  instalou-se a primeira emissora, a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro. Na capital fluminense, as emissoras segmentadas ao público evangélico, como aquela presente no filme de Joffily, respondem a posições de destaque entre as dez mais ouvidas do Rio. Em Maio de 2022, a Rádio Melodia ocupava o segundo lugar, numa disputa muito acirrada com a líder. A 93FM, também religiosa, ocupou a quinta posição. Há pelo menos quatro anos, a líder no segmento é a FM O Dia, emissora popular/eclética.