* por Rodrigo Otávio
Quando foi anunciada neste ano, a “então” CNBC Brasil surgiu para o público cercada não só de expectativas — afinal, seria um canal que representaria a estabelecida CNBC/NBC —, mas também de grandes dúvidas: como seria mais um canal de economia e negócios no já saturado mercado de all news para TV? Mais ainda, como torná-lo atrativo ao falar de negócios para o público brasileiro?
Para sanar essas dúvidas, a emissora contratou os carismáticos Christiane Pelajo, Zeca Camargo e Carol Barcellos e trouxe nomes fortes da Globo, como Fábio Turci. Também recrutou jovens talentos, como Rafael Ihara e Nathalia Ariede. Contudo, a estreia do canal, no domingo, 17/11, foi uma sucessão de equívocos. Falhas de som, entradas de VT e outros problemas técnicos poderiam até ser mais compreensíveis por se tratar de uma estreia. Mas não. Não era possível sequer acessar o canal.
Transmitido pela Claro TV e por pequenas transmissoras, restou o acesso através de um link disponível no site do canal. Eis aí a primeira gambiarra: qual é o nome do canal? Se procurarmos por CNBC no Google, seremos redirecionados à matriz americana. No fim de semana da estreia, o canal assumiu que seria Times Brasil. Depois, veio o extenso nome: “Times Brasil – Licenciado Exclusivo CNBC”. O Times Brasil não pode ser chamado de CNBC Brasil porque não possui licenciamento de marca, mas sim de conteúdo. Procurada na véspera da estreia, a então CNBC garantiu que o nome do canal seria esse e que a clássica logo do pavão estaria presente no canto da tela. Eis aí a segunda gambiarra: ela não apareceu, exceto na canopla dos microfones e nos VTs da sucursal americana.
O Times Brasil ainda parece frágil. Assemelha-se a uma afiliada da CNBC quando utiliza a logomarca em produções próprias e a da matriz americana nos conteúdos estrangeiros. Adota uma linguagem de TV a cabo, especialmente ao se comunicar exclusivamente com o público especialista em negócios. Não está errado, pois é um canal segmentado, mas isso reduz o público a um nicho extremamente específico. A CNBC é integrante do grupo NBCUniversal. Além das operações nos Estados Unidos, possui filiais na Europa e na Ásia, e também participa de outras afiliadas pelo mundo.
Os nomes dos jornais foram mudados em cima da hora, e o pavão, que aparecia anteriormente, deixou de aparecer. O principal telejornal, Jornal Times CNBC, mudou de nome para Jornal Times, suprimindo-se a abreviação na locução.
Ora, será que o canal não pensou que esse nome seria ruim para o SEO? Inserir “Times Brasil” no Google faz o buscador entregar resultados sobre os times de futebol do Brasil. Inserir “Times Brasil” no YouTube retorna a página do “Time Brasil”, do Comitê Olímpico Brasileiro.
Destacamos a questão da logo do pavão e do nome CNBC porque esta foi uma prerrogativa e um elemento muito forte na entrevista que Christiane Pelajo deu ao site Heloisa Tolipan, em julho deste ano:
A CNBC é o braço de negócios da NBC. E aí tem uma novidade que eu não contei para ninguém, nem para a direção. Quando decidi fazer jornalismo, meu sonho era trabalhar na NBC, que é uma das maiores do mundo. Eles são muito pioneiros, tanto que o grupo NBC Universal foi o primeiro a transmitir a cores nos Estados Unidos, em 1956. Um convite desses é impossível de negar.” — Christiane Pelajo, em 12/07/24
O improviso não para por aí. No site, mais uma gambiarra: o link para assistir à transmissão do canal, durante a estreia, estava quebrado. Não havia, ao contrário do prometido, a transmissão ao vivo no YouTube. Esta reportagem só conseguiu assistir à estreia por um link no Dailymotion.
Resolvida essa saga, tivemos a primeira grande entrevista do canal: o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, foi entrevistado de forma segura pela sempre competente Christiane Pelajo. Outra entrevista igualmente exclusiva e reveladora foi conduzida por Fábio Turci com o presidente do STF, Luís Roberto Barroso. A CNBC, no entanto, vacilou ao exibir uma entrevista com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, gravada nos Estados Unidos, em inglês, com dois voice-overs — um para cobrir a voz de Campos Neto e outro para a da jornalista americana —, possivelmente realizados por inteligência artificial. As vozes não tinham modulação alguma, tornando a tradução simultânea artificial e excessiva. Talvez essa seja a gambiarra número quatro.
Outro ponto a lamentar na estreia foi a escolha de uma “decolagem” totalmente de gaveta. Ainda que as entrevistas com Haddad e Barroso tenham sido quentes, devido ao noticiário semanal, a emissora “comeu bola”, pois, naquele dia, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, estava na Amazônia e viajou, praticamente na hora da estreia, ao Rio de Janeiro para a reunião do G20. Não havia sequer um link ao vivo sobre o assunto, especialmente para um canal que se anunciou como detentor de 15 horas de programação ao vivo. Além disso, exibiu um minidoc sobre Steve Jobs produzido há oito anos pela matriz americana.
Somaram-se a isso uma série de problemas de áudio — como dessincronização e atraso de imagem — e confusão na própria forma de se autorreferir. Aliás, sobre autorreferência: enquanto esta crítica era escrita, a emissora publicou um vídeo em suas redes sociais, uma espécie de mea culpa, explicando a questão da confusão dos nomes e se apresentando oficialmente como Times Brasil.
No dia seguinte à estreia, na segunda-feira, mais uma série de erros marcou a transmissão ao vivo: enquadramentos equivocados — no programa diurno apresentado por Rafael Ihara, as mãos de outra apresentadora apareciam no quadro da câmera focada em Ihara. Já à noite, no jornal de Christiane, a vinheta não entrou durante o deslocamento da apresentadora, deixando-a exposta em cena aberta.
Mas, de todos os erros, o mais primário e amador foi a emissora não ter assinado com o Kantar Ibope. Ou seja, não é possível saber quantos telespectadores acompanharam essa saga para assistir ao canal, nem estabelecer comparações com concorrentes diretos como CNN, Record News, BandNews, GloboNews ou até mesmo Bloomberg TV. Procuramos o canal para questionar a parceria com o Ibope e ainda não obtivemos resposta. Caso a emissora se posicione, este texto será atualizado.
Num primeiro olhar, aparentemente, o Times Brasil/CNBC foi para poucos. Enquanto o site HT assistia ao canal pelo Dailymotion, havia apenas 400 e poucos telespectadores na estreia. No momento exato da escrita desta crítica, eram 221. No Instagram, a emissora soma quase 21 mil seguidores.
Em termos de alcance, estima-se que só na próxima semana o Times estará em todas as TVs a cabo e nos canais FAST. Talvez a ânsia do pioneirismo tenha gerado ansiedade e precipitação na estreia. O capital humano do Times/CNBC é bom demais para passar pelo constrangimento de estar num “puxadinho de TV gringa” ou numa “gambiarra-chique”.
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