Inspiramais 2020_II – Projeto Referências Brasileiras vai a Petrópolis e transforma história em produtos de moda


A partir dos sonhos de Santos Dumont e a resistência da cultura africana, projeto traz pesquisa inédita. Designers e empresas se uniram para criar produtos que instiguem um olhar de desenvolvimento que integra as referências do Brasil, mapeando importantes influências culturais e abrindo um novo espaço para o design para originar coleções de calçados, acessórios, joias, moveis e confecções

Antes mesmo de mergulhar no universo do Projeto Referências Brasileiras e contar a você, leitor, um preview do que será apresentado a designers, empresários, profissionais da moda e players das indústrias de calçados, bolsas, acessórios, vestuário e móveis de Norte a Sul do país e do exterior no  Inspiramais 2020_II – Único Salão de Design e Inovação de Materiais da América Latina, a ser realizado nos dias 4 e 5 de junho, em São Paulo, é necessário contar a boa nova: As duas últimas edições do projeto tiveram alguns protótipos selecionados para a Semana de Design de Milão. É a criatividade made in Brasil ganhando o mundo e a internacionalização do Inspiramais corroborando a importância e relevância de um trabalho em união total.

Promovido pela Associação Brasileira de Empresas de Componentes para Couro, Calçados e Artefatos (Assintecal), Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Centro das Indústrias de Curtumes do Brasil (CICB) e Programa de Internacionalização da Indústria Têxtil e de Moda Brasileira (Texbrasil), Brazilian LeatherBy Brasil Components, Machinery and Chemicals e Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex-Brasil), o Inspiramais abrange toda a cadeia dos setores de moda, calçadista e moveleiro, apresentando mais de 1.000 materiais inovadores para as indústrias nacionais e da América Latina e será realizado no Centro de Eventos Pró Magno, em São Paulo.

Leia aqui – Inspiramais 2020_II: Norteado pelo tema “Zen”, um olhar sobre vínculo, tempo e relação humana

O Projeto Referências Brasileiras é totalmente vanguardista, como tenho frisado a cada edição que acompanho, com ênfase na valorização da cultura brasileira. Acompanho de perto o trabalho da designer Julia Webber, que está à frente do Referências Brasileiras. Ela é integrante do Núcleo de Design da Assintecal, coordenado por Walter Rodrigues, e sempre ressaltou a importância do projeto que tem como objetivo unir a indústria do componente e design para originar coleções de calçados, acessórios, joias, móveis e confecções a fim de criar uma linguagem efetiva de elaboração de produtos criativos e inéditos que enalteçam as raízes brasileiras para além dos estereótipos que norteiam a identidade do Brasil.

A designer Julia Webber pelas lentes de Zé Roberto Muniz

Leia aqui – Minas Trend: Durante palestra de Walter Rodrigues, o start de Inspirações 2020_II norteadas pela palavra-chave Zen

O Referências, assim como o Projeto Iconografia Local, que eu contei aqui para vocês sobre o que vamos conferir in loco em São Paulo – já está pensando nas inspirações para 2021_I e permeadas pela palavra-chave “Sincronismo“, a partir dos estudos feitos pelo Núcleo de Design da Assintecal. A cidade de Petrópolis, na Região Serrana, repleta de história e um dos locais de turismo mais importantes do Brasil passou por uma grande decodificação desenvolvida pela designer em parceria com um grupo de empresas inovadoras.

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Temos ressaltado aqui também que o Referências Brasileiras  é um dos mais amplos trabalhos atuais de pesquisa e identidade de moda nacional, busca conectar as tendências globais da moda a inspirações enraizadas na identidade brasileira. Desde fevereiro, a equipe faz mil trabalhos de campo na Região Serrana do Rio em busca por novos caminhos e linguagens para superfícies, formas e estética de materiais e produtos de moda com promoção da Associação Brasileira de Empresas de Componentes para Couro, Calçados e Artefatos (Assintecal), Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), Centro das Indústrias de Curtume do Brasil (CICB) e Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex Brasil).

Leia aqui – Walter Rodrigues: “Há diálogo entre liberdade de usar, criatividade e identidade. Tudo expressa novo jeito de ser”

Julia nos conta que “entre as infinitas informações ao redor, combinamos passado e presente, ensaiando vislumbrar o futuro.  Em 2021_I, buscamos sincronia e conexões. Olhamos para Petrópolis, fundada por D. Pedro II numa época de grandes descobertas científicas. Petrópolis de barões e palacetes, onde Alberto Santos Dumont (1873-1932) construiu uma casa que, como seus estudos sobre aviação, era prática e minimalista”, conta Julia Webber responsável por decodificar os signos da cidade.

A casa de Santos Dumont em Petrópolis, Região Serrana do Rio (Foto: Zé Roberto Muniz)

Entre o encontro de Santos Dumont e seus inventos – degraus modulares para economizar espaço, um chuveiro com aquecimento, o balão Brésil e o14-Bis e a disposição de construir uma imagem positiva do Brasil no exterior, e as rodas de samba e capoeira e o voo de conquistas e resistência traz um pouco do que esperar do projeto: inventar uma nova década, voar juntos e promover uma sinapse global.

Para esta edição, o Referências Brasileiras conta com a parceria das empresas Aletta, Cipatex, Cuscoloko, Curtume Finileather , Curtume Nova Kaeru, Despi, Junior Costa,LRB Tecidos, Mangue, Manoela Moog, Master Bord, Nipesi, Stickfran, Werner, Visual.

Chapéu de Santos Dumont (Foto Zé Roberto Muniz)

Leia aqui – Inspiramais 2020_II: Projeto Iconografia Local decodifica Petrópolis sincronizando passado, presente e futuro

Conversei com Julia sobre o périplo pela cidade que amo desde a infância e ela me contou que, entre os mil e um palacetes históricos, se sentiu “muito cativada pelo universo que cercava Santos Dumont”. Segundo a designer, “ter visitado sua casa foi algo muito importante nesta percepção”. Visionário, Santos Dumont viveu em uma casa “simples, direta e prática, mas compreendê-la no contexto petropolitano é que foi incrível”, comentou Júlia.

“Até hoje, Petrópolis é uma cidade de grandes construções, muitos palacetes de barões e mesmo casas mais contemporâneas são enormes, tudo é de porte imperial. Aí você chega na Encantada – a casa do inventor – e ela é o que as construções atuais são, tudo pensado de maneira prática para uma pessoa viver confortavelmente, mas simples e com o mínimo possível. Você percebe que o modo de pensar dele era genial e muito à frente do tempo em todos sentidos: nada de ostentação, tudo voltado para suprir suas necessidades diárias que era inventar, inventar e inventar. Não havia cozinha pois ele gostava de comer enquanto trabalhava em seus projetos, em cima da escrivaninha mesmo e chamava uma “tele-entrega” de um hotel. Os degraus modulares, feitos para ocupar menos espaço e ainda começar com pé direito a subida, ou seja, a entrada na casa deveria ser com o pé direito”, relatou Julia.

Escada modular da casa de Santos Dumont em que o visitante sempre pisa com o pé direito (Foto: Zé Roberto Muniz)

De acordo com a designer, “a genialidade dele não foi apenas relacionada à invenção do avião, mas ao número de invenções que fez em vida, muitas vezes remodelando projetos inteiros em 20 dias! O mundo só não o conhece mais pois ele ainda era fã da colaboração e negou-se a patentear seus projetos. Ele queria que todos pudessem fazer uso dos resultados que atingia e ainda melhorá-los. Isso fez com que muito do que produziu se perdesse em meio à efervescência científica da época ou então até algumas empresas que fizeram uso para venda de pesquisas de Santos Dumont”.

Foto: Zé Roberto Muniz

Julia nos faz mergulhar nesse universo ao relatar ainda que “tudo o que Santos Dumont fazia era pensando em unir as pessoas, em unir as nações, promover igualdade, disseminar conhecimento. Acho que precisamos de muitos Santos Dumont hoje. No nosso último dia em Petrópolis, pudemos fazer parte de uma roda de capoeira, pois queríamos abordar na pesquisa a cultura da população afro-descendente, e encontramos pessoas incríveis que nos contaram de toda sua dificuldade e nos proporcionaram esta experiência. Ali, tive um momento muito especial em que vi em cada salto, em cada giro – que mais parecia voo, uma forma de resistência, de busca por reconhecimento e liberdade desde a abolição da escravatura”.

Voos de resistência e liberdade na capoeira em Petrópolis (Foto: Zé Roberto Muniz)

Pois bem… como os integrantes do Núcleo de Design da Assintecal já trabalham para a edição do Inspiramais, 2021_I “falamos de sincronia de toda esta loucura de informações que estamos vendo acontecer, de todos estes tipos de pessoas, e o tema que eu escolhi trabalhar foi batizado “Sinapse”, que justamente fala das conexões e de como estamos vivendo um novo renascimento tecnológico. Fiquei muito inspirada pelos capoeiristas e amigos que fizemos em Petrópolis e saí de lá com as palavras “Voos de Resistência”, “Saltos para a Liberdade” e “Sinapse Global” na cabeça. Uni toda genialidade, modernidade e colaboratividade de Santos Dumont com a poesia e força dos capoeiristas, e foi a partir disso que baseei minha pesquisa”.

Mais flagrantes do sincronismo na capoeira em Petrópolis (Foto: Zé Roberto Muniz)

Julia trabalhou com empresas parceiras do Sul e a maioria de Petrópolis e Rio de Janeiro para produzir em conjunto os componentes e produtos do projeto que veremos nos dias 4 e 5 de junho. “A troca toda é muito gratificante, pois aprendo muito de cada um envolvido e mostro um outro olhar sobre a cultura brasileira e a cidade em que as empresas estão situadas e todos vemos como podemos chegar em sínteses encantadoras que não esperávamos e vão se delineando com essa troca em grupo. Assim, no Inspiramais veremos todo este universo que falei com novas leituras de acordo com as tendências globais de preview da primeira estação de 2021!”, concluiu.

Equipe de pesquisa da Assintecal e do Sebrae em Petrópolis (Foto: Zé Roberto Muniz)

Só para lembrar: os representantes das indústrias e designers que estiveram na edição passada do Inspiramais já estão trabalhando com toda criatividade nas Referências Brasileiras encontradas no Sertão Baiano. “Estudamos a origem da nossa história sob a ótica do Sertão Baiano. Os passos dos hominídeos naquela região, observando as pinturas rupestres. Como princípio, então, trabalhamos a questão do indivíduo, fazendo uma exaltação do fazer manual, da matéria-prima e desse vínculo que esses saberes manuais criam entre as pessoas. Ao abordar o coletivo, nós pensamos no ambiente, na paisagem, no todo e entorno desse espaço e o que ele mostra para nós e a ação do tempo ali”, comentou Julia Webber.

O tema “Zen” é uma simbiose entre passado e futuro, segundo Julia Webber. “Uma questão é usar essa abordagem para pensar qual é o legado que vamos deixar, juntamente com a ação do tempo nesses ambientes e o ponto da sustentabilidade. Pensamos nos materiais, nas técnicas e na inovação. A gente tem uma pluralidade de técnicas e eu acredito que um dos aspectos que o projeto acaba contemplando é de ser bem plural. Temos um handmade mega artesanal assim como podemos também fazer uma releitura mais industrial utilizando uma técnica muito bacana de sustentabilidade. É uma forma de mostrar como dá para aplicar essas ideias em vários setores, que podem ser de acordo com o objetivo da marca: superprodução ou mais artesanal”, esclareceu.

A sustentabilidade aplicada à inovação também trouxe parcerias de sucesso e produtos interessantes. “Apresentamos um tecido sustentável, feito de garrafa pet e algodão reciclado. O material é desenvolvido pela Ecosimple e a estamparia da LRB, sendo cada metro dele o correspondente a oito garrafas PET retiradas do meio ambiente. Ele foi aplicado em todos os forros das bolsas e em um calçado, que foi feito pela Beatriz Calçados. A variedade misturando nossas estratégias também está numa bolsa, feita pela Classe Couros, onde nós brincamos com essas formas orgânicas e com a corrosão, como se tivesse uma bolsa dentro da outra, além das aplicações de metal. Ela é feita de couro de jacaré da Arte da Pele, onde tem essa brincadeira do opaco com o verniz, o metalizado e a padronagem, que foi feita em cima de uma fotografia aérea”, contou a designer.

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