*Por Brunna Condini
“Crer no incrível, ver o invisível e receber o impossível”, amamos a frase! A citação/mantra é de um mestre budista, doutrina filosófica e espiritual que Yohama Eshima pratica há 12 anos e tem guiado sua vida. A atriz interpreta a policial Yone, braço direito da delegada Helô, vivida por Giovanna Antonelli em ‘Travessia‘. “Acho mesmo que atraímos o que emanamos, e Giovanna é como eu: implacável no desejo, na força, sabe exatamente quem é, e não se importa com o que falam”, observa a atriz que tem ascendência japonesa, indígena e italiana. “Mas sou brasileira. Não sou a ‘japinha’ da novela, essa descrição nem estava na escalação para a personagem. Sou uma atriz amarela e estou ocupando o meu espaço, como outras”.
A curitibana é casada com o diretor, produtor e roteirista de cinema Flávio Tambellini, com quem tem o pequeno Tom, de 2 anos, que nasceu com esclerose tuberosa. Apesar dos desafios no dia a dia, ela não se queixa e faz questão de destacar o que realmente importa. “Meu filho, antes de ter uma mutação genética, de ser um bebê com deficiência, é uma criança. Ele tem saúde, amor e demonstra desejo em brincar, aprender. Desenvolvemos com o Tom o desejo de comemorar as pequenas vitórias. Celebramos cada conquista dele. Aqui em casa raramente nos lamentamos”. Aos 34 anos, casada com Flávio de 70, Yohama também comenta sobre a diversidade da sua configuração familiar. Pinta preconceito com a diferença de idade entre vocês? “Gostei da pergunta, porque até agora ninguém a fez. Não tenho o menor receio de falar de nada, até por que nossa família é mesmo diferente. Já ouvi comentários preconceituosos, sim, até daqueles meio velados. Te digo que quando encontrei o Flávio me apaixonei pela história dele, pelo o que é. Não olhei a diferença de idade, olhei pra ele, que é um homem encantador. Isso nunca foi uma questão”, divide.
“A primeira fala preconceituosa que ouvi foi pelo fato de eu ser atriz e ele diretor. Algumas pessoas vieram me dizer que achariam que eu estava com ele por interesse. Deixa que falem. Nossa relação é feita de muito amor e admiração. São realmente 37 anos de diferença, tenho a idade do filho mais velho dele, são dois do primeiro casamento, e nos damos super bem. Já ouvi também que Flávio não teria disposição para cuidar do Tom. Imagina. Muitas vezes, ele tem mais energia do que eu, se exercita, se cuida. Sem falar, que o Flávio é um super pai para o nosso filho. Está tendo a oportunidade de exercer isso full time, coisa que na época dos meninos não conseguiu, pela vida, o trabalho. O Tom tem muitas demandas, então nos dividimos em tudo. Estamos juntos, em família, criando um ser juntos. Não é sobre a idade, é a mente, a disposição. Então, escuto tudo isso e deixo pra lá. Mesmo não sendo um problema para nós, acho importante falar. Mas garanto que por aqui está tudo ótimo”.
Tom foi muito desejado, já que antes da chegada dele, Yohama teve menopausa precoce. “Ele é luz, o amor das nossas vidas! Com meu filho percebi como somos capacitistas. Não foi fácil, mas corri atrás de informação, para não falar besteiras. A condição de vida dele hoje não é um problema para nós. Aqui em casa exercitamos olhar tudo da forma mais leve possível”. E compartilha um pouco da rotina de cuidados com o bebê: “Usamos canabidiol, fazemos dieta citogênica, ele toma alguns remédios, faz fisioterapias, terapia ocupacional. Tom ainda tem convulsões diárias, mas em breve não serão. Ele acabou de fazer uma cirurgia para o implante de um gerador, com o objetivo de neutralizar as crises. Estamos com uma ótima expectativa, os médicos estão empolgados. Meu filho tem uma síndrome rara, uma mutação genética, isso faz com que tenha múltiplos tumores no cérebro. São benignos, mas impedem que possa se desenvolver bem. Por conta disso, tem displasia cerebral, várias crises convulsivas. E também hipotonia muscular, então ainda não senta, não tem o controle de cabeça, seu desenvolvimento é em outro tempo: o dele. Como todos nós, na verdade. E repito: por aqui, mais celebramos o que ele consegue fazer, do que lamentamos pelo o que ele não faz, sabe?”.
Esperança, resiliência, budismo e amor
“Esse trabalho na novela veio no melhor momento. Hoje sou mais resiliente, a ingenuidade ficou lá atrás. Sei muito bem o que desejo e quem sou. Quero trazer esse poder do feminino, de mãe, esse desejo de construir para o meu trabalho para as pessoas que estão ao meu redor. A esperança brota, se cria, precisamos manifestar. E vejo minha missão assim, de forma simples, através das palavras e ações transmitindo algo bom para as pessoas. Porque de catástrofes e coisas ruins o mundo está cheio. Então, faço a minha parte. Esse exercício foi fundamental para que eu estivesse aqui dando essa entrevista agora, porque teve um momento que eu desisti de ser atriz, no pós-maternidade.
Me considero uma mulher muito forte, não achei que teria depressão pós-parto, mas hoje vejo que tive. Acho até que a maior parte das mulheres deve ter. E quando pensei em desistir da profissão, essa força me levantou. Coloquei luz em mim mesma, conquistei uma mente boa para a maternidade, para o trabalho e para poder conquistar os meus caminhos” – Yohama Eshima
Praticante do budismo de Nitiren Daishonin, ela recorda como conheceu a religião/filosofia. “Foi em um momento de sofrimento, há 12 anos, em Curitiba, na época de um término de relação. Era muito novinha, achava que o mundo ia acabar (risos), e uma amiga me levou. Foi bom, porque gosto de estudar, de ter embasamento. E o budismo acalmou meu coração. Mostra como tudo é mesmo no momento presente e impermanente. Se eu não quero sofrer mais, é só fazer algo neste momento. É uma prática que me organiza”.
Ela conta também como espiritualidade a guiou até o marido, Flávio Tambellini. “Tem cinco anos que moro no Rio de Janeiro. Conheci o Flávio no budismo. Sentia que tinha uma coisa que me puxava para a cidade. Em Curitiba têm grandes artistas, mas a arte por lá parece muitas vezes aquela coisa natimorta. Nasce com potência e acaba por lá mesmo. Pensei que tenho muita coisa para falar para o mundo, queria explorar. Quis vir para o Rio, queria ver o mar, fazer novela, aquela coisa bem de gente do interior”.
Cria do teatro, ela veio tentar a profissão no Rio munida somente de desejo e coragem. “Vim para cá sem nada, fiquei hospedada na casa de um amigo. Decidi não ficar indo em festinhas de artistas para fazer network, até tinha convites, mas preferi focar nas reuniões budistas. Sabia, sentia que era o lugar que me levaria além. E minha intuição me move. Estar em contato constante com a minha espiritualidade fez toda diferença nas minhas escolhas. Lembro que tinha acabado de voltar de uma aldeia indígena, havia redescoberto uma conexão poderosa, e lá eu fazia muito o Daimoko, o nosso mantra budista. Os meus amigos indígenas ouviram e me disseram que aquilo era muito forte, que era uma conexão direta com Deus. E vieram fazer comigo, pediram que eu os ensinasse. Quando voltei, dei esse relato onde faço as reuniões. O Flávio estava neste dia e decidiu se converter, se inspirou. Fui eu que o orientei em sua entrada no budismo. Temos até foto deste momento (risos). Um tempo depois, saímos e estamos juntos até hoje. Por eu ser atriz e ele, diretor e produtor, acham que nos conhecemos na profissão, mas não. O budismo me presentou com esse amor”.
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