*por Luísa Giraldo
Desde que “Malu” foi lançado nos cinemas, Yara de Novaes, 58 anos, está ganhando o mundo. A artista mergulhou de corpo e alma no processo de conexão com a protagonista, a atriz Malu Rocha (1947-2013), mãe do escritor e diretor Pedro Freire, que, aos 65 anos morreu por complicações de uma doença neurodegenerativa de príon. Como resultado, o longa-metragem recebeu, nesta semana, os prêmios de Melhor Filme e Melhor Atriz no 27º Festival Internacional de Cine de Punta del Este, no Uruguai. Em novembro, ela também foi premiada no Cairo International Film Festival, no Egito. Em conversa com o site, a atriz belo-horizontina reflete sobre a “loucura feminina”, frequentemente associada a mulheres que não seguem normas e padrões pré-estabelecidos pela sociedade, uma característica-marca da personagem.
A primeira coisa que fiz foi não patologizar a minha relação com a Malu. Provavelmente, [a doença] era um aspecto da Malu Rocha que nem eu mesma sabia. Nunca houve diagnóstico, apenas suposições. Sempre entendi a loucura da personagem como algo produzido socialmente, pelas circunstâncias — Yara de Novaes.
Yara constata que a personagem foi uma mulher artista em um momento em que inexistiam questionamentos sobre a descredibilização das dores e dos sentimentos femininos. A atriz observa que a “loucura” atribuída à Malu também se relaciona com a invisibilização da mulher nos anos 1990.
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A atriz reflete sobre a loucura (Leo Lara/Universo Produção/Divulgação)
“O excesso dela tinha a ver com a incapacidade de se submeter às regras da masculinidade; uma maneira de dizer ‘não’ às imposições do sistema; uma incapacidade de negociar com os seus algozes. Quando isso acontece, aparecem todos esses adjetivos que desqualificam uma mulher”, reflete ela.
Sem vergonha dos estigmas e adjetivos pejorativos, Yara afirma semelhanças entre as duas.
No meu caso, por ser uma artista que imagina, que inventa, também, em algum momento, devo ter tido essa pecha de louca — Yara de Novaes.
Feminismo e representação da mulher no cinema
A representação da complexidade feminina nas artes deve ser feita com bastante cuidado e sensibilidade. Yara de Novaes entende que mais profissionais estão se empenhando para tratar das dores e dos traumas das mulheres nas telas.
“O cinema tem feito isso com muita excelência. Vários dos filmes que mais me marcaram tiveram protagonistas femininas. Citando alguns brasileiros, [lançados] nos últimos tempos: ‘A vida invisível’, ‘Aquarius’, ‘Carvão’, ‘Bem-vinda’, ‘Violeta’, ‘Que Horas Ela Volta’, entre outros. O cinema tem nos ajudado a avançar. Temos grandes mulheres na direção e na produção desses filmes”, identifica.
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Yara de Novaes é premiada como Malu (Divulgação)
Por outro lado, a atriz exalta o trabalho de Pedro Freire, diretor de “Malu”, que fez o filme em homenagem à carreira artística da mãe, Malu Rocha (1947-2013). Em um contexto que valoriza a dinâmica feminina e a ancestralidade, a obra conta com as atuações de Carol Duarte e Juliana Carneiro da Cunha, que dão vida à filha e mãe da protagonista, respectivamente.
“Trabalhar com o Pedro Freire foi maravilhoso. Além de ser o roteirista e ter vivido com a Malu, ele é um excelente diretor de atores. Me deram muita liberdade para me conectar com a Malu. O dentro e o fora da personagem foram bem trabalhados”, avalia a intérprete.
Ao exaltar o eixo familiar avó-mãe-filha no filme, Yara reconhece a importância da dinâmica feminina para a trama. Outros aspectos imprescindíveis são a dor e o trauma intergeracionais, destaca ela.
O que é mais importante é perceber como essas três gerações partilham de uma mesma dor, de um mesmo conflito, e como elas lidam de modos disruptivos ou recorrentes com essa herança. Isso acontece com todas nós. Ao observarmos nossas avós, bisavós e mães, vamos nos enxergar com mais clareza, perceber como a nossa linhagem feminina se expressou e como nós nos expressamos a partir delas — Yara de Novaes
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Yara de Novaes critica a loucura atribuída à mulher pela sociedade (Divulgação)
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