Walcyr Carrasco não é o único. Relembre outros 4 casos de autores que escreveram novelas adoecidos


Desde que estreou “Terra e Paixão”, Walcyr Carrasco tem passado por diversos problemas de saúde, que dificultaram a condução da trama. O autor teve de operar catarata e sofreu duas quedas que acabaram por fazer com que Thelma Guedes assumisse a roteirização da novela das 21h, a única entre as inéditas da Globo a estar apresentando bons resultados. Walcyr, contudo, não é o único autor a apresentar problemas de saúde durante a escrita de uma novela. Vincent Villari, autor de “A Lei do Amor” (2016), relatou na última semana que teve uma grave crise de ansiedade naquela ocasião e está em tratamento até hoje e que escrever a novela foi traumatizante. Gloria Perez foi outra a adoecer enquanto escrevia “Caminho das Índias”. Com a saúde debilitada, Janete Clair e Walter George Durst faleceram durante a exibição de “Eu Prometo” e Os Ossos do Barão”, respectivamente

*por Vítor Antunes

É de conhecimento geral que escrever uma novela é um exercício hercúleo. São muitas as páginas diárias, e especialmente no caso da novela das 21h, grandes cobranças tanto comerciais como corporativas. É enorme a responsabilidade de liderar a principal novela da televisão brasileira, atualmente é a trama de maior audiência da Globo, cheia de investimentos comerciais e atravessamentos de interesses que vão além da mera dramaturgia. Atualmente, Walcyr Carrasco, autor de “Terra e Paixão” tem vivido uma epopeia para levar a novela ao ar. Em agosto, passou por uma cirurgia de catarata e teve que operar os dois olhos. Ato contínuo, em setembro, sofreu uma queda que resultou em uma fratura no fêmur. O novelista está usando cadeira de rodas. No último domingo, o próprio Walcyr sofreu um novo acidente doméstico que o fez afastar-se da escrita da trama das 21h, assumida por pela coautora, Thelma Guedes, conforme publicou Valmir Moratelli, na Veja.

Acordei disposto, feliz da vida, saltei da cama — e caí em cima da mesa ao lado dela. Gritei, gemi. Pedi ajuda. Minha fiel funcionária veio correndo. Olhou e diagnosticou: ‘O senhor quebrou a perna’ – Walcyr Carrasco

Além dos acidentes anteriormente relatados, o médico do escritor, Pedro Andrade, especialista em medicina de precisão e funcional, explicou que Walcyr está em “tratamento de uma hérnia de disco que comprometia sua locomoção”. “Terra e Paixão” não raro flerta com os 30 pontos de Ibope e estabelece um grande abismo entre o segundo lugar, a novela “A Infância de Romeu e Julieta“, do SBT. No dia 07/12, por exemplo, o folhetim infantojuvenil marcou 3,9 pontos. Quase oito vezes menos que a líder. Além deste caso, relembre outros de autores que adoeceram durante as suas novelas – ou por conta do insucesso de sua obra, ou por enfermidades preexistentes.

Gloria Pires é Irene em “Terra e Paixão” (Foto: Divulgação/Globo)

Vincent Villari em “A Lei do Amor” (2016)

Na última semana, Vincent Villari, autor de “A Lei do Amor” (2016) junto com Maria Adelaide Amaral, falou sobre os percalços que encontrou com a novela, que teve problemas de toda ordem, desde desacertos entre o elenco e desacordo conceitual entre roteiro e direção. A trama protagonizada por Cláudia Abreu e Reynaldo Gianecchini precisou ser totalmente reescrita enquanto estava no ar devido à baixa audiência. Vincent disse em entrevista ao jornalista Duh Secco, num material publicado no canal do próprio Vincent no YouTube, que “novela das nove quando dá errado a culpa é do autor. (…) É como se a segurança nacional dependesse da audiência da novela das 21h”.

A sinopse foi totalmente pro lixo. Eu estive com o Ricardo Linhares segurando a minha mão. (…).  Desenvolvi um transtorno de ansiedade tão violento que fiquei ali, chumbado de remédios, tentando sobreviver (…) Estou tratando disso até hoje, mas nem se compara com o que vivi antes. Foi tudo muito intenso, eu adoeci mesmo. Cheguei a emagrecer 12 kg. (…) “A Lei do Amor” é um apagão em minha mente – Vincent Villari

Ante ao fracasso da novela, Ricardo Linhares foi chamado para colaborar com os autores. Expediente semelhante ao que faz atualmente, com “Fuzuê”. Ainda sobre a entrevista que concedeu a Duh Secco, Vincent ressalta que o clima da Globo durante a produção de “A Lei do Amor” não era dos mais amistosos: “Saí do grupo de discussão da Globo e havia tanto grito [entre a equipe técnica] que tive a impressao de que iria morrer (…). Tive a pior noite da minha vida”, disse ele.

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A Lei do Amor” foi a primeira e única novela de Vincent às 21h. O último trabalho de Villari na Globo foi ser colaborador de “Todas as Flores“, novela do Globoplay que a Globo exibiu entre setembro e novembro de 2023. Maria Adelaide Amaral, sua dupla na autoria da trama, já declarou não mais querer voltar ao horário. Coincidentemente, esta também foi sua última novela.

Vincent Villari e Maria Adelaide Amaral foram os autores de “A Lei do Amor”, em 2016 (Foto: Reprodução/Globo)

Walter George Durst, em “Os Ossos do Barão” (1997)

Um dos maiores nomes tanto do teatro como da televisão, Walter George Durst foi o autor dos sucessos “Gabriela” (1975) e “Tocaia Grande” (1995). Quando escrevia o remake de “Os Ossos do Barão” (1997), para o SBT, descobriu que tinha câncer. “Imediatamente ele começou o tratamento, mas, com medicação pesada, os efeitos colaterais foram muitos, e o coração não resistiu”, disse Marcelo Durst, seu filho, em entrevista à Folha, em 1997. O autor morreu em 24 de agosto, e deixou entregue todos os capítulos da trama. Com total de 115 episódios, o último capítulo da versão do SBT foi exibido em 08/09 daquele ano. O folhetim contou com a presença de figuras proeminentes como Ana Paula Arósio e Tarcísio Filho e era uma adaptação do original de Jorge Andrade (1922-1984)

[Meu pai] pediu que os médicos fizessem com que vivesse até finalizar o trabalho – Marcelo Durst, filho de Walter George Durst

Ana Paula Arósio em “Os Ossos do Barão” (1997), no SBT. Última novela de Walter George Durst (Foto: Reprodução)

 

Janete Clair, em “Eu Prometo” (1983)

A última obra televisiva de Janete Clair (1925-1983) foi a novela “Eu Prometo“, a qual ela não conseguiu concluir devido à sua morte em 16/11/1983, aos 58 anos. O desfecho foi elaborado por Gloria Perez, com a colaboração e supervisão de Dias Gomes (1922-1999). Esta foi a primeira vez, em seus 39 anos de carreira, que Janete Clair contou com a parceria de um coautor. Por conta de sua saúde debilitada, consequência de um câncer no intestino, Janete  não conseguia mais escrever uma novela sozinha, embora desejasse continuar trabalhando. Ela conseguiu redigir a novela até o capítulo 60. Após seu falecimento, Glória Perez concluiu a trama.

Janete escreveu no hospital, até o último minuto (…) Ditava o capítulo que cabia a ela e eu apenas anotava. Ela sabia que estava morrendo. (…) Como nos encontrávamos todos os dias, fui acompanhando passo a passo aquele piorar. Quando Janete achou que não chegaria ao fim da novela, me deu instruções de como queria que a história terminasse (…)  e todos os desfechos.” – Gloria Perez, ao Memória Globo 

Malu Mader, estreando nas novelas, e Dina Sfat. “Eu Prometo” ficou marcada como sendo a última novela de Janete Clair, que faleceu enquanto a escrevia (Foto: CEDOC/TV Globo)

 

Glória Perez em “Caminho das Índias” (2009)

Em 2009, a novelista enfrentou um diagnóstico de câncer na tireoide, o que a levou a passar por uma série de cirurgias e sessões de quimioterapia ao longo do ano. Este período coincidiu com a escrita de “Caminho das Índias“. Ela precisou se afastar temporariamente da novela para tratar o câncer. Considerando que Gloria Perez geralmente escreve suas tramas sozinha, sem a colaboração de outros autores, o desenvolvimento da novela poderia ser impactado. Nesse contexto, para assegurar a continuidade dos capítulos, a autora contou com o apoio de Carlos Lombardi, que contribuiu escrevendo alguns capítulos da trama, permanecendo disponível para colaborar, se necessário, assim como Elizabeth Jhin, quando Gloria se recuperou. Durante esse período, Gloria também se submeteu a sessões de quimioterapia preventiva, visando evitar a recorrência da doença.

Eu escrevia na cadeira da quimioterapia. Às vezes, enfraquecida. Mas levava o computador porque tinha que escrever o capítulo, o que também era um estímulo para me manter fortalecida”, Gloria Perez ao R7, em 2014

Retrato de Raj (Rodrigo Lombardi) e Maya (Juliana Paes) em Caminho das Índias (Foto: TV Globo/Renato Rocha Miranda)