*Por João Ker
Qualquer pessoa que use a internet, veja TV ou ande pelas ruas do Rio de Janeiro e de São Paulo, sabia que nesta terça (15/07), às 22h30, acontecia a estreia de “Tudo Pela Audiência”, o novo programa de auditório do Multishow, apresentado pelos dois fenômenos da comédia nacional, Tatá Werneck e Fábio Porchat, que juntos apresentam uma química cômica surpreendente. Com uma liberdade de expressão que é dada a poucos contratados da Rede Globo, ambos os comediantes passam uma hora por dia, de segunda a sábado, ridicularizando o máximo de assuntos possíveis, incluindo eles mesmos.
Quem está familiarizado com o trabalho de Tatá ou de Fábio sabe que escrúpulo é uma ideia que existe apenas no papel. Tatá vem mostrando uma incapacidade para a seriedade desde o início da sua carreira televisa na MTV (o que, longe de ser um defeito, é um dos vários motivos pelos quais ela é tão querida pelo público); Fábio, apesar de conseguir falar sério, já provou inúmeras vezes tanto no Porta dos Fundos quanto em programas da própria Globo, como A Grande Família, que rir é sempre o melhor remédio, mesmo que seja contra uma doença terminal. Partindo desse princípio, era de se esperar que um programa com tal nome, e com essas duas pérolas à sua frente, fosse o cúmulo da apelação e da autocrítica. Ainda assim, desde os minutos iniciais do episódio de estreia, as expectativas da tão almejada e fissurada audiência conseguiram ser superadas. Do figurino extravagante e exótico à la Chacrinha e Chacretes à autodepreciação e apresentação da plateia como os “marombados da Classe C”, Fábio e Tatá deixam claro já no início que sabem muito bem o que estão fazendo e não têm vergonha nem medo de afundar o dedo na ferida. Os dois descrevem o programa como uma mistura de vários outros “sucessos” brasileiros, de Mara Maravilha a Adriane Galisteu, e têm direito até a assistentes de palco seminus: para ele, as “porchetes”, gostosonas de verdade que podem aparecer ocasionalmente vestidas apenas por pasteis e uma calcinha fio-dental (sim, pasteis de comida, pasteis de verdade); para ela, os “boitatás”, que finalmente trazem homens lindos de sunga e cueca em horário nobre na tevê brasileira (mesmo que acompanhados de anões, afinal o tema aqui é humor e essa “mãozinha” é mais do que recorrente no meio).
A ridicularização é usada a esmo e de forma quase que incontrolável pelos dois apresentadores. Eles zombam de si mesmo, da plateia, das porchetes e dos boitatás, das perguntas do público, da emissora, de seus trabalhos anteriores e, claro, até do convidado que, no piloto, foi Naldo Benny. Por sinal, o músico que anda meio parado nos lançamentos finalmente explicou em rede nacional o porquê de ter adotado o sobrenome “Benny” (!!!), que não é nada além de uma estratégia de marketing para uma possível carreira internacional (o que parece estar na moda dentre os artistas brasileiros). Voltando à ridicularização, ela toma sua melhor forma através dos quadros de “Tudo Pela Audiência”, que resgatam o pior da tevê que, consequentemente, acaba se tornando o melhor trash possível no gênero.
Por culpa de Naldo ou da plateia, algumas esquetes não funcionam tão bem no primeiro episódio, como o quadro em que eles amarram alguém do auditório a algum famoso – uma ótima sacada que chama à atenção a fascinação da declarada classe C por celebridades – ou o “Chora Brasil”, uma mistura de “Arquivo Confidencial” do Programa do Faustão com “De Volta Para Minha Terra” do Domingo Legal (a associação depende do personagem). As ideias são brilhantes assim mesmo e provavelmente serão desenvolvidas de forma mais eficiente em outros episódios. De qualquer forma, o primeiro “Kama Surta” chegou depois do intervalo e conseguiu esquentar as coisas antes que soasse alguma sirene para “apelação de emergência” (sim, ela existe e, por sinal, já foi acionada). Em uma mistura de “Ponto Pê” da saudosa Penélope Nova na já extinta e mais saudosa ainda MTV (felizmente, nem a recente perda de rumo e concorrência da emissora gringa com o Multishow fugiram à língua afiada de Porchat) com Laura Muller no “Altas Horas”, os apresentadores respondem perguntas de teor erótico feitas pelo público. Apesar de os apresentadores inicialmente terem se segurado – quer dizer que nem Tatá Werneck e nem Fábio Porchat sabem o que significa “beijo grego”? Arram -, os bonecos infláveis com pênis e vaginas à mostra são um tipo de atrevimento sempre bem-vindo ao clima coxinha do humor atual. Afinal, até com a plateia eles são imperdoáveis, lançando perguntas indiscretíssimas que fariam até a própria Laura Muller corar.
Outro momento divertido foi o quadro “Fritando o pastel”, uma versão mais safada do “Tira o Chapéu” de Raul Gil que serviu para evidenciar que quase ninguém sabe quem é Angela Merkel (dica para a próxima: ela é primeira-ministra, e não presidente da Alemanha). A parte de fazer coreografias dos hits antigos também promete ser algo empolgante (uma pedida? Ragatanga!) e o “Barraco do Dia” é a cereja de um bolo mais apelativo do que aquele usado no chá de bebê da Christina Aguilera. Na melhor encarnação de Márcia Goldsmith (mexeu com você, mexeu com ela!) em Casos de Família, Tatá e Fábio recebem duas pessoas que precisam “acertar as contas”, enquanto os apresentadores põem lenha na fogueira e incentivam o bom e velho barraco na tevê brasileira. Se as histórias são verdadeiras ou não passam de um truque da produção, ninguém nunca saberá, já que o programa original também permanece um mistério. Agora, indubitavelmente, um dos momentos de ouro desses 60 minutos de programa foi a volta de Fernandona, a tão amada quanto vesga personagem criada por Tatá já nos primórdios da sua carreira na MTV. Apenas uma palavra para definir esse momento: nostalgia.
Dentre os próximos convidados de “Tudo Pela Audiência” estão a apresentadora Eliana, o antigo comediante Tom Cavalcante sem seu cuecão de couro, a onipresente Preta Gil, Valesca, Anitta, Sheilas Carvalho e Mello e mais uma penca de gente aleatória e que deve render ótimas risadas, como Danilo Gentili e João Kleber. Os seis episódios por semana podem até ser um desafio de audiência que precise mesmo ser muito bem conquistado e cultivado, mas se fosse para escolher duas pessoas para tal tarefa, ninguém seria melhor que Tatá Werneck e Fábio Porchat.
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