*Com Thaissa Barzellai
Márcelia Cartaxo. Foi esse o nome comentado por todos os que passaram pelo Festival de Cinema de Gramado, mesmo dias após a sessão de exibição do longa-metragem “Pacarrete”, que conta com a direção de Allan Deberton. Sua interpretação no filme nordestino foi de uma sensibilidade e grandiosidade inigualáveis. Ela emocionou e arrebatou o coração dos espectadores e do júri ali presentes e, portanto, só havia um desfecho digno para essa história que ficou para o legado dessa grande festa cinematográfica: o Kikito de Melhor Atriz. E assim foi. Ovacionada, a atriz e diretora subiu ao palco para receber o prêmio. “É uma gratidão muito grande. Tocar o coração das pessoas é muito difícil hoje em dia”, disse.
Com oito Kikitos na bagagem, entre eles o de Melhor Filme pelo Júri Popular e Oficial e Melhor Roteiro, a obra é uma grande homenagem à trajetória dessa artista nordestina. Bailarina e professora de dança aposentada, Pacarrete, interpretada por Marcélia, retorna à cidade natal no interior do Ceará com apenas um desejo: se apresentar para a população que sempre fez parte da sua vida. O que ela não esperava é que seria rejeitada pelos conterrâneos. Assim como a sua personagem, a atriz sabe muito bem o que é retornar a um lugar quando o destino se transforma em um caminho repleto de obstáculos.
Mesmo ganhadora de grandes prêmios internacionais, como o Urso de Prata em Berlim por sua brilhante performance no longa-metragem “A Hora das Estrelas”, direção de Suzana Amaral, um dos títulos que consagrou a atriz no cenário audiovisual, Marcélia Cartaxo se viu sem ter para onde seguir: oportunidades de trabalho cessaram e, radicada no Rio de Janeiro, decidiu que era hora de voltar para casa – não para desistir, mas para encontrar outros caminhos na arte como a Pacarrete que sempre foi. “A Pacarrete é uma artista de exemplo e resistência, igual a mim. Ela é dança, cinema e, acima de tudo, arte. Ela abriu grandes portas para a gente na história de hoje”, declara em entrevista exclusiva ao site Heloisa Tolipan.
Em meio a tantos filmes incríveis apresentados na Mostra Competitiva, “Pacarrete”, pela sua força de elenco e de narrativa, foi como uma luz no fim do túnel para o cinema nordestino ao ser consagrado como um dos grandes vencedores da noite. Como gestora cultural na Fundação Cultural de João Pessoa (Funjope), Marcélia entende bem as dificuldades que o cinema nordestino passa para ser feito e efetivamente reconhecido, mesmo sendo uma das regiões que mais representa o cinema brasileiro mundo afora. No palco do Palácio dos Festivais, em Gramado, na Serra Gaúcha, no maior festival da América Latina, Marcélia ressaltou: “O Nordeste sempre teve grandes momentos na história do cinema, então ter esse espaço e esse reconhecimento no Festival de Gramado só nos engrandece e fortalece tudo aquilo que já estamos trilhando. Tudo isso vai ser importante para nós continuarmos contando as nossas histórias ”.
Agora, com uma força fullgás pós-Festival de Cinema de Gramado, Marcélia retorna à cidade natal, Cajazeiras, exatamente como a “Pacarrete”: com um desejo maior do que ela de fazer arte. Com três curtas-metragens no currículo, como o “Tempo de Ira”, a grande vencedora do Kikito se prepara para lançar seu primeiro trabalho como diretora de longas: “Eu Vou Tirar Você desse Lugar”, cujo roteiro, escrito pelo ator Paulo Roque, é uma grande amostra do que é a presença alagoana e paraibana por meio de um melodrama sobre amores improváveis entre pessoas que enfrentam a marginalidade e crises sociais. Sempre à frente da expansão da arte nordestina, Marcélia também lança esse ano mais três produções feitas na região que comanda sua trajetória: o documentário “Seu Amor de Volta” (Bertrand Lira), e o filme “Ambiente Familiar” (Torquato Joel) – além, claro, do grandioso “Pacarrete“, que chega em circuito nacional em 2020 após percorrer outros festivais. Pelo visto, o futuro de Marcélia vai ser do jeito que ela sempre quis. “Esse ano é nosso! Viva o Nordeste”.
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