Thiago Amaral, da série Reis, reflete sobre machismo e patriarcado: “Para mudar precisamos escutar as mulheres”


O ator, que também pode ser visto em ‘Cúmplices de Um Resgate’, disponível na Netflix, analisa o tema a partir da história de seu personagem na trama da Record. “Entender que nós homens fazemos parte de um lugar privilegiado e abdicar disso é essencial. Tem que saber ouvir e agir diferente, como fez o Micael, um cara que tem atitudes à frente do tempo dele, que é uma ponta de esperança”. A criação da filha, Ellora, de 4 anos, vem ajudando o artista a rever conceitos. “Eu sou do Sul do Brasil, gaúcho, onde o machismo e o patriarcado estão na raiz da cultura. Então, educar uma menina hoje em dia é uma oportunidade incrível de reflexão, de reparar os nossos erros dentro dessa estrutura que a gente perpetua sem saber”, pontua.

* Por Carlos Lima Costa

Em uma sociedade patriarcal, o machismo sempre esteve presente através dos anos. Mesmo o homem que não defende esse tipo de comportamento, muitas vezes se viu nesse lugar por conta de um comentário, por exemplo. Para o ator Thiago Amaral, o israelita Micael da série Reis, da Record, o melhor caminho para uma mudança efetiva é escutar as mulheres. “Esse é o ponto de partida. Escutar, refletir e agir diferente. Isso se consolida nas ações do dia a dia. A partir daí está sendo o meu ponto de mudança. Tenho muito a aprender, a evoluir ainda. O nascimento da minha filha, Ellora, de 4 anos, veio como mais uma oportunidade para que eu mude as atitudes e plante essa semente nela também. Entender que nós homens fazemos parte de um lugar privilegiado e abdicar disso é essencial. Tem que saber ouvir e agir diferente, como fez o meu personagem, um cara que tem atitudes à frente do tempo dele, que é uma ponta de esperança”, enfatiza o artista.

Na história, Micael tem a vida pautada por acontecimentos inesperados. Sâmila (Natália Ferrari) se recusa a recebê-lo justamente quando ele vai lhe pedir em casamento. Depois, ao descobrir que a jovem havia sido estuprada, ele lhe dá acolhimento. “Micael teve uma atitude belíssima. Se a gente for entender ali as regras de convivência social, como se formavam as famílias, muito em função do patriarcado, ele é um homem que realmente tem atitudes boas. O fato de levar o amor deles em conta e aceitar se casar com a Sâmila é uma atitude que demonstra isso. O amor pela família é o motor de vida dele”, explica.

Atualmente, Thiago pode ser visto na série Reis., da Record, e em Cúmplices de Um Resgate, na Netflix (Foto: Carlos Sillero)

Atualmente, Thiago pode ser visto na série Reis., da Record, e em Cúmplices de Um Resgate, na Netflix (Foto: Carlos Sillero)

Atualmente, por mais que as mulheres tenham conquistado espaços, posições de comando, denunciem assédios verbais e morais, abusos sexuais, o patriarcado ainda é forte. Como pai, Thiago se preocupa com o futuro da filha e explica como a ensina para que no futuro consiga fugir das armadilhas machistas. “Educar uma menina hoje em dia é uma oportunidade incrível de reflexão, de reparar os nossos erros dentro dessa estrutura que a gente perpetua sem saber. Eu sou do Sul do Brasil, gaúcho, onde o machismo e o patriarcado estão na raiz da cultura. Mas aprendo muito com a minha esposa, Ohana Homem, e a gente presta muita atenção para instrumentalizar a Ellora para ela poder se posicionar no futuro quando se sentir encurralada por essas situações”, observa.

Thiago com a mulher, Ohana Homem, e a filha do casal, Ellora, em clima de brincadeira (Foto: Arquivo Pessoal)

Thiago com a mulher, Ohana Homem, e a filha do casal, Ellora, em clima de brincadeira (Foto: Arquivo Pessoal)

Thiago chama atenção que na série se vê ainda a questão da corrupção, outro tema tão atual também. “Ali tem a descrença, a falta da fé e o Micael é uma ponta de esperança, um personagem resignado que sempre luta pela justiça”, conta. Já casado e com filhos, ele vai para as batalhas. Mais uma surpresa, afinal ele não é um guerreiro. É um homem que trabalha com a terra. “O Micael vai para a guerra sem ter experiência nenhuma. Uma barra pesadíssima. Ele não é um personagem de ataque. Então, nos treinamentos de artes marciais que fiz para as cenas de batalhas, trabalhei muito a esquiva e a defesa”, observa ele, que teve aulas de lutas com espada, escudo, arco e flecha, lança e adaga.

A situação da ficção remete à guerra da Ucrânia, onde civis pegam em armas para defender o país atacado pela Rússia. “Esse paralelo é perfeito. Quando gravamos as batalhas essa guerra ainda não existia, mas quando estourou fiquei pensando sobre isso. O Micael se vê em uma guerra com a família colocada em risco, defendendo o que ele acredita. Devemos estar vendo vários como ele na Ucrânia”, analisa o ator, que, anteriormente, havia atuado em Gênesis, outra trama religiosa, na mesma emissora. “Minha relação com a religião é mais humanista do que propriamente dogmática. O meu ritual é muito mais ligado à meditação, ao bem estar, a empatia, entender que precisamos olhar e ouvir o outro”, afirma.

Thiago Amaral e Natália Ferrari, interpretam um casal na série Reis (Foto: Arquivo Pessoal)

Thiago Amaral e Natália Ferrari, interpretam um casal na série Reis (Foto: Arquivo Pessoal)

Natural de Porto Alegre, onde se formou em Artes Cênicas, ele, no decorrer da pandemia voltou a morar no Sul do país com a mulher e a filha do casal. “Morávamos em um apartamento em São Paulo, onde caçávamos o sol no play do prédio, aí viemos para cá. Estamos morando no litoral, com uma qualidade de vida incrível, em uma casa, a três quadras de uma praia relativamente bem vazia”, ressalta.

Assim, ao gravar Reis, se manter longe de seus dois amores foi a parte mais difícil. “Foi um período de afastamento bem pesado. Cheguei a ficar 60 dias fora de casa. A saudade delas me colocou em um lugar mais à flor da pele também para viver o Micael, afastado da família no meio de uma batalha e voltando para vê-los. Esse é um movimento comum entre nós dois”, aponta ele, que contracenou com a mulher na novela Cúmplices de Um Resgate, do SBT, em 2016. Ohana deixou a profissão de atriz e agora é psicanalista. “Ela achou um caminho bonito com a terapia e está satisfeita, plena, foi uma transição bonita”, assegura.

“Minha relação com a religião é mais humanista do que propriamente dogmática. O meu ritual é mais ligado a meditação, ao bem estar, a empatia, entender que precisamos olhar e ouvir o outro”, conta Thiago (Foto: Carlos Sillero)

“Minha relação com a religião é mais humanista do que propriamente dogmática. O meu ritual é mais ligado a meditação, ao bem estar, a empatia, entender que precisamos olhar e ouvir o outro”, conta Thiago (Foto: Carlos Sillero)

Juntos há mais de dez anos, os dois se conheceram, em Porto Alegre, gravando comerciais. “Nosso primeiro beijo foi em um comercial de guaraná, um beijo técnico, mas quando a gente é adolescente tudo se mistura um pouco. Quando fomos aprovados para Cúmplices de Um Resgate, já morávamos juntos, no Rio de Janeiro, e aí fomos para São Paulo”, lembra.

Profissionalmente, Thiago é um exemplo típico dos artistas da atualidade que atuam em várias plataformas de streaming e nas TVs abertas. Entre outros trabalhos, ele atuou em Rebelde, na Record, Preamar, na HBO, As Canalhas, no GNT, Cúmplices de Um Resgate, no SBT, Lara Com Z e A Favorita, na Globo. “O streaming chegou trazendo uma nova onda de qualidade. Foi uma mudança muito positiva. O fato é que tem mais trabalho para todo mundo, para a classe artística como um todo. Quando saí de Rebelde fui direto para Lado a Lado, na Globo, já saí fazendo uma transição que era pouco comum na época. Mas o fato é que a entrada do streaming e a deixada de hegemonia da Globo, digamos assim, distribuiu mais trabalho para todo mundo”, avalia.

Ao longo da carreira, Thiago vem atuando em variados canais da TV aberta e dos streamings como Record, Globo, SBT, HBO e GNT (Foto: Carlos Sillero)

Ao longo da carreira, Thiago vem atuando em variados canais da TV aberta e dos streamings como Record, Globo, SBT, HBO e GNT (Foto: Carlos Sillero)

E prossegue: “Hoje, temos a Record com as produções bíblicas. Em Reis vemos uma sofisticação e um avanço tremendo dentro de linguagem de cinema. Tem o SBT com as produções infantis e que dão muito certo, principalmente com esse público com apelo de internet. E todos os streamings, como o Netflix, Amazon, Apple TV, consumindo os produtos brasileiros. Estão entendendo que investir em audiovisual é um negócio tremendo, porque aqui temos atores extremamente talentosos para produções supervariadas. Então, a mudança foi positiva e trouxe muito mais trabalho para a classe artística”, avalia.

Além da trama bíblica da Record, atualmente ele pode ser visto em Cúmplices de Um Resgate, disponível na Netflix. “Está indo bem, percebi um aumento de seguidores nas redes sociais. É um público totalmente novo, diferente. Muito bacana ver como um produto que deu certo na TV aberta está fazendo supersucesso no streaming”, finaliza ele, que no cinema marcou presença no filme Meu Tio Matou Um Cara, e, no teatro, atuou em peças como O Despertar da Primavera.