“Sou uma outra pessoa”, diz Bel Kutner sobre período em que foi diretora artística da Cidade das Artes


Em conversa exclusiva, a atriz falou sobre o novo papel na novela das 18h, e, após a premiação pelo trabalho realizado como diretora artística na Cidade das Artes, refletiu sobre as dificuldades encontradas: “A burocracia administrativa para se fazer cultura e arte por aqui é indigente. E não à toa, quase nunca chega a uma grande parcela populacional”

*Com *Por Thaissa Barzellai

Recém-saída da diretoria artística da Fundação Cidade das Artes, na Barra da Tijuca, Rio de Janeiro, Bel Kutner, que esteve no cargo durante três anos, e por conta do desempenho, levou um troféu na sétima edição do Prêmio Cesgranrio de Teatro, no final de janeiro, falou com exclusividade ao site sobre a experiência. “Acho que cada um tem que dar, à sua maneira, o tempo e dedicação para pensar no interesse público, no interesse de uma formação cultural na nossa cidade, do nosso estado e do nosso país. Então, nada melhor do que estar dentro e entender como a máquina funciona, porque existem regras, existe uma história”, reflete a atriz, que desempenhou a função sob a batuta de André Marini, que foi diretor-presidente da Fundação, durante o mesmo período.

Bel Kutner vence prêmio pelo trabalho realizado na Cidade das Artes como diretora artística. (Créditos: AgNews)

Na temporada à frente da programação da instituição, Bel conheceu a história da cultura carioca e do Brasil, sentada do outro lado da mesa. E foi descobrindo que, como quase tudo na trajetória do país, o buraco sempre pode ser mais embaixo. “A burocracia administrativa para se fazer cultura e arte por aqui é indigente. E não à toa, quase nunca chega a uma grande parcela populacional”, diz. “Sou uma outra pessoa e tenho uma responsabilidade muito maior. Vou ter que digerir e entender muita coisa ainda, sobre como me posicionar neste novo momento. Também para produzir os meus projetos e estar junto dessas pessoas que administram esses espaços, entendendo como podemos criar uma rede para o teatro. Principalmente, porque o Rio é uma cidade gigantesca e o que acontece no Centro, por exemplo, não chega à Zona Oeste”, analisa a atriz, que durante o tempo na Cidade das Artes fez questão de criar projetos inclusivos e eventos gratuitos. Não há dúvidas de que foi um período de grande benefícios para ambas as partes, apesar do que o pedido exoneração da atriz do cargo e da repercussão de sua saída possam transparecer para quem acompanha.

Ao sair do cargo, André Marini exaltou, através de texto enviado à equipe e amigos próximos, os ganhos da sua experiência na gestão, e também os resultados alcançados. E claro, agradeceu à Bel e a outros colaboradores pelo empenho, afirmando que o seu sentimento era o de dever cumprido, e que continuará apoiando, voluntariamente, os artistas e produtores. Bel também vê sua passagem pela instituição, da forma mais positiva possível, apesar do que muito se especulou a respeito do desfecho deste ciclo.

“Vou ter que entender sobre como me posicionar neste novo momento. Também para produzir as minhas coisas” (AgNews)

Ela, que por algum tempo não se manifestou sobre o ocorrido, não hesita em falar que a experiência foi essencial para que evoluísse enquanto cidadã, em tempos que o engrandecimento sociopolítico é uma ferramenta de sobrevivência contra iniciativas governamentais no Rio. “Não existe uma política pública e só quem está lá sabe. Todo mundo bate cartão, às vezes até mesmo de outro setor, de segunda a sexta-feira. O Rio de Janeiro tem uma cultura fortíssima, super diversa, e a Cidade das Artes é um centro cultural maravilhoso, novinho em folha começando a experimentar todo tipo de experiência cultural”, diz. “Mas acho que foram três anos de muita alegria, sucesso, trabalho, e eu aprendi demais. Espero que continue sendo assim”, relembra Bel, que não descarta a possibilidade de retornar ao local, desta vez, como atriz ou produtora de novos projetos. Seja como for, uma coisa é certa: Bel Kutner não vai parar.

“Foram três anos de muita alegria, sucesso, trabalho, e eu aprendi demais. Espero que continue sendo assim” (AgNews)

Nos seus 30 anos de carreira, a atriz acumulou a bagagem que reflete seu talento e suas escolhas, tudo motivado por sua inquietude artística, que continua a surpreendendo. Como recentemente, quando realizou o sonho de entrar para o time de atores da dupla Charles Moeller e Claudio Botelho no musical “O Despertar da Primavera”, e também, no momento em que se prepara para retornar à TV, na próxima novela das 18h, “Nos Tempos do Imperador”.

Bel com as madeixas alongadas para viver Celestina em “Nos Tempos do Imperador”, a nova das 18h (Reprodução Instagram)

A trama vai contar o período comandado por Dom Pedro II. “É uma emoção revisitar essa história do Brasil que eu não conhecia muito, fora o que tinha aprendido na escola. Esse foi um período fundamental na transição do país até chegar na libertação dos escravos e na República. E Dom Pedro II foi um personagem importantíssimo. Sua história é muito bonita”, conta.

Bel vai viver Celestina, na novela de Alessandro Marson e Thereza Falcão (Divulgação)

Ao lado de nomes como Selton Mello (o próprio Dom Pedro II) e Alexandre Nero, Bel vai viver Celestina, o braço direito e esquerdo da imperatriz Thereza Cristina (Letícia Sabatella), na novela de Alessandro Marson e Thereza Falcão, que tem como pano de fundo, o Segundo Reinado, e abordará comportamentos dessas figuras históricas na sociedade da época, refletindo muitas questões que ainda se perpetuam em meio à nossa sociedade. “Era um Brasil que tinha muito a esperar do futuro e muita coisa não se concretizou. Na novela, a gente consegue entender como as coisas foram iniciadas e isso é muito bonito. É uma história que fala dos negros que estavam aqui, muitos já livres, e começando a vida em um país, fazendo algo deste lugar”, explica.

A atriz já está gravando em locações como Valença, no Rio de Janeiro, e Lençóis, na Bahia, e assumiu a cabeleira característica do papel. Ela conta ainda, que por meio de todos os personagens, inclusive os ficcionais, o passado representado terá muito o que ensinar ao mundo atual, corroborando o conceito de que um país sem memória, é um povo sem história, e portanto, incapaz de evoluir socialmente e humanamente. “Sempre que se fala de relações humanas, fala-se do indivíduo contemporâneo, porque podemos estar falando de qualquer tempo. Nós vamos encontrar as referências, como os núcleos familiares, as identificações, as grandes paixões, a corrupção, enfim. Vamos enxergar o ser humano que é tão rico e ao mesmo tempo tão terrível”.