*Por Rafael Moura
O público mal se despediu de Paulo Rocha, que na novela ‘Éramos Seis’, vivia o advogado Felício, no folhetim de Angela Chaves, e já pode conferir o português em dose trilha nas telinhas, nas reprises da TV Globo: em ‘Novo Mundo’, 2017, ‘Totalmente Demais’, 2015, e ‘Fina Estampa’, de 2011. “Eu não consigo acompanhar as três novelas por inteiro por conta da rotina em casa. Tento assistir um pouco de cada uma e é muito interessante analisar os trabalhos sem toda uma expectativa e o fato de estar gravando ao mesmo tempo. Ver o trabalho com esse distanciamento, inclusive na parte afetiva, é muito interessante. Consigo analisar os personagens e as performances de forma mais real e prática”, revela o ator ao site Heloisa Tolipan.
Na trama das 18h, Paulo encarnou o General Avilez, que chegou a ser um ‘grande desconforto nas bonitas’ de Dom Pedro I, vivido por Caio Castro. Nas 19h, ele interpreta o vilão Dino, padrasto da mocinha Elisa, personagem de Marina Ruy Barbosa. E, no horário nobre, às 21h, dá vida ao romântico e trabalhador Guaracy, seu primeiro trabalho em uma TV brasileira. “Foi um projeto que marcou muito, me mudei de Portugal para o Brasil. Então, acho que isso revela bem a importância que essa novela e esse personagem tiveram em minha vida”, enfatiza.
Na história de Aguinaldo Silva, o português, é um comerciante, apaixonado pela protagonista, Pereirão/ Griselda, que fica milionária, interpretada por Lília Cabral. Cansado de não ter a atenção de sua amada, inicia um romance com a estilista Esther, personagem de Júlia Lemmertz. No fim o personagem termina com a mocinha. “Cheguei ao Brasil com 33 anos, não conhecia o país. Então, era tudo muito novo. Cheguei com a ambição de fazer o meu trabalho da melhor maneira possível, não era um projeto de longo prazo. Lembro de uma situação engraçada nas gravações na primeira cena de jantar em que o Guaracy estava na casa da Griselda. Com todo mundo na mesa eu tinha que explicar a chegada do personagem no Brasil. Eu falava: ‘Eu tinha um tio’ em português de Portugal, e cada vez que eu falava isso todo mundo ria. Foi um momento muito divertido. A gente se divertia muito com aquela família toda. Fui muito bem recebido por todos. Tenho grandes amigos que me acompanham até hoje, que conheci no trabalho em Fina Estampa”, relembra.
Já na história de Rosane Svartman e Paulo Halm, ‘Totalmente Demais’, uma versão contemporânea da história da Cinderela, o artista marcou uma nova fase em sua carreira, pois sai o galã e entra um vilão, machista, abusador com um ar mais cafajeste, mostrando sua versatilidade criativa ao público brasileiro. “O Dino é um homem terrível, com uma visão de mundo péssima. Ele é realmente um ser humano muito difícil. Foi o primeiro vilão que eu fiz no Brasil. Foi uma oportunidade para fazer uma boa pesquisa. Sem dúvida, um dos trabalhos mais marcantes da minha carreira”, frisa.
Essa faceta de vilão fez tanto sucesso que Rocha em 2017, acionou novamente esse lado mau-caráter para interpretar o General Avilez, parceiro de Thomas, papel de Gabriel Braga Nunes em ‘Novo Mundo’, de Thereza Falcão e Alessandro Marson, que lutavam para que o Brasil não se tornasse independente de Portugal. Para os atores, a história da novela traz algumas semelhanças com esse período de pandemia. “Naquela época, o povo enfrentava um novo mundo, como enfrentamos hoje. Um mundo que nos deixa inseguros, assustados, mas onde nem tudo é ruim. É hora de cuidarmos e estarmos com quem nos faz feliz e amamos”, compara. E completa: “O Avilez me deu a oportunidade de voltar a fazer um personagem português no Brasil depois de tantos anos interpretando brasileiros, além de um personagem histórico, envolvido num tema tão importante. Todo o trabalho de pesquisa, de conexão com os colegas foi um processo incrível”. O ator ressalta ainda que as três novelas falam de transformação, superação e esperanças. “Estamos vivenciando tempos difíceis, o que motivou isso a acontecer é assustador. Gosto de acreditar que as tramas passam uma mensagem de esperança, além de apresentarem histórias leves”.
Seu pai, José Manuel Costa Reis, é um grande cenógrafo, figurinista e pintor, o que acabou exercendo uma grande imersão no universo das artes, dentro de casa, influenciado na sua carreira de ator. “Sem dúvida nenhuma o meu pai fez com que a minha sensibilidade para as artes fosse ampliada e aguçada em todo seu espectro por conta da profissão dele. Eu nunca cheguei a pensar em outra profissão para exercer. A partir do momento em que comecei a pensar mais seriamente no meu futuro, o trabalho de ator atravessou o meu caminho e foi paixão à primeira vista. E isso ter acontecido em tenra idade fez com que eu nunca tivesse dúvidas sobre qual profissão seguir. E de lá para cá não tive vontade de fazer outra coisa que não fosse atuar”, revela.
Paulo conta ainda que gostaria de interpretar um personagem clássico. “Sempre tive grande curiosidade em alguns clássicos, por isso a vontade de dar vida a um dos grandes protagonistas de Shakespeare. Por tudo o que Shakespeare representa na dramaturgia e na literatura mundial, por ser uma referência em nosso universo artístico”.
A arte por si só é um ato/ profissão de resistência. O poeta Ferreira Gullar costumava dizer que ‘A arte só existe porque a realidade não basta’. Perguntamos ao ator, como ele enxerga essa afirmação. “A arte é aquilo que nos torna humanos, é o que nos diferencia. Não existe humano fora da arte. A arte é uma característica exclusiva nossa enquanto espécie. E é uma parte fundamental da nossa existência. Eu colocaria de outra forma: sem arte se morre de realidade. É a arte que nos ajuda e ela é muito mais ampla do que a gente imagina”, reflete.
Com a mão na terra
Para o ator, o isolamento social por conta da pandemia causada pela Covid-19, não chega a ser um ‘problema’, afinal Paulo, que garante ser um homem caseiro, estava de férias com a família. “Eu acabei de sair de ‘Éramos Seis’, estava nos planos uma pausa para descansar”, conta. O português revela ainda que está aproveitando para se conectar mais com a natureza, por conta desse momento desses ares mais calmos e tranquilos do campo. “Tenho procurado cavar a terra, rachar a lenha, fazer adubo. Estou fazendo o pão aqui em casa, reavivei algumas receitas de Portugal, voltei a cozinhar”, diz. Apesar dessa calmaria, o artista nos conta que o tédio passa longe, afinal ele tem um filho de dois anos, José Francisco. “Quando a gente tem uma criança pequena e uma casa para cuidar, o tédio não tem nem espaço. A gente mal tem tempo para se coçar, como se diz em Portugal”. E completa. “Tenho dias melhores e outros nem tanto. Eu estou com a minha esposa, com os meus sogros e com o meu filho. Apesar do momento que estamos vivendo, ter a possibilidade de ficar 24 horas por dia próximo do meu filho e acompanhar dessa forma tão intensa o crescimento dele, é maravilhoso”.
Paulo conta com mais de 139 mil seguidores no Instagram, sendo a internet, atualmente, a nossa grande forma de comunicação e entretenimento. “É um meio incontornável. Nossa sociedade está mudando muito rápido e temos que nos adaptar, sobretudo pessoas que começaram a ter contato com isso ao longo da vida, que não nasceram já nessa era. Hoje em dia, crianças de 13, 14 anos nasceram nessa era e isso já se apresenta como algo natural. De qualquer modo, acho que é importante, porém oferece algumas armadilhas, pois nem sempre temos como confiar nas informações. Mas olhando pelo lado mais positivo, a internet permite uma democratização da informação. Permite a possibilidade de novas formas de arte aparecerem e serem apresentadas justamente por conta dessa democratização. E isso é ótimo”, conclui.
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