Robson Lima vive músico Júlio Rasec no filme ‘Mamonas Assassinas’ e fala sobre receptividade da banda pela Geração Z


Robson Lima está no elenco de “Mamonas Assassinas – O Impossível Não Existe”. Ele reflete sobre a aceitação das letras e comportamentos dos personagens pela juventude da atualidade. “Como artistas, acredito que nós somos seres políticos e que temos espaço para manifestar atos políticos e entretenimento. São muitos caminhos e escolhas que podem coexistir. Os cinco meninos de Guarulhos tinham essa leveza, o aspecto que tocou tanto o público. Muita gente falava ‘não é possível que eles fossem assim o tempo todo’, mas nós tivemos contato com os familiares e amigos. Eles eram assim de verdade. Então, é algo que faz parte da essência deles enquanto indivíduos, o que torna impossível de dissociar isso da manifestação política transmitida por eles. Mas a mensagem que os meninos queriam passar era de alegria e diversão”

Robson Lima abre o coração sobre o transtorno de ansiedade

*por Luísa Giraldo

O ator e cantor Robson Lima assumiu o desafio de interpretar o músico Júlio Rasec (1968-1996) – integrante de uma das principais bandas de rock cômico dos anos 80 no Brasil -, no longa “Mamonas Assassinas – O Impossível Não Existe”. O filme relembra a trajetória do quinteto que alcançou a fama e uma legião de fãs e que morreu em um trágico acidente aéreo em maio de 1996. Robson já interpretou nos palcos o icônico Danny, encarnado originalmente pelo galã hollywoodiano John Travolta, em “Grease”. Ciente da responsabilidade destes trabalhos em um momento de inúmeras suscetibilidades sociais e embates relacionados a elas nos ambientes virtuais, o ator reflete sobre se haveria um possível cancelamento da banda e das letras de cunho humorístico – e, muitas vezes, sexista – pela Geração Z, sobre as inseguranças envoltas na personalidade cafajeste de Danny e a forma como ele procurou abordá-las com humanidade no musical.

Em uma tentativa de descrever a emoção pela oportunidade de compor o elenco do filme do Mamonas Assassinas, Robson elenca a palavra “responsabilidade”. Para conseguir lidar com ela, o artista dividiu o papel em dois planos: da dimensão e da execução. Portanto, ele optou por se ater “na humanidade do Júlio e a pensar sobre a pessoa maravilhosa que ele foi como filho, irmão e amigo”. A ideia de Robson era transmitir a história da banda que, até hoje, carrega uma simbologia emocional imensa para uma parcela dos brasileiros.

A partir de uma reflexão sobre o legado do quinteto de Guarulhos no repertório musical do país, o artista expõe a opinião sobre as polêmicas letras do grupo. “Entendo que o conteúdo das músicas é sensível de certa forma, mas me ative, ao mesmo tempo, ao fato de que eu sou compositor. Quando a gente fala sobre o processo e composição, o artista compõe sobre a sua sociedade, a sua visão de mundo e o recorte em que ele vive. Os Mamonas foram transgressores em alguns aspectos e muito irreverentes em outros. A década de 90 aborda o fim de narrativas e vivências muito específicas, o que fez com eles fizessem recortes temporais de assuntos relevantes para a época e a desconstrução de outros”, pontua. 

Precisamos avaliar outros parâmetros quando falamos dos anos 90. Como eram as propagandas? O que passava na TV? Qual era a estrutura dos programas? A discussão é muito mais profunda, e vai além dos Mamonas. A banda teve início e fim nesse mesmo período. Não sabemos o que eles teriam produzido após ou como os trabalho se apresentariam [e seriam recebidos] nos dias de hoje. Como exemplo, a canção “Robocop Gay” [associada com frequência pelos fãs à temática LGBTQIA+] fala muito mais sobre se libertar e ser quem se é genuinamente do que qualquer outra coisa. O fio narrativo e as letras, algumas vezes provocativas, não deixam de ser o fruto do tempo em que viveram — Robson Lima

Robson identifica que eles ascenderam rapidamente pela forma que se comunicavam com o público daquela geração. Ainda assim, o cantor acredita que o transpor o “recorte de uma vida que aconteceu no passado e foi finita” para os dias de hoje é um desafio, sobretudo em um contexto de tantas discussões políticas e de minorias sociais.

Robson Lima é Júlio Rasec em filme sobre os Mamonas Assassinas (Foto: Divulgação)

Robson Lima é Júlio Rasec em filme sobre os Mamonas Assassinas (Foto: Felipe Quintini)

“Nós não temos como prever ou entender o que aconteceria com o futuro dessa banda. Se os integrantes estariam juntos ou não e se continuariam com o mesmo estilo. Nunca saberemos se eles, como quaisquer seres humanos que têm a oportunidade de aprender e fazer diferente, também mudariam as narrativas das suas letras e composições. Entendo que, ao recortar esses caras dos anos 90 e trazê-los para 2023, pode dar muito o que falar. Com esta reflexão do recorte temporal, a gente compreende que é algo que aconteceu no passado”.

Acredito que a cultura do cancelamento não abre margem para evoluir o que temos de mais eficaz enquanto seres humanos: o diálogo. Penso que não é possível traçar um paralelo sobre vidas que infelizmente não estão mais entre nós. O que podemos, sim, é analisar que esses meninos levavam muita alegria, irreverência e crítica para a sociedade em que viveram na década de 90. Mas não podemos prever o que eles seriam hoje — Robson Lima

Mesmo encantado pelo carinho do público que permanece até os dias de hoje, o ator de 29 anos compreende a frustração de muitos acerca da inatividade política do grupo. Ele avalia as críticas recebidas pelos Mamonas Assassinas em momento de volta da democracia como válidas, porém reforça o foco da banda: o entretenimento.

“Como artistas, acredito que nós somos seres políticos e que temos espaço para manifestar atos políticos e entretenimento. São muitos caminhos e escolhas que podem coexistir. Os cinco meninos de Guarulhos tinham essa leveza, o aspecto que tocou tanto o público. Muita gente falava ‘não é possível que eles fossem assim o tempo todo’, mas nós tivemos contato com os familiares e amigos. Eles eram assim de verdade. Então, é algo que faz parte da essência deles enquanto indivíduos, o que torna impossível de dissociar isso da manifestação política transmitida por eles. Mas a mensagem que os meninos queriam passar era de alegria e diversão”, explica o artista, que tingiu os cabelos de vermelho para o papel.

A chave é o entendimento que as atuais discussões e lutas latentes são produtos da observação e do aprendizado a partir do que já passou. Os tempos eram outros, assim como as referências. Todos os debates e temáticas que temos no presente abrem caminhos e espaços que não eram sequer abordados. Que bom que temos a oportunidade e a constante busca pela evolução enquanto sociedade — Robson Lima

Ainda no tópico da leveza, o intérprete de Júlio confessou ter roubado a característica do personagem para si. Ao site, Robson abre o coração sobre a ansiedade que o acompanha há anos, acentuada pela pandemia da Covid-19. A forma que encontrou para conter a intensidade dos sentimentos foi compor músicas, o que tornou a estabelecer “uma relação bem mais madura com a ansiedade”.

Robson citou a importância da presença da irmã de Júlio, Paula Rasec, e da família durante o processo de conexão com o personagem. “O que mais trago da troca entre o Júlio e o Robson é esse sentimento de segurança e acolhimento. O período das gravação foi muito intenso, mas tentei respirar e entender que, assim como o Júlio era o porto seguro do grupo, também queria ser isso para os meus amigos durante o processo. Também acredito que a generosidade e bondade do Júlio com essa ótica bonita de ver o mundo e as relações com cuidado é algo que eu busco para a minha vida”, admite.

O artista Robson Lima lançou um single sobre seu transtorno de ansiedade e recebeu feedbacks positivos até mesmo de psiquiatras

O artista Robson Lima lançou um single sobre seu transtorno de ansiedade e recebeu feedbacks positivos até mesmo de psiquiatras (Foto: Felipe Quintini)

Ao visitar as memórias da gravação, o artista relembrou que o apoio dos figurantes nos shows, interpretados pelos próprios fãs da banda, o ajudou a lidar com a pressão imposta pelo papel. Ele identificou a criação de uma ” egrégora energética” pelo público, algo que julgou essencial para acalmá-lo.

 

Grease, O Musical

Quando escolhido, Robson Lima mergulhou no papel do irresistível Danny, do longa norte-americano “Grease – Nos Tempos da Brilhantina”, lançado em 1978, que, por aqui, virou a peça de teatro “Grease, O Musical”. Em uma trama que se passa no final da década de 1950, o bad boy faz de tudo para conquistar a recatada personagem Sandy, interpretada por Olivia Newton-John (1948-2022) nos cinemas. O ator carioca assumiu o desafio de desconstruir a imagem metida de Danny a fim de despertar um sentimento e identificação com o público sem descaracterizá-lo.

Apesar do sucesso comercial e da crítica da época ter alçado o filme a esfera de “clássico do cinema”, “Grease” carrega estereótipos, pensamentos e comportamentos machistas dos personagens, proporcionais ao período em que foi formulado e a época que tratou. Assim como em Mamonas, Robson lutou contra a disseminação exagerada de falas e atitudes de cunho preconceituoso e sexista. Em 2022, o musical ficou em cartaz durante dois meses na capital paulistana e lotou todos os espetáculos.

“Como artista, tenho esse cuidado de abordar tudo de uma forma proporcional à época e à geração, apesar de pertencer a uma outra e ter uma mentalidade diferente do Danny. No espetáculo, a minha intenção foi justamente transformar esse personagem em um espelho. A gente trouxe um recorte da década de 60, que tem muitas problemáticas, e o meu grande trabalho foi criá-lo [nesse contexto], já que aquilo era real na vida desse personagem. Quis transformar o Danny em um espelho; não para ser replicado, mas confrontado. A minha ideia era fazer com que ele percebesse que precisava rever alguns comportamentos e pensamentos”, relembra. 

Aos 29 anos, o artista Robson Lima deu vida ao personagem Danny, de "Grease", mas abordou uma faceta insegura dele

Aos 29 anos, o artista Robson Lima deu vida ao personagem Danny, de “Grease”, mas abordou uma faceta insegura dele (foto: Felipe Quintini)

Em seguida, Robson detalhou a boa receptividade do público. Ele recebeu de centenas de crianças a milhares de idosos, saudosos da época da adolescência e do início da vida adulta. Tocado pelos feedbacks dos espectadores, o artista disse ter se sentido como uma “cápsula do tempo” para pessoas mais velhas ao permitir que elas viajassem ao final dos anos 1950.

Robson não se conteve ao abordar a faceta humana que atribuiu ao galã. “Adoro desafios artísticos, principalmente ao falarmos falando de outra época e de diferentes tipos de relações com outras formas de ver e expressar a intimidade. O Danny é, no fundo, um cara inseguro e que deseja se encontrar. Todos nós, em algum momento da vida, já tivemos as nossas inseguranças. Acredito que encontrar o lugar humano dele foi entender a grande motivação para as inseguranças dele dentro das atitudes do personagem. Apesar de trazer o cafajeste, tentei mostrar que ele só era um menino assustado. É uma tentativa constante de auto-afirmação”.

Antes de concluir o tópico, o artista frisa se encantar pela multipluralidade do ser humano. Ele descobriu que o combustível para o seu trabalho é justamente a abordagem da complexidade humana nos personagens, além da possibilidade de proporcionar uma identificação do público com as humanidades deles.

 

Carreira como cantor

Motivado pelo período de isolamento social, Robson compôs uma trilogia de canções no mini ep “Naïve”. Segundo o artista, as músicas tratam de um trabalho íntimo que narra assuntos delicados da vida dele de uma forma poética. O single debut do cantor foi “Respira”, lançado no final do ano passado. O próximo passo da carreira é o lançamento de “Chuva”, marcado para janeiro.

Robson Lima anuncia novo single romântico para janeiro: "Chuva"

Robson Lima anuncia novo single romântico para janeiro: “Chuva” (Foto: Felipe Quintini)

“Sempre engavetei tudo desde os 14 anos. Sentia uma síndrome do impostor e pensava que as minhas narrativas, as minhas histórias e a minha voz não eram relevantes. A maturidade artística e profissional me mostrou que outras pessoas poderiam querer saber sobre os meus sentimentos. Durante a Pandemia, tratei sobre assuntos relevantes desse período tão sensível e que deixou a gente ‘a flor da pele’ com uma linguagem lúdica e poética. Em ‘Respira’, falei sobre ansiedade, as minhas crises de ansiedade e tudo que eu vivi e foi se acumulando de certa forma. Transformei esse sentimento em arte para me ajudar a processar o que estava acontecendo”. 

Antes do lançamento nas plataformas digitais, Robson compartilhou a canção “Respira” com os seguidores no Instagram. O feedback imediato foi identificação e conexão com o público. Com carinho, ele relembra que recebeu mensagens até mesmo de médicos e psiquiatras que estavam usando a canção nos consultórios para auxiliar nos tratamentos psiquiátricos. Os pacientes diziam se identificar e conseguiam, a partir da música, “materializar e entender” a ansiedade que sentiam. O desejo de comercializá-las nasceu dessa troca.

O single “Chuva” trata de uma nova abordagem do amor e dos encontros: a forma como as pessoas se encontram romanticamente com as outras. O cantor descreve que, na vida, “os encontros são inevitáveis como a chuva”, o que fez com que ele optasse por um tom romântico e pop. Após uma canção sobre o sentimento angustiante da ansiedade, Robson comemora a oportunidade de celebrar a leveza do amor para a trilogia de músicas.