Roberta Rodrigues: “Nunca fiz troca de casais. Não evoluí o suficiente para ter uma relação aberta”


A atriz está em duas comédia sobre relações humanas que chegam ao público agora, em agosto. Vivendo mulheres potentes na telona e na TV, em ‘Nos Tempos do Imperador’, ela também fala de sexualidade, culpa e autocompaixão neste período de pandemia. “Me bateu uma deprê absurda. Fiz terapia, com a Cintia Leite, uma psicóloga preta, fiz Theta Healing. E comecei a me desprender disso. Que na verdade é entender que só posso carregar na ‘mochila’ o que aguento. Ter a humildade de entender que não vou mudar o mundo, mas posso ajudar a transformar”

Roberta Rodrigues (Foto: Sergio Baia)

*Por Brunna Condini

Vivendo mulheres potentes e que sabem o que desejam – tanto na TV quanto no cinema -, Roberta Rodrigues vê em Bettina, que interpreta na comédia ‘Dois+Dois’, em cartaz dia 12 de agosto, a oportunidade de ampliar o debate sobre sexualidade. No filme, a personagem é procurada pela amiga Emília (Carol Castro) para entender como funciona a troca de casais, já que Bettina é adepta da prática com o marido, vivido por Marcelo Laham. Em entrevista exclusiva, Roberta revela se já viveu a experiência ou algo parecido: “Nunca fiz troca de casais. Nesta parte sou até cafona demais, não evoluí o suficiente para ter uma relação aberta. Não saberia lidar com a situação. Nem sou ciumenta ao extremo, mas gosto de saber que aquela pessoa está só comigo. Não conseguiria viver uma relação em que todo mundo pode ser de todo mundo. Mas entrei no universo da Bettina sem preconceitos, para entender como ela chegou ali”.

Marcelo Laham, Roberta Rodrigues, Carol Castro e Marcelo Serrado na comédia "Dois+Dois', que estreia nos cinemas em 12 de agosto (Divulgação)

Marcelo Laham, Roberta Rodrigues, Carol Castro e Marcelo Serrado na comédia “Dois+Dois’, que estreia nos cinemas em 12 de agosto (Divulgação)

“O filme fala muito da liberdade sexual, das possibilidades. E as cenas de sexo que me preocupavam foram tranquilas. O Marcelo Saback , que nos dirige, tem um olhar de beleza, que sai do vulgar. Até a cena mais ‘punk’, fica algo bonito de se ver. No filme dá para perceber que podemos lidar com as cenas de sexo no Brasil de uma outra forma. Além disso, amplia meu olhar para um universo que não conhecia. Tenho um respeito maior pelas pessoas que têm tesão nessa liberdade. A tendência do mundo é que as pessoas encontrem o que é bom para elas. Ainda bem que tudo caminha para ampliarmos essa diversidade”, afirma.

Roberta nos bastidores do filme: “A comédia fala muito da liberdade sexual, das possibilidades. E as cenas de sexo que me preocupavam, foram tranquilas de fazer" (Reprodução Instagram)

Roberta nos bastidores do filme: “A comédia fala muito da liberdade sexual e das possibilidades. E as cenas de sexo que me preocupavam foram tranquilas” (Reprodução Instagram)

Casada com o empresário Guilherme Guimarães desde 2015, com quem tem Linda Flor, de 3 anos, a atriz também está em outra comédia, que estreia quase que simultaneamente, em 15 de agosto, no streaming e no canal Telecine Premium. Em ‘L.O.C.A. – Liga das Obsessivas Compulsivas por Amor’, Roberta está ao lado de Debora Lamm e Mariana Ximenes para falar de outro ponto de vista das relações sob o olhar feminino. Com direção de Claudia Jouvin e produção de Carolina Jabor, o longa conta a história de três mulheres que vivem grandes paixões, mas não aguentam mais serem chamadas de ‘loucas’, até que se unem e decidem dar fim a seus relacionamentos tóxicos.

“Minha personagem, a Rebeca, se envolve com um cara mau caráter. Acho que todas as mulheres já se envolveram com um. Tive um relacionamento em que o cara dizia que eu era ‘louca’ o tempo todo, mas eu sempre pensava que ele estava mentindo, que eu não era. A maioria das mulheres também já passou por isso. Queremos respeito, sororidade, empatia umas com as outras. E isso tem no filme. Vai dar um alento para as mulheres que já sofreram com relações assim. As mulheres se sentirão ‘vingadas’. É um filme de empoderamento”, promete Roberta, acrescentando: “Além disso, é importante destacar sempre, que as mulheres que vivem neste país são f… então, podemos dar vazão às nossas ‘loucuras’, ser as ‘loucas’ que quisermos. Ninguém vai nos dizer como ser ou que tipo de loucura podemos experimentar”.

A atriz ao lado de Debora Lamm e Mariana Ximenes, em outra comédia, 'L.O.C.A. - Liga das Obsessivas Compulsivas por Amor' (Divulgação)

A atriz ao lado de Debora Lamm e Mariana Ximenes, em outra comédia, ‘L.O.C.A. – Liga das Obsessivas Compulsivas por Amor’ (Divulgação)

A atriz também está gravando a nova novela das 18h, ‘Nos Tempos do Imperador’, como a divertida e potente Lupita. Na trama de Thereza Falcão e Alessandro Marson, ela será obrigada pelo patrão a denunciar os escravizados que fogem para a Pequena África, um local que recebe e protege os negros que são rechaçados pela sociedade da época. Para sobreviver, Lupita vende cocadas pela cidade.

“Ela cresceu e foi criada junto com o ‘sinhozinho’ e é usada por ele como informante. Mas Lupita pensa à frente do seu tempo. Vende cocadas para comprar sua alforria. Vamos tocar em assuntos delicados e contar a história que nunca foi narrada antes em uma trama. Eu mesma, Roberta, atriz preta, não conhecia”, admite. “O que mais me assusta a cada capítulo que leio é que muito deste contexto ainda é atual. Por isso, antes de entrar no set, falo que estou ali por todos os meus ancestrais. Entro em cena carregando todo um povo preto que nunca viu na TV essa história verdadeira. Muitas atitudes não mudaram, infelizmente”.

Vivendo Lupita: "O que mais me assusta a cada capítulo que leio, é que muito desde contexto ainda é atual" (Divulgação)

Vivendo Lupita: “O que mais me assusta a cada capítulo que leio, é que muito desde contexto ainda é atual” (Divulgação)

Roberta destaca semelhanças na questão política do Brasil Império com a situação atual do país. “A corrupção vem de lá, nesta época já existia o que chamamos de ‘rachadinha’, já tinham políticos que só queria levar vantagem. Além da questão do povo preto que era escravizado e tem a falta de empatia da sociedade desde então”, analisa. “Minha personagem suscita essa reflexão, muitas vezes age como se não fosse escravizada. E isso acontece até hoje. Se não fosse atriz de novela, me olhariam diferente na rua ou quando entrasse numa loja, por exemplo. Desde os ‘tempos do imperador’, se fosse diferentes, o racismo não se perpetuaria por aqui”.

Ela afirma também, que como atriz, tem outra visão e maturidade para viver uma personagem escravizada hoje. “Tenho uma postura de questionamento, consciente, de mulher preta que veio da comunidade (o Vidigal). Me posiciono quando acho que algo não deve ser dito de alguma forma, por exemplo. Falo com o diretor quando acho determinado aspecto não legal, do tipo chamar os negros da época de ‘escravos’, quando a palavra correta é ‘escravizados’. A ideia de raça para dominar também está contida aí. Se falamos que os negros eram escravos, era como se tivessem nascido assim, o que não foi o caso. Foram escravizados, algo cruel e não humano”.

“Tenho uma postura de questionamento, consciente, de mulher preta que veio da comunidade (o Vidigal). Me posiciono quando acho que algo não deve ser dito de alguma forma” (Foto: Sergio Baia)

Compaixão e autocompaixão

Entre as principais mudanças na vida dos brasileiros provocadas pela pandemia do coronavírus, a saúde mental e emocional foi mencionada por mais da metade da população. A atriz conta que passou por alguns estágios dentro do recolhimento que a Covid impôs. “Foi o maior período que passei com minha filha desde que ela nasceu e ao mesmo tempo começamos a fazer o movimento de doações para as pessoas. No Vidigal e em outras comunidades”, recorda. “Depois, isso começou a bater em um ponto de culpa por estar em casa, segura, quando outras pessoas não estavam, não tinham nada. Me bateu uma deprê absurda. Fiz terapia, com a Cintia Aleixo, uma psicóloga preta, fiz Theta Healing. E comecei a me desprender disso. Que na verdade é entender que só posso carregar na ‘mochila’ o que aguento. Ter a humildade de entender que não vou mudar o mundo, mas posso ajudar a transformar”.

Roberta Rodrigues com a filha Linda Fllor e o marido Guilherme: "A pandemia foi o maior período que passei com minha filha desde que ela nasceu" (Reprodução Instagram)

Roberta Rodrigues com a filha Linda Fllor e o marido Guilherme: “A pandemia foi o maior período que passei com minha filha desde que ela nasceu” (Reprodução Instagram)

Roberta conclui sobre as transformações que contabiliza no período: “Falei pra Deus que nunca mais vou reclamar de muito trabalho, nem se eu estiver cansada. Trabalhar na pandemia foi importante. Continuo refletindo sobre a minha carreira, minha vida, mas com muito mais calma, até em relação às críticas. Antes, se alguém ‘pisasse no meu pé’, brigaria, hoje respiro fundo e vejo o que vale. Mas continuo sendo alguém que fala o que pensa e faz o que quer, sem medo. Também sou uma pessoa que busca mais seus direitos. E isso inclui receber o salário que mereço. Ainda conservo a menina que veio do Nós do Morro‘, do Vidigal, mas hoje sei exatamente o meu valor”.

“Falei pra Deus que nunca mais vou reclamar de muito trabalho, nem se eu estiver cansada” (Foto: Sergio Baia)