* Por Carlos Lima Costa
A atriz Roberta Foster experimentou de forma dolorosa a máxima de que o sucesso é efêmero. Com beleza e talento, ela atuou nas novelas A Indomada, Corpo Dourado e Cama de Gato. Mas foi no humorístico Zorra Total que ganhou maior visibilidade e se tornou símbolo sexual ao, em trajes mínimos, interpretar Eva ao lado de Nelson Freitas e, posteriormente, com Agildo Ribeiro (1932-2018). Badalada, estampou a capa da Playboy. De repente, as cortinas se fecharam, ela perdeu espaço na TV, os amigos da época se afastaram, veio a depressão e que chegou a morar de favor. Foi trabalhar no comércio, começando como vendedora de loja. Anos de percalços. Com os pés no chão, recentemente voltou a trabalhar no teatro e ainda pensa em viver da antiga profissão. Nesta entrevista exclusiva, ela relembra e conta sobre os dias difíceis que começaram a partir de 2013, após ser demitida do Zorra Total.
Com receio de ficar marcada pelo personagem, Roberta chegou a parar de dar vida a Eva, mas, por insistência do diretor Maurício Sherman (1931-2019), ela voltou. E a personagem foi realmente a última grande atuação na TV. Depois, realizou apenas pequenas participações, sendo a melhor delas na novela Pega Pega. “Não fiz mais uma personagem. Fiquei muitos anos vinculada ao programa. Foi bom e foi ruim, tive o bônus e o ônus. O ônus é esse. Você fica estigmatizada. O Nelson Freitas, que fazia o quadro comigo, sempre falava para eu sair do programa, porque, na verdade, nem sou comediante. Sou uma atriz que vem de novela, de dramaturgia. É aquela questão. Quando temos um salário, com todos os benefícios, a gente acaba se acomodando. Mas não estava mais feliz como Eva, chegando em um limite como atriz, eu queria sair da personagem, porque sabia que ia ficar fadada a isso. Já estava infeliz, ainda voltei, porque o Sherman insistiu e eu tinha um contrato. Saindo da Eva eu iria perder o contrato. Voltei e gravei quase um ano com o Agildo. Mas, então, fiquei desempregada e acabei indo trabalhar no comércio, no varejo”, explica ela.
Foram dois anos como vendedora e outros dois como gerente de loja da Agilità, emprego que deixou em fevereiro desse ano. “Não sabia fazer nada, mas tinha que sobreviver. Não estava casada, tinha contas para pagar. Eu falo de resiliência, porque a minha vida é de resiliência. Passei maus bocados, então, é uma forma de falar sobre mim mesma ou me encontrar. Fiquei quatro anos nesse mundo do varejo e, agora que consegui me capitalizar um pouco, negociei com a empresa, disse que queria sair. Estou com 50 anos, ainda tenho energia, quero fazer algo da minha vida. Não quero terminar a minha vida dessa forma”, enfatiza.
Sendo atriz, famosa, Roberta conta que não foi fácil trabalhar em loja até por conta da questão do ego, algo tão associado a profissão do artista. “Isso também foi uma resiliência, um aprendizado bacana. A gente sabe que tem mulheres que vivem sustentadas pelo marido, fazem pé de meia. Quando me separei, fiquei anos solteira, entrei na depressão, passei um bom tempo me reconstituindo. Quando você está no chão, a sensação é de fracasso. Ser atriz e ir para uma loja foi difícil, até porque muitas das clientes eu até conhecia, tipo Viviane Araújo. Com o passar do tempo, você trabalha a mente. Eu pensava: ‘tenho uma dignidade que muitas não têm, ficam com um cara para bancar, até mesmo casado, vivem de aparência, de favor’. Eu não tolero isso, sempre quis ter a minha casa. Nunca achei que homem é agência bancária. Então, no início, foi processo doloroso, não sabia vender nem uma blusa. Encarei como se fosse uma personagem. Tinha que sobreviver, pagar conta, sou sozinha, não tenho estrutura familiar para me dar um apoio. Foi difícil, mas, depois, lidei com isso de forma bacana. Fui aprendendo, colocando na cabeça que eu era muito valiosa. Isso me tornou forte”, ressalta.
E viveu a experiência já vivida por tantas pessoas no que se refere aos amigos da época em que trabalhava na TV. “Descobri que não eram amigos. São pessoas que você passa por elas de momento. Essa é a real. Era muito oba oba, queriam que você proporcionasse facilidades. Amizades de interesse. De uma forma geral não tinha amigos nesse meio. Não sei se foi um erro meu, porque sou muito na minha, fechada. Quem eu convivia muito era o Sherman, a gente ia muito a teatro. Mas antes dele ficar doente eu já tinha me afastado. O Nelson Freitas é um amigo, mas depois que saímos da Globo, perdemos contato, coisas da vida. Se nos encontrarmos, vamos dar aquele abraço, como se a gente nunca tivesse se separado. Ele é um amor de pessoa”, assegura.
A fase depressiva e difícil financeiramente acarretou também uma série de mudanças antes de se tornar vendedora. Ela tinha um apartamento próximo ao Projac, onde permaneceu um ano em depressão, ainda contratada da Globo, mas sem atuar. “Precisava de ajuda, mas levantei sozinha. Um dia, saí da cama e pensei: ‘tenho que viver’. Mas vendi meu apartamento, fiz um monte de besteira financeira e morei de aluguel. Quando você vende tem que investir logo, mas gastei um pouco, porque estava com dívidas. Aí fiz um financiamento louco de 30 anos em Santa Teresa, onde morei dois anos. Dei todo o dinheiro que eu tinha. Olha a besteira. Ainda era contratada da Globo, aí fui mandada embora no final de 2013. No ano seguinte, eu fiquei pagando o apartamento, as dívidas começaram a entrar e faltou grana para pagar o financiamento. Para não perder o apartamento, eu o aluguei, mas não tinha onde ficar. Fui morar de favor com pessoas mais simples e humildes. Aquela vida de riqueza, aquelas pessoas ricas que eu conhecia, todas sumiram e eu em um processo complicado de depressão. Quando você está no chão, ninguém te acode, essa que é a verdade. Geralmente, a ajuda vem de onde você menos espera. Aí fiquei um bom tempo na Praça Seca, no pé da favela praticamente e trabalhando em loja, me refazendo. Aí, depois, a minha inquilina saiu, voltei para Santa Teresa. Fiquei mais um tempo lá, consegui vender o apartamento, paguei a dívida com o que sobrou comprei um apartamento no Anil, onde estou morando hoje”, relata.
Atualmente, vive com o que ainda resta do que recebeu da loja e trabalha vendendo joias para uma ex-cliente. “Tenho uma cartela de clientes bacana, mas está muito no início. Não penso em voltar para loja, a não ser que vá morrer de fome. Me programei para ficar um tempo, sabia que ia ficar enxugando gelo se continuasse daquele jeito”, diz.
E explica que não desistiu da profissão de atriz. “Mas está complicado. Vou esperar departamento de elenco me ligar? Não rola. As novelas estão enxutas, uma concorrência absurda, então, dá um pouco de desânimo como sempre deu. Um trabalho que é saxonal você fica de saco cheio”, explica. Mas, em plena pandemia atuou na comédia, Enrolados, com Charles Paraventi. E participou ainda da peça espírita Quem Mandou Você Aqui, com Daniel Jaimovich. “Apresentamos em uma plataforma online e ficamos um mês em cartaz no Teatro Vannucci. Então, fiz esse retorno, ainda tateando, depois de mais de quatro anos sem atuar”, explica. E conta que devem rolar novas apresentações, em janeiro, no estado do Rio. “Aceitei fazer por isso, porque se não enlouqueço. Esse tempo da loja, eu fiquei real sem fazer nada. O que faço são poesias e poemas que gosto de interpretar no Instagram. Hoje, na Globo, não conheço a galera que está dirigindo, percebi isso quando fiz participação em Pega Pega. Os diretores e produtores de elenco mudaram, dá preguiça para recomeçar. Se você não é pessoa conhecida para os autores lembrarem, você tem que estar fazendo teste. Quero fazer mais trabalhos como atriz. É o que eu sei fazer na minha vida”, assegura.
Ela, aliás, estava com um projeto voltado para a sua rede social. Mas não como atriz. Distraída respondeu um e-mail e teve o Instagram hackeado há cerca de quatro meses. Então, abriu uma nova página e está recomeçando do zero. “Era um projeto de entrevistas sobre resiliência, bem a ver com programa de Multishow, GNT, onde converso com pessoas que passaram por perrengues na vida e deram a volta por cima. O meu processo de cura aconteceu muito por isso. Busquei ajuda em pessoas que nunca vi na minha vida ao ver que conseguiram dar a volta por cima em situação de pobreza extrema, de saúde, quase morte. Esse assunto me dominou, porque, hoje, tenho propriedade parar falar disso. Vivi isso profundamente, foi barra pesada. Estava empenhada em fazer isso, mas dei uma baqueada por conta do que aconteceu e está meio engavetado. Preciso organizar a casa, porque tenho que refazer a relação com meus seguidores”, explica ela que se formou em jornalismo, em 2003, e chegou a comandar o programa Beleza TV, na Band, durante alguns meses. “Na época, não me desenvolvi nessa área, mas amo também essa profissão. Desse projeto para o Instagram, eu tenho quatro programas gravados. Não tinha lançado ainda porque queria ter frente maior ou um patrocinador. Não é um programa caro, mas preciso de um operador de som e de uma produtora mínima para organizar para mim.”
Hoje em dia, a questão da depressão também melhorou. “Estou bem. Tive que trabalhar a libertação desse mundo artístico que a gente vive, por se um símbolo sexual, ter sido bonita, com corpo bonito, gostosona. Se não trabalhasse isso, ía ficar ferrada. E talvez, esses sofrimentos todos que eu tenha passado, gerenciamento financeiro, casamento destruído, problema familiar, deprê de ficar na cama dois, três dias sem tomar banho. Tudo isso me deu estofo para lidar bem até com o envelhecimento, porque lidei com questões tão profundas, de me sentir fracassada, sem grana, desamparada. Precisei criar forças dentro de mim. Não sou uma mulher que faço procedimento. Não é que eu não gosto. É porque não tenho grana. Sou o que sou mesmo. Agora, malho muito. A idade está na cabeça. A cabeça estando boa, você leva tudo de uma maneira melhor”, pondera.
E prossegue: “Tenho essa cabeça hoje por conta de todos os perrengues, como não ter lugar para morar. Não tive nenhuma amiga do meu lado, nem namorado, ninguém. Era eu e Deus. Tenho muitas histórias para contar. Estava até negociando com alguém para escrever um livro, porque escrevi alguns capítulos nessa época de dor. Se interessaram, mas com a covid está tudo parado, talvez mais para frente aconteça”, pontua ela que morou junto três vezes. “Já brinquei de casinha pra caramba, agora estou legal. É tão difícil a gente voltar a morar com alguém, juntar de novo, porque você se acostuma a ficar sozinha. Eu amo minha companhia. E como disse, não tenho problema com envelhecimento. A idade está na cabeça. Tenho medo é de ficar doente e sozinha, porque vejo minha mãe, hoje, totalmente dependente da minha irmã, problema no joelho, não consegue andar direito. Tenho receio disso”, garante.
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