*Por Brunna Condini
Já tem torcida para que o romance entre Mara, vivida por Renata Gaspar, e Menah (Camilla Damião), se concretize em ‘Terra e Paixão‘, novela das 21h da Globo. Depois da polêmica recente envolvendo o beijo entre duas mulheres na novela das 19h (‘Vai na Fé’), perguntamos, vai ter mesmo beijão entre as personagens da trama de Walcyr Carrasco? “Espero que o beijo entre elas aconteça, senão vai ser muito esquisito. Até entendo que a novela está no começo e não queiram acelerar as coisas, mas acho que vai rolar. Vai ter muita revolta se não rolar, até minha (risos). Rolar, é naturalizar duas pessoas que se gostam e querem ficar juntas”, opina Renata, em entrevista exclusiva ao site Heloisa Tolipan. “É preciso ver essas referências no ar. Mulheres que ficavam com outras eram retratadas muitas vezes de uma forma repulsiva, no lugar pejorativo, do “cuidado que você vai virar isso aí”, como se não fosse algo bom. Esse tipo de atitude dificultava para quem estava se descobrindo”, completa a atriz, casada com Bebel Luz, desde 2020.
Aos 37 anos e feliz ao lado da empresária, a atriz revela um importante plano a duas: “Eu não queria ser mãe, tinha certeza absoluta. E menina, hoje eu quero ter filho (risos). Pode ser que depois eu não queira de novo, mas no momento, estamos querendo. Para daqui a uns dois anos talvez. Pensamos em gerar, eu ficaria grávida, e adotar também”. Aproveitando a proximidade do Dia do Orgulho LGBTQIA+ (28 de junho), trazemos Renata para pensar junto conosco: por que um romance na novela das 21h ainda incomoda, por que o desejo do outro ainda é pauta? “Acho isso muito triste. O que tem a ver a vontade do outro com a sua? Não dá para entender tanto ódio. Só consigo entender no lugar de uma sociedade muito reprimida. De pessoas que não conseguem dar vazão aos seus desejos como algo natural, e isso dá muita raiva, raiva de si mesmo, que é transferida para o outro. É uma sociedade doente. Estamos caminhando para as conquistas de direitos, colocando pessoas da comunidade em espaços de poder, que precisamos estar como referência, mas é um caminho em construção. Ainda é muito estranho ter uma censura de beijo entre duas mulheres em uma novela, por exemplo. O que teria de tão ruim em um beijo entre elas? Isso sempre bate em mim como um susto. Vem a consciência que ainda estamos dando passos de ‘formiga’ neste sentido, e espero que a gente consiga andar mais rápido”.
O teatro e a arte me salvaram. Me libertei ali dentro, descobri quem eu era e segui nessa busca de autoconhecimento, espiritualidade – Renata Gaspar
Conhecida do grande público pelo humor, Renata vem experimentando outras possibilidades na dramaturgia desde ‘Um Lugar ao Sol‘ (2021), em que interpretou Shirley, uma manicure do subúrbio carioca, que vivia a dualidade de ser uma pessoa solar e, ao mesmo tempo, viver oprimida pela violência praticada pelo marido. “Compor personagens fora da comédia é um caminho que eu já fazia no teatro e no cinema e quis experimentar na TV. Algo que vai me dar muita satisfação também é realizar meus próprios projetos. Dirigir meu filme, minhas peças. Acredito que minha carreira vai caminhar para uma autoralidade maior, acho que é o que vai me deixar completa, é onde miro. Sempre tive vontade disso, mas também tinha muito medo, agora tomei coragem. Quero questionar a realidade que vivemos, falar daquilo que não questionamos. Me interessa ‘puxar esse tapete’ do ser humano, em todos os sentidos”.
Naturalizando o amor
Embora as personagens da trama das 21h não tenham falado do amor que sentem uma pela outra abertamente, caminham para isso. “Elas devem se declarar essa semana. Vai acontecer uma situação em que a Menah põe a Mara um pouco contra a parede, e elas vão dar uma nova afastada, para depois voltarem a se aproximar mesmo. Por enquanto é isso que dá para contar”, antecipa Renata, dando um pequeno spoiler para quem shippa o casal.
Eu não queria ser mãe, tinha certeza absoluta. E hoje eu quero ter filho (risos). Pode ser que depois eu não queira de novo, mas no momento, estamos querendo – Renata Gaspar
“Estou descobrindo tudo junto com o espectador, mas espero que consigam concretizar essa paixão, coisa que meio que já está acontecendo. Elas se gostam, não conseguem ficar longe uma da outra e estão tentando entender esse sentimento. É muito natural, sincero, mas para além disso tudo que é muito bonito, existe o contexto em que vivem, o de um ambiente bem conservador. A Mara é conservadora, casou até com um cara porque lá atrás gostava dele, mas sempre teve um lugar de interesse pelo sexo feminino, e não tinha muito espaço para deixar isso acontecer, tanto fora quanto dentro da mente dela. Das duas, a Mara é a que mais disse ‘nãos’ para si mesma. Então, também acho interessante que elas não estão questionando a sexualidade delas no momento, só desejam ficar juntas. É um outro recorte”.
Bissexual, Renata recorda sua jornada de autoaceitação e aceitação externa. “Lembro de que quando gostei da primeira menina, aos 14 anos, neguei isso 100% pra mim. Vim de uma família conservadora. Me neguei, tive muita raiva de mim, e em seguida, comecei a ter raiva da menina. Só alguns anos depois, aos 18, fui ficar com a primeira mulher. Foi todo um processo, porque as pessoas tentam te colocar em uma caixa, têm os estigmas, parece um fardo, quando é algo que deveria ser natural. O teatro e a arte me salvaram. Me libertei ali dentro, descobri quem eu era e segui nessa busca de autoconhecimento, espiritualidade. Hoje está tudo certo, minha família lida bem, convive com a Bebel, viajamos juntos”, compartilha.
Em meus projetos autorais, quero questionar a realidade que vivemos, falar daquilo que não questionamos. Me interessa ‘puxar esse tapete’ do ser humano, em todos os sentidos – Renata Gaspar
“Quando eu e Bebel casamos, foi um dos momentos que mais conseguimos entender as nossas famílias. Antes só conseguia achar que eles pensavam diferente de mim e ponto, que estava errado. Foi um momento importante de nos entendermos, ouvirmos. Baixei a guarda e fui em busca do diálogo, de compreender porque era tão difícil para eles entenderem quem eu era, são outras histórias de vida. É um movimento que nem sempre é fácil por parte de quem não está sendo ‘aceito’, mas é necessário. Entendo minha família e muitas pessoas terem tentado colocar isso em ‘caixinhas’, sempre foi assim, as pessoas são reprimidas e não só sexualmente, mas acho que a arte possibilita que vejam tudo isso por outro recorte, e isso pode facilitar a empatia. Ainda bem que temos a arte para salvar tudo. Por isso fazer esse papel me deixa tão feliz, pode ser referência”.
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