*Por Thaissa Barzellai
Seja nos palcos ou nas telas, Letícia Sabatella hipnotiza e conquista o espectador não só pela nitidez do talento como também pela verdade com a qual mergulha em cada trabalho que se propõe fazer. É assim que, sempre de corpo e alma, Sabatella tem conseguido cada vez mais se renovar enquanto artista e surpreender mesmo aqueles que a acompanham desde 2001 em “O Clone”, seu primeiro grande trabalho em rede nacional. Agora, depois de viajar o Brasil com o seu show “Caravana Tonteria” e interpretar a dama francesa na peça “Piaf e Brecht – A Vida em Vermelho”, que estreia dia 19, no Imperator, no Méier, Letícia se prepara para abrir mais uma porta da sua nuance artística: PopStar, programa da Globo de competição musical cujas gravações começam em outubro.
Ao lado de nomes como Claudia Ohana, George Sauma e Totia Meireles, Sabatella é uma das maiores expectativas entre a equipe e os próprios competidores – afinal, quem teve o prazer de ouvi-la cantar “Hino ao Amor” ou “La Vie en Rose” ao vivo como Piaf sabe o quão transcendental é poder presenciar tal performance. Entusiasta da arte enquanto ferramenta empática e transformadora, Sabatella quer mesmo é mostrar, mais uma vez, a sua verdade e por meio da música. “É um espaço que muita gente gostaria de ter para se expressar, então é uma honra ser convidada para ocupar esse espaço onde 20 milhões de pessoas vão assistir. Eu vou estar ali pensando em expor a minha alma, através da música, dar um toque pessoal em canções que já são famosas e atrair as pessoas para que todo mundo cante mais e xingue menos. A música é esse caminho de tocar pelo coração”, conta a atriz que, no primeiro dia com a equipe, já se emocionou. “Eu chorei no primeiro dia só de saber sobre a história de cada um dos participantes e da vontade de eles se superarem. Vai todo mundo poder crescer ali, mesmo que a gente pense de outro jeito, e isso é muito bonito”, completa.
Essa sensibilidade para com o outro, com o diferente, de querer se conectar de todas as formas que conhece, principalmente pela arte, é de longa data; quase como se a atriz tivesse vindo à terra para estreitar laços entre os lados desiguais dessa sociedade. Curitibana, Letícia Sabatella passou boa parte da infância brincando pelas ruas e interagindo com todas as crianças, não importava de onde fossem. Foi assim que ela se deparou, em um Natal, com a primeira prova de que o mundo talvez não fosse feito de rosas, gerando uma indignação precoce e ingênua que viria a ser transformada alguns anos depois em luta: ao sair de casa para brincar com o carrinho que ganhou, ela passou por uma casa onde se deparou com sete crianças que não tinham ganhado nada e apenas ficaram em silêncio olhando para ela. “Eu lembro dessa sensação de “que solidão é essa?” e foi muito dolorosa. Ali já foi um momento de perceber o por quê das coisas serem tão diferentes e isso sempre me assustou”, relembra. Desde então, foi como se, mesmo que ainda não entendesse por completo o que foi esse sentimento, Letícia tivesse descoberto o seu propósito enquanto ser humano e artista.
Hoje, a atriz marca presença em diversas manifestações pelo direito das mulheres, indígenas e por tantas outras questões que ainda afligem o mundo desigual e opressor, e para ela isso vai muito além da política: é questão de humanidade. “A desigualdade é chocante e a luta para acabar com ela não é pautada por nenhuma fissura por um líder político. É só a dor de você ver uma pessoa que tem tão pouco e você enxergar isso. Você consegue se sentir bem ao lado de alguém que é tão autocentrado e não olha para o lado, para o outro? Isso para mim é uma pobreza de espírito”, declara. No mês passado, Sabatella, que desde 1996 mantém uma relação com povos indígenas, tendo gravado e dirigido o documentário“Hotxuá” após passar seis meses na aldeia dos Khraô, na Amazônia, foi na Marcha das Margaridas, onde teve um momento de renovação quando escutou aquelas mulheres cantarem pelas suas vidas após um dia árduo de trabalho.
Ali, inspirada por essa força coletiva, Leticia Sabatella reafirmou as suas crenças de que sua melhor arma sempre será a arte. “Ver aquelas mulheres cantarem depois de ter um dia tão árduo me fez ver o poder da música. Na Caravana, por exemplo, eu canto músicas que não tem discurso político, mas eu ler um poema do T.S. Eliot – o mundo não acaba com um estampido – você já está dizendo o que precisa dizer, já está tocando as pessoas pela sensibilidade”, afirma. Embora se manifeste muito mais nos trabalhos como cantora, como tem sido o caso das peças e em breve na participação do Popstar, Sabatella usa a ideologia da ótica pelo amor e compreensão como norte em todos os seus trabalhos enquanto atriz, nem que seja entre a relação da atriz com o próprio personagem.
No ano que vem, Letícia retorna às telinhas depois da participação especial em “Órfãos da Terra” dessa vez como protagonista em “Nos Tempos do Imperador”. Assinada por Thereza Falcão e Alessandro Marson, a novela vai abordar o Brasil do século XIX, quando ainda era comandado por Dom Pedro II. Na pele da arqueóloga e cantora lírica Teresa Cristina, Letícia vai viver um triângulo amoroso e terá um desafio que para ela, sem dúvidas, será prazeroso: fazer o público ter empatia. “Teresa Cristina tem uma personalidade muito fantástica, mas eu vou cortar um dobrado para trazer carisma para uma personagem histórica, mas que no triângulo amoroso não tem. É uma personagem de possibilidades, né? Vai ser um trabalho que traz muita liberdade”, conta. É que na trama a artista, por não corresponder ao retrato enviado do imperador, vive momentos de retaliação por parte da do noivo a ponto de ser convidada a retornar ao país de origem. Só que tudo muda quando Dom Pedro escuta sua voz e se apaixona pelas notas cantaroladas.
Já no cinema, Letícia empresta um pouco da sua arte para o longa-metragem “Legalidade”, que conta os bastidores do movimento político liderado por Leonel Brizola (interpretado por Leonardo Machado) nos anos 60. Em cartaz no circuito nacional, o filme traz a atriz na pele de Bianca, uma mulher que vai em busca da mãe, a jornalista Cecília, em uma participação especial em apreço ao trabalho do amigo e diretor Zeca Brito. “O Zeca é um grande historiador. É impressionante o que ele fala, o que ele conhece. A mente dele é muito brilhante nesse sentido”, afirma Letícia que teve a chance de conhecer mais a fundo a história desse momento do Brasil durante as filmagens. Além da oportunidade de se conectar com uma parcela da luta sulista, a atriz também leva dessa experiência a troca que teve com o ator Leonardo Machado, uma atuação que fez valer todo o conjunto da obra. “A interpretação do Leo vale todo o filme. Eu fiquei impressionada. A gente realmente vê o Brizola. Na cena em que ele fala no radiofone, você tem a sensação que é o próprio. Ele coroou a vida dele com esse trabalho”, compartilha.
Embora a temática possa parecer partidária aos olhos de quem enxerga o pôster, para Letícia, o filme é um ato de resistência que vai muito além da política retratada. Em sua visão, todas as produções cinematográficas são uma força social. “O Brasil tem momentos de criatividade do seu cinema, tem matéria-prima, tem pessoas formadas para fazer o melhor e, como temos visto, gerando cada vez mais empregos”, declara. E se depender de Letícia Sabatella essa será uma indústria sempre alimentada com personagens carregados de humanidade e vida por um Brasil melhor.
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