*Por Brunna Condini
Marcos Palmeira é mesmo um ator que empresta como ninguém sua alma para contar memoráveis sagas familiares na TV. Não à toa, protagoniza ‘Renascer‘, o segundo remake de Benedito Ruy Barbosa adaptado pelo neto do autor, Bruno Luperi, que estreia na Globo em 22 de janeiro. As semelhanças entre José Leôncio de ‘Pantanal‘ (2022) e o José Inocêncio da nova trama das nove, são inegáveis. Ambos são fazendeiros/coronéis, ‘heróis’ com suas imperfeições e feridas expostas, inclusive no que diz respeito a relação com os próprios filhos. “Estou atento e confio muito na direção para não cair numa repetição, mas também não estou amarrado nisso. Quero contar essa história da melhor maneira possível. As semelhanças estão aí e as comparações vão existir. Mas não vejo o Zé Leôncio no Zé Inocêncio, o que já me distancia bastante. Um é do Nordeste e o outro é do Brasil central. O foco é mergulhar nestas camadas de uma nova história, no cacau. Me sinto bem livre para viver esse personagem, estou inteiro. Dane-se se quiserem comparar, o objetivo é embarcar na viagem. Quem ficar preso a isso é porque a história não está interessando muito. Mas confio que o espectador vem com a gente”, aposta o ator.
Vale lembrar que Palmeira fez também as primeiras versões das duas tramas e em ambas nos papeis dos filhos rejeitados pelos respectivos pais: viveu primeiro Tadeu em ‘Pantanal‘ de 1990, que sofria por não ter o carinho de José Inocêncio, interpretado por Claudio Marzo (1940-2015); e mais tarde, esteve na pele de João Pedro em ‘Renascer‘ de 1993, que precisava enfrentar a culpa pela morte da mãe no parto, que o pai José Inocêncio (Antônio Fagundes) fazia questão de não esquecer. O ator fala sobre experimentar personagens tão importantes nas mesmas tramas, separadas pelo tempo.
“Dizem que estou tendo a vingança em cima de mim mesmo (risos), mudando de lugar mais uma vez. O Benedito sempre traz esse pai que nunca reconhece esse filho tão parecido com ele, que é o seu espelho. É sempre assim, o filho ‘espelhado’ é o mais rejeitado. Essa coisa psicológica que tem por trás da relação dos personagens enriquece muito a dramaturgia”. E acrescenta a respeito da parceria com Juan Paiva que faz João Pedro na atual versão: “Posso dizer que tem sido incrível ver o João Pedro no Juan. É mesmo um novo jeito de fazer, uma nova leitura dessa história clássica. Onde não existe o totalmente bom e o completamente mal, mas o humano. Cada um na sua verdade, sem maniqueísmo”.
O texto do Benedito sempre fala dos sentimentos humanos, das inseguranças, paixões, dos amores, das relações equivocadas, que acabam se acertando. Tem esse humor nordestino, esse jeito de no auge da crise conseguir dar uma virada na vida – Marcos Palmeira
O ator conta que não reviu a trama, porque está tudo muito vivo dentro dele ainda. “Além disso, estamos fazendo uma história atualizada”. E faz questão de exaltar: “Se hoje estou aqui devo muito ao Benedito porque nas novelas dele as coisas aconteceram para mim. Mas esse remake, apesar de ser um texto clássico dele, é algo novo. Só que como é uma trama conhecida, essas novas camadas inéditas vão enriquecendo o trabalho. Hoje minha única preocupação é contar essa história da melhor forma, essa realidade do cacau 30 anos depois. É um novo olhar para essa nova antiga forma de produzi-lo. Esse cacau da agrofloresta, das cabrucas (sistema de plantação de cacau)”, afirma. “Nos perdoem, no melhor sentido da palavra, as ‘viúvas’ da primeira versão, mas é uma outra novela”.
“Estou muito grato pela confiança do Bruno, do Zé (José Luiz Villamarim, diretor de dramaturgia da Globo), da Globo, de me colocar novamente fazendo o pai de um personagem que fiz. Isso não tem preço. É um fortalecimento como ator, como homem. Recontar também é reviver, que é reavaliar, que proporciona modificar, que é crescer. Estou nesse processo de me tornar uma pessoa melhor. E acho que o Zé Inocêncio também tem esse desejo, inclusive verbaliza isso. É uma busca das pessoas serem melhores”.
Um herói da vida real e com a mão na massa
O intérprete detalha ainda, as diferenças do personagem da versão 2024 de ‘Renascer’. “O Zé Inocêncio foge do estereótipo do coronel de antes, feito brilhantemente pelo Fagundes. Hoje ele é um coronel que mete a mão na massa. Na verdade, nem é um coronel, é um fazendeiro que faz, pega na lida. Isso dá uma dinâmica para ele diferente. Não é o cara que fica só dando ordens, é parceiro dos funcionários, realiza o trabalho em equipe e isso vem muito desse espírito da agrofloresta. Um homem que enxerga a natureza dessa forma não pode se colocar em um lugar só de comandar, embora o personagem ainda traga resquícios disso. Posso dizer que é um Zé Inocêncio nada óbvio, tem um olhar ambiental hoje”, conta Palmeira.
“Quando o Zé Inocêncio invade aquelas terras acha que estão abandonadas. E por isso acaba preservando-as. Então tem todo esse pensamento da dramaturgia das histórias familiares, mas também a história do cacau, da terra. É uma novela que vai direto ao ponto, sem floreios, vai no coração da história, da Bahia. Isso dá muita agilidade para a narrativa. O Bruno nos dá a oportunidade de revermos conceitos de mais de três décadas atrás”. E conclui destacando o quanto tem mexido com ele estar em um remake da inesquecível produção: “Ontem até chamei o Jackson Antunes de Damião em cena (risos) – esse foi o personagem de Jackson na novela de 1993, hoje ele faz Deocleciano – Fiquei pensando se naquele momento eu estava me vendo como João Pedro…sei que é muito amor envolvido”.
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