*Por Brunna Condini
Já podemos batizar Marcos Palmeira como o novo rei do horário nobre, na pele de José Inocêncio, o ‘coronel/herói’ (ou um belo anti-herói?) da trama das 21h da Globo, ‘Renascer‘. A novela estreou com audiência surpreendente e elogios do público e da crítica: audiência de 26 pontos e 44% de participação — a melhor estreia do horário desde o remake de ‘Pantanal‘, 2022, também uma adaptação de Bruno Luperi para um sucesso de Benedito Ruy Barbosa. É novelão no melhor dos sentidos. E o ator que se lançou no cinema há mais de cinco décadas no filme ‘Copacabana me engana‘, já previa isso quando aceitou dar vida ao protagonista épico. “Na minha carreira nunca esperei estar neste lugar hoje. Imagina, fazer mais de um ‘coronel’ do Benedito? Vem a lembrança de quando ainda estava começando, fazendo a primeira versão de ‘Pantanal‘ (1990), depois a de ”Renascer‘ (1993) e pensando já: será que algum dia vou conseguir fazer um protagonista de uma obra dessas? E agora pelas mãos do Bruno estou revisitando essa dramaturgia, com tantas novas camadas…ah, isso me atravessa inteiro”, se emociona. “Não poderia chegar aos 60 anos de uma forma melhor, fazendo uma história clássica da dramaturgia, que vai fundo nas relações humanas”.
Acho que vou ter a noção disso tudo que estou vivendo quando passar. É algo grande. Através desses últimos trabalhos pude visitar vários biomas, a Mata Atlântica, o Pantanal, depois também de me tornado um cara mais ligado ao meio ambiente, poder recontar essa história em uma época que traz um novo olhar para a natureza, para a produtividade, então espero que as pessoas embarquem conosco. Estou muito envolvido – Marcos Palmeira
Palmeira ainda não assumiu o ‘trono’ do coronel do cacau’ na faixa das 21h, já que entra na trama a partir de 5 de fevereiro, quando começa a segunda fase. Sobre sua composição, ele observa mais uma vez a relação entre José Inocêncio de ‘Renascer‘ e José Leôncio, seu protagonista de ‘Pantanal‘. “Eles andam muito próximos em suas essências. São pais de filhos que enjeitam, homens com amores não correspondidos, então para mim é um exercício de me experimentar em outros lugares. Estou muito realizado, aproveitando tudo”. E destaca:
O Zé Inocêncio é mais próximo de mim, bota a mão na massa, tem a mesma origem que eu, de uma região cacaueira, do Sul do Bahia. Não nasci lá, mas me criei na fazenda, nesse interior do Brasil, e tenho uma relação profunda com o cacau. Tenho em mim todas as reflexões que meu avô (Francisco Anysio de Oliveira Paula, pai de Zelito Viana, seu pai e irmão de Chico Anysio) sempre fez sobre a questão ambiental, se discutia a monocultura, a produção de alimentos como um todo, então esse personagem está colado em mim de alguma forma – Marcos Palmeira
Seu Zé Inocêncio em ‘Renascer‘ diz ter o ‘corpo fechado’ – que é uma crença e prática espiritual que busca proteção contra energias negativas, doenças e ataques físicos – “Ele veio da terra, do mato, ninguém sabe de onde ele veio. É um personagem que tem pacto com uma árvore, Deus e o Diabo, é um personagem muito poderoso”, resumiu Humberto Carrão, sobre o coronel que faz na primeira fase. E Marcos Palmeira, tem fé em quê? “Acredito em energia, que vibramos o tempo todo e recebemos o que damos. Acredito nesta troca. Não tenho uma religião, mas respeito todas elas. Acho o espiritismo incrível, o candomblé muito rico, os orixás, esse imaginário da natureza, que nos dá muito essa energia, nos reconecta, é um estado profundo de religiosidade, de fé. E minha energia se renova também muito no que estou trocando com as pessoas diariamente”, exprime.
Meu corpo está ‘aberto’ para tudo, para a vida, não tenho compromisso com a eternidade, como dizia o meu avô. Mas se tivesse que dizer que tenho ‘corpo fechado’ para algo, seria para a inveja. Não que não seja um sentimento humano, mas inveja é difícil de lidar – Marcos Palmeira
Do outro lado
Fazer um personagem que tem tanto em comum com seu último em ‘Pantanal‘ (2022) não deixa o ator apreensivo, na verdade só o empolga pelo mundo de possibilidades pela frente na nova empreitada. “Nenhum ator diria não para um convite desses. É maravilhoso. E tem outra coisa, sempre vão querer nos colocar em esteriótipos. Quando comecei a carreira na TV era o playboy carioca, me chamavam muito para esse tipo de papel, depois diziam para eu ter cuidado para não ficar estigmatizado fazendo personagens rurais, que também fiz muito. Aí vieram os delegados. Enfim, estão sempre querendo ‘colar’ algo em nós, mas eu mesmo não tenho nenhuma preocupação com isso. O personagem é bom? Posso colaborar com ele? Vou lá e faço”.
Sigo jogando onde acho que me cabe. Posso até fazer mais um remake lá na frente, por que não? Quem sabe estarei em ‘Vale Tudo’? Estou brincando (risos) – Marcos Palmeira
Em ‘Renascer‘, o artista deu vida a João Pedro na novela de 1993. Agora, com tantos capítulos gravados, como se sente mudando de lugar assim, separado por 30 anos no tempo? “Só Freud explica (risos). Fagundes (Antônio Fagundes foi o primeiro coronel do cacau) tinha 43 anos quando fez o Zé Inocêncio, eu tinha 30 quando fiz o João Pedro. O Juanzinho (Juan Paiva, que faz João Pedro hoje), tem 25 anos. Ele é um grande parceiro de cena. Eu já havia trabalhado com ele em “Vendo ou Alugo”, filme da minha irmã, Betse de Paula, temos uma conexão boa. Às vezes, olho para ele em uma cena e penso que já fiz aquilo ali, é uma viagem no tempo, algo inexplicável, é interessante reviver isso”, divide.
A questão ambiental
Sempre atuando em prol do meio ambiente, o ator e ativista celebra o universo da obra. “Essa novela tem um olhar ambiental , ecológico forte. O Zé Inocêncio é um grande produtor com espírito de pequeno produtor. Espero que essa novela traga um pouco desse olhar para a natureza, de renascimento, de pensar em devolver o que tanto tiramos, que é a recuperação das matas ciliares, das florestas. Ainda falamos de garimpo, é um retrocesso gigante. Mas sou um otimista, acredito que depende da gente e podemos mudar isso”, diz.
“Hoje passamos esse calor infernal porque durante muito tempo só tiramos, não trocamos com a natureza, sabemos o que tem que ser feito, mas ninguém quer. A discussão é sempre “econômica”, é preciso entender que estamos no limite. Há um tempo atrás vermos 40 graus nos termômetros era tipo quase calamidade pública, hoje já trabalhamos com 50…é uma loucura. Tem a escassez de água, já vivemos um momento de não retorno. Isso é muito sério – Marcos Palmeira
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