Pierre Baitelli está fazendo o maior sucesso como o extrovertido Antonio, de “A Lei do Amor”. Talentoso, bonito e assumidamente tímido, o ator de 33 anos vem arrancado suspiros e boas gargalhadas do público que o acompanha no folhetim das nove, na Rede Globo. Agora, se nas cenas da novela o galã aparece descontraído, engraçado e falando igual a uma matraca, na vida real ele se disse o oposto disso. “Quando surgiu o convite para fazer o Antonio eu entrei quase em pânico (risos). Me achava muito diferente dele em relação a forma expansiva, solar e sem os melindres com que ele se relaciona com as pessoas. É muito difícil falar de si mesmo, mas me percebo um cara muito mais quieto, reservado, de poucas palavras e poucos e bons amigos”, destacou Pierre em entrevista exclusiva ao site HT.
Atualmente encarando seu papel de maior destaque na televisão brasileira, Baitelli comemora a oportunidade de flertar pela primeira vez com o gênero da comédia. Mas ele está longe de ser um estreante na arte da interpretação. Figurinha carimbada do teatro musical, Pierre já participou de grandes produções como “O Despertar da Primavera” e “Hedwig e o Centímetro Enfurecido”. E, ele conta como surgiu o ímpeto de querer brilhar pelos palcos. “Meu primeiro interesse pelo teatro veio aos oito anos assistindo a uma peça. Ao final, eu disse a minha mãe: ‘quero fazer teatro’. Me encantava a possibilidade de ser outras pessoas que não eu mesmo. Era uma espécie de fuga. Aos poucos, a brincadeira foi ficando mais séria e percebi que aquilo me nutria de uma forma especial. Aos 15 anos, decidi me mudar para o Rio a fim de me aprofundar e comecei a trabalhar profissionalmente aos 18. Por volta dos 25, fiz o meu primeiro trabalho de maior visibilidade no teatro no musical ‘O Despertar da Primavera’ que foi pouco antes do meu primeiro trabalho na TV na minissérie ‘Capitu’. De lá pra cá, as coisas começaram a acontecer”, disse ele, que graças ao seu inegável talento recebeu o Prêmio Arte Qualidade Brasil ao interpretar uma roqueira transexual mutilada, em “Hedwig e o Centímetro Enfurecido”.
Mas como nem tudo são apenas flores de primavera na vida de um artista brasileiro, o ator confessou também que já passou por situações complicadas pelas escolhas que fez na vida. Muito lúcido e de pé no chão, ele não se deixa ludibriar pelo véu obscuro da fama. “Nesses anos todos, entendi que esta carreira é muito instável e que nada está garantido. Existem, sim, os momentos de entressafra em que você desanima, pensa em desistir e entra em crise, mas não me vejo sendo feliz fazendo outra coisa”, ponderou ele, que ainda acredita que a profissão de ator deve carregar, sim, um cunho muito mais relevante na sociedade do que apenas se tornar mais um rostinho na multidão. “Ser ator, por si só, já é uma expressão e, pelo poder expressivo, somos políticos. Aliás, como em qualquer outra profissão. Um enfermeiro é um ser político, um lixeiro é um ser político. Um psicanalista, também. Todos nós que existimos, estamos nessa condição. O que falta é a conscientização do nosso lugar no mundo. Concessões não deveriam existir. Sempre me lembro de como comecei nesta profissão, dos palcos que eu já varri, dos refletores que já pendurei, das malas de figurino que levava de casa, no que isso representa em mim, no meu trabalho, no respeito ao ofício, à ideia de equipe. É isso que gera o reconhecimento do trabalho. Fama é outra coisa e pode vir, ou não”, avaliou.
Agora, voltando a falar sobre do personagem em “A Lei do Amor”, fato é que a dobradinha entre casal Antonio e Ruty Raquel (Titina Medeiros) tem dado o que falar. No decorrer da história, o falastrão se envolve com uma mulher um pouco mais velha em um relacionamento conturbado e ao mesmo tempo divertido. Entretanto, ao contrário do que se esperava, a dobradinha entre os atores tem chamado a atenção dos telespectadores. “É surpreendente. As pessoas simpatizaram rápido com o casal e torcem por ele. Este tema do preconceito com a diferença de idade já foi abordado alguma vezes nas telenovelas, mas é importante revisitar essa discussão que trás possibilidades de debates sobre outros tipos de preconceitos como raça, credo, classe social e gênero. É inacreditável que, nos dias de hoje esses temas ainda sejam tabus e que a grande maioria da sociedade tenha uma mentalidade tão retrógrada, segregadora e pouco humana a respeito dessas questões”, revelou ele, descartando qualquer possibilidade de já ter vivido esse tipo de experiência em sua vida pessoal.
“Não, mas, independente da diferença de idade, acredito que dentro de uma relação ioiô há uma grande cilada. É preciso identificar se o desejo de estar junto é real para ambos e, a partir daí, se propor verdadeiramente a enfrentar as adversidades em prol da relação. Já quando o desejo de estar junto não é genuíno para uma das partes e, mesmo assim, as idas e vindas acontecem, provavelmente não se trata de amor, mas de apego, vaidade, interesse, egoísmo e, em alguns casos, de uma crueldade e perversidade em manter o outro preso a um ‘jogo’, como alimento do ego. Não há nada mais destrutivo do que isso”, alertou ele.
No entanto, apesar de toda a pompa de Antonio, o rapaz também carrega consigo alguns dramas da vida real. Fruto de uma inseminação artificial, o rapaz guarda a frustração de não conhecer o pai biológico. “É um personagem plural e excêntrico. Apesar de extrovertido, falastrão e solar, carrega uma dor e grande carência pela ausência da figura paterna. Fruto de uma produção independente, soube da existência do pai (Tato Gabus Mendes) aos sete anos de idade e nunca teve contato com ele. Os amigos tentam convencê-lo a se aproximar do pai, mas por não saber lidar com a situação, usa seu humor como fuga. Ele é um parceiro que todos gostariam de ter. Sabe ouvir, aconselhar e coloca seus pontos de vista num discurso leve e inusitado”, sintetizou ele.
Apesar de ainda ser um ambiente novo para Pierre Baitelli, o ator vem flertando com as redes sociais para aproximar seu público de fãs que só tem aumentando nós últimos meses. “Ainda estou aprendendo a lidar com essa ferramenta. Recentemente criei um perfil aberto ao público onde coloco fotos de trabalho, de divulgação e onde recebo as impressões do público. É bacana saber o que as pessoas pensam sobre o seu trabalho e lido de forma muito tranquila com o pouco assédio que tenho. Entendo que existem pessoas que realmente admiram e torcem pelo meu trabalho e outras que estão mais interessadas na imagem”, entregou ele, que não se enxerga carregando o título de galã da Rede Globo.
“Não acho que me encaixo na categoria e não é um desejo. Vejo que isso pode também ser um estereótipo superficial, efêmero e, às vezes, limitador para o ator. Entendo que, na televisão, a imagem é importante, mas, como venho do teatro, aprendi que meu ofício é ‘ser ator’ e não ‘ser bonito’. Existem exceções, mas é triste ver uma parte da nova geração de atores criados pela televisão que, muitas vezes, desconhecem o ofício em si e constroem uma carreira apoiada só na imagem e na popularidade em redes sociais. O resultado disso, em alguns casos, é visível num trabalho frágil e descartável”, avaliou pertinentemente.
E falando em usar o ofício de ator para comunicar, Pierre também segue no ar na série “Magnífica 70”, da HBO. Em sua segunda temporada, a história retrata o universo dos tempos da ditadura militar e as relações com os órgãos de censura na década de 1970. Na série, Baitelli aparece cabeludo e bem diferente do irreverente Antonio. E, ele descarta a importância da produção. “Acho pertinente recordar esse período da história, principalmente porque foi marcado pelo autoritarismo. Em tempos onde surge uma legião de fãs do Sr. Deputado Jair Bolsonaro, é importantíssimo mostrar o quão terrível é um país com traços fascistas. O meu questionamento maior seria em relação a quantidade enorme de gente que viveu na ditadura e, ainda assim, apoia Jair Bolsonaro. As pessoas sentem uma raiva muito grande e isso nasce de diversas formas: frustração, repressão e, principalmente, falta de reflexão”, destacou ele.
Atento aos movimentos políticos do pais Pierre manifestou apoio total ao movimento estudantil que protesta contra a PEC 241/55, que visa o teto dos gastos do governo na Saúde, Educação e outras pastas. “Estou com os estudantes, com os trabalhadores da cultura e com a saúde pública. Temos que ter um ajuste fiscal e isso é claro. Aliás, todo país tem que ter uma boa ‘saúde’ fiscal, mas não me parece nada certo cortar só de quem mais precisa. Se pegarmos o orçamento da união, observamos que mais de 45% vai exclusivamente para pagar juros e dívidas aos bancos. E resolvem cortar gastos dos 5% da educação???”, questionou ele, que vê o momento propício para a classe artística criar ainda mais projetos que dialoguem com a população. “Cabe aos artistas, nesse momento de crise política e econômica, tentar também criar. A crise pode até ajuda na criação, mas, infelizmente, na prática, isso tem se tornado extremamente complicado com a redução de verbas para cultura”, completou.
Artigos relacionados