*Por Brunna Condini
A campanha Agosto Lilás marca o aniversário da Lei Maria da Penha, e tem como objetivo o enfrentamento à violência contra a mulher em todo o país. O machismo estrutural e a falta de políticas seguem fazendo da violência de gênero uma realidade. Falar do tema é por elas. Mas também é preciso falar sobre eles. É preciso questionar a masculinidade. E como nós do site, fazermos o exercício de pensar juntos, convidamos um homem e artista pensador do seu tempo para falar sobre o assunto, entre outras coisas. O ator Pedro Caetano, que está na primeira série musical do Globoplay ‘Vicky e a Musa‘, tem consciência de que o machismo enraizado, com tantos desdobramentos nocivos, é uma construção social que pode ser desaprendida, e a nosso pedido, ele que é pai de menina (Alice, de 8 anos), fala sobre o tema.
“Eu digo que estou reaprendendo, porque é como me sinto. Hoje percebi que a estrutura machista me pegou no berço, então precisei reaprender desde o básico. E muito disso também passa por me conhecer, assim como meus medos e inseguranças. O primeiro passo foi a terapia, que já faço há cinco anos. Hoje temos muito material sobre o tema, muita literatura, grupos de estudo, canais em redes sociais. Acho que cabe a nós, homens, fazermos nosso dever de casa agora”, sinaliza.
O ator de 41 anos também comenta a vivência da masculinidade tóxica e de como vem se transformando através do autoconhecimento. “O mais difícil foi entender que nós somos a masculinidade tóxica. O machismo não é um monstro desconhecido, não está no outro apenas, está em nós mesmos. Depois de finalmente entender isso, comecei a me referir ao machismo em primeira pessoa. A olhar para aquilo que me atravessava, aquilo que só eu poderia transformar. A partir disso, tudo ao redor começa a mudar. Seu grupo de amigos, suas redes sociais, seu relacionamento”.
Investindo em se tornar um homem melhor, e naturalmente um artista melhor, ele também compartilha as ferramentas das quais lança mão para se autoconhecer e cuidar da saúde mental. “Terapia para mim é a chave de tudo. É o espaço mais seguro e confiável para entender minhas questões, meus traumas. Só através dela pude entender o que não queria mais, o que precisava mudar e do que precisava cuidar. Hoje procuro estar mais comigo, passar mais tempo cuidando da minha saúde, bem-estar. O cuidado espiritual através do candomblé também é um elemento importante para mim”, confidencia.
O protagonismo que queremos ver
Na semana em que nos despedimos de Lea Garcia, atriz pioneira no enfrentamento do racismo e na abertura de espaços para atrizes e atores negros na TV e no cinema, Pedro diz como percebe o movimento no audiovisual que vem se voltando para o protagonismo negro: “Acho um movimento importante, mas que não começou agora. Muitos já lutaram por esse objetivo no passado e acho que esses devem ser lembrados e reverenciados. Mas acredito que com a chegada da internet, das redes sociais e das plataformas digitais, nosso povo teve mais facilidade de se unir, de começar a criar e a consumir suas próprias narrativas. Hoje temos cada vez mais criadores negros, mas que ainda encontram dificuldade de abrir mercado na grande mídia e com grandes marcas. Falta o mercado validar esse movimento, abraçando e consumindo esse conteúdo”.
Digo que estou reaprendendo, porque é como me sinto. Hoje percebi que a estrutura machista me pegou no berço, então precisei reaprender desde o básico – Pedro Caetano
Mesmo não havendo ainda equilíbrio entre o número de atores negros e brancos na maior parte das histórias, essa movimentação pode indicar uma mudança mais concreta e representatividade maior nas produções do país, que tem 56% da população negra. “Acho que é necessário criar histórias nas quais a narrativa da diversidade não é apenas sobre superação de preconceitos. Pessoas negras falam sobre preconceito, sim, mas também amam, trabalham, sonham, criam, se divertem. É preciso validar nossa existência, criar identificação. É preciso abandonar estereótipos. Silas e Fafá (personagem do ator e de Cris Vianna em ‘Vicky e a Musa‘), são um bom exemplo disso. Se amam, trabalham, têm problemas, criam filhos, são presentes, ensinam valores. Uma infinidade de possibilidades que vão além das dificuldades enfrentadas por serem negros. É preciso exaltar essas possibilidades”, completa.
Eu mesmo tenho vontade de me desafiar mais como ator, com papéis psicologicamente complexos ou com realidades bem diferentes da minha. Gostaria de interpretar um personagem que abordasse as questões psicológicas que vem crescendo em nossa sociedade, como a ansiedade, o TDAH, transtornos compulsivos e depressão, por exemplo – Pedro Caetano
Amor de pai
No ar em ‘Vicky e a Musa‘, outra criação bem-sucedida de Rosane Svartman, autora do sucesso ‘Vai na Fé‘, ele faz Silas, o pai da protagonista Vicky (Cecília Chancez), um cara dedicado à família e apaixonado pela mulher vivida por Cris Vianna. Pedro Caetano sinaliza em que pontos a sua paternidade se cruza com a da ficção. “Também acredito na escuta como agente transformador. A escuta me ajudou muito a entender as necessidades da minha filha, como ela se expressa e a oferecer a confiança que precisa. Silas é um pai atento aos seus filhos, às suas necessidades. É uma boa qualidade dele”, diz o ator, que tem a guarda compartilhada da filha com a ex-companheira, e namora a psicóloga Ana Luiza Britto.
O mais difícil foi entender que nós somos a masculinidade tóxica. O machismo não é um monstro desconhecido, não está no outro apenas, está em nós mesmos – Pedro Caetano
Ele também conta o que faz questão de ensinar para a filha Alice: “Busco fortalecer a autoestima dela, ajudá-la a entender seus limites e capacidades. Acredito que minha relação com ela é fundamental para que entenda as características positivas da figura masculina, o que pode ajudá-la a evitar relações tóxicas. Quero que minha filha saiba que ela tem lugar no mundo, que é capaz e que pode seguir qualquer caminho que escolher”.
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