*Por Brunna Condini
Após um hiato de aproximadamente cinco meses, Valentina Bulc voltou a gravar ‘Salve-se Quem Puder’, na pele da ginasta Bia, irmã da Kyra de Vitória Strada. E, apesar da alegria de voltar a trabalhar, Valentina confessa que estranhou a nova dinâmica ou o tal do ‘novo normal’. “O ritmo de gravação diminuiu e a ideia é não misturar as equipes para não haver chance de contágio. Foi muito louco voltar a gravar. Quando foi chegando perto fiquei muito nervosa, parecia que estava começando uma novela do zero. Porque foi muito tempo sem processar os pensamentos da personagem. Todos os atores que estavam ali tinham a sensação parecida”, conta. “Estamos com uma nova visão e é um novo processo de fazer a novela. Acho que vim construindo bem a Bia. Então, assim que recebemos os novos capítulos, a recuperei. Ela está muito em mim. Mas as primeiras semanas de volta foram difíceis”.
Ainda se adaptando aos novos hábitos em que pandemia nos inseriu, a atriz detalha os protocolos de segurança que a TV Globo adotou para minimizar os riscos durante o trabalho. “Fazemos o teste da Covid-19 semanalmente. E, quando chegamos nos estúdios, profissionais medem nossa temperatura sempre. Cada ator tem seu camarim, fazemos nossa própria maquiagem e cabelo, recebemos nosso figurino higienizado e ajustamos. Só saímos do camarim quando somos chamados para gravar. Daí passamos o texto e ensaiamos de máscara ainda. Durante a gravação, tiramos a máscara, e quando precisamos ficar perto, tem o acrílico nos protegendo. É necessário, mas é tudo muito estranho, uma coisa de cenário meio apocalíptico mesmo”, diz. “É diferente fazer algo tão humano quanto interpretar, estar na pele de outra pessoa, com essa distância. Mas é isso que temos que fazer para manter a nossa segurança. Sei que estamos vivendo um momento histórico. É tudo muito louco, mas estamos dando nosso jeito de continuar contando esse capítulo de vida”.
Amor que fortalece
Desde cedo Valentina, que hoje tem 20 anos, precisou aprender que a vida continua apesar das dificuldades e dos períodos difíceis. Ela perdeu o padrasto, o diretor Sacha Celeste, em setembro de 2016, vítima de um câncer, e desde então, ela e a mãe, a também atriz Adriana Prado, estão mais unidas do que nunca, inclusive durante a quarentena por conta do novo coronavírus. “Eu e minha mãe temos laços muito fortes, nos últimos meses temos mais consciência ainda da importância disso. Sobre a perda do meu pai, acho que você aprende a viver sabendo que essa dor faz parte de você. Mas muito mais do que a dor, faz parte de mim o que foi o Sacha. São as lembranças, os ensinamentos dele que ficaram comigo. Ele era muito sonhador, fazia muitos planos e acreditava que iam se tornar realidade. Também era muito artístico, tinha um olhar de fotografia que sinto que herdei. Isso fica. Sinto muita falta dele e para sempre. Estou fazendo faculdade de cinema, atuando, e ele era diretor. Então, vira e mexe, eu penso que precisava ter ele aqui para trocar”.
A atriz destaca ainda, a importância de campanhas informativas e de prevenção como o Outubro Rosa. “Acho que todo mundo que já teve um caso de câncer na família tem muito medo da doença. Eu tenho. Acho bizarro ainda não termos achado a cura por completo. Isso é muito desesperador. É um assunto que eu busco informações, mas me traz muita dor. Mas sei da importância de falarmos sobre isso e das campanhas de prevenção”.
Voz atuante
Nascida em Brasília, mas criada no Rio de Janeiro, Valentina não sonhava em ser atriz. Na verdade, ela queria ficar atrás das câmeras, como já está estudando para fazê-lo. Um dia. “Estou encantada com a faculdade de cinema. Lembrei esses dias que o primeiro contato que achei que teria com a arte seria na direção, por conta do incentivo do Sacha. Mas tenho um longo percurso ainda para trilhar. Tenho muito o que estudar. Mas quem sabe daqui há alguns anos? Se estiver confiante. Por enquanto, meu foco é ser atriz. É o que me faz mais feliz no mundo”.
Valentina tem a atitude e a curiosidade inquietantes da sua geração. É questionadora e procura ser consciente, inclusive na sua relação com os seguidores nas redes sociais, onde costuma abordar temas como feminismo, assédio e vegetarianismo, por exemplo. “Quando você é uma figura pública e se expõe falando sobre temas como esses sempre vai ter gente julgando, achando tudo uma besteira, e eu tento ser paciente. Mas se recebo mensagens que são de haters, pessoas que só querem discórdia, atenção e disseminar o ódio, eu não acho que valha à pena a conversa. São pessoas que vão aprender de outras formas. Com muito seguidores, quando estão abertos ao diálogo, apesar da discordância, eu gosto de falar, rebater, expor o que tiver que ser exposto. Acabo falando de assuntos que são cansativos, ficam repetitivos, que as pessoas não gostam muito de abordar, mas que se não falarmos, não tem mudança. Precisamos desta consciência. Temos questões sociais, políticas que não podemos ignorar, são urgentes, por mais que doa. Gosto do diálogo quando ele serve para abrir a cabeça”.
E completa: “Tem muita gente que me segue, e já acho isso um termo pesado: seguir. Então tenho responsabilidade com o que falo, as reflexões que quero expressar, sobre o que mostro ou deixo de mostrar, porque é importante ter atenção nisso também, algo que você coloque pode ser gatilho para alguém, por exemplo. Mas adoro essa troca. Tem o lado que não é bom também. Querendo ou não, as redes sociais são o lugar onde mostramos nossa melhor versão, e isso faz com que a gente se compare às outras pessoas. Algo que deixei de fazer recentemente foi usar filtro no Instagram. Estava viciada e percebi que o uso do filtro estava impactando na minha autoestima. Isso me fez mal e devia fazer mal a quem me via achando que eu era perfeita. Aquele documentário, ‘O Dilema das Redes’ (da Netflix) é urgente e também fala disso. Acho que devemos saber usar e nos distanciar quando vira um vício”.
Um ano para ficar na história
Apesar da pouca idade, a atriz sabe o que deseja. Valentina conta que a reflexão tem sido um exercício intenso destes dias em que precisou ficar mais recolhida. “Esse ano é um ano que ou tomamos consciência do que estamos fazendo com o planeta, e consequentemente com a raça humana, ou tem muita gente que vai fingir que não tem nada acontecendo e não é responsabilidade nossa as consequências que estão aí. Sabemos que a grande maioria desses vírus vem de exploração animal. Então, temos responsabilidade nisso, acho que precisamos rever nossos hábitos. Durante a pandemia tenho ficado muito ligada e estudado ainda mais essas questões ambientais e ficado cada vez mais assustada com o nosso futuro. Mas sou uma pessoa positiva. Prefiro acreditar que vai ficar tudo bem e que o ser humano vai mudar. Mas estou muito mais ligada em tudo. Cresci muito neste ano até aqui, aprendi demais. Para mim, 2020 não foi jogado fora”.
E como tem lidado com a ansiedade deste período? “Tenho feito psicanálise há três anos e não sei o que seria de mim neste momento se não fosse isso. Eu já era sensível, fiquei ainda mais. Li, fiz exercício físico para relaxar e foi essencial. Qualquer atividade física ajuda quando estou ansiosa. Funciono na produtividade. E comecei a fazer yoga. Mas tudo depende do nível de ansiedade que estamos. Tem vezes que precisamos nos permitir ficar no fundo do poço, em posição fetal, chorando, comendo chocolate e vendo série. E também temos que entender que esses momentos não podem durar para sempre. Tiveram meses que algumas ações funcionaram para a minha ansiedade e, depois, pararam de funcionar. Acho que assim é um pouco a vida: as coisas mudam e a gente muda”.
E aonde a Valentina quer chegar? “Quero fazer trabalhos que alimentem a minha alma, de verdade, independente do veículo, da casa. Quero viver personagens de forma visceral e encontrá-los em mim. Isso é mais importante do que aonde quero chegar. Acho que estou no caminho”.
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