Para Rhener Freitas, do projeto Mamonas Assassinas, humor politicamente incorreto do grupo é datado: “Outra época”


O ator é um dos protagonistas do projeto audiovisual “Mamonas Assassinas”. Segundo ele, o humor dos rapazes de Guarulhos, que estouraram nas paradas de sucesso nos anos 90, é fruto e uma época. Ainda sobre os músicos, ele diz haver se emocionado ao ter acesso ao acervo de Sérgio Reoli, seu personagem, e haver conhecido o pai do músico falecido tragicamente, assim como os outros componentes da banda. Para o ator, é uma responsabilidade dar vida ao Mamonas, também por conta da expectativa do público e dos fãs, ainda muito ativos, mesmo quase 30 anos depois da morte dos artistas. Também com uma carreira musical paralela Rhener pretende lançar seu EP no ano que vem. Um álbum de estilos variados, mas com músicas que dialogam com sua proposta artística

*por Vítor Antunes

Neste ano, a Record completou sete décadas de existência. É, portanto, a rede nacional há mais tempo em atividade. A emissora da Barra Funda é uma das produtoras de “Mamonas “Assassinas – O Filme” e “Mamonas Assassinas – O Impossível Não Existe“. Projeto audiovisual em filme e em série, que terá duas estratégias de lançamento: uma ao fim deste ano, no dia 28, nos cinemas, e outra ano que vem, como série. Com direção de Edson Spinello e roteiro e Carlos Lombardi – que volta a roteirizar um filme – algo que não fazia desde 2005, com “Mais Uma Vez Amor”, finalmente o projeto ganha as telas, depois de seguidas desistências da emissora veterana. No projeto audiovisual onde a extinta banda de rock irreverente é homenageada, Rhener Freitas interpreta Sérgio Reoli (1969-1996), baterista do Mamonas. Sérgio e seu irmão Samuel (1973-1996) compunham a banda de rock cômica e ambos morreram no desastre aéreo, em 1996, que vitimou todos os integrantes do conjunto. Com músicas que falavam abertamente sobre sexo grupal e brutal, anatomia e estética dos órgãos sexuais,  relacionamento interracial, agressão à mulher, zoofilia e homossexualidade de forma anárquica, haveria espaço para tamanha irreverência hoje, num tempo em que prevalece o politicamente correto? Para Rhener, a banda é o retrato de uma época: “São tempos diferentes. Os Mamonas estouraram na década de 1990 e foram muito revolucionários nessa época. Falavam de temas importantíssimos, de liberdade de expressão e de temas políticos também. Eram muito inteligentes nas músicas que escreviam. Acredito que se não fosse a tragédia, se eles tivessem continuado, hoje eles seriam como os Red Hot Chili Peppers (RHCP)”, diz.

O processo de composição do personagem, segundo Rhener foi emocionante: “Durante o meu processo de trabalho, eu conversava muito com o pai deles e chegamos a ir na caminhonete do Sérgio. Pedi para entrar e seu Ito, pai dele, mostrou uma foto do filho naquela mesma caminhonete. A gente nem conversou muito nesse momento, acho que o silêncio fala mais que palavras. Naquele instante ali, eu senti muito a energia do Sérgio”.

Ainda que esteja no longa/série sobre o Mamonas, o ator ainda não fez TV ou cinema em seu formato tradicional. “Ainda não chegou a oportunidade para eu fazer cinema e TV. Eu já fiz alguns testes para a novelas, mas eu super toparia TV. Acho que é importante na carreira do ator passar por esse segmento, mas admito que me interesso mais por cinema e por streaming, já que sou músico, e novela ocupa muito o nosso tempo. O streaming e o cinema acabam sendo mais objetivos na duração deles, o que me dá mais liberdade”.

O ano que vem, na expectativa do artista, será mais “focado na minha música. Esse ano já faz seis meses que eu estou trabalhando no meu primeiro EP. E hoje ele já está finalizado, são cinco músicas autorais. Eu trabalhei intensamente nessas músicas, nas quais coloquei todo o meu coração. São músicas especiais demais pra mim”.

Rhener Freitas. Ator é músico e lançará seu primeiro EP em 2024 (Foto: Divulgação)

“ATENÇÃO CREUZEBEK!”

Quando os Mamonas Assassinas surgiram na cena artística nacional ocuparam um espaço inédito e, talvez ainda hoje não ocupado. Das músicas aos figurinos, às palavras inventadas – como o Creuzebek, apelido pelo qual chamavam o agente e empresário Rick Bonadio e que colocavam nas músicas – tudo era muito irreverente. A morte trágica de todos os integrantes deixou um buraco e nada conseguiu suplantar. Há quem diga que se houvessem permanecido, estariam no ostracismo, assim como há os que dizem que, a contrário, se reinventariam. Um dos que acredita na reinvenção é Rhener.

O ator acha que eles poderiam ser algo como os americanos do RHCP, “já que eram grandes músicos, tinham muita presença de palco. Talvez não continuariam com a pegada mais das letras que faziam, mas seguiriam mais pelo lado rock’n’roll, até porque eles começaram no Utopia, com letras mais sérias. Eu acredito que eles voltariam para o Utopia”. A referência que o ator faz ao Utopia relaciona-se com a primeira banda dos músicos, anterior aos Mamonas, e que era mais densa, mais intelecualizada e tinha a ver com, a tamém extinta, Legião Urbana.

A nostalgia já fez até mesmo os Mamonas virarem enredo de escola de samba. Eles foram homenageados pela Inocentes de Belford Roxo, em 2011. Agora é a vez do cinema/série. “Fazer esse projeto sobre os Mamonas Assassinas foi uma grande alegria e também uma grande loucura. Gravamos os dois trabalhos em um mês e uma semana, além de um mês de preparação e uma grande responsabilidade em contar a história de uma das bandas mais amadas do Brasil, que todo mundo conhece e com uma legião de fãs ainda muito presentes até os dias de hoje”.

Inocentes desfilou em homangem aos Mamonas em 2011. Ficou em 8º lugar (Foto: Adriana Loretel/RioTur)

Segundo Rhener nos conta, os familiares acompanharam de perto a produção do filme/série, o que tornou o ambiente muito mais próximo do real. “Foi uma experiência bem intensa e bacana. Eles nos liberaram vídeos de backstage que me ajudaram muito. Como Sérgio era office boy, aprendi a andar de moto também e me dispus a pesquisar muito sobre a vida desses profissionais. E também aprendi a tocar bateria – inicialmente uma emprestada – e dentro de poucos dias eu já tava já tava tocando”. Uma das propostas do diretor era que os atores do conjunto musical vivessem o personagem o tempo todo, não só no set, mas também em casa, o que os atores gostaram: “Cada minuto era essencial para mim”.

Sempre que eu vou fazer um trabalho assim, eu procuro me munir das possíveis cobranças e expectativas, porque senão eu não consigo focar no meu trabalho, no roteiro e na criação do personagem, que é o que realmente importa pra mim – Rhener Freitas

Rhener Freitas como Sérgio Reoli (Foto: Divulgação)

 

“NÃO BAIXA O VOLUME, CREUZEBEK!”

O título anterior faz referência indireta ao trecho de uma das músicas que os Mamonas tiveram que “improvisar” para entregar à gravadora. A EMI pediu 10 músicas e eles só tinham 3. Uma das escritas em uma semana foi “Uma Arlinda Mulher‘, na qual os autores referenciavam-se a Rick Bonadio, e de que ele estava diminuindo o volume para tirá-los do estúdio. Rhener porém, não deixaria o Creuzebek diminuir o som. A previsão é que o ator/músico lance canções novas em 2024.

Esse vai ser o meu ano musical, assim, com o meu projeto autoral. Sou músico desde os 9 anos e já estava tocando violão. Com 12 eu já estava na igreja tocando guitarra e aos 14, eu já tinha a minha primeira banda de rock, tocava na minha cidade e entrava em várias baladas porque eu era o artista da noite. Ver minhas próprias músicas sendo gravadas e compartilhá-las com o mundo é ótimo. Decidi lançar meu EP em janeiro e já com o nome definitivo”. O EP tem gênero versátil e varia entre o pop, o trap e o rock – Rhener Freitas

Anteriormente ao projeto Mamonas, Rhener já havia feito um trabalho audiovisual para a Disney Channel,  mudou-se pra Buenos Aires por dois anos onde teve que aprender a falar espanhol, pra compor o elenco da série “Bia”. Depois da pandemia, foi chamado para fazer outra série da Disney, “O Coro“, do Miguel Falabella. “Quero aproveitar essa onda do Mamonas, para continuar fazendo filme, fazendo série, estudar cinema. Estudar e melhorar sempre. Eu não tenho um plano B. Ou é isso, ou é isso”. Eis ai um exemplo de que a profissão de ator se pauta mais que sobre talento, ainda que isso seja importante. É sobre ser uma profissão de fé.