Osmar Prado aborda fim de contrato com a Globo, consagração como o Velho do Rio, e planos para cinema e TV


Osmar Prado roubou a cena na teledramaturgia no remake da novela “Pantanal”. “O Velho do Rio foi um presente cósmico, coroou meus 75 anos de idade e 63 anos de carreira”, enfatiza. E minimiza o fato do vínculo com a Globo não ser renovado. “Nessa profissão, não existe contrato vitalício. O meu se encerra neste domingo, dia 30, e eu sabia que passaria para obra certa. Mas, no próximo ano, provavelmente, estarei voltando para as telas”

* Por Carlos Lima Costa

Atualmente no ar como o avô da personagem de Maria Casadevall, em “Ilha de Ferro“, além da reprise de “Chocolate Com Pimenta“, ambos na Globo, Osmar Prado, um dos mais importantes atores brasileiros, roubou a cena na televisão, em 2022, na pele do Velho do Rio, no remake de “Pantanal”. Para ele, o personagem veio como uma bênção à sua trajetória. “Todos papéis foram importantes e emblemáticos. São meus filhos, tenho que amá-los sem nenhum tipo de preferência por um ou outro. E se pudesse repeti-los em novo formato, faria com o mesmo empenho. Agora, o Velho do Rio é o coroamento de 63 anos de carreira e dos meus 75 anos. Ter vivido o Velho do Rio foi um presente cósmico, uma espécie de combinação entre os deuses do teatro e o universo que me premiaram com a possibilidade de recriar personagem tão emblemático.Tenho certeza de que Cláudio Marzo (1940-2015) estava torcendo por mim”, enfatiza ele em entrevista exclusiva.

Lembrança: Osmar Prado e Claudio Marzo, o Velho do Rio, da versão original de “Pantanal” (Foto: TV Globo/João Miguel Júnior)

Com total naturalidade, comenta sobre o fato de seu vínculo contratual com a Globo se encerrar neste domingo, dia 30. “Eu já esperava. O meu histórico com a TV Globo é longo, mas tive algumas saídas. Muitas vezes fiquei fora da televisão. Trabalhei um período na Manchete, mas retornei. Tive outra saída, na qual fiquei quatro anos praticamente no SBT. Fizemos sucesso com “Éramos Seis”, que abriu o núcleo de teledramaturgia do Silvio Santos. Depois, retornei ao Rio de Janeiro, fiquei um tempo no teatro, voltei à Globo. Enfim, na nossa profissão não existe contrato vitalício. São raros os profissionais, por exemplo, que ficaram eternamente até o desenlace da vida contratados pela TV Globo”, frisa, citando Paulo Gracindo (1911-1995).

Osmar Prado caracterizado como Velho do Rio, em Pantanal (Foto: Globo/João Miguel Junior)

E prossegue: “Quando a Globo e eu acertamos de vez, fiquei um longo período com contratos renovados de quatro em quatro anos. Mas, quando veio a pandemia, eu sabia que algo ia acontecer, porque ela acabou com tudo. Eu lembro que findos os últimos quatro anos, renovaram por mais dois e eu e muitos colegas tivemos de fazer um reajuste. Embora eu não seja e não tenha sido o maior salário do setor de teledramaturgia, negociei entre os tops. E imaginei que, ao final, provavelmente, não seria renovado. Inclusive meu contrato se encerra agora no dia 30 e eu sabia que passaria para obra certa. Me prestaram até uma homenagem por conta do Velho no ‘Domingão Com Huck‘, mas eu sabia que aquilo era uma despedida”

“Veja, não houve um rompimento entre mim e a Rede Globo. Houve uma mudança de relação contratual. Como estão desmontando o núcleo de teledramaturgia, nós passaríamos a trabalhar por obra certa e, evidentemente, que, em algum momento, no próximo ano, provavelmente, estarei voltando às telas. Já ouvi outros atores também me dizendo que já estavam preparados para esse desenlace temporário. São novas regras, épocas diferentes e a crise faz modificações drásticas, então, temos que seguir em frente, ou melhor ir ‘Tocando em Frente‘ como diz o Almir Satter”, pontua, citando o sucesso do cantor.

Os primeiros a serem cortados dos contratos foram nada mais nada menos que Tarcisio Meira e a Glória Menezes, ícones históricos. Então, é claro que iria sobrar para todo mundo e não seria eu o privilegiado – Osmar Prado

E enxerga o mercado artístico aquecido por conta das plataformas dos streamings. “O mercado abriu. Dificilmente faltará trabalho para os atores que já têm um certo nome. Eu já tenho previsão para o cinema, estamos em negociações. Me enviaram alguns roteiros para eu ler, mas agora estou descansando. ‘Pantanal” foi um trabalho exaustivo e eu estou aproveitando para me reencontrar comigo mesmo. Aqui em casa, gosto de fazer bricolagem, de mexer com mecânica também, cuidar dos bichinhos, temos gatos, cachorros. Acredito mesmo que eu retorne em um trabalho para valer em 2023 e espero já com uma nova realidade para o próprio país. Tenho colegas que nunca assinaram um contrato longo com quem quer que seja e estão aí no mercado. Se você tem valor jamais faltará trabalho. Então, vamos para a nossa realidade e seguir em frente”, analisa.

EMOÇÃO COM DISCURSOS DO VELHO DO RIO

E relata com mais detalhes sua trajetória com o Velho do Rio: “A cada cena, ele era marcante, provocava forte emoção ou pelo menos uma delicadeza como combustível para aquilo que era falado. Sem estar alicerçada pela emoção, a fala não atingiria o efeito que queríamos. Nesse quesito, eu estava maduro o suficiente para controlar também a dosagem de emoção em cada situação. Eu destacaria como cenas marcantes a queimada, o monólogo sobre o envenenamento dos rios, o encontro final com o meu querido colega e amigo Marcos Palmeira com o desenlace da cena, o momento em que andando pelo rio, o Velho se entrega totalmente ao seu destino, com sua tarefa cumprida, despede-se do filho que passa a ser então, o guardião da mata, o novo Velho do Rio”.

Osmar Prado diz que se houver outro remake de Pantanal, o papel do Velho do Rio deve ser interpretado por Marcos Palmeira (Foto: Globo/João Miguel Junior)

Osmar se identificou com o personagem como, por exemplo, quando disse a fala repetida no último capítulo na voz do autor da versão original Benedito Ruy Barbosa: “‘O bicho homem é o único animal que envenena a água que bebe, que maltrata o bicho que come e que derruba a árvore que purifica o ar que ele respira. O homem ou o bicho homem está condenado a morte’. Mais ou menos isso”, explica Osmar que assistiu muito pouco do “Pantanal”, em 1990. “Eu sabia que teria que construir o Velho de dentro pra fora. Quando o Papinha (o diretor Rogério Gomes) me chamou, eu estava há mais de um ano sem cortar a barba e o que me resta de cabelo. Fiquei todo o período da pandemia deixando crescer à vontade até os pelos da orelha (risos), então, mergulhei num processo de interiorização, contei com a ajuda da maquiagem, que só acentuou as marcas do meu rosto, e do figurino com aquela capa de cinco quilos”, lembra.

HOMENAGEM A CLÁUDIO MARZO

Igual ao público ele soube da homenagem a Claudio Marzo durante a exibição do capítulo. “Gravamos a comitiva fantasma sem saber que haveria uma inserção do rosto dele. Quando assisti, não acreditei naquilo que estava vendo. Me emocionei muito, porque Claudio e eu trabalhamos juntos, éramos vizinhos de sítio. O dele era a 12 quilômetros do meu lá em Lumiar”, recorda Osmar, que atualmente pode ser visto na reprise de “Chocolate Com Pimenta”, como o doceiro Margarido, e na segunda temporada de “Ilha de Ferro”, exibida originalmente no Globoplay, como o avô da personagem de Maria Casadevall. “Grande colega, pessoa guerreira, foi uma parceria muito bonita com ela e ele era do sindicato dos Petroleiros, tinha uma liderança ali, uma participação importante na luta da classe, na questão da ética. Foi uma experiência ótima, um cidadão contemporâneo das lutas, de resistência”, ressalta.

No momento, Osmar está no ar como o avô da personagem de Maria Casadevall, em “Ilha de Ferro”, além da reprise de “Chocolate Com Pimenta” (Foto: Globo/Raquel Cunha)

A declaração de Osmar, remete ao remake de “Pantanal”, que abordou mais a política e questões sociais mais do que a versão original. “O discurso da novela veio com a questão das queimadas, a destruição da Amazônia. Desde que se iniciou a pavimentação que levaria a governança deste grupo que está aí à frente da presidência da República, ‘Pantanal’ teria que acompanhar esse momento. O Velho do Rio disse frases incríveis. E não só ele. A questão da família do Tenório, a das relações, inclusive, de gênero, o personagem do Silvero (Pereira), por exemplo, que queria ser peão, o preconceito e o machismo… Por tudo isso que a novela mexeu muito com o público. Discutiu-se muitas questões ali pertinentes a nossa época com maior liberdade. Falou-se em machismo e em uma série de problemas que infectam a nossa convivência, a nossa realidade social”.

ESPERANÇA NA RECONSTRUÇÃO DO BRASIL

Muitos dos problemas citados passam pelo momento atual de forte conturbação política. “Eu tenho a impressão que tudo isso começou quando a nossa presidente Dilma Rousseff foi eleita e seu oponente Aécio Neves não aceitou a derrota e resolveu tirar o PT do poder. Tudo isso começou com o golpe de 2016 em que sem ter cometido crime de responsabilidade defenestraram do poder uma presidente honesta. Mas aí deu no que deu. Se eu for enumerar tudo aquilo que aconteceu e depois cada passo da Lava Jato, da condenação e prisão do Lula. (Jair) Bolsonaro não enganou ninguém, todo mundo sabia como era desde os tempos das Forças Armadas, dele ter ameaçado de ser expulso por terrorismo até chegar a deputado no Congresso e todo histórico dele de misoginia. Então, é isso aí, estamos no caos, na fake news. Agora, os últimos acontecimentos nessa questão do Roberto Jefferson. Todos sabem o que eu penso, nunca escondi as minhas preferências, sempre votei em Luiz Inácio Lula da Silva. Ele perdeu três vezes e nunca questionou, a legitimidade das urnas eletrônicas”, desabafa Osmar.