Oscar 2015: Academia negligencia Michael Keaton em noite na qual Lady Gaga ganha o respeito de Julie Andrews e domina a cena


Em premiação que dividiu os holofotes entre “Birdman” e “O Grande Hotel Budapeste”, cerimônia recupera seu antigo brilho com ritmo enxuto e números de dança, consagrando Eddie Redmayne e Julianne Moore como ‘Melhor Ator’ e ‘Melhor Atriz’

Em premiação que contemplou “Birdman” (idem, de Alejandro Gonzalez Iñarritú, New Regency Pictures e outros) e “O Grande Hotel Budapeste” (The Grand Budapest Hotel, de Wes Anderson, Fox Searchlight Pictures e outros) meio a meio – quatro estatuetas para cada um – a 87ª edição do Oscar mostrou recuperar o brilho que já teve em apresentação enxuta, mas repleta do charme, com uma das cenografias mais bonitas dos últimos anos e trazendo até números de dança, que tinham desaparecido há bastante tempo de cena, nos moldes das cerimônias que rolavam nos anos 1970/1980. Traduzindo: na noite deste domingo (22/2), a maior festa do cinema mundial procurou valorizar sua tradição formal, ainda que mantendo o avassalador uso das mídias sociais como alavanca para sua divulgação. Foi impactante a deliciosa abertura musical com bailarinos e coreografia bem marcadíssima recheada de caubóis, coristas e stormtroopers de “Star Wars”, capitaneada pelo apresentador Neil Patrick Harris ­– sim, são tempos politicamente corretos e o mestre-de-cerimônias continua sendo gay: sai Ellen De Generes, entra o assumidíssimo Harris, recém-casadíssimo em setembro – e com divertida presença de Jack Black e Anna Kendrick.

Harris: tarimba de one man show  comprovada no comando do Oscar 2015 (Foto: Divulgação)

Harris: tarimba de one man show comprovada no comando do Oscar 2015 (Foto: Divulgação)

E, se ano passado o momento mais marcante foi o selfie imortalizado por Ellen com a participação de gente ilustre como Meryl Streep, Julia Robert, Brad Pitt e Bradley Cooper, esse ano as redes sociais já não estão conseguindo dar conta da bombástica apresentação de Lady Gaga interpretando um pot-pourri de canções para comemorar os 50 anos de “A noviça rebelde” (The Sound of Music, de Robert Wise, Twentieth Century Fox, 1965), seguida da magnética participação de Julie Andrews, que entregou a estatueta de ‘Melhor Canção’ para John Stephens e Lonnie Lynn pela contundente “Glory”,de “Selma”, o drama de tintas raciais esnobado pela Academia, exceto nesta categoria e  indicado a ‘Melhor Filme’.

Gaga receb o carinho da noviça: depois de passar meses pensando em como chamar a tenção do seu público, a cantora finalmente consegue, em maquinações diabólicas, mas simplesmente revelando seu talento vocal (Foto: Reprodução)

Gaga recebe o carinho da noviça: depois de passar um bom tempo pensando em como chamar a atenção do seu público, a cantora finalmente consegue, sem maquinações diabólicas, mas simplesmente revelando seu talento vocal (Foto: Reprodução)

Gaga mostrou que, quando despida da parafernália visual criada para pegar adolescentes pelo pé – tipo figurinos mirabolantes com jeito de criação de aluno de escola de moda e perucas elucubradas por visagistas de carnaval –, sobra uma artista enxuta com voz avassaladora, capaz de rivalizar com Julie Andrews na hora de evocar standards do cinema hollywoodiano. Boa surpresa, já que, no red carpet, ela demonstrava ser a primeira criatura midiática a ficar com cara de saco de batatas após ser vestida pelo mestre Azzedine Alaïa, ícone eterno da elegância. Aliás, pipocaram nas mídias sociais brincadeiras ironizando as luvas vermelhas usadas pela moça para completar o look, prova de que ela continua precisando rever seus valores para se manter no topo. Felizmente, ela não entrou no palco com as tais luvas.

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No quesito moda, além de Gaga, predominaram batons vermelhos como os de Julianne Moore e de Dakota Johnson, enquanto Emma Stone, de cabelos ruivos e batom laranja, provou por que é it-girl. E Scarlett Johansson e Cate Blanchett continuam sendo imbatíveis no palco, somente sendo engolidas pela fenomenal Tilda Swinton, que essa ano não deu as caras. Infelizmente, a francesa bola da vez, Marion Cotillard, não fez jus à sua nacionalidade e, mal vestida,  parecia uma versão feminina do Bob Esponja calça quadrada.

E, curiosamente, a responsável em grande parte pelo banimento das top models nas capas de revista em prol das estrelas de cinema, a toda poderosa Anna Wintour, apareceu de relance na plateia, sentadinha e pianinho de óculos escuros. É, como a moda anda em crise, melhor dar pinta no mais importante evento do cinema mundial, não é mesmo?

Em uma noite que refletiu a tradição, a tela mostrou gente há muito sumida dos tabloides sendo homenageada, como Harry Belafonte e a atriz Maureen O’Hara (“Como era verde o meu vale”, “Rio Grande” e “Depois do vendaval”), antiga estrela dos anos 1940/1950, partner de John Wayne em pelo menos dois filmes e símbolo da ruivice suprema. E, considerando que Belafonte, a despeito do enorme sucesso em sua trajetória como cantor e da participação como ator em 13 longas, sempre foi uma voz a defender os negros, sua rápida aparição, ainda que em telão via Governors Awards, serviu para aplacar a fúria dos ativistas de plantão que não se conformam com a ausência da diretora (negra) Ava DuVernay (“Selma”) na lista de candidatos a ‘Melhor Diretor’.

Na divisão de prêmios, a coisa ficou mais ou menos assim: o visceral “Birdman” ganhou quatro importantes estatuetas: ‘Melhor Filme’, ‘Melhor Diretor’, ‘Melhor Roteiro Original’ e ‘Melhor Fotografia’. À trupe do genial Wes Anderson couberam os prêmios de requinte visual, desbancando as produções de super heróis e sci-fi (muitas vezes vencedoras nestas categorias): “O Grande Hotel Budapeste” arrematou ‘Melhor Figurino’, ‘Melhor Maquiagem e Cabelos’ e “Melhor Design de Produção’, além de ‘Melhor Trilha Sonora’ para Alexander Desplat, bamba que também concorreu por “O jogo da imitação” (The imitation Game, de Morten Tyldum, Black Bear Pictures). Este acabou levando para casa o prêmio de ‘Melhor Roteiro Adaptado’. O contemplado? O garotão Graham Moore – visivelmente emocionado e, pelo discurso, obviamente um gay que escreveu um filme sobre um personagem igualmente gay –, que tratou logo de mandar um recadinho para a rapaziada alegre: “Tentava encontrar o meu lugar quando tinha 16 anos e me sentia diferente. Aqueles que se sentem diferentes, que permaneçam diferentes”.

"Birdman" x "O Grande Hotel Budapeste": divisão aristotélica de prêmios (Fotos: reprodução)

“Birdman” x “O Grande Hotel Budapeste”: divisão aristotélica de prêmios (Fotos: reprodução)

Recordista de indicações na história do Oscar (19 ao todo), Meryl Streep não arrematou a estatueta de ‘Melhor Atriz Coadjuvante’ pela bruxa má de “Nos caminhos da floresta” (Into the Woods, de Rob Marshall, Walt Disney Pictures). Melhor assim, a grande dama corre o risco tremendo de ter um trabalhão para trocar a estante, que certamente já não deve comportar mais um prêmio sequer. Mas, em compensação, ela estava divinamente bem vestida, coisa que não costuma acontecer. No fundo, ela é meio cafoninha e todo mundo faz vista grossa porque, afinal, se trata de Meryl Strep, ué! Mas dessa vez ela estava cheia de charme no palco prestando homenagem à turma que passou dessa para melhor: entre outros, James Garner, Robin Williams, Rod Taylor, Lauren Bacall, Martha Hyer, Mickey Rooney, Luise Rainer, Alain Resnais, Bob Hoskins, Eli Wallach, Anita Ekberg, Virna Lisi, Maya Angelou, Paul Mazursky, Louis Jourdan, Ruby Dee, o diretor Mike Nichols (“A primeira noite de um homem”) e até H. R. Giger, o artista plástico que criou o monstruoso “Alien, o oitavo passageiro” (Alien, de Ridley Scott, Twentieth Century Fox, 1979).

Da esquerda para direita; os vencedores nas categotias de ator principal e coadjuvante: J. K. Simmons, Julianne Moore, Eddie Redmayne e Patricia Arquette (Foto: Divulgação)

Da esquerda para direita; os vencedores nas categorias de ator e atriz principal (centro) e ator e atriz coadjuvante: (extremidades) J. K. Simmons, Julianne Moore, Eddie Redmayne e Patricia Arquette (Foto: Divulgação)

Aos 54 anos e após cinco indicações, Julianne Moore finalmente recebeu seu prêmio por “Para sempre Alice” (Still Alice, de Richard Glatzer, BSM Studios e outros).  Mas, entre todos os agraciados na noite, é impossível não mencionar outro ruivo, Eddie Redmayne, vencedor de ‘Melhor Ator’ por “A teoria de tudo” (The Theory of Evertything, de James March, Working Title Films), nocauteando o veterano Michael Keaton (“Birdman”). Não que o jovem ator britânico não seja bom. Mas tudo tem seu tempo. E o desrespeito da Academia ao negar o brilho de Keaton só é comparável – mantendo as devidas proporções – ao fato de nunca conferido um Oscar a Alfred Hitchcock e só ter agraciado Charles Chaplin com dois Oscars honorários. Ou, talvez, pelo mico de ter negado o prêmio de ‘Melhor Trilha Sonora’ a Ennio Morricone por “A Missão” (The Mission, de Roland Joffé, Warnrs Bros, 1986), uma das mais contundentes sinfonias já criadas para a Sétima Arte. Vergonha no nível.

Keaton em modelito de Ralph Lauren: no final, negliegenciado pela Academia, ele foi o grande injustiçado da noite

Keaton em modelito de Ralph Lauren: no final, negliegenciado pela Academia, ele foi o grande injustiçado da noite

Veja a lista de indicados e vencedores do Oscar 2015:

Melhor ator coadjuvante
Edward Norton (“Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)“)
Ethan Hawke (“Boyhood – Da Infância à Juventude“)
J.K. Simmons (“Whiplash – Em Busca da Perfeição“) – VENCEDOR
Mark Ruffalo (“Foxcatcher: Uma História que Chocou o Mundo“)
Robert Duvall (“O Juiz“)

Melhor figurino

O Grande Hotel Budapeste” – Milena Canonero – VENCEDOR
“Vício Inerente” – Mark Bridges
Caminhos da Floresta” – Colleen Atwood
Malévola” – Anna B. Sheppard e Jane Clive
“Sr. Turner” – Jacqueline Durran

Melhor cabelo e maquiagem

“Foxcatcher: Uma História que Chocou o Mundo”
“O Grande Hotel Budapeste” – Frances Hannon, Mark Coulier  – VENCEDOR
Guardiões da Galáxia

Melhor filme estrangeiro

Relatos Selvagens” (Argentina”)
Ida” (Polônia) – VENCEDOR
Leviatã” (Rússia)
“Tangerines” (Estônia)
Timbuktu” (França/Mauritania)

Melhor curta de ficção

“Aya” – Oded Binnun e Mihal Brezis
“Boogaloo and Graham” – Michael Lennox e Ronan Blaney
“Butter Lamp (La Lampe Au Beurre De Yak)” – Hu Wei e Julien Féret
“Parvaneh” – Talkhon Hamzavi e Stefan Eichenberger
“The Phone Call” – Mat Kirkby e James Lucas – VENCEDOR

Melhor documentário curta-metragem
“Crisis Hotline: Veterans Press 1” – Ellen Goosenberg Kent e Dana Perry – VENCEDOR
“Joanna” – Aneta Kopacz
“Our Curse” – Tomasz Sliwinski e Maciej Slesicki
“The Reaper (La Parka)” – Gabriel Serra Arguello
“White Earth” – J. Christian Jensen

Melhor mixagem de som

Sniper Americano
“Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)”
“Interestelar”
“Invencível”
“Whiplash: Em Busca da Perfeição” – VENCEDOR

Melhor edição de som

“Sniper Americano” – Alan Robert Murray, Bub Asman – VENCEDOR
“Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)”
O Hobbit: A Batalha dos Cinco Exércitos
“Interestelar”
“Invencível”

Melhor atriz coadjuvante

Patricia Arquette, “Boyhood – Da Infância à Juventude” – VENCEDOR
Keira Knightley, “O Jogo da Imitação
Emma Stone, “Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)”
Meryl Streep, “Caminhos da Floresta”
Laura Dern, “Livre

Melhores efeitos visuais

Capitão América 2: O Soldado Invernal
Planeta dos Macacos: O Confronto
“Guardiões da Galáxia”
“Interestelar” – VENCEDOR

X-Men: Dias de um Futuro Esquecido

Melhor curta de animação

“The Bigger Picture” – Daisy Jacobs e Christopher Hees
“The Dam Keeper” – Robert Kondo e Dice Tsutsumi
“O Banquete” – Patrick Osborne e Kristina Reed – VENCEDOR
“Me and My Moulton” – Torill Kove
“A Single Life” – Joris Oprins

Melhor longa de animação

Operação Big Hero” – Don Hall, Chris Williams e Roy Conli – VENCEDOR
Os Boxtrolls” – Anthony Stacchi, Graham Annable e Travis Knight
Como Treinar o Seu Dragão 2” – Dean DeBlois e Bonnie Arnold
“Song of the Sea” – Tomm Moore e Paul Young
“O Conto da Princesa Kaguya” Isao Takahata e Yoshiaki Nishimura

Melhor desenho de produção

“O Grande Hotel Budapeste” – Adam Stockhausen e Anna Pinnock – VENCEDOR
“O Jogo da Imitação” – Maria Djurkovic e Tatiana Macdonald
“Interestelar” – Nathan Crowley e Gary Fettis
“Caminhos da Floresta” – Dennis Gassner e Anna Pinnock
“Sr. Turner” – Suzie Davies e Charlotte Watts

Melhor fotografia

Emmanuel Lubezki – “Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)” – VENCEDOR
Robert Yeoman – “O Grande Hotel Budapeste”
Lukasz Zal e Ryszard Lenczewski – “Ida”
Dick Pope – “Sr. Turner”
Roger Deakins – “Invencível

Melhor edição

“Sniper Americano” – Joel Cox e Gary D. Roach
“Boyhood – Da Infância à Juventude” – Sandra Adair
“O Grande Hotel Budapeste” – Barney Pilling
“O Jogo da Imitação” – William Goldenberg
“Whiplash – Em Busca da Perfeição” – Tom Cross – VENCEDOR

Melhor documentário

“O Sal da Terra”
“Citizenfour” – VENCEDOR
“A Fotografia Oculta de Vivian Maier”
“Last Days in Vietnam”
“Virunga”

Melhor canção original

“Everything Is Awesome”, Shawn Patterson (“Uma Aventura Lego“)
“Glory”, by John Stephens e Lonnie Lynn (“Selma“) – VENCEDOR
“Grateful”, Diane Warren (“Além das Luzes”)
“I’m Not Gonna Miss You”, Glen Campbell e Julian Raymond (“Glen Campbell… I’ll Be Me”)
“Lost Stars”, Gregg Alexander e Danielle Brisebois (“Mesmo Se Nada Der Certo“)

Melhor trilha sonora original

“O Grande Hotel Budapeste” – Alexandre Desplat – VENCEDOR
“O Jogo da Imitação” – Alexandre Desplat
Interestelar” – Hans Zimmer
“Sr. Turner” – Gary Yershon
A Teoria de Tudo” – Jóhann Jóhannsson

Melhor roteiro original

Wes Anderson, “O Grande Hotel Budapeste”
E. Max Frye e Dan Futterman, “Foxcatcher: Uma História que Chocou o Mundo”
Alejandro González Inarritu, Nicolas Giacobone, Alexander Dinelaris, Armando Bo, “Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)” – VENCEDOR
Richard Linklater, “Boyhood – Da Infância à Juventude”
Dan Gilroy, “O Abutre

Melhor roteiro adaptado

Jason Hall, “Sniper Americano”
Graham Moore, “O Jogo da Imitação” – VENCEDOR
Paul Thomas Anderson, “Vício Inerente”
Anthony McCarten, “A Teoria de Tudo”
Damien Chazelle, “Whiplash: Em Busca da Perfeição”

Melhor direção

Alejandro G. Iñárritu – “Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)” – VENCEDOR
Richard Linklater – “Boyhood – Da Infância à Juventude”
Bennett Miller – “Foxcatcher: Uma História que Chocou o Mundo
Wes Anderson – “O Grande Hotel Budapeste”
Morten Tyldum – “O Jogo da Imitação”

Melhor ator

Steve Carell (“Foxcatcher: Uma História que Chocou o Mundo”)
Benedict Cumberbatch (“O Jogo da Imitação”)
Michael Keaton (“Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)
Eddie Redmayne (“A Teoria de Tudo”) – VENCEDOR
Bradley Cooper (“Sniper Americano”)

Melhor atriz

Marion Cotillard (“Dois Dias, uma Noite“)
Felicity Jones (“A Teoria de Tudo”)
Julianne Moore (“Para Sempre Alice”) – VENCEDOR
Reese Witherspoon (“Livre”)
Rosamund Pike (“Garota Exemplar“)

Melhor filme

“Sniper Americano”
“Birdman ou (A Inesperada Virtude da Ignorância)” – VENCEDOR
“Boyhood – Da Infância à Juventude”
“O Grande Hotel Budapeste”
“O Jogo da Imitação”
“Selma”
“A Teoria de Tudo”
“Whiplash – Em Busca da Perfeição”