“O Brasil precisa de faxina. Começaria desburocratizando”, diz Micaela Góes à frente do programa ‘Santa Ajude-se’


A apresentadora, no ar com a nova temporada do seu Santa Ajuda no GNT, que gravado de forma remota virou Santa Ajude-se, fala dos desafios do novo formato, do dom descoberto pela amiga e comadre Camila Pitanga, e da quarentena com a família. Micaela também dá dicas para quem trabalha em casa e fala da situação do país, se fosse “organizá-lo”: “As ações individuais afetam o coletivo para o bem e o mal. Então, se você puder ficar em casa, fique, porque isso afeta outras pessoas. Se cuide, cuide dos outros. Para melhorar para todo mundo, isso já organiza mais nessa pandemia”

*Por Brunna Condini

A capacidade de reinvenção tem dado um gás extra e necessário para que as pessoas adaptem suas rotinas diante da pandemia e das mudanças que ela impôs. Com isso, Micaela Góes vem encarando desde o início de agosto um super desafio na nona temporada do seu Santa Ajuda, no GNT. Referência quando o assunto é organização, com o cenário do isolamento social, a apresentadora produziu a atração com novo formato, orientando quem precisa à distância.

Micaela batizou o novo formato, versão pandemia, de Santa Ajude-se, exibido todas as terças-feiras, às 21h45. “Para mim é um desafio falar e acompanhar que façam. Antes eu falava e fazia. Não posso estar ali junto, colocando a mão na massa, então minha função vira orientar o trabalho do dono da casa no cômodo que estamos organizando”, diz a personal organizer. “A cada temporada sempre damos uma renovada, mas nada como nesta. Estou desenvolvendo até uma nova forma de orientar, já que essa é a realidade”.

“Antes eu falava e fazia. Não posso estar ali junto, colocando a mão na massa, então minha função vira orientar o trabalho” (Divulgação)

Os participantes dos dez episódios recebem um kit com câmeras e equipamentos esterilizados e um manual, além de orientação da direção. Por conta do formato inédito, os episódios ficaram menores também, com 15 minutos de duração cada: “Não sabíamos se ia funcionar, com a excelência que o programa pede. No começo eu ficava mais agoniada, agora estou me acostumando, porque é a pessoa que faz, então tem a cara dela. É um jogo, eu estou daqui falando, a pessoa absorve e faz, com o tempo dela. Também estou aprendendo”.

“É um jogo, eu estou daqui falando, a pessoa absorve e faz, com o tempo dela. Também estou aprendendo” (Divulgação)

Lar como retiro

Ela observa que nunca estivemos tanto em casa, convivendo com os cômodos que amamos e com aqueles espaços que ainda temos ressalvas e pendências. “Na quarentena nossa casa ganhou o status de lugar mais seguro do mundo. Estamos recriando, valorizando ambientes. E também nos incomodando com coisas que não incomodavam. Além de todas as demandas da casa, ainda temos que fazer caber o trabalho, as aulas das crianças, as nossas aulas…”, diz Micaela. E dá dicas para quem está trabalhando em home oficce. “Crie um ambiente, determine um local para trabalhar e horários. Não sente de pijama. Se não tiver um escritório, faça um cantinho, mesmo que seja em uma bandeja, e coloque tudo que precisa para trabalhar em um lugar só. E se atente para criar horários para concluir suas tarefas”.

Micaela e o marido, o engenheiro Pedro Xavier Hermeto, com as filhas, as gêmeas Júlia e Lara, de 9 anos (Reprodução Facebook)

Micaela tem passado o período de distanciamento social com o marido, o engenheiro Pedro Xavier Hermeto, com as filhas, as gêmeas Júlia e Lara, de 9 anos, em uma casa na Região Serrana do Rio de Janeiro. E é de lá que a apresentadora também trabalha. “Estou gravando em casa, então estou tendo que antever tudo o que preciso. Da yoga às tarefas das crianças, a passar o aspirador. O mais importante é o planejamento ser pensado com uma certa antecedência. Com isso, já ficamos afogados em tarefas, imagina sem? Senti necessidade de criar mais rotinas neste período, senão os dias vão parecer todos iguais. Tudo é novo. Temos que reconfigurar a nossa vida, a nossa rotina. Para as gravações remotas estou contando também com a ajuda da minha irmã, Georgiana Goés. Tem sido fundamental”.

Micaela e a irmã Georgiana Goés, que tem trabalhado com ela de forma remota na nova temporada do programa, o Santa Ajude-se (Divulgação)

Não dá preguiça de organizar estando tanto tempo em casa agora? “Estamos desde março nesta casa e tem sido uma experiência diferente. É uma casa que tem uma estrutura enxuta, e estou vivendo a experiência do essencial total. É pequena e toda planejada para ser prática. Uma vez que você tem um esforço macro para organizar, o resto é manutenção, tudo tem lugar certo. Não gasto muito tempo na organização, levo mais tempo é na faxina. Mas manter é parte do dia a dia, não é grandioso, é simples. Temos que fazer, não tem jeito. E outra coisa, é uma casa com crianças, então tem vida, claro”.

Como são Julia e Lara no “quesito” organização? “Procuro ensiná-las para que isso não seja algo doído. Procuramos fazer com que entendam que devem ser independentes, isso é o mais importante”, conta Micaela. “Mostro que organização é planejamento. Pensar antes para tornar a vida mais fácil. Nesta temporada aqui, elas aprenderam a fazer ovos, café, tudo com nossa supervisão. E elas vão curtindo a autonomia que isso dá. São ensinamentos que fazem parte da educação. Só vejo vantagens em você ser minimamente organizado. Falo minimamente, porque cada um tem um parâmetro. Uma estrutura que funciona. Minha filha Julia falou algo engraçado outro dia (risos): “E se eu for morar sozinha um dia e não souber fazer nada, já pensou? Vou virar um adulto inútil”. É sobre independência também”.

Micaela e as filhas: “Nesta temporada na serra, elas aprenderam a fazer ovos, café, tudo com nossa supervisão. E elas vão curtindo a autonomia que isso dá” (Reprodução Instagram)

Dom

Aos 45 anos, Micaela, que além de profissional da organização é apresentadora e atriz, não descarta nenhuma das atividades que a guiaram até aqui. “Não deixamos de ser nada que já fomos. No meu trabalho de organizadora tem a atriz, a bailarina, a arte terapeuta. A vida tomou outro rumo, a organização me escolheu. Mas estou sempre aberta a oportunidades”, diz ela que também é sócia ao lado de Ivana Portella e Stella Rangel no espaço A Casa Com Vida, que tem como missão propagar o estilo de vida organizado e formar novos profissionais na área.

Ter uma relação organizada com os espaços é um dom? “É, mas também é uma prática. Tem gente que nasce com predisposição, mas quem não nasceu também pode conseguir”, afirma. “Eu sou uma pessoa naturalmente organizada. E quando criança, minha casa era uma casa organizada, com horários, regras de funcionamento. Então, nunca achei isso fora do comum. E a casa da minha avó paterna, Risoleta (que já participou de quadros no Santa Ajuda), também tinha um funcionamento muito bem pensado. Cresci assim. Portanto, acho que a organização para mim veio de maneira natural”.

“Eu sou uma pessoa naturalmente organizada. E quando criança, minha casa era uma casa organizada, com horários, regras de funcionamento” (Reprodução Instagram)

Ela lembra que só se atentou para o “dom especial”, quando Camila Pitanga, sua amiga e comadre, pediu ajuda para organizar a própria casa. “Na época, disse que só sabia fazer na minha casa e poderia fazer como se fosse para mim, ela topou. Comecei pelas roupas, depois fui para a logística da casa. Quando terminei, ela falou que eu precisava fazer aquilo. E eu disse: “Mas quem vai querer?”. E ela respondeu: “Quem puder pagar e precisar”. A partir daí, começou a funcionar como trabalho. Um indicava para o outro e trabalhei só com organização residencial durante oito anos até pintar o Santa Ajuda, com ele já são nove anos. No total, são 18 anos que vivo da organização de forma profissional”.

Micaela Goes com a amiga e comadre Camila Pitanga, que a incentivou a entrar no ramo da organização (Divulgação Globo)

E os amigos pedem muitas dicas? “Pedem e dou super de boa. Muitos ficam me perguntando se reparo na casa dos outros. E te digo que não. A primeira postura para trabalhar com organização é não julgar. A pessoa não deixou daquele jeito de propósito. Quem é desorganizado ou não liga ou não sabe fazer diferente. Não pode julgar. É importante acolher quem te procura. Trazer o lado positivo da organização, tirá-la do lugar de castigo e colocá-la no lugar do benefício. Ela tem uma função terapêutica, de organizar externamente, para organizar internamente. Estamos vivendo um momento de incertezas. A organização até neste momento ajuda: está tudo confuso lá fora, mas aqui dentro, consigo manter alguma sanidade. O funcionamento interno, a rotina. A organização como uma ferramenta de transformação, não como um castigo. Se você tem uma vida minimamente organizada, você tem ganho de produtividade, de tempo. Nunca imaginei que pudesse ser esse o meu caminho, inspirar as pessoas, mas fico muito feliz que a minha vida tenha sido transformada e que eu possa inspirar as pessoas”.

“É bom olhar a organização como uma ferramenta de transformação, não como um castigo” (Divulgação)

Se o Brasil fosse uma casa, como você começaria a organizar? “O Brasil está precisando de muita faxina. Começaria desburocratizando. Eliminaria tudo que não serve, ocupa espaço. O país precisa de organização e faxina”, aponta Micaela. “Há pontos que temos que lembrar neste cenário que vivemos. Na democracia é o povo que decide, a maioria. E estamos vivendo, sim, um momento sombrio, mas que foi escolhido pela maioria. Ao mesmo tempo, em uma democracia as necessidades da maioria devem ser atendidas, não só de uma minoria. Estamos vivendo uma inversão. Além disso, também é uma crise semântica. O Brasil precisa de organização estrutural, de valores, do que é importante. Como uma nação pode se construir sem educação, o pilar mais importante, cultura e saúde? Como? Temos 1.500 anos somente. Somos um país jovem, próspero, cheio de recursos. Mas há anos estamos sendo explorados de forma errada, estamos regredindo. Mesmo diante desta situação de pandemia, temos dificuldades de pensar no coletivo. Apesar de estamos percebendo que nossas ações individuais repercutem no outro. O sujeito espirra na China, e estamos aqui. Não existe mais espaço para posturas egoístas. As ações individuais afetam o coletivo para o bem e o mal. Então, se você puder ficar em casa, fique, porque isso afeta outras pessoas. Se cuide, cuide dos outros. Para melhorar para todo mundo, isso já organiza mais nessa pandemia”.