O Projeto Fragmentos, do Globoplay, trouxe à tona a grave questão que transita pela manutenção de novelas e programas na íntegra. Em alguns casos, em canais como a CNT, tudo foi perdido. A Globo, ainda que não tenha sido muito zelosa com todo o seu arquivo, já que perdeu obras como “Sol de Verão” e “Estúpido Cupido“, ainda assim, tem muitas obras mantidas. Às novelas efetivamente perdidas, surgiu uma esperança nas redes sociais. Alguns pesquisadores levantaram uma possibilidade de que algumas obras como “Gabriela” (1975)”, “O Feijão e o Sonho“, “O Casarão“, “O Astro” e “Louco Amor” faziam parte do arquivo da RTP, emissora portuguesa que as exibiu entre os anos 1970 e 1980. Como não é praxe na televisão portuguesa fazer dublagens, os interessados no tema acreditavam que ali poderia haver um bom recurso para a manutenção das obras na íntegra. Porém a RTP jogou um balde de água fria nos mais esperançosos:
As novelas foram adquiridas no âmbito da compra de programas estrangeiros; a RTP recebeu o master para a transmissão e, posteriormente, efetuou a sua devolução à entidade produtora das mesmas. Não existem cópias nos nossos arquivos – RTP
Algo muito semelhante disse a SIC, emissora portuguesa que passou a transmitir as novelas brasileiras no meado dos anos 1990 e ainda hoje é a casa que transmite as novelas da Globo. De acordo com a SIC, não há nada de novelas brasileiras lá.
A SIC não tem arquivo de conteúdos internacionais. Quanto à língua, sendo português, não há dublagem em Portugal – SIC
A QUESTÃO “GABRIELA”
No caso de “Gabriela” há ainda algumas particularidades. A trama protagonizada por Sonia Braga foi a primeira a ser exibida em Portugal. Estreou por lá em 16 de março de 1977, tornando por hábito a presença de folhetins brasileiros pelas terras lusitanas. E a transmissão foi regida à pompa e circunstância, com show de Vinicius de Moraes (1913-1980), Toquinho e Maria Creuza. Todas as meninas tinham o corte de cabelo de Malvina (Elizabeth Savalla), enquanto os rapazes portavam pentes iguais ao usado pelo personagem Tonico Bastos (Fulvio Stefanini).
Ante ao sucesso, outras obras também passaram a estar por lá e não apenas isso. A forma de falar o português à brasileira acabou ganhando força. Os portugueses veriam a novela em algumas reexibições e os brasileiros, também. Em 2012, a trama ganhou um remake, também bem-sucedido. A questão é: Quando veremos as “Gabrielas”? A última reprise da versão de 1975 no Brasil foi em 1988. A mais recente foi excluída do Globoplay por conta de uma relação contratual entre a Globo e a Warner, detentora dos direitos da obra. Ainda que detenha o poder de sua obra audiovisual, os direitos da história original são dos americanos.
E 1983, a história da cozinheira “Bié” foi filme protagonizado por Sonia Braga, e ali o acordo foi firmado com os detentores da obra literária. Perguntada sobre quando a versão original de “Gabriela” entrará na Globoplay, o player disse “não ter previsão de publicação”, ou seja, não há clareza se esta trama voltará ao streaming, já que o acordo firmando entre a Globo e a família de Jorge Amado (1912-2001) é anterior à exclusividade firmada em 1983. Completa, caso volte, a primeira versão de “Gabriela” entrará no Projeto Resgate. Já quanto à versão de 2012 “não está publicada por não termos direitos”.
Decididamente, o que direciona ou não uma novela ir ao ar não é exclusivamente o fato de estar completa ou não. Como se nota, ambas as “Gabrielas” têm entraves jurídicos que impedem não apenas a sua reexibição como até mesmo a hospedagem nos players. E também há de se lamentar que nada tenha sido poupado devidamente, ainda que se considere que a filosofia de arquivamento e armazenamento hoje é vista como algo de mais importância que no passado.
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