*Por Brunna Condini
No ar na segunda temporada de ‘Aruanas‘ na Globo como uma personagem que acaba se tornando peça fundamental para revelar um esquema de corrupção dentro da série, Bella Piero diz que fazer parte da produção revolucionou seu envolvimento com a causa ambiental. “Me tornei ativista do Greenpeace. A arte é política, posicionamento, inovação, é podermos pensar juntos em nossa sobrevivência, na perpetuação da humanidade. É uma única engrenagem. Não consigo pensar na minha profissão, sem pensar no todo. Depois dessa série, ficou latente eu me colocar na linha de frente, e tenho com o Greenpeace me posicionado em ações, usando meu possível alcance para reverberá-las. Acredito que é inerente ao ser artista o se posicionar, e dentro disso existem muitas formas, claro. Meu trabalho é sobre essa troca humana, se eu não cuidar disso, não sobra nada”.
Aos 27 anos e buscando diariamente ser uma versão melhor de si mesma, Bella fala da consciência de que nossas escolhas no mundo dizem muito de nós e aproveita para comentar o recente acidente com o submersível Titan, que implodiu no Oceano Atlântico matando cinco pessoas, que pagaram US$ 250 mil (aproximadamente R$ 1 milhão), para verem de perto os destroços do Titanic. “Acho até desumano pensarmos que se paga uma fortuna para ver de perto o que sobrou de uma tragédia no fundo de um oceano, com tantas questões precisando de apoio. Tenho pensando muito em como é perigosa essa ganância do homem, e os caminhos a que isso leva”, reflete.
Experimentei escrever, produzir e atuar há pouco tempo. Não é fácil, mas muito prazeroso. Isso partiu da minha vontade de colocar as minhas palavras no mundo, sem ficar refém da espera de alguém pensar em mim para um papel – Bella Piero
“E, se pensarmos mais no assunto ganância no que diz respeito à questão ambiental, é assustador mesmo, porque é exponencial, as consequências não param. É desmatamento, aquecimento global, as doenças reverberando na saúde da população, a situação indígena e ancestral, e tantas outras consequências. Claro que neste tema entram o posicionamento e as políticas públicas, mas acho cada vez mais importante pensarmos em nossas escolhas, e isso inclui a participação também em rotas alternativas para buscar saídas. Nosso tempo, de fato, está acabando. Acredito que essa é a pauta mais urgente hoje em dia”, pontua Bella.
Amazônia
Sobre as drásticas previsões de especialistas de que a floresta amazônica está chegando a um ponto sem retorno sob o efeito das mudanças climáticas e pode desaparecer dentro de 50 anos, a atriz compartilha. “É desolador, me emociono com isso. Fui com o Greenpeace para a Amazônia uma semana após o assassinato do Bruno Pereira e Dom Phillips, em 2022. Nosso roteiro teve que ser todo remanejado, por medidas de segurança. Nós íamos para o navio do Greenpeace, batalhar pela construção de uma RDS (Reserva de Desenvolvimento Sustentável), e tivemos que ser realocados para outro local. Testemunhamos a Amazônia que queremos que exista, com a floresta em pé, com manejo sustentável. O futuro é ancestral, não podemos esquecer disso. Foi muito potente e transformadora essa experiência”, recorda.
Arte é política, posicionamento, inovação, é podermos pensar juntos em nossa sobrevivência, na perpetuação da humanidade. É uma única engrenagem – Bella Piero
Ela faz cinema
A atriz deve lançar dois filmes por aqui ainda esse ano. O esperado ‘Meu Último Desejo’, dirigido por Arnaldo Jabor (1940-2022), e ‘Meu Casulo de Drywall‘, trabalho selecionado pelo festival norte-americano SXSW, que ocorre em Austin (Texas). Sobre o último trabalho de Jabor, Bella traduz. “Minha experiência com ele é material para o resto da vida. Jabor é imortal, porque será sempre uma figura revolucionária, uma potência. Reconhecido pela poesia crítica, política, mas só quem já trabalhou com ele teve a capacidade de ser tocado por esse homem gigante, cheio de amor, e eu fui uma dessas pessoas. Me sinto privilegiada”, afirma.
“O mais curioso, é que eu não era o perfil da personagem, geralmente não sou, mas insisto pra ser testada quando acredito que é possível, e assim foi. Acho fascinante a gente poder subverter estereótipos, as caixinhas que a sociedade tenta colocar a gente. Neste filme faço Lu, uma enfermeira simples e forte, que não tem barreiras para conquistar o que deseja, vive nessa utopia fantasiosa de querer ser reconhecida, se tornar atriz, quer se sentir importante. É uma brasileira que quer existir”.
E revela sobre o cineasta no set: “Nos intervalos, sentávamos para conversar, e ele me contava histórias dele com seu amigo Nelson Rodrigues (1912-1980), imagina? Um dia, depois de uma cena, me disse uma coisa que me tocou muito: “Bella, tenho duas filhas mulheres, mas você bem que poderia ser a terceira”. Tivemos uma relação muito generosa. O coração fica apertado de saber que o longa está perto de ser lançado e não vamos contar com a presença física dele aqui. Mas tenho certeza que essa obra vai homenageá-lo como ele merece”.
Acho até desumano pensarmos que se paga uma fortuna para ver de perto o que sobrou de uma tragédia no fundo de um oceano, com tantas questões precisando de apoio – Bella Piero
Novos horizontes
Depois de ‘Aruanas‘, ela decidiu se aventurar por mares autorais, como tantos artistas já fazem, buscando um caminho com mais liberdade. “Escrevi, produzi e atuei no piloto de ‘Sonhos D’água‘. E enlouqueci (risos). Não é fácil tomar toda a responsabilidade de um trabalho assim para si, mas por outro lado é extremamente prazeroso. Esse projeto partiu da minha vontade de colocar as palavras no mundo sem ficar refém da espera de alguém pensar em mim para um papel”, pondera. “O nome é provisório, mas faz uma conexão direta com o inconsciente, sou encantada pelo tema. Na psicanálise falamos muito desse nosso ‘eu’ ser algo ficcional, e que a realidade também é uma ficção que a nossa fantasia constrói pra gente não ser atolado por uma angústia enorme”, diz.
Testemunhamos a Amazônia que queremos que exista, com a floresta em pé, com manejo sustentável. O futuro é ancestral, não podemos esquecer disso – Bella Piero
A artista também mira onde deseja alcançar: “Comecei a trabalhar com 7 anos, então são 20 de pesquisa, trajetória. Gostaria de trabalhar fora, aprender mais. Sempre levando a importância da nossa produção nacional, esse é meu DNA. Tive o gostinho com o filme no Texas, e agora gostaria de levar meu trabalho para outros lugares”.
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