Nathalia Dill: Sociedade mais cobra do que acolhe a mulher. Tive sorte de engravidar em período que não perdi trabalho


A atriz, que está na comédia romântica ‘Um Casal Inseparável’ contracenando com Marcos Veras, conta sobre as experiências na sua vida particular nesse um ano e meio de pandemia. Uma semana antes do anúncio oficial dos primeiros casos de Covid-19 no país, Nathalia decidiu morar junto com músico Pedro Curvello. Em seguida, veio a experiência de ser mãe de primeira viagem de Eva, que está com oito meses: “Além da maternidade e as mudanças para vivê-la, existem as transformações na mulher. O meu corpo é outro, apesar de eu ter tido parto normal. São muitas mudanças físicas, emocionais, estruturais. E só temos noção ao passar mesmo, não adianta falar, tem que passar. Aliás, se quiser, porque nenhuma mulher tem que desejar ser mãe. O que quero dizer é que só vivendo para saber o quão maravilhoso e louco é a experiência da maternidade. Precisa de uma aldeia para criar uma criança e isso nem todo mundo tem. É complexo’

*Por Brunna Condini

O longa-metragem ‘Um Casal Inseparável’ traz Nathalia Dill como Manuela, uma professora de vôlei de praia autoconfiante e independente, que se apaixona por Léo, vivido por Marcos Veras, um pediatra bem-sucedido e muito diferente dela. Na comédia romântica escrita e dirigida por Sergio Goldenberg, a atriz experimenta mais uma vez o humor para falar de um casal que parece improvável, mas se completa muito. Fora da ficção, Nathalia é casada com o músico Pedro Curvello, que a assina a trilha original do filme, e fala sobre esse equilíbrio na relação. “O filme sai até do lugar comum do comportamento dos gêneros. A minha personagem é a mais ‘yang’ na relação. Acho bacana esses papeis se misturarem, ora um amparar mais e o outro ser acolhido e vice-versa. Aqui em casa temos essa parceria. Tem dias que estou mais enlouquecida e o Pedro me ancora. Em outros, ele precisa mais de mim. Vamos experimentando esse equilíbrio, até porque não tem como não surtar nesta pandemia, né?”, indaga.

Nathalia e Marcos Veras em cena no longa 'Um Casal Inseparável', que chega aos cinemas na próxima semana (Divulgação)

Nathalia e Marcos Veras em cena no longa ‘Um Casal Inseparável’, que chega aos cinemas na próxima semana (Divulgação)

A atriz conta que ela e o músico foram morar juntos uma semana antes da pandemia ‘estourar’. “Já tínhamos o plano de viver juntos, mas nunca pensamos em ficar enclausurados juntos. Foi bom para percebermos que era o que queríamos: estar um com o outro. Mas, claro que também tivemos momentos difíceis. Veio a gravidez, que tem suas complexidades, depois a obra no apartamento, que por si só já é algo estressante. Com a maternidade e toda essa situação de mudança, eu experimentei sentimento que nunca havia sentido antes, como ansiedade por conta de uma parede que precisou ser quebrada, por exemplo. E não sou uma pessoa ansiosa. Depois fui saber que toda grávida faz obra ou se muda. Passamos por muitas experiências em pouco tempo e saímos mais fortalecidos”, afirma.

A atriz e Pedro Curvello foram morar juntos pouco antes da pandemia: "Saímos mais fortalecidos, que bom que foi ele pra passar isso comigo" (Reprodução/ Instagram)

A atriz e Pedro Curvello foram morar juntos pouco antes da pandemia: “Saímos mais fortalecidos, que bom que foi ele pra passar isso comigo” (Reprodução/ Instagram)

Durante a entrevista, realizada por uma plataforma de teleconferência de vídeo, a pequena Eva, de 8 meses, acordou e foi trazida para Nathalia por Pedro. “Ela é demais, não digo só porque é minha filha, olha!. Eva não dá trabalho. É muito maravilhosa, super alegre, independente”, derrete-se. “Tudo é novo. De vê-la crescer à dinâmica na vida e na casa. Tudo se transforma. Vou tentando entender com os dias. Para dar essa entrevista, por exemplo, precisei estruturar a rotina. Tudo tem que ser pensado antes e vamos aprendendo. Venho trocando muito com as pessoas também e querendo saber como fazem. Isso ajuda”, revela.

"Ela é demais, não digo só porque é minha filha (risos). Ela não dá trabalho, além do trabalho normal. Eva é muito maravilhosa, super alegre, independente" (Foto: Babuska fotografia)

“Ela é demais, não digo só porque é minha filha (risos). Ela não dá trabalho. Eva é muito maravilhosa, super alegre, independente” (Foto: Babuska fotografia)

Ainda sobre o turbilhão de emoções e transformações, Nathalia avalia: “Além da maternidade e as mudanças para vivê-la, existem as transformações na mulher, no corpo. O meu é outro corpo, apesar de eu ter tido parto normal. São muitas mudanças físicas, emocionais e estruturais. E só temos noção ao passar mesmo, não adianta falar, tem que sentir. Aliás, se quiser, porque nenhuma mulher tem que desejar ser mãe. O que quero dizer é que só vivendo para saber o quão maravilhoso e louco é a experiência da maternidade. E a sociedade não é estruturada para acolher a mulher neste momento. Por isso, talvez, eu venha me interessando tanto em saber como as pessoas estão fazendo por aí. Quem não tem carteira assinada, licença maternidade, por exemplo, como faz? É uma sociedade que mais cobra do que acolhe a mulher. Não respeita os ciclos e cobra produtividade e os mesmos estados sempre. Precisa de uma aldeia para criar uma criança e isso nem todo pode ter. É complexo. A sorte de engravidar neste período foi que não perdi trabalhos, afinal, estamos enfrentando uma pandemia”.

"A sorte de engravidar na pandemia também foi isso, não perdi trabalhos, afinal, era a pandemia. Pude viver isso inteiramente" (Foto: Vinicius Mochizuki)

“A sorte de engravidar na pandemia foi que não perdi trabalhos, afinal, estamos enfrentando uma pandemia” (Foto: Vinicius Mochizuki)

Resistência

Nathalia tem vivido, apesar do cenário, tentando ver o lado bom da vida: “Tenho privilégios, estou com saúde, então reconheço isso, mesmo diante de tanta tragédia. E neste momento tudo está mais simples de se enxergar. Os ‘véus’ foram tirados. Dá para saber quem é quem. Conseguimos saber com quem estamos lidando e isso é sempre bom”. Para a atriz, lançar um filme neste momento, é resistir dentro do panorama de desvalorização da cultura. “É dizer que estamos aqui e continuaremos fazendo arte. A pandemia veio evidenciar como a arte é fundamental”, diz a atriz.

E voltando a ‘Um Casal Inseparável‘ que estrela ao lado de Veras, Stepan Nercessian, Totia Meirelles, Danni Suzuki, Claudio Amado, Ester Dias, Carlos Bonow, Junno de Andrade e Cridemar Aquino, a atriz destaca que a leveza da produção cai ‘como uma luva’ para aliviar estes tempos duros. “Neste período da pandemia, a comédia romântica tem sido um gênero extremamente necessário com temas que nos façam bem, gerem identificação e prazer. Tal qual um sopro de vida. Eu mesma tive dificuldade de assistir certos temas neste momento, porque já estava tendo que lidar com muitas questões. Então, acho que o filme se encaixa para todas as pessoas, idades e estados emocionais. Tem leveza. E falar de amor é sempre importante, tanto quanto qualquer outra temática”.

Nathalia como Manuela: "Falar de amor é sempre importante, tanto quanto qualquer outra temática" (Divulgação)

Nathalia como Manuela: “Falar de amor é sempre importante, tanto quanto qualquer outra temática” (Divulgação)

No longa, ela também se encontra com duas paixões que conseguiu exercitar: a comédia e o vôlei. “Sou muito fã do gênero, só não sou comediante por que não nasci para ser e acredito que o comediante nasce. Admiro quem tem esse timing. O humor é uma forma inteligente de acessar o público, fazer críticas de forma elegante. Então, sempre que consigo colocar a comédia no meu trabalho, faço. Onde acho que dá, vou. E o Veras tem a veia. Conversando com ele já é engraçado. Criamos muito juntos em cena”, observa.

Para entrar na pele da jogadora de vôlei Manu, Nathalia contou com aulas de Jackie Silva do vôlei. “Existem sinais e energia. Sempre gostei de vôlei e morri de vontade de jogar na praia. Daí o Sergio me convidou para o filme, achei até engraçado ele ter pensado em mim. Eu estava gravando a novela ‘Dona do Pedaço‘ ,na época. E sabendo que faria o filme mais adiante, eu resolvi criar um grupo com minhas amigas para jogar vôlei na praia. Era uma válvula de escape. Uma das dificuldades de ter que ficar enclausurada quando começou a pandemia foi essa. Eu estava super praiana. Senti falta desse contato e da atividade. Na sequência, eu engravidei. Agora estou voltando, aos poucos. Tenho vontade de colocar novamente o vôlei na rotina. É mais do que um esporte, é terapêutico”.

"Tive que treinar com 'sede', 'fome' de atleta. É outra energia. E Jackie tem isso a raça, a intensidade que é muito única dos atletas" (Reprodução)

“Tive que treinar com ‘sede’, ‘fome’ de atleta. É outra energia. E Jackie tem isso: a raça, a intensidade, que é muito única dos atletas” (Reprodução)

No entanto, a atriz deixa claro que essa moleza de ‘atividade terapêutica’ não tem semelhança com sua preparação para o filme. “Tive que treinar com ‘sede’, ‘fome’ de atleta. É outra energia. E Jackie tem isso: a raça, a intensidade que é muito única dos atletas. Acho que isso foi uma das coisas mais bacanas que absorvi para a minha personagem. A Manuela tem essa intensidade no jogo e na vida”.