*por Vítor Antunes
Atemporal. Por mais que passem os anos, Marisa Orth continuará sendo chamada a falar sobre Magda, sua personagem de “Sai de Baixo”. Hoje em dia, Magda, porém, ganha outro contorno. Há quem a problematize, dizendo que há uma possível invisibilização ou silenciamento da personagem, famosa por insistentemente ordenada a calar-se. Marisa Orth, porém, não a problematiza, mas aos problematizadores – se assim é possível dizer. “A Magda é uma personagem em primeiro lugar. Ela serve para jogar luz sobre as mulheres silenciadas e idiotizadas. Ela já era um manifesto, já era uma crítica. Se confundem isso com a realidade, as pessoas que são pouco inteligentes, convenhamos. É algo como dar um tiro no bobo da corte ou prender o menino que diz que o rei está nu. E eu sinto muito pela falta de inteligência dessas pessoas, que não acho que as pessoas estejam enlouquecendo, mas emburrecendo. Nem tudo é loucura e não admito que falem mal de louco!”
Marisa foi uma das apresentadoras da primeira edição do Big Brother, cuja passagem foi polêmica. Perguntamos à atriz sobre qual assunto ela não aguenta mais falar e foi cirúrgica: “Isso, do BBB e do “Sai de Baixo“. Aconteceu há mais de 25 anos. A Magda eu adoro, é mais legal falar sobre ela do que sobre ter sido apresentadora do BBB, que foi uma brevíssima e triste passagem. É melhor falar de sucesso do que de fracasso. Mas vejo nesse resgate ao Big Brother um tanto de crueldade das pessoas, já que minha carreira é bem sucedida”. Ainda segundo ela, “o BBB não pode ser considerado o meu maior fracasso, porque foi algo incipiente demais”.
O que deve estar em pauta e ser criticado é o humor excessivamente agressivo, pautado em cima de bullying, sobre pessoas reais – sejam eles gordos, mulheres chamadas de burras ou gays. Óbvio que sou contra isso, contra reforço de preconceito. A arte não serve só para a gente amar e enfeitar. Ela deve ser crítica também, denunciar, mostrar. O humor é muito poderoso como denúncia. Quando não pudermos falar mais nada isso vai gerar o efeito contrário. Seremos hegemonizados e controláveis – Marisa Orth
No teatro, Marisa está com duas peças em cartaz. Uma delas é “Radojka – Uma Comédia Friamente Calculada“, dos autores uruguaios Fernando Schmidt e Christian Ibarzabal, numa versão dirigida por Odilon Wagner e protagonizada por ela e Tania Bondezan. Outra é “Barbara“, uma peça baseada na obra “A Saideira: Uma dose de esperança depois de anos lutando contra a dependência”, de Barbara Gancia. “Parece que estou com peça de repertório”, diz ela, referenciando-se ao Teatro Brasileiro de Comédia paulistano, que mantinha essa característica. A artista transita entre o drama profundo e a tragédia desesperada. Conta-nos ela que o novo espetáculo, “desgraçadamente engraçado. Tem um astral patético, que promove a mistura de riso e choro, tal como no estilo Besteirol. As personagens são derrotadas, mas ainda assim nos acabamos de rir delas”. Ao fim do ano, ela também fará a remontagem de “Fica Comigo Esta Noite“, com Miguel Falabella, para comemorar os 100 anos do Teatro Tivoli, em Portugal.
ADULTOS PLUS
Uma das peças de Marisa é “Radojka”. Nesta, duas mulheres maduras são cuidadoras de idosos, traz à tona a maturidade e o etarismo. “Elas são mulheres maduras, ou melhor, adultas plus. Fazia tempo que eu não mergulhava em um texto tão bom e que, sobretudo é adequado para mulheres da nossa idade. Nossas personagens cuidam de uma paciente com 97 anos”. Sobre o preconceito às pessoas maduras, Marisa Orth aponta que “o mundo tem que debater e criar dramaturgia a nós. A idade média das pessoas aumentou, a faixa do público também. Além de tudo é um é um grande prazer trabalhar com a Tania Bondenzan, já que tinham-nos como parecidas. Temos uma química boa”.
Além dessas montagens, Marisa poderá ser vista na série “Body by Beth“, da Warner, e que vai ao ar na TNT, na qual faz a protagonista. “Barbara” e “Radojka” vão fazer temporada nacional. E é uma vontade da atriz voltar com “Romance”, musical protagonizado por ela com músicas românticas de várias tessituras. A atriz, que foi uma das cantoras à frente da banda Luni, da vanguarda paulistana dos Anos 1980 – e que chegou inclusive a cantar o tema de abertura da novela “Que Rei Sou Eu” (1989), diz sentir falta de grupos assim. “Acho que tudo deu uma encaretada, tudo hoje está meio separado, como o drama da comédia e a dramaturgia da música. Hoje se entende que música tem que ser pop, tem que ser para dançar, que ter refrão, que entreter, ou ser jazz ou rap”, analisa.
Porém, pondera que hoje “tem coisas boas e criativas. Não quero ficar sendo ‘a velha que diz que não se faz mais música como antigamente'”. E também que “ainda que hajam cantores tidos como bregas ou bregas raiz. Hoje o brega reside nos maravilhosos Joelma, Gaby Amarantos, Felipe Cordeiro. Eu amo! Amo sofrência, que é assumidamente brega… A música e a vida estão aí, não ficam paradas. E eu gosto de misturar tudo. Tanto que o meu maior sucesso na TV é Magda, do “Sai de Baixo“, que era teatro”. Luni, a banda que ela participava também transitava com dramaturgia e música.
CALA A BOCA, MAGDA?
Contemporaneamente, junto ao debate sobre o espaço conferido à mulher, alguns grupos feministas vêm apontando o que seria o “silenciamento de Magda”, que além da pouca inteligência era sempre calada por seu marido, Caco (Miguel Falabella). Perguntada sobre como vê esse debate, Marisa diz: “Bem, existindo isso, não seria uma problematização, mas uma burrice. A Magda é uma crítica e, sim, compõe a luta feminista, não é o contrário. Eu me considero mais feminista e consciente por causa dela. Criticá-la é algo como fingir que não tem mulher imbecil. Isso não vai nos ajudar como mulher”.
Formada em Psicologia, a atriz nunca exerceu a profissão. Segundo aponta “isso sempre me ajudou muito e só cliniquei na época da faculdade. Acho que há um talento específico para ser psicóloga. O meu é em ser paciente. Usei esse estudo como ferramenta de saúde mental para ser uma pessoa melhor, uma pessoa legal”. Mas, parafraseando a frase que tornou Magda famosa, no qual era mandado que lhe calasse, Marisa diz que em seu epitáfio haverá a frase “Enfim, calada”.
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