Lucas Vasconcelos estreia em Cannes com curta inspirado em medo pessoal: “Sempre tive ansiedade com a morte”


O projeto do filho de Pedro Vasconcelos, diretor da novela Império, vai ser exibido no Short Film Corner, do festival de cinema francês, no próximo dia 15. “É a maior alegria que eu podia sonhar um dia ter. Estou muito feliz, porque vou compartilhar o tapete vermelho com nomes como Spike Lee, Kleber Mendonça Filho, Pedro Almodóvar e o Wes Anderson”, pontua. E acrescenta: “Meu curta mostra como seria o mundo onde as pessoas tem que morrer obrigatoriamente aos 30 anos. Quer dizer: levei um medo meu para as telas. Eu tenho medo do que não consigo controlar, mas como diretor eu controlo tudo. Gosto de tratar sempre de questões que me afligem. Meus filmes são uma sessão de terapia”, explica

Curta-metragem Nada de Bom Acontece Depois dos 30, de Lucas, vai ser exibido, dia 15, no Festival de Cannes (Foto: Rodrigo Lopes)

Curta-metragem ‘Nada de Bom Acontece Depois dos 30’, de Lucas Vasconcelos, vai ser exibido, dia 15, no Festival de Cannes (Foto: Rodrigo Lopes)

* Por Carlos Lima Costa

Filho de Pedro Vasconcelos, diretor-geral de novelas, como A Força do Querer e Império, atual reprise das 21h, Lucas Vasconcelos mostra total DNA artístico e o desejo de seguir os passos do pai. Nesta sexta-feira, dia 9, ele está chegando em Cannes, na França, onde Nada de Bom Acontece Depois dos 30, seu sexto curta-metragem, vai ser exibido dia 15, no Short Film Corner, mostra não competitiva, na 74ª edição do Festival de Cannes, que começou de forma presencial no dia 6.

Mesmo sem estar disputando um prêmio, Lucas está radiante por seu projeto integrar um festival dessa magnitude. “É uma realização só de estar exibindo e pisando onde os meus heróis já pisaram. É a maior alegria que eu podia sonhar um dia ter. Estou muito feliz, porque vou compartilhar o tapete vermelho com nomes como Spike Lee, Kleber Mendonça Filho, Pedro Almodóvar e o Wes Anderson, minha maior inspiração de todos os tempos que vai estar com o filme dele The French Dispatch. E sonhando um dia estar lá competindo com um longa-metragem”, comenta emocionado. Ele verá a aceitação de seu trabalho na companhia da namorada, a estudante de Direito, Luisa Camacho, de 21 anos.

Lucas com o pai, Pedro Vasconcelos: "Toda sensibilidade que eu tenho como diretor vem totalmente dele." (Foto: Reprodução Instagram)

Lucas com o pai, Pedro Vasconcelos: “Toda sensibilidade que eu tenho como diretor vem totalmente dele.” (Foto: Reprodução Instagram)

O curta estrelado por Pedro Nercessian surgiu a partir de um medo pessoal. “Eu gosto sempre de tratar sobre questões que me afligem, que acontecem na minha vida. Tento deixar minhas obras o mais pessoal possível. Por exemplo, algo que comentei com a minha psicóloga é que eu sempre tive uma ansiedade com a morte e resolvi colocar na história desse curta como seria o mundo onde as pessoas têm que morrer obrigatoriamente aos 30 anos. Quer dizer, levei um medo meu para as telas. Eu tenho medo do que não consigo controlar, mas como diretor eu controlo tudo. Então, já que a gente não consegue controlar a morte na vida real eu vou tentar controlá-la nos meus filmes”, explica.

E acrescenta: “Todo mundo que eu falo sobre isso diz que não preciso pensar nisso, que sou jovem. Mas agora, principalmente, estamos vivendo um momento que parece que a morte flerta tanto com a gente, são doenças, questões sociais. Graças a Deus, sou muito saudável, mas essas questões acabam refletindo. Como artista tenho muito isso, crio cenas na minha cabeça. O meu medo cresce mil vezes por eu conseguir imaginar as cenas na minha cabeça. Então, eu acho que o momento que a gente está vivendo, não só pela Covid-19, mas também a atualidade violenta, me fizeram criar esse medo. O lado positivo é que eu consigo pegar esse medo e transformar em algo bom, por exemplo, um roteiro. Meus filmes são uma sessão de terapia”, comenta.

Quando retornar ao Brasil, Lucas pretende realizar seu primeiro longa-metragem, Eu, Meu Pai e as Cinzas da Minha Mãe (Foto: Rodrigo Lopes)

Quando retornar ao Brasil, Lucas pretende realizar seu primeiro longa-metragem, Eu, Meu Pai e as Cinzas da Minha Mãe (Foto: Rodrigo Lopes)

E Lucas já tem uma meta para quando retornar ao Brasil. “Pretendo realizar meu primeiro longa. Já estou com o roteiro. O filme se chama Eu, Meu Pai e as Cinzas da Minha Mãe. Um título bem sugestivo. É a história de um filho e um pai que percorrem o país com as cinzas da mãe por conta de uma promessa”, conta ele, que vai realizar o projeto pela Boa Ideia Entretenimento, produtora que tem com o pai, que no início do ano deixou a Globo para focar no cinema.

O desejo de ser diretor surgiu acompanhando o trabalho do pai nas novelas. “Com certeza, minha maior influência foi dentro de casa, meus pais artistas, minha mãe atriz (Daniela Pessoa, que esteve nas três primeiras temporadas de Malhação e que abandonou a profissão e, hoje, é advogada), meu pai diretor (como ator, Pedro participou de novelas como Vamp, Fera Ferida e A Próxima Vítima). O Projac foi meu jardim de infância, que meu pai me levava para lá e acabou que não teve jeito, comecei a gostar de estar cercado de câmeras, luzes e entrei nos negócios da família. Não estagiei com meu pai na Globo, mas ele começou a me dar as oportunidades para trabalhar no set de cinema. Fiz os filmes dele, o Dona Flor e Seus Dois Maridos, o Fala Sério, Mãe! e O Mágico di Ó. Ele falava para eu levar a câmera dele e eu ficava fazendo umas fotos, still frame dos sets, mandava algumas imagens para divulgação. Estava ali curioso, aprendendo. Aquilo ali foi a minha faculdade, digamos assim”, lembra.

"Quis ter primeiro uma experiência como ator. E foi única na minha vida, e ótima também para entender que o meu negócio é direção mesmo", ressalta Lucas (Foto: Divulgação)

“Quis ter primeiro uma experiência como ator. E foi única na minha vida, e ótima também para entender que o meu negócio é direção mesmo”, ressalta Lucas (Foto: Divulgação)

E completa: “A minha formação acabou sendo essa de acompanhar meu pai e de realizar meus curtas. Na verdade, tentei cursar Cinema três vezes, mas não passei no vestibular. Mas, graças a Deus, estou em um caminho que eu estou superorgulhoso. Com meu sexto curta, eu diria que o Festival de Cannes é a minha formatura. Posso encerrar essa minha faculdade que foi fazer os curta-metragens e agora começar a fazer os meus longas.”

Mas as primeiras experiências dele foram como ator. Após estudar no Tablado, estreou como ator com o personagem Dragão, em Malhação – Toda Forma de Amar, em 2019. “Foi uma surpresa para os meus pais. Quis ter primeiro essa experiência como ator. E foi única na minha vida, adorei. Mas foi ótima também para eu entender que o meu negócio não era atuação, mas sim direção mesmo. Não vou dizer que nunca mais vou atuar, a gente nunca pode falar essas coisas. Temos que estar abertos, mas à princípio quero focar mais na direção, realizar meu primeiro longa e continuar nesse caminho de diretor”, explica ele, que realizou seu primeiro curta, La Voisine, em 2016.

"Comparando com a gente, como a Europa está tão avançada em relação ao covid. Todos os outros presidentes fizeram uma gestão diferente", pontua Lucas (Foto: Divulgação)

“Comparando com a gente, como a Europa está tão avançada em relação ao covid. Todos os outros presidentes fizeram uma gestão diferente”, pontua Lucas (Foto: Divulgação)

A participação em Malhação teve um lado bastante afetivo, afinal foi atuando nesse produto que seus pais se apaixonaram, em 1997. Graças a Malhação, ele existe. “Exatamente, sou grato a esse produto (risos). Eu brinco até hoje, mas lembro que foi uma coincidência superfeliz. Quando descobrem que sou filho deles, a receptividade é sempre com muito carinho, arrisco até a dizer que é um sentimento como se lembrassem dos momentos dos meus pais atuando. E sempre me falam que sou a cara do meu pai”, recorda. E ressalta: “Em teatro eu fiz apenas curso, queria entender melhor como funcionava a dramaturgia em questão de me colocar no lugar do ator. Acabei gostando e depois quis ter a experiência profissional de trabalhar na TV. E, como disse, no final já tive certeza de que adorei atuar, mas meu negócio é direção mesmo, não tem jeito.” E aponta que característica traz do pai na direção. “Toda sensibilidade que eu tenho como diretor é totalmente dele. E também a visão sobre ter uma atenção maior aos atores. É algo que meu pai me ensinou muito. É importante para conduzir a história da melhor forma possível”, diz.

Sobre a pandemia que já matou mais de 530 mil brasileiros, ele conta que primeiro o pai, depois ele e em seguida a mãe, todos contraíram o novo coronavírus, mas de forma tranquila. “Passei todo o período de isolamento social tentando escrever algo, produzir, não estava vindo nada, parecia que eu não sabia para quem escrever, que a gente não via cinema retornando tão cedo. Estava tudo parado. Agora, graças a Deus, as coisas estão voltando. Infelizmente a gente ainda está com um número de mortes altíssimo”, observa. Direto da Europa, ele fala que Jair Bolsonaro é um líder de estado e tem que ser um exemplo. “Era um momento para ele tentar ser um bom presidente e acabou que no final das contas a gente não estava errado. Foi o pior presidente que o Brasil poderia ter durante uma pandemia, com certeza”, analisa Lucas, que antes de chegar na França, para entrar na Europa, fez uma quarentena na Croácia e, em seguida, aproveitou uns dias com Luisa, em Paris.

Antes de ir para Cannes, Lucas Vasconcelos visitou Paris ao lado da namorada, Luisa Camacho (Foto: Reprodução Instagram)

Antes de ir para Cannes, Lucas Vasconcelos visitou Paris ao lado da namorada, Luisa Camacho (Foto: Reprodução Instagram)