* Por Carlos Lima Costa
Os últimos dois anos foram fundamentais para que a atriz Lola Fanucchi, que brilhou como a Muna, em Órfãos da Terra – recentemente premiada como Melhor Novela no Emmy Internacional 2020 -, começasse a colher, no audiovisual, os frutos de uma decisão vista por muitos como ousada e até temerária. Ela sempre teve a certeza de seu desejo de ser atriz, mas após perder a mãe, aos 17 anos, agiu mais com a cabeça do que com o coração e tomou outro rumo profissional. Se formou em Comunicação e durante quase cinco anos trabalhou na área corporativa, com marketing. “ Conquistei a independência financeira”, relembra.
A decisão tinha sido puramente racional. Então, chegou um momento em que ela não tinha vontade de realizar suas funções. “Concluí que precisava fazer o que eu amava para ser feliz, por mais que isso significasse uma certa insegurança. Mas não larguei tudo de um dia para o outro. Tenho tendência a ser pragmática, racional, mesmo quando tomo decisões que parecem mais do coração”, relata. Durante o tempo que trabalhou na área corporativa, fez vários cursos. Assim, em 2011, quando deixou a estabilidade de lado, já conhecia inúmeros profissionais da área artística. A peça Nas Alturas – In The Heights, de 2014, marcou seu primeiro trabalho e não parou mais. Participou de musicais no teatro até que em 2019 estreou no audiovisual na novela, Órfãos da Terra. Agora, será a vez do primeiro filme, Tudo Bem No Natal Que Vem, longa-metragem da Netflix, que estreia nesta quinta-feira, dia 3 de dezembro.
“Gravar com um elenco daquele, imagina como foi. O Leandro Hassum é muito engraçado, ele improvisou bastante e a gente tinha que reagir na hora. Então foi um processo de aprendizado estar em um ambiente da comédia, vertente que eu gosto bastante, mas não tinha explorado tanto. O diretor Roberto Santucci também já tem credenciais no gênero, deu direções claras do que ele queria. Isso foi fundamental para eu me sentir confortável. Espero que todos se divirtam assistindo, porque eu me diverti muito fazendo”, frisa ela que interpreta Luana, cunhada de Jorge, vivido por Hassum.
“É uma menina que está descobrindo o que ela quer, mas é corajosa. A maior parte do filme se passa apenas na noite de Natal. Você acaba não vendo o processo dela de mudança de um caminho para o outro, então, é engraçado, gera algumas situações, ‘meu Deus, o que aconteceu que ela está completamente diferente?’. É como uns parentes que vemos pouco, encontramos só no Natal, às vezes, e aí estão completamente diferentes. As pessoas talvez consigam enxergar ali um pouco da própria família”, acrescenta.
Para Lola, o Natal é uma época de boas lembranças. “Quando criança, eu amava montar árvore, presépio, queria adivinhar os presentes, então, ficava apertando o papel da caixa para tentar descobrir o que era. Sempre foi uma data feliz pra mim. Depois de mais velha não ligo tanto. Não é o presente que importa tanto e sim estar com as pessoas que amamos. Mas confesso que gosto mais do Réveillon, o momento da virada me deixa sempre emocionada, parece que a energia se renova completamente. De 2019 para 2020 sentimos isso e levamos um tapa na cara”, diz, lembrando a pandemia que veio a seguir.
“Estou em São Paulo, fechadíssima em casa. Ninguém imaginava que seria tão limitante”, frisa. Assim, em casa, vibrou com a vitória de Órfãos da Terra, sua primeira novela, no Emmy. “Vim de teatro, não tinha pretensão de fazer audiovisual”. Em 2018, estava em cartaz com o musical Natasha, Pierre e o Grande Cometa de 1812, quando o diretor artístico Gustavo Fernandez assistiu o espetáculo e a convidou para atuar na novela. “Foi muita sorte, entrei por essa porta não usual por ter sido vista no teatro e me apaixonei pelo audiovisual. Não consigo imaginar mais a vida sem essa possibilidade. Foi incrível trabalhar com Flávio Migliaccio, (1934-2020), meu avô na trama, e que foi uma perda grande. O elenco da novela tem um grupo no WhatsApp, e combinamos de assistir o Emmy, remotamente. Mesmo separados comemoramos muito. E, à noite, nos encontramos em uma reunião pelo Zoom, para celebrar. Ver esse reconhecimento internacional deixou a gente muito feliz”, ressalta.
Lola lembra a morte da mãe, Helda. “Foi rápida e inesperada. Havia um surto de dengue e os sintomas como febre e dor no corpo batiam com o diagnóstico da dengue. Na verdade, era uma bactéria que deu uma infecção na válvula mitral, fez cirurgia, mas não aguentou. Essa é uma tristeza que não passa nunca, se acomoda. Semana passada, dia 26, era aniversário dela, gosto de comemorar, relembrar. Foi a primeira pessoa que eu perdi, nem lembro de viver o luto com tanta intensidade. Hoje, sinto falta dela, íamos ser grandes companheiras, ela ía ficar feliz de me ver na novela, no palco”, aponta a atriz.
“Não conhecia meu pai biológico, ele e minha mãe se separaram quando eu era bebê e ele não esteve presente na minha vida. Quando minha mãe se foi, minha avó Geny foi tipo minha segunda mãe. É engraçado, quando falo sobre esse assunto não sinto que tenho trauma em relação a isso. Nunca senti falta, talvez porque nunca tive essa figura paterna presente. Minha mãe fez um trabalho excepcional ao me criar. Não tenho nenhum sentimento ruim pelo meu pai biológico. Quando minha mãe faleceu, eu o conheci pessoalmente, mas ao mesmo tempo é uma pessoa que não tenho intimidade. Não foi um momento que mudou a minha vida. Conheci nessa ocasião, mas não temos contato”, pontua ela.
Aos 35 anos, a atriz fala sobre a ditadura da beleza: “Só tenho que agradecer a genética da família que está me ajudando, porque nossa indústria é cruel. A gente coloca essa questão da idade, de envelhecer em um lugar muito complicado, as mulheres ficam ‘noiadas’ de envelhecer, parece que só são interessantes se são mais novas, se você está fisicamente adequada no padrão. Isso é uma luta que devemos batalhar para mudar, principalmente na indústria do entretenimento”, analisa.
Nesse período de quarentena do Covid-19, refletiu bastante. “A pandemia forçou a parada de todos nós, isso propiciou momento de reflexão. Penso não só para a minha vida, mas para a gente como sociedade. A pandemia colocou muita luz na desigualdade que vivemos. Que futuro queremos construir? Como sociedade estamos fracassando em várias coisas. Falo de lugar de privilégio de poder parar e não ter problema de colocar um prato na mesa. Muita gente não teve essa oportunidade. Vendo o que aconteceu, tenho tristeza de ver tantas mortes, o descaso do governo com tantas coisas. Temos que repensar enquanto sociedade. Não da para termos tanta desigualdade social”, reflete.
Durante este período, desenvolveu um pouco também seu lado criativo. “O que mais senti falta foi de poder estar trabalhando em equipe, ensaiar, estar no palco. Ao mesmo tempo, estamos nessa situação e não adianta fugir. Nesse momento de ócio criativo, escrevi roteiro para série e lancei duas músicas”, conta.
Das músicas, lançou o clipe de Dorival. “Queria dar protagonismo aos motoboys, um dos heróis desse momento. No meu cotidiano pedia tudo por delivery, dependi desses profissionais. Me irritou profundamente ao ver notícias de entregadores sendo humilhados, então, quis mostrar este outro lado”. Para participar do clipe Lola convidou motoboys de verdade, tanto para o papel principal quanto para figuração.
Lola não passou a quarentena sozinha. Há quatro anos, ela namora o ator e compositor Elton Towersey. “Passamos muitos dias juntos, colados, porque temos muitos assuntos, gostamos de ficar na companhia do outro”, diz ela, que nunca vivenciou uma relação tóxica, tema tão falado nos dias de hoje. “Dei muita sorte de nunca ter passado por isso. Acho importante que este diálogo esteja acontecendo com mais frequência. A mulher que se sentir acuada tem que denunciar, não pode ficar em relacionamento abusivo. Amor não limita, ele ajuda a expandir as possibilidades. Isso está sendo tirado do lugar do tabu e a mulher está ganhando voz, espaço e diante de situações como esta e de assédio não vamos mais nos calar”, frisa.
Planos para 2021, por enquanto é continuar filmando Sobre Todas As Coisas, de Vitor Rocha. que tem a intenção de contar um pouco sobre o que foi e o que está sendo a pandemia, por meio de diversos pontos de vistas ao redor do mundo. “Começamos a rodar no início da quarentena e é sobre como as pessoas tem visões diferentes da mesma situação. No começo, fizemos pequenas filmagens em casa. Agora, já gravamos a parte da narrativa em grupos de 3, 4 pessoas. Diretor de fotografia, por exemplo, acompanha remotamente, então, tudo tem sido feito com muito cuidado”, explica.
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