*por Vítor Antunes
Desde o final de abril, o Rio Grande do Sul vive uma catástrofe climática. Mais de 80% do estado está alagado, incluídos aí, bairros inteiros, cidades em sua totalidade, documentos, memórias, histórias… Uma a apresentar um pouco dessa desolação é a atriz Leona Cavalli. Natural de Rosário do Sul e criada em Porto Alegre, entre os bairros do Menino Deus e Bom Fim, ela disse “estar bem, dentro do possível, mas muito preocupada”. Para Leona, a preservação do meio ambiente é “o ato mais urgente da humanidade e deveria ser prioridade em todos os governos. Parece que, realmente, é através da dor que isso acaba se tornando uma realidade. [Essa falta de zelo com a natureza] é uma postura suicida em termos humanos. Ao mesmo tempo, há uma desinformação grande, ou o atendimento a algo meramente imediato e financeiro. Se houvesse um pensamento de economia baseada na preservação, haveria um resultado melhor, mas a ganância imediatista da qual a nossa sociedade é fundamentada acaba trazendo resultados assim”. A atriz estava com passagens compradas para visitar a mãe, não só para celebrar o Dia das Mães. “A parte da minha família que mora em Porto Alegre vive com dificuldade: com racionamento de energia, sem água, mas conseguindo ajudar quem sofre maior dificuldade”.
A fim de atender à população que está muito vulnerabilizada, Leona disse ter feito colaboração individual a quem estava precisando, além de haver se envolvido em várias correntes e grupos específicos que também estão amparando os gaúchos. Alguns artistas funcionários do Theatro São Pedro de Porto Alegre e a ONG Paz Sem Fronteiras, que está recebendo donativos no Rio e enviando-os à sede gaúcha do Instituto. Eles estão em parceria com a Central Única das Favelas (CUFA) fazendo a distribuição de roupas e cobertores. “É um apoio necessário e constante”.
Dados do Portal da Transparência da prefeitura de Porto Alegre mostram que a gestão do prefeito Sebastião Melo (MDB) não investiu um real sequer em prevenção a enchentes em 2023. Em 2021, a Prefeitura investiu R$ 1.788.882,48 (R$ 1,7 milhão); em 2022, R$ 141.921,72 e, em 2023, nem um real. Estudos encomendados pelo Governo Federal entre 2013 e 2015 e custaram R$ 3,5 milhões previam chuvas acima dos níveis históricos no extremo sul do país e o programa foi engavetado. O Ministério do Meio Ambiente afirmou que programa será retomado face à tragédia.
O Rio Grande do Sul vai se reerguer e renovar, mas para onde nós, seres humanos, caminharemos? A questão é urgente e é preciso uma consciência humanitária maior e isso reflete numa necessidade do povo escolher melhor seus representantes que deem prioridade e à preservação da natureza. Preservar a natureza é preservar a humanidade” – Leona Cavalli
Em 1941, Porto Alegre sofreu um uma grande enchente também. Grandes obras foram feitas, bem como houve a construção de comportas e mecanismos para escoamento da água, já que naquela ocasião, o lago Guaíba havia subido 4,75 metros e deixado a cidade inundada por 40 dias. Na última segunda-feira (13), o nível do lago estava em 4,77 e já passou dos 5m. Edificado na década de 1970 e malcuidada, as comportas e portões não funcionaram. A maioria dos motores foi roubada e os demais não tiveram a manutenção adequada e estão sem funcionar. Alguns portões estavam enferrujados.
Para Leona, o clima é de instabilidade constante. A chuva que não cessa, não apenas por conta do clima. “Esse é um processo antigo e constante de abuso e descuido da natureza e em várias formas. É praticamente o estado inteiro. É algo que nunca vimos. E não podemos deixar de falar da Amazônia. É algo previsível e anunciado há muito tempo. Não se leva o cuidado, a preservação do Meio Ambiente em conta. Há quem ache que isso é uma abstração. Espero que agora haja uma constância de prevenção, já que isso pode acontecer em qualquer lugar”
Para nós que somos gaúchos é tudo muito triste. O bairro onde me criei, que é a minha referência na cidade de Porto Alegre vive uma situação terrível. Eu morei no Menino Deus que é um dos bairros mais alagados, e o Bom Fim, menos, mas 85% da cidade está inundada. Um dos lugares onde estudei, tanto a Pontifícia Universidade Católica, como a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) viraram um lugar de acolhimento – Leona Cavalli
Leona está em cartaz com uma peça inspirada no livro “Ser artista“, de Marcus Montenegro. “É uma homenagem ao teatro brasileiro, no qual eu interpreto grandes atrizes que foram ou são agenciadas pelo Marcus. Dentre elas, Nathalia Timberg, Bibi Ferreira (1922-2019), Camilla Amado (1938-2021), Zezé Motta, Nicette Bruno (1933-2020), e Tônia Carrero (1922-2018). É um desafio imenso. Uma peça com um pouco mais de uma hora na qual revisitamos depoimentos da vida delas e homenageamos o teatro em si. O Anderson Müller faz na montagem um papel equivalente ao do autor do livro, o Marcus”. A encenação conta com a direção de Beth Goulart. Ela também pode ser vista em “Elogio da Loucura” versão teatral inspirada no livro “O Elogio da Loucura”, de Erasmo de Roterdã, um dos maiores escritores da História.
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