Leandro Hassum lança filme sobre cultura da mentira: ‘Vem no momento certo em que o mundo sofre com fake news’


‘O auto da boa mentira’ baseado nas frases de Ariano Suassuna estreia nesta quinta-feira (29) com direção de José Eduardo Belmonte, dividido em quatro histórias, a partir de aulas-espetáculo do poeta pernambucano. A partir do tema do longa Leandro Hassum levanta a questão: até onde uma mentira é engraçada ou pode se tornar um grande perigo? No filme, o humor prevalece

*Por Brunna Condini

Nesta quinta-feira (29) estreia nos cinemas o novo filme protagonizado por Leandro Hassum,‘O Auto da Boa Mentira’, com direção de José Eduardo Belmonte, baseado nos contos de Ariano Suassuna (1927-2014). O filme é dividido em quatro histórias diferentes, criadas a partir de frases clássicas do poeta. Todas abordam algum aspecto da mentira e suas muitas consequências. Aquela dita apenas para não perder a amizade do interlocutor. Com roteiro de João Falcão, Tatiana Maciel e Célio Porto, o filme teve sua coletiva nesta segunda-feira, com o diretor, Luís Miranda, Renato Góes, Jackson Antunes e Hassum falando diretamente dos Estados Unidos, onde passa férias. “O Suassuna é atual sempre. Vivo o subgerente de RH Helder, que é confundido com um ator famoso. “Suassuna fala da mentira de forma genuína, de uma forma que sai do regional e vai para o universal. O filme vem no momento certo em que o mundo sofre com as fake news. E fica esse pensamento: até onde uma mentira é engraçada ou pode se tornar um grande perigo? No filme, o humor prevalece. Tem uma passagem em que diz: “Fale mal da pessoa quando ela for ‘simbora’, quando estiver de costas, é muito mais educado da sua parte (risos). As redes sociais acabaram com isso, não há limite para os comentários. Você posta uma foto já aparecem dizendo que está ‘feio’, ‘o cabelo está horroroso’. Acho que todos deveriam conferir as palestras de Ariano Suassuna disponíveis na internet”.

Giselle Batista e Michelle Batista ao lado de Leandro Hassum no longa dirigido por José Eduardo Belmonte (Divulgação)

Giselle Batista e Michelle Batista ao lado de Leandro Hassum no longa dirigido por José Eduardo Belmonte (Divulgação)

O elenco conta ainda com Cassia Kis, Nanda Costa, Jesuíta Barbosa, Rocco Pitanga, Giselle Batista, Michelle Batista , Letícia Novaes/Letrux , entre outros. Hassum comentou sobre a oportunidade de trabalhar com profissionais incríveis ao longo da carreira. “Na época do ‘Zorra total’ sentava no camarim, estavam Chico Anysio (1931-2012), Carvalhinho (1927-2007), Francisco Milani (1936-2005)… o melhor da convivência com esses gênios são as histórias e como contavam. A obra do Suassuna tem esse poder de minúcias na hora de descrever seus personagens e tipos, que realmente é incrível. A graça e o humor estão nisso”.

Passando férias no Sul dos Estados Unidos com a mulher, Karina Hassum, o ator também exaltou a cultura nordestina: “É muito rica. É desafiador fazer comédia por lá, afinal, o Nordeste é berço dos ‘causos’. A grande influência do Ariano Suassuna para nós é elevar esse nível cultural. Seu brilhantismo na escrita, a ingenuidade, o lúdico e a inteligência”.

"Suassuna fala da mentira de forma genuína, de uma forma que sai do regional e vai para o universal. O filme vem no momento certo, em que o mundo sofre com as fake news" (Foto: Helena Barreto)

“Suassuna fala da mentira de forma genuína, de uma forma que sai do regional e vai para o universal. O filme vem no momento certo, em que o mundo sofre com as fake news” (Foto: Helena Barreto)

Qual a maior ou melhor mentira que você já contou? “Sou sou caseiro e não gosto de sair. Então, às vezes, pintam umas mentiras neste sentido para não ir a algum lugar. Mas tem uma história com mentira boa também. Estava saindo com uma pessoa e pintou uma paquera. Almocei com a que estava saindo e queria sair com a outra. Aí, eu disse que passei mal com o nhoque que comi no almoço. Menti tão bem que nunca mais comi o nhoque do lugar, mesmo sabendo que era mentira. Esse é o bom mentiroso: que mente tão bem, vive aquela mentira e ela vira verdade. A mentira boa, você tem que construir ela bem”, detalha.

“Respiro de vida”

Aos 60 anos, Jackson Antunes nascido em Carnaúba, Minas Gerais, também revela os tipos de mentiras que vem à memória: “Quando eu vou na minha terra, sempre que chego em casa aparece alguém pedindo dinheiro emprestado e não é pouco não . As pessoas te veem na TV em novela e acham que você tem muito dinheiro. Já me pediram R$ 5 milhões para comprar uma fazenda. Sabe o que eu respondi? Disse assim: “Meu amigo, não vou poder fazer isso agora, porque acabei de comprar um fazenda em Goiás que custou R$ 10 milhões. Deixa para depois, para o mês que vem”.

“O filme traz também o lado telúrico da vida. O seu Ariano - com quem tive a satisfação de conviver um pouco - era a própria poesia, a própria ternura" (Foto: Helena Barreto)

“O filme traz também o lado lúdico da vida. Ariano Suassuna, com quem tive a satisfação de conviver um pouco, era a própria poesia, a própria ternura” (Foto: Helena Barreto)

Ele contou que na época em que recebeu o convite para viver o palhaço Romeu em uma das histórias do longa, havia passado por um problema de saúde. “Tinha saído de duas cirurgias e ficado 30 internado. O personagem Romeu me deu um ‘respiro de vida’. Agradeço ao Zé Belmonte e aos deuses. Dessa situação e do convite para o filme já se passaram quase três anos. Os médicos me davam 5% de chances de sobreviver. E hoje estou aqui”, relembra Jackson, que, no filme, vive um palhaço amigo do personagem de Renato Góes, Fabiano, um jovem que não acredita em nada, e que apesar do ceticismo fica intrigado quando ouve um mistério circense envolvendo a mãe (Cássia Kis) e o pai, supostamente morto há anos.

O ator compartilha ainda, que conheceu Ariano Suassuna. “O filme traz também o lado lúdico da vida. Ariano Suassuna, com quem tive a satisfação de conviver um pouco, era a própria poesia, a própria ternura. Tem uma ingenuidade gostosa neste filme. E ele é muito oportuno, especialmente neste momento e na nossa forma de ver o outro através da mentira. As mentiras podem mudar o comportamento humano, podem mudar até o rumo da humanidade. Mas, quando ela saudável, ela pode trazer esperança para o ser humano também”, diz e exalta mais uma vez a sua escolha para o papel: “O circo é muito importante na minha vida. A simplicidade do circo e do povo do circo”.