*Por Valmir Moratelli
O Brasil ama odiar uma vilã. Odete Roitman, Carminha, Nazaré Tedesco, Flora, Perpétua… E até as importadas, como Soraya Montenegro, da mexicana “Maria do Bairro”. A lista é imensa e não caberia aqui. As vilãs carregam consigo a quebra de um estereótipo feminino de zelo e cuidado maternal que atinge o âmago do brasileiro, passional e dramático por natureza. Todas têm, entre suas características, vaidade exacerbada, maldade insólita e um carisma sedutor.
Karol Conká veio suprir a abstinência por vilanias novelescas paralisadas há um ano, devido à pandemia do Covid-19 que cessou as gravações teledramáticas no país. Ao protagonizar as mais ácidas cenas do BBB 21, a rapper assumiu a dianteira de um posto vago momentaneamente: a de vilã capaz de unir o país. Não por acaso conseguiu o inédito feito de superar a votação recorde da semana anterior, que colocou Nego Di (com 98,76%), seu fiel cordeirinho de jogadas vis, para fora do reality. Num país que fabrica vilões reais na surdina da política e na esteira da justiça, a ficção televisiva é uma válvula de escape onde se tem a chance de torcer por punições urgentes. A histórica rejeição da cantora, com 99,17% dos votos, mostra o quanto ela foi eficiente na sua personagem.
Toda vilã tem um alvo potencial, aquele que vai sofrer perversidades mil. Coube a Lucas Penteado este papel, quando Conká ordenou que ele não a encarasse e que não falasse à mesa enquanto comiam. Mas não foi só Lucas que provou o pão que Conká amassou. Ela debochou do sotaque nordestino de Juliette. Atiçou Gilberto para que ele tirasse satisfação com Arthur. Forçou romance com Arcrebiano e, percebendo desinteresse do rapaz, armou arapuca para que ele caísse no paredão. Bateu boca até com Camilla de Lucas, que se agigantou em memes aqui fora. Desde o começo, a rapper ironizou os adversários e debochou dos que lhe serviam de escada.
Inteligente como todas as vilãs, Conká percebeu que estava prestes a “tombar”. Nos últimos dias, disse que sairia satisfeita do programa. Claro sinal de uma vaidade que não lhe permite vivenciar uma cena de derrota. Agora, cabe a Conká o destino de toda grande vilã ao término de uma novela: passar o bastão da infâmia para a personagem da próxima trama. Com a volta de “Amor de Mãe”, prevista para 1º de março, Thelma (Adriana Esteves) vai ter que suar muito para ocupar o posto tão bem honrado por Conká nessas semanas quentes de fevereiro. A “novela” BBB agora segue sem sua melhor e maior vilã de todas as edições. “Eu me perdi dentro de mim”, disse Karol que, agora, segundo ela vai ter que “rever suas questões de animosidade na terapia”.
*Valmir Moratelli é roteirista e pesquisador em teledramaturgia da PUC-Rio
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