Juliano Cazarré aponta mudanças em Fuzuê e debate preconceito e invisibilização a católicos: “Não sai na mídia”


O ator é um dos principais destaques da novela “Fuzuê”, atual cartaz das 19h, que passou por diversas transformações. Vivendo o vilão Pascoal na trama, Juliano, que é gaúcho, experiencia outro registro em sua vida pessoal. É um homem profundamente religioso, apaixonado por sua família – vem aí o sexto filho com a consultora de moda Letícia Cazarré -, sua fé, e pelo Grêmio. Neste entrevista, o ator salienta o quanto o fato de ser católico gera discussões na sociedade: “O tempo inteiro somos ridicularizados, tratados como anacrônicos, retrógrados, ultrapassados, caretas… E a gente sabe que vai ser assim a vida inteira, porque o próprio Jesus disse que por sua causa, sofreríamos. Então, a gente está pronto pra sofrer, pra levar esse tipo de paulada, e prosseguir com fé, querendo ir pro céu, querendo levar nossa família pro céu, querendo ser pessoas melhores aqui na Terra e rezando até por essas pessoas que nos fazem mal e que falam mal de nós”

*por Vítor Antunes

Baseado num poema de Manuel Bandeira (1886-1968), Haroldo Barbosa (1915-1979) e Luís Reis (1926-1980) escreveram a música “Notícia de Jornal“. No samba, eles diziam “A dor da gente não sai jornal“. Algo muito semelhante ao que Juliano Cazarré sinaliza quando reitera estar havendo não apenas o preconceito, mas a invisibilização de atentados e discriminações  diversas às pessoas que, como ele, são de fé católica. “Agora, no final do ano, no Natal, duzentos cristãos foram assassinados na Nigéria. Todos os dias, em algum lugar do mundo, cristãos são assassinados e a gente não vê notícia nenhuma”, afirma.

O tempo inteiro somos ridicularizados, tratados como anacrônicos, retrógrados, ultrapassados, caretas… E a gente sabe que vai ser assim a vida inteira, porque o próprio Jesus disse que por sua causa, sofreríamos. Então, a gente está pronto pra sofrer, pra levar esse tipo de paulada, e prosseguir com fé, querendo ir pro céu, querendo levar nossa família pro céu, querendo ser pessoas melhores aqui na Terra e rezando até por essas pessoas que nos fazem mal e que falam mal de nós – Juliano Cazarré

Juliano afirma sobre sua missão: “É seguir com coragem, e podendo dizer: eu sou um artista, sou um católico, pai de família e todas essas coisas podem andar juntas muito bem. Uma das maiores complexidades da paternidade, é, claro, o desafio básico de prover sua família num país difícil como o Brasil, um país que não cresce, com poucas oportunidades. Prover uma família é sempre desafiador, mas eu destacaria, além disso, que uma das coisas mais difíceis é proteger a pureza das crianças. A todos os lados a ingenuidade delas é atacada. Mesmo nos desenhos infantis mais inocentes há uma mensagem ruim ali, uma coisa, um viés político-ideológico atravessado, escamoteado ali dentro. Eu quero que as minhas crianças possam ser crianças durante toda a infância delas, para que depois possam ser adolescentes saudáveis e um dia se tornarem adultos dignos, responsáveis”.

Neste 2024, Juliano revela que quer “terminar bem a novela ‘Fuzuê’, além de fazer alguns projetos de filmes”. E acrescenta: “Quero também, no segundo semestre, estar voltando para a telinha, mas ainda não sei exatamente em qual projeto, e focar bastante no Casa Cozinha, um quadro que criei no Instagram, e expandi-lo para além das receitas. Quero ir com o Casa Cozinha para o YouTube”. Sobre a novela das 19h, ainda que esteja com a audiência estabilizada e tendendo à ascender, a trama de Gustavo Reiz passou por grandes reformulações, justamente na tentativa de seduzir o telespectador. Alguns personagens mudaram, bem como a ambientação. Ao ver de Cazarré, “‘Fuzuê’ passou por muitas modificações, mas o Pascoal, meu personagem, não foi um em que estas mudanças foram tão drásticas. Ele já era mau, já era o vilão, ele apenas ficou mais malvado. Mas creio que essa é a graça da novela. Toda novela tem um pouco disso, de trocar o pneu com o carro andando e de ir sentindo a reação do público e entendendo o que ele está achando, o que ele quer. Tem sido uma aventura muito divertida e tenho a sorte de ter um monte de atores bons lá comigo. É muito prazeroso sair de casa para ir fazer o Pascoal”.

Pascoal é um dos principais vilões de “Fuzuê” e seu primeiro ‘vilãozão’ nas novelas. (Foto: Divulgação/Globo)

O XAVANTE, O MOSQUETEIRO E O VIVENTE

Antes mesmo do “Buenas e me espalho!”, que o Capitão Rodrigo Cambará – personagem de Érico Veríssimo (1905-1975), Juliano Cazarré também faz questão de apresentar-se assim. Não como uma pessoa, mas como um ‘vivente’:  “Ser gaúcho faz parte da minha essência. Tanto que neste momento, estou aqui, de bombacha, tomando o meu chimarrão, escutando música regionalista e sempre fantasio de um dia voltar para o Rio Grande do Sul, de um dia morar no meu estado natal. Eu não sei se isso vai acontecer, mas é uma vontade que eu tenho, eu acho que eu seria feliz por lá”. Nascido em Pelotas, cidade distante em cerca de 260 quilômetros da capital, Porto Alegre, o ator guarda com carinho as lembranças que lá teve. “Eu cresci afastado de Pelotas, ia pra lá nas férias de inverno, nas férias de verão. É uma terra da qual eu gosto muito, que mora no meu coração”.

Aliás, falando-se em coração, costumeiramente o dos gaúchos é, no futebol, dividido entre o Grêmio e o Internacional. Rivais eternos. O peito de Cazarré é tricolor: “Torço pro Grêmio, que foi o time gaúcho que eu via jogar na televisão quando eu era pequeno. Meu pai – o escritor Lourenço Cazarré – também. Mas tenho uma simpatia muito grande, pelo Brasil de Pelotas. Meu avô paterno morava perto do Estádio Bento Freitas, do Brasil de Pelotas e cheguei a ir em alguns jogos quando estava lá. Minha família chegou a trabalhar no “Xavante’. De vez em quando o pessoal fica confuso ao me ver com a camisa do clube, pois que ela é vermelha, e é algo inaceitável uma camisa vermelha num gremista”, descontrai-se o artista.

Juliano Cazarré e paixões: a família e o Grêmio. Uniforme do ator referencia a campanha invicta da Copa do Brasil de 1989 (Foto: Reprodução/Instagram)

Fruto de uma família de artistas, Juliano diz não saber se seus parentes atores – Olney (1945-1991) e Older Cazarré (1935-1992) , ícones da chanchada, além de seu pai, que é escritor – “influenciam na minha decisão de ser ator. Assim, ela foi uma decisão que ocorreu porque eu assistia muito teatro na época. Resolvi fazer um quadro de comédia lá no colégio e isso acabou me levando para faculdade de Artes Cênicas. Talvez de alguma maneira subconsciente eu tivesse no fundo da cabeça ali essa ideia de parentes-atores, mas era uma coisa um pouco distante. E quando eu fui fazer teatro também eu não pensava na televisão. Quando estudei Artes Cênicas na UNB (Universidade de Brasília), eu não pensava que um dia eu ia parar na TV. Eu queria fazer teatro em Brasília e aí a coisa foi aumentando, cheguei no cinema, depois na TV de uma maneira bem natural. O trabalho do meu pai influenciou ante ao fato de ele ser um contador de histórias. Eu ter lido, ter escutado muitas histórias na infância fez com que eu gostasse de também ser um contador de histórias, ser um ator que cria personagens. Aí tem uma influência”.

Outro elemento que também identifica o ator é o fato de ter uma família numerosa. Serão seis filhos. A esposa, Letícia Cazarré, está nos últimos meses da sexta gravidez. Oito pessoas em casa. Como fazer o casamento manter a magia em meio a uma rotina movimentada, com as demandas dos filhos, numa casa cheia?

Eu acho que primeiro é preciso entender o casamento como algo que é para sempre. Isso faz toda a diferença. Se você se joga num relacionamento, sabendo que no primeiro vento forte você pode pular do barco, você vai acabar pulando do barco. Então, é preciso entender o sacramento do casamento como uma coisa que é para sempre. É uma promessa que eu fiz junto com a Letícia e com Deus e essa aliança não pode ser quebrada. Mas há uma afinidade entre nós diante das questões do dia a dia, de estar sempre conversando sobre as necessidades da casa, falando de cada filho, como é que tem que ser, o que que a gente pode fazer pra melhorar e tentando estar sempre juntos – Juliano Cazarré

Juliano e Letícia são casados desde 2011. Letícia está grávida do sexto filho (Foto: Reprodução/Instagram)

BRASIS

Especialmente após o primeiro governo Dilma Rousseff, o Brasil ganhou contornos bem marcados dentro da política e debates cada vez mais acalorados entre ideologias políticas divergentes. Há,espaço para o contraditório no Brasil? E especialmente hoje, há algum abrandamento e/ou tolerância para se debater esse assunto? Para Juliano, não. “Eu não acho que houve algum abrandamento no coração das pessoas. A gente tem essa briga muito grande entre direita e esquerda e eu acho que eu vejo muita gente falando em abrandar, pacificar, mas na verdade acredito que se esteja querendo priorizar [ideologicamente] um lado só. Enquanto houver dois lados haverá essa polarização. Tenho receio da galera que fica muito falando sobre isso, sobre acabar com a polarização à força, censurar discurso, censurar pensamentos…”.

Não sei se no coração do brasileiro houve algum abrandamento, mas certamente há um lado que não pode falar com tanta liberdade quanto o outro. Eu acho que no Brasil não há espaço para o outro lado – Juliano Cazarré

A prerrogativa da opinião, para Juliano Cazarré, privilegia um lado em detrimento a outro (Foto: Priscila Nicheli)

Há 123 milhões de católicos no Brasil, mas segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) o número de evangélicos vem crescendo. Perguntamos ao ator se ele percebe essa variação e/ou diminuição de adeptos à fé romana: “Não vejo de dentro da igreja, e na verdade eu questiono essa afirmação, de que há uma gradativa diminuição de católicos. Acho que sempre tem gente saindo. Ser católico é algo de muita exigência, então sempre vai haver pessoas que não querem assumir o compromisso de tudo que a Igreja nos pede. E, a contrário, vejo é um número gigantesco de conversões. Há muitos irmãos protestantes vindo para a essa diretriz da cristandade, as paróquias estão lotadas, cheias de casais jovens, de crianças, de adolescentes, de gente procurando a tradição e a gente só vê igreja vazia nas paróquias onde os padres utilizam da batina para fazer discurso político. Aqui no Rio, em todas as missas que eu vou, vejo casais com muitos filhos e sei que essa realidade também está acontecendo nos Estados Unidos. Tanto aqui como lá, há muita gente procurando a Igreja mais tradicional, a que fala de Cristo, a que fala da cruz, a que trata do pecado, do Céu, do inferno…. Igreja esvaziada é aquela utilizada para o elitismo político”.

Eu rezo muito pelo clero da Igreja Católica no Brasil e, principalmente, pelos sacerdotes que ao longo das suas vidas foram desencaminhados. E eu rezo para que eles voltem a falar de Cristo, que voltem a falar da cruz, de céu e de inferno, de vida eterna, porque é isso que Cristo veio trazer à Terra. Cristo não veio fazer o paraíso na Terra, mas nos dizer que depois dessa vida a gente pode ser eternamente feliz com Deus e em Deus – Juliano Cazarré

Em razão de a sua prática religiosa, Juliano acredita ser alvo de maledicências, inclusive da imprensa. “Há pouco tempo atrás fui procurado a fazer uma matéria sobre famílias numerosas e não topei, inicialmente. Temia que houvesse um ponto de vista debochado, que aviltasse a imagem da minha família, e a repórter garantiu que seria uma abordagem respeitosa. Por fim, a matéria foi levada ao ar como eu imaginava, chamando-nos de radicais. Esse é o tipo de coisa que o cristão sofre”, analisa.

Como católico, eu tenho o dever de amar o Papa Francisco, e eu o amo. Rezo por ele para que ele continue levando o rebanho de Cristo para o céu e que ele possa conduzir a nossa igreja com força aí durante todo o seu papado, então ele está sempre nas minhas orações – Juliano Cazarré

Juliano Cazarré: Fé aviltada pela intolerância (Foto: Priscila Nicheli)

O ator diz ver uma “falsificação da doutrina de Cristo nos ideólogos que tentam nos dizer que é possível ter o paraíso aqui na Terra, quando isso não é possível. Aqui, a gente vai ter que sempre estar fazendo trocas, sempre vai haver algum tipo de desigualdade, pois que esta é um fato da natureza e a gente tem que lutar claro para ajudar todo mundo. A maior instituição de caridade do mundo é a Igreja Católica, a maior instituição social do planeta também é a Igreja Católica, mas a principal função da Igreja é levar almas para o céu”.

Eu acho que a minha profissão de fé é essa: Ser um homem católico, mais que isso um pai católico em 2024, época em que o mundo olha com assombro para uma família de seis pessoas e olha com naturalidade para uma pessoa vivendo sozinha com seis pets – Juliano Cazarré

Ouvir o canto gauchesco e brasileiro, da terra que ama desde guri. Terra de flor de tuna, camoatim de mel campeiro. Entre as pedras mouras das quebradas do Inhanduy, à doçura do queque, haverá sempre algum ginete a tocar gaita e violão. Tal como a quem – ousa – perguntar onde fica o Alegrete, Juliano também é daqueles que, antes de tudo, segue o rumo do próprio coração.

Créditos:

Styling Samantha Szczerb
Beleza Luan Milhoranse
Agradecimentos Hotel Windsor Marapendi