* Por Carlos Lima Costa
Conhecido do público por seu desempenho em Totalmente Demais, Malhação – Viva a Diferença e As Five, o ator Juan Paiva, pela primeira vez atua no horário nobre e vive seu melhor momento profissional como o Ravi, em Um Lugar Ao Sol. “Me vejo com uma história que tem um fundamento. É uma carreira de muito trabalho, estudo. O tempo todo ali acreditando realmente. Só de poder dar orgulho para a minha família e das pessoas verem o meu trabalho, a minha vida, me terem talvez como referência e inspiração, é maravilhoso. Estar nesse lugar de representatividade como um jovem negro, favelado, com pouco recurso me dá um gás para continuar. Que eu sirva de inspiração para tantos outros que possam vir, negros e favelados como eu, que a gente merece. A favela tem história tão delicada, complicada. Então, chegar em um lugar de reconhecimento pelo público em geral e inspirar é fantástico. Continuem fazendo arte, porque arte é muito importante para o andamento do mundo. Sem arte é difícil viver. O Brasil devia valorizar muito isso”, enfatiza.
Juan vibra com o personagem. “Ele é incrível, cheio de nuances, conflitos internos. Ele acredita na vida, na bondade das pessoas. Eu sabia desde o início o que é fazer um trampo das nove, com uma visibilidade maior. Está sendo uma grande oportunidade e eu estou feliz com o momento, entendendo que o retorno positivo é consequência do meu trabalho. Sou grato a Deus e às pessoas que me deram a oportunidade de estar ali junto com toda a equipe fazendo esse texto da Lícia Manzo com a direção do Maurício Faria. Independentemente do momento delicado de pandemia que estávamos vivendo, o trabalho fluiu de maneira maravilhosa”, reflete. Inclusive, o ator encontra semelhanças com o personagem. “Me identifico no jeito de acreditar nas pessoas, de me entregar, ser afetuoso e prezar pela família e a amizade”, explica.
Aos 23 anos, ele mostra maturidade e consciência em sua trajetória não só profissional, mas de vida, comprovadas na forma como investe o dinheiro. Quando estreou na TV, em Totalmente Demais, ajudou a melhorar a casa dos pais. Ele mesmo conseguiu adquirir um imóvel no Vidigal, o qual está reformando com o atual trabalho. “Meus pais (o garçom Celso e a empregada doméstica Jacira) me educaram dessa forma com pé no chão, sabedoria e inteligência em como gastar o meu dinheiro. Me fizeram entender que tudo é momento, é passageiro. Com meu crescimento no Vidigal é necessário ter o pé no chão, respeitar as pessoas. Aprendo isso desde criança. No momento que eu tiver dinheiro sobrando, aí vou poder usá-lo de maneira mais livre, mas como tenho uma família que é grande, e de certa forma a gente entende que existem os momentos de crise, é sempre bom pensar duas vezes antes de agir e gastar no impulso”, explica.
Nascido e criado no Vidigal, ele teve uma vida difícil. “Antes de reformar a casa da minha mãe, por exemplo, ela era no chapisco, não tinha piso no chão. Era uma casa com a parede rabiscada, um tom meio cinza, então, acumulava muita poeira e por conta disso eu sofria de bronquite, por ser asmático. Era ruim para dormir, por exemplo. Complicado não só para mim, mas para os meus irmãos também (Kauã, 16 anos, e Ryan, 18). Era um lugar bem humilde, sem recurso nenhum. Isso me estimulou também a correr atrás para melhorar de vida junto com a minha família”, ressalta.
A vida vem progredindo, mas Juan não pensa em deixar a comunidade carioca. “Eu gosto de onde eu moro. Aqui no Vidigal tem várias casas bacanas para se viver. Meu desejo é permanecer aqui, onde estão meus familiares e amigos. E o Vidigal é Zona Sul, perto de um monte de lugares. Como toda favela, tem os seus conflitos, às vezes. Pela minha percepção aqui, como morador e cria do Vidigal, isso é pequeno demais, passageiro. Quando acontece, depois leva dois, três anos sem ter nada. O Vidigal está virando até um ponto turístico. Vira e mexe aparece uma galera gravando clipe, filme, vindo nas festas e bares”, analisa.
Na trama de Um Lugar Ao Sol, seu personagem se tornou pai. Fora da ficção, Juan é pai de Analice, de 7 anos, para quem vislumbra um futuro melhor. “Eu quero que a minha filha seja feliz em tudo que ela fizer, no trabalho que exercer. Quero que seja uma pessoa que se importe com o outro, tendo prazer em estudar, correr atrás, que entenda que a vida não é fácil, mas mantenha o pé no chão, a cabeça erguida, correndo atrás dos sonhos. Ela já é uma pessoa de mente avançada, inteligente, sábia nas atitudes. Tenho um orgulho dela, e de mim e da minha companheira, Luana Souza, 24 anos, de estar criando um ser humano. Que ela seja feliz na vida o máximo possível. E quando vier os perrengues que ela saiba lidar com eles de maneira elegante e justa. E que sempre possa escutar nossos conselhos com a mente aberta. O que ela quiser eu estou fechado com ela”, se desmancha ele.
Juan relembra o susto e responsabilidade ao se tornar pai aos 16 anos. “No começo foi desesperador, porque ainda não estava trabalhando. Tinha feito alguns filmes, mas já tinha um tempo. Fiz uma peça profissional que ajudou no financeiro. Mesmo assim foi preocupante no início, mas meus pais sempre apoiaram a gente, o meu sonho, disseram para que eu continuasse estudando. Independentemente de qualquer aspecto, eles iam estar disponíveis para ajudar em tudo. Em seguida, veio Totalmente Demais, no tempo perfeito. Minha filha tinha talvez oito meses de nascida e eu peguei esse trampo bacana que deu para ajudar a minha família naquele momento. A gente olha para trás, vê uma história tão bacana. Hoje, minha filha já está em uma fase de independência, de querer se maquiar sozinha, frequentar a casa de amigos, ficar com as avós, as amigas vem aqui e é esse o rolê. Hoje, está muito mais tranquilo de tempo e de atenção entre nós, a gente conversa, ela é muito minha amiga”, conta.
Em tempos de polarização, preconceitos exacerbados, como o racismo, Juan, é claro, se preocupa com o futuro da filha. “Eu já sofri o racismo em alguns momentos. Sempre procurei agir de forma inteligente, educada, com papo reto, sincero. É o que eu falo para a minha filha, que se ela estudar, adquirir conhecimento, ninguém vai fazê-la de boba e ela vai ter argumento para debater, trocar ideia. Tem situações que são bem cruéis, que causam revolta, mas sempre falo para ela que se posicionar é superimportante. Tem que expor a opinião, não ficar em cima do muro. Essa foi a minha educação. Transmito para ela o que eu aprendi”, comenta.
Foi para perder a timidez que, aos 8 anos, Juan ingressou no curso de teatro no grupo Nós do Morro, no Vidigal, de onde saíram nomes como Thiago Martins, Babu Santana, Jonathan Azevedo e Roberta Rodrigues. “Ainda sou tímido, mas, hoje, por conta do trabalho, sou mais articulado. O teatro me ajudou a socializar com as crianças. Minha mãe queria o meu desenvolvimento e até ocupar a minha cabeça, para não ter muito tempo livre de bobeira. Até que com dez anos eu fiz o meu primeiro filme, 5 Vezes Favela – Agora Por Nós Mesmos (o longa é feito a partir de pequenos curtas, sendo que Juan é um dos protagonistas do episódio Arroz Com Feijão). A partir daí e já tendo referências, sabendo que atores que haviam passado pelo Nós do Morro, já estavam no mercado, me deu essa esperança. Percebi que poderia ter essa arte como profissão. Ali comecei a acreditar que isso era possível. Fé em Deus, estudo e correr atrás dos trampos”, lembra. “Tenho o maior respeito e admiração por todos que passaram pelo Nós do Morro. Cada um que surgiu de lá já é inspirador para todos nós que somos favelados”, acrescenta. Com o grupo, ele atuou por exemplo em peças de William Shakespeare (1564-1616) como Os Dois Cavaleiros de Verona e Romeu e Julieta, interpretando respectivamente Proteu e Romeu.
Para 2022, talvez tenha um novo trabalho no cinema. “Espero que no próximo ano a gente possa voltar a nossa vida normal por inteira sem precisar usar máscara, podendo abraçar. E que não volte mais esse momento que foi cruel. Desejo muita luz, positividade, trabalho, que todos sejam seres humanos mais interessantes, que a pandemia possa ter ajudado nesse lugar de pensar que a vida de certa forma é um sopro. É tudo muito rápido e a gente deve aproveitar o momento e respeitar um ao outro”, ressalta ele, que chegou a ter Covid-19 na reta final das gravações de Um Lugar Ao Sol. “Eu já havia tomado a primeira dose da vacina e tive sintomas leves”, diz.
E conta que talvez muito em breve tenha mais artistas na família. “Acredito que daqui a pouco o meu irmão Ryan vai se lançar na música. Chegou a fazer teatro, parou um tempo, está escrevendo algumas letras. Eu faço as batidas para ele, é mais na pegada do hip hop, um pouco do pop também. Ele está descobrindo que artista ele quer ser. Eu estou começando a aprender a tocar teclado, mas é programa de computador, ai a gente vai criando batidas. Eu tenho um home studio no quarto do meu irmão e ali a gente vai fazer as melodias, a harmonia. Às vezes, me experimento, cantando. Se eu vier a lançar algo na música vai ser realmente um conteúdo que eu queira falar e deixar no mundo. A minha praia é mesmo a atuação, mas nada me impeça de soltar alguns sons”, observa. E finaliza: “Kauã, o caçula, é adolescente, ainda está na fase de curtir a vida e estudar.”
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