*Com Bell Magalhães
José Henrique Ligabue vive o soldado Harshi, na fase recente de “Gênesis”, no ar pela TV Record. Natural de Porto Alegre (RS), o ator retornou na fase “Ur dos Caldeus” após anos longe da televisão. Sobre esse período sabático, José pontua: “Fiquei dois anos afastado depois que o meu filho nasceu. Essa decisão acabou fechando algumas portas para mim, mas não me arrependo nunca dessa escolha”. Caminhando para a parte final do arco, a novela não deixa de transmitir aprendizados. Com o papel, ele espera que o público perceba as nuances que os personagens possuem e que têm uma força imensa para a dramaturgia: “O personagem é um soldado muito fiel, tanto ao rei e ao reino, como ao pai dele. Essa fidelidade se estende do trabalho até a vida pessoal e a família. Ele vai até o fim com esse traço, só que nem sempre as histórias são da maneira que esperamos. Existem desafios na vida que colocam a lealdade à prova”.
Assim como Harshi, lealdade também é um ponto importante na vida do ator. Em meio ao enfrentamento da Covid-19, José critica a falta de empatia da sociedade durante um tempo tão difícil: “Hoje falta um pouco de lealdade na sociedade, sobretudo nesse momento que estamos vivendo. Temos que fazer escolhas e tomar as decisões certas, mesmo quando não temos as respostas tão bem elaboradas. Precisamos estender essa afetividade e pensar nas pessoas que são mais afetadas, que estão em situação de vulnerabilidade, e que talvez não tenham acesso a um hospital, ao tratamento e à internação”, afirma.
A Record continuará com o cronograma de gravação mesmo durante o feriado prolongado instituído pela Prefeitura do Rio. Sobre a continuidade das filmagens, José opina: “No começo do ano passado, o medo era presente. Talvez seja o que nos falta hoje, porque nos coloca em um lugar de reflexão. Voltamos com muitas incertezas, porém com o tempo nós fomos sentindo muita segurança diante do processo que a Record criou para gravarmos”, no que conclui: “Se está certo ou não continuar, não sou eu quem tem essa resposta. É inegável que estamos vivendo uma falta de representatividade séria. Se não temos um Estado forte que nos imponha o que devemos fazer, ficamos à mercê das escolhas individuais de cada um”.
Ainda sobre coletividade, presenciamos nas últimas semanas um acontecimento trágico. A morte de Henry Borel Medeiros, de 4 anos, está sob investigação e as polêmicas que giram em torno do caso são inúmeras. Pai na vida real, José entende a necessidade de discutirmos casos como este e darmos visibilidade a tantos outros que passam despercebidos pelos olhos da mídia: “Dói muito ver, principalmente quando são casos de crianças que estão em situação de maior vulnerabilidade e que não ganham tanta projeção. Estas tragédias precisam ser noticiadas igualmente para que tenham a devida atenção do aparato legal e dos departamentos de proteção à infância”.
Cultura do cancelamento
O movimento do ‘cancelamento’ vem ganhando corpo nas redes sociais ao longo dos últimos anos. Atores, cantores e outras celebridades sofreram ataques que colocaram em xeque por erros que foram vistos apenas por um certo ângulo. José critica os limites do ideal de perfeição moral constante dentro dessa onda: “Eu estou bem assustado com isso. Estamos em um momento de censura, não só vindo dos poderosos, e sim de todos os lugares. Todos querem falar e serem ouvidos o tempo inteiro, mas ninguém está disposto a escutar. É muito fácil transferir a culpa para uma pessoa só, uma testa de ferro, um bode expiatório”.
Uma das protagonistas mais recentes da onda de críticas foi a cantora e ex-BBB Karol Conká. José diz que sente empatia com a situação da artista, pois pensa que o mesmo poderia acontecer com ele: “Eu, que sempre quis participar do BBB, fiquei impressionado com o caso da Karol. Quando eu a vi lá, pensei: ‘poxa, por que eu não me candidatei para essa edição?’ Depois que ela foi eliminada, fiquei pensando como seria se eu estivesse lá, no lugar dela”, nos conta.
Família é prioridade
Durante a pandemia, relações pessoais e familiares mudaram a dinâmica. Muitos pais se acostumaram em ter os filhos em casa, enquanto outros não souberam lidar bem com a demanda de atenção constante em isolamento. O ator, que é pai do Arthur, de 6 anos, conta que teve que se adaptar à nova rotina, mesmo com o medo de não dar conta: “Estamos sempre ganhando, em todos os aspectos. Mesmo esgotado, estudando de madrugada e trabalhando, vejo que construí laços significativos e duradouros com ele. Poder viver essa troca com ele me deixa muito feliz, por mais que estejamos em um contexto de isolamento social”. E sobre quem não aproveita a cumplicidade da relação parental, em especial os homens, José dá o recado: “Se o seu filho está em casa, você precisa aproveitar esse tempo com ele. Antigamente, os homens iam trabalhar para ganhar o dinheiro para pagar a escola, o videogame, o tablet e ocupar os filhos o tempo inteiro, mas depois reclamavam que os eletrônicos estavam fazendo mal para as crianças. Temos que entender que nada troca o que criamos com essa convivência”.
Como é passar essa pandemia junto do filho? “Minha casa se transformou totalmente. Fiz uma parede de escalada, coloquei brinquedos, piscina de plástico… Está parecendo um parque de diversões! (risos) É o lugar que nós temos para nos distrair, passar o tempo juntos, e não vemos a hora de tudo isso passar. Meu filho sempre foi uma criança com muitos amigos e ele está louco para dividir tudo com eles, ao mesmo tempo que estamos descobrindo um lugar nosso”, conclui.
Novos projetos
No teatro, José está vivendo um momento muito lindo, “pois eu e mais alguns atores, que são meus vizinhos, montamos um novo grupo, o “Te-arteiros Santa Marta”, que tem como objetivo trazer o teatro cada vez mais para dentro da comunidade. Além disso, também vou fazer algumas últimas apresentações do meu espetáculo solo “TEDY – O amor não é para amadores” de forma online para fechar o ciclo e começar um monólogo novo, que estreia nesse ano. Também tenho alguns projetos autorais no teatro, um deles estará no ar em breve: a performance “A Forma do Tempo”. No segundo semestre começará a montagem de meu novo espetáculo solo “Ideias para adiar o fim do mundo inspirado no livro do grande autor Ailton Krenak”.
E tem mais: o próximo objetivo do ator é estudar para se tornar professor de teatro. O interesse partiu da união entre as artes cênicas e da ligação com o próprio filho, que o fez mergulhar na área da educação. Durante a pandemia, ele participou de um coletivo parental onde as famílias se juntaram para criar uma espécie de creche, com pedagogos e educadores, tudo com a participação ativa dos pais na concepção do plano educacional. Foi durante esse período que José resolveu seguir a vocação: “Dentro desse processo de parentalidade, me identifiquei com essa parte de educação e assumi esse papel. Eu tenho uma ligação muito forte com crianças, dentro da parte lúdica, e acho que foi essa conexão que me levou para o mundo das artes cênicas. Agora posso unir minhas duas paixões: a docência e a arte”.
Quanto ao novo ciclo, o futuro educador dispara: “Estou radiante! Estou vendo que vai ser uma ‘tranqueira’, porque não quero abrir mão do meu trabalho agora que eu voltei depois de tanto tempo. Agora estou de volta na TV, veio a licenciatura, mas é muito bom não ficar parado. O lugar de acomodação é sempre ruim, um lugar de apatia. É um dos meus objetivos como professor: nunca ficar acomodado. A educação, a arte e todas as áreas desse espectro é trabalhar com o movimento, de ‘chacoalhar’ a gente”.
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