Joana Limaverde: o afastamento das novelas, a carreira como gestora pública e os problemas com direitos conexos


Afastada das telinhas desde 2011, a atriz, na última semana, teve um trabalho seu, a novela “Uga Uga” de volta à exibição no Globoplay. Ainda que celebre a reexibição da trama de Carlos Lombardi, Joana queixa-se do não pagamento dos direitos conexos das novelas exibidas no streaming global, bem como as baixas remunerações daquelas vendidas para o exterior. Também fala sobre as novelas da Manchete que estrelou e das quais algumas, como “Xica da Silva”, que continuam sendo exibidas sem que tenha alguém tutelando-as. A atriz fala sobre a nova trajetória em sua carreira, dedicando-se às políticas públicas culturais no estado do Ceará, onde reside junto ao seu pai, o cantor Ednardo, recém recuperado de um câncer de boca, e sua filha Sofia, que convive com o Transtorno do Espectro Autista de nível 1

*por Vítor Antunes

Desde 2011 sem fazer uma novela completa, sendo esta “Amor e Revolução“, Joana Limaverde hoje reside no Ceará. Desde a pandemia, atriz volta-se às políticas públicas para artistas e ao audiovisual. E na capital cearense acompanha de perto o seu pai, o cantor Ednardo, recém recuperado de um câncer de boca, e sua filha Sofia, que convive com o Transtorno do Espectro Autista de nível 1 de suporte. Após trabalhar quase ininterruptamente por dez anos na televisão, a atriz resolveu dar uma pausa em 2005 a fim de ser mãe, o que era uma grande vontade sua. Desde então, desacelerou sua produção, junto ao audiovisual para dedicar-se à família.

Um dos grandes nomes da TV Manchete, onde esteve compondo o elenco de três das quatro últimas obras exibidas pelo canal carioca, Joana lamenta o não pagamento dos direitos conexos daquelas novelas, que permaneceram sendo vendidas para o estrangeiro. De acordo com as falas da atriz, ela não sabe nem a quem recorrer, já que a TV Manchete faliu em 1999, o Grupo Bloch em 2000 e a produtora das tramas, a Bloch Som e Imagem, foi fechada em 2006. Em 2022, Pedro Jack Kappeller, um dos herdeiros da emissora, também faleceu. A queixa se estende, de igual maneira, à Globo que recentemente disponibilizou em sua plataforma a novela “Uga Uga” (2000). Segundo ela, o critério para o pagamento aos artistas é arbitrário: “Os direitos conexos em relação à Globo só são recebidos de fato em uma boa quantia quando as novelas são exibidas no Vale a Pena Ver de Novo”.

Próxima de completar seu cinquentenário, a atriz vê a passagem do tempo com naturalidade, especialmente por não estar diante das câmeras. Vê nisso uma liberdade estética, no que tange às mulheres artistas, a quem não era permitido envelhecer, ou estar na praia em sua liberdade, sem ser julgada por sua aparência. “A pressão em frente às câmeras é bizarra. Me libertei disso”.

Joana Limaverde. Atriz quer propor debate para políticas que defendam os artistas (Foto: Reprodução/Instagram)

CULTURA, “FORTAL”, FAMÍLIA

Joana estreou nas novelas em 1995, em “Tocaia Grande“, após ser vista por Walter Avancini (1935-2001) numa vinheta de comercial para o lançamento de um shopping center carioca. Antes da novela da extinta emissora, fez uma participação em “A Viagem“, da Globo, e trabalhou como assistente de palco da apresentadora Angélica, no “Clube da Criança”. Entre a primeira novela e a última, se contada a participação em “Bang Bang” (2005), foram dez anos ininterruptos na TV. Hoje ela mora em Fortaleza. “Em 10 anos eu fiz dez novelas. Meus pais são daqui do Ceará e um dos motivos que me fizeram deixar o Rio deveu-se do fato de eu querer que a minha filha crescesse num lugar onde ela tivesse mais referências familiares. Além disto, meus pais se separaram depois de um relacionamento de quarenta anos”, disse a atriz, que é filha do cantor e compositor Ednardo e da educadora Rosane Limaverde.

A ida para a capital cearense foi definitiva para a atriz não apenas por permitir uma reconexão com seus familiares, mas também por orientar um acompanhamento e uma rotina mais assertivos para a sua filha, Sofia. “Nesses dez anos de trabalho, Sofia estudou em seis escolas diferentes. Eu ficava entre o Rio e São Paulo por causa das novelas e acabava me mudando para vários apartamentos diferentes e sempre com uma criança pequena, nessa vida nômade. Nesse período ela estava com um diagnóstico de TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade). Quando chegamos aqui no Ceará, notamos que a questão era outra e ela foi diagnosticada como pessoa que convive com o TEA (Transtorno do Espectro Autista), de nível 1 de suporte”, explicou.

Com as mudanças no Código Internacional de Doenças (CID), que começaram a valer em janeiro de 2022, o TEA nível 1 de suporte passou a incluir o que, anteriormente, era compreendido como Síndrome de Asperger. Ou seja, um autismo leve. Limaverde nos conta que a sua filha irá começar em breve “um curso de língua japonesa na UECE (Universidade Estadual do Ceará), e desenha super bem”, exalta. As pessoas que convivem com o autismo em sua forma leve, tal como Sofia,  possuem vida social quase normotípica, sem grandes mudanças quando comparados às outras pessoas. De acordo com os dados do Center of Diseases Control and Prevention (CDC), o Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) atinge de 1% a 2% da população mundial e, no Brasil, aproximadamente dois milhões de pessoas.

Quando decidiu engravidar, a atriz percebeu que o seu relógio biológico já estava apitando. Via-se muito decidida a encarar os desafios da maternidade. “Ser mãe modifica totalmente a sua estrutura de vida, especialmente o profissional das mulheres. De modo que é preciso que seja uma vontade atávica a de ser mãe. A minha gestação chegou num momento que percebi ser o timing perfeito. Sofia nasce em 2005, momento em que decidi dedicar-me a ela”.

Joana Limaverde fez sua última novela completa em 2011. Atriz se dedica à gestão pública cearense atualmente (Foto: Henrique Cardozo)

Joana só retornaria às telenovelas em 2010, no remake de “Uma Rosa Com Amor“, do SBT. Na mesma época, apresentou um programa do extinto canal BemSimples, sobre dicas de maternidade. “Como eu estava com a minha filha pequena, tirava as minhas dúvidas ali e descobri muitas coisas junto aos especialistas”. Pouco tempo depois, a atriz compôs o elenco de “Amor e Revolução“, trama sbtista sobre a Ditadura Militar. “Esta foi a minha personagem mais emblemática, dirigida pelo Reynaldo Boury (1932-2022) e escrita pelo Tiago Santiago. Na época da exibição da trama, o Brasil tinha uma presidenta que havia sido, nos Anos 1970, presa, torturada e era uma coisa muito latente. O SBT foi muito corajoso em abordar esta questão.  Durante os preparativos da trama pudemos conversar com pessoas que deram relatos de sua tortura e fizeram parte da guerrilha armada e nos deram relatos surpreendentes, chocantes. Minha personagem era uma atriz do teatro de vanguarda, e me inspirei tanto na Leila Diniz (1945-1972) como na Anecy Rocha (1942-1977). Logo em uma das minhas primeiras cenas havia tortura e logo depois outra que envolvia um aborto, além de quase ter  migrado para a guerrilha armada. Stela, minha personagem transforma-se numa diva do Cinema Novo. Nesta novela pude explorar o pleno arco dramático da personagem.

Joana Limaverde era Stela Lira em “Amor e Revolução” (Foto: Divulgação/SBT)

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Quando a atriz chegou no Ceará, acabou mudando radicalmente sua carreira. Inicialmente, ministrava aulas de interpretação para câmera e tutoriais de audiovisual na UNIFOR (Universidade de Fortaleza). “Quando estava desenvolvendo um programa sobre turismo de experiência no estado do Ceará, foi decretada a pandemia. Momento em que, por conta da crise da Covid, comecei a fazer articulações com artistas, jornalistas e intelectuais progressistas para fazer mobilizações na sociedade civil voltadas para resolver situações emergenciais aos fazedores de cultura, já que fomos os primeiros a parar em razão das questões sanitárias impostas pela pandemia. Em razão disto, me redescobri como gestora cultural”.

Limaverde conta-nos que no ano passado, 2022, foi convidada a fazer parte do Fortaleza Film Comission, uma parceria que, junto a outras capitais brasileiras também contempladas, objetivava firmar acordos para facilitar filmagens em vias publicas, geralmente algo burocratizado, e fomentar mais políticas no audiovisual,  já que “isso gera renda, tem participação no PIB e faz saber que o cinema, assim como a moda, a música e a economia criativa é o que nos revela o mundo. Estou muito imbuída agora desse espírito, pleiteando um cargo na Secretaria de Cultura de Fortaleza para criar um fórum audiovisual no Ceará, o que é um dos requisitos para que o estado e o município possam participar da Lei Paulo Gustavo e dos polos de cultura. E me coloquei à disposição para ser uma das representantes do estado na operativa nacional desta Lei”.

Embora esteja feliz nesta área das políticas públicas, se alguém me chamar para fazer publicidade ou propaganda eu vou, mas estar na gestão cultural hoje é tão gratificante quanto estar sendo aplaudida em cena aberta. Fico feliz em saber que através disto,  estaremos gerando o emprego de 450, 500 pessoas de uma só vez – Joana Limaverde

Joana Limaverde se diz fascinada pelas políticas públicas de incentivo à cultura, ainda que não negue a possibilidade de voltar a trabalhar como atriz (Foto: reprodução/Instagram)

Joana revela que dentro da política “há poucas pessoas capacitadas a compreender a variedade de linguagens possíveis do fazer artístico. Há gente que não sabe nada mesmo a respeito da cadeia produtiva e das linguagens culturais. Alguns são funcionários públicos, outros são colocados ali por questões políticas e não estão sensibilizados e/ou não fazem ideia de como incluir nos fazeres culturais as questões de gênero, a diversidade, os povos originários… Estou com uma grande injeção de ânimo para essa nova carreira”, relata. A artista, inclusive, nega o que afirmou uma reportagem veiculada em 2018, de que estaria dedicando-se apenas à carreira de cantora. Segundo ela “eu nunca me imaginei cantora, mas chegando em Fortaleza, sendo filha do Ednardo, e desconhecida aqui, cantei em alguns barzinhos, onde tive acesso à cena cultural local. Nunca pensei em virar cantora, gravar CD, nada disso. Sou afinada por que sou filha de músico e fiz aulas de canto, mas não tenho técnica. Sou uma atriz que canta”.

Além da intenção de dar uma outra assistência à filha, Joana também retorna a Fortaleza para acompanhar os pais, que se divorciaram após 40 anos casados, além do fato de Ednardo ter estado sob tratamento de um câncer de boca, do qual, atualmente,  está curado. “Hoje ele está bem, trabalhando muito, fazendo show em São Paulo, além de haver gravado um documentário”.

Joana Limaverde hoje mora no Ceará, onde dá uma assistência à sua família (Foto: Henrique Cardozo)

ENTRE O PAVÃO MYSTERIOZO E O ÚLTIMO ARTESÃO 

Conforme citado anteriormente, Joana Limaverde é filha do cantor Ednardo, famoso especialmente por haver escrito e cantado o tema de abertura da novela “Saramandaia” (1976), o “Pavão Mysteriozo”. O diretor da trama realista-fantástica era Walter Avancini que também afamou-se por seu talento, e não apenas por isto, mas por sua técnica pouco convencional de dirigir atores e atrizes. Limaverde diz que o próprio Avancini a convidara a estar no elenco de “Tocaia Grande” (1995). “Na época eu era menor de idade e o meu pai foi, junto a mim, assinar o contrato na extinta emissora. De cara, o diretor o reconheceu, pois que conheciam-se desde a trama setentista da Globo. Por esta razão, acho, consegui passar de forma mais tranquila com o Walter e fiz três das quatro últimas novelas da emissora – além de “Tocaia”, Xica da Silva e Mandacaru”.

Sobre o polêmico diretor – conhecido como “O Último Artesão” – Joana é cautelosa. Reconhece seu talento na direção de atores, mas pondera que o seu método hoje seria problemático. “Avancini era um gênio, um dos melhores diretores que tive na vida. Tudo que aprendi (em televisão) foi com ele. Já que eu vinha do teatro e a linguagem é outra. Ele tinha o cuidado de não deixar que não nos emperiquitássemos tanto para gravar uma novela como “Xica”, que entrássemos em cena suados, por exemplo, já que apreciava cenas visualmente mais naturalistas. Isto posto, acredito que ter ido com o meu pai, que era seu amigo, me protegeu. Avancini nunca me pediu coisas que me deixassem desconfortável em cena e/ou me expusessem, mas não posso negar que vi isso acontecer com vários colegas, e especialmente mulheres. Ao mesmo tempo, (em que era poupada) me segurava pois não sabia quando aconteceria o mesmo comigo – ainda que nunca tenha ocorrido. Mas isso não era uma coisa exclusiva de Avancini. Muitos grandes diretores agiam assim. Eles achavam que destruindo o ego de um ator podiam deixa-lo tão à flor da pele, que assim estariam susceptíveis a qualquer comando, e que chegariam à cena com lágrimas nos olhos.

Ele manipulava (nossas emoções) mesmo e hoje isso realmente poderia ser visto como assédio. Alguns atores não gostam de que preparadores de elenco usem desse expediente, o que é algo totalmente fora do nosso universo – Joana Limaverde

Joana Limaverde foi Catarina em “Xica da Silva”. Sucesso da Manchete tem um bastidor conturbado (Foto: Reprodução/TV Manchete)

Além de uma dramaturgia de guerrilha – com parcos equipamentos e grandes limitações técnicas – outro problema que cerca as novelas produzidas pela extinta Manchete diz respeito aos direitos conexos. Muitas foram as reexibições de novelas da emissora sem que os artistas recebessem por isso. “A novela foi vendida pelo mundo inteiro e para outras emissoras, e não recebi um centavo. Fui uma das últimas contratadas da Manchete e ainda consegui ter todos os salários e rescisão contratual pagos, já que estive vinculada à emissora durante a primeira fase de Mandacaru (1997). Alguns colegas foram fazer “Brida” (1998) e tomaram um calote”.

Sobre a estrutura da falecida TV, a atriz diz que eles saíam do bairro da Glória, Zona Sul do Rio, para Maricá, na Região Metropolitana, de Kombi. E tudo era muito precário e arriscado.

As cicatrizes que tenho são todas da novela “Mandacaru”. Tenho marcas dos pontos que levei no braço, de quando uma bala de festim me feriu. Por vezes ficávamos nas externas e demorávamos para almoçar, e nas salas dos atores não havia ar condicionado. Sempre havia um balão de oxigênio para socorrer um ator que passava mal. Houve uma pessoa do elenco de apoio que teve fraturas tão complicadas após cair de um cavalo que não pôde fazer a novela – Joana Limaverde

Diante de tanta escassez, a artista conta sobre a ocasião na qual sofrera um acidente a cavalo que lhe fez trocar de personagem na trama noventista. “Era a primeira vez estávamos tendo acesso ao animal. Porém a emissora não foi cuidadosa, de modo que um outro ator, que já sabia montar a cavalo, galopou em frente àquele que eu estava. O meu assustou-se  e disparou. Não tive tempo de pegar em outro lugar senão na crina do bicho, até que, desesperada, soltei dele e caí sentada. Fraturei o cóccix e em decorrência disso a minha personagem mudou. Acabei dando vida à cangaceira Neném, que entrou mais tarde na trama”.

Uma das pautas de Joana enquanto gestora cultural é, justamente esta, que regulamenta as produções e visa melhor condição de trabalho para os atores, bem como um quinhão mais justo nos direitos conexos tanto partidos da TV como do streaming. “Como gestora quero trabalhar em prol dessas políticas de horas de trabalho no audiovisual. Tivemos essa coisa das produções ‘de guerrilha’, de forma bem adversa, onde ou se fazia assim ou não se fazia. E na Manchete esta filosofia era bem presente, já que não havia grande estrutura. Além disto, por “Xica da Silva” , recebi apenas o meu salário e a rescisão contratual. Não sei nem a quem procurar para reaver isto”.

Com efeito, o contrato firmado pela atriz junto à Manchete deu-se através de uma “produtora independente”, fundada pelo próprio grupo que administrava a emissora, que já vinha de uma reestruturação após a quase falência em 1993. Joana foi contratada pela Bloch Som e Imagem, que realizou as quatro últimas novelas exibidas pela TV, citadas no início desta reportagem. Ainda que todas as empresas do grupo tenham decretado falência entre os anos de 1999 e 2000, a Bloch Som e Imagem se manteve ativa até 2006. Como uma manobra para despistar a União, a sede da Bloch Som e Imagem era em Maricá, no mesmo local da cidade cenográfica das novelas da emissora, e não na capital carioca como as outras empresas “oficiais” do grupo Manchete. Com o falecimento de Adolpho Bloch (1908-1995), a massa falida do conglomerado de mídia passou às mãos de Pedro Jack Kappeller, o Jaquito, que faleceu em maio de 2022, com 83 anos. A atual gestora da Massa Falida é a sua filha, Jaqueline Keppeller.

Os direitos conexos em relação à Globo só são recebidos de fato em uma boa quantia quando as novelas são exibidas no Vale a Pena Ver de Novo. Quando são vendidas para fora ou exibidas pelo Viva são centavos. E quando vão para o Globoplay, nada – Joana Limaverde

A atriz prossegue dizendo que uma das batalhas a qual se dedica é, justamente, pela regulamentação do streaming. Aponta-nos ela que “Os players vêm aqui e levam milhões em dinheiro e não deixam nada. E quando vão vender os seus produtos, as cláusulas são tão leoninas que o artista passa a ser prestador de serviço dos seus próprios produtos”, alega.

WHAKA-AWE-AWE-AWE-E

O refrão da música “Kotahitanga”, interpretada pela cantora Hinewehi Mohi foi o tema de abertura da novela “Uga Uga“, um dos maiores sucessos da Globo exibida em 2000. Ainda que tenha feito uma das maiores audiências da emissora naquele ano – chegando a marcar quase 40 pontos de média – a trama nunca foi reexibida, nem no “Vale a Pena Ver de Novo” nem no “Viva” . Atualmente está em cartaz na Globoplay. Foi a trama de estreia de Joana Limaverde na emissora líder de audiência, após haver feito três novelas na TV Manchete (1983-1999) e uma na Record TV . “E foi uma vilãzona para ninguém botar defeito. Bruna foi capaz de explodir o marido numa lancha, matar a mãe numa acidente de carro e acaba a novela vendendo livro de autoajuda com o pai, vivido por Wolf Maya. Eu ria muito lendo os textos do Lombardi, que eram muito bem humorados. Além disto, na sua novela havia uma questão interessante que eram os homens descamisados. Uma clara inversão no sex appeal, já que a sensualidade feminina era sempre alvo naqueles idos. Em “Uga Uga” era a vez dos homens estarem com seus corpos à mostra e sendo desejados”. Para a atriz, essa investidura na sensualidade masculina pôde ser revisitada na nova versão de “Pantanal”, “onde o corpo dos homens era exposto de forma mais escancarada ao passo que o das mulheres era revelado de forma mais sutil e poética”.

Joana Limaverde foi a Bruna de “Uga Uga”. Uma das vilãs da trama dos Y2K, de volta no Globoplay (Foto: Nelson di Rago/TV Globo)

VIDA E TEMPO

Ainda que esteja dedicada a uma carreira mais voltada às questões burocráticas e/ou políticas, Limaverde não recusa a possiblidade de voltar às telas. “Recebi convites de publicidade e programas para a Fecomercio-CE (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Ceará) e fui convidada, ainda antes da pandemia, para participar de um longa e de uma série sobre vida do Belchior (1946 —  2017)”. O falecido cantor era amigo de Ednardo. Joana prossegue dizendo haver “recebido alguns roteiros, mas estou com muita parcimônia. Minha carga mental está grande por que sou mãe, cuidadora, dona de casa, e não quero que haja conflito de interesse, por estar na esfera pública e em paralelo tocando a careira de atriz”.

Às raias dos 50 anos, a atriz lida com o tempo com naturalidade.”Sou tranquila quanto a isso. Haver me afastado da frente das câmeras também me tira um pouco da carga, da cobrança e da pressão estética que nós atrizes sofremos. Não éramos poupadas pelos paparazzis mesmo estando na praia”.

Houve situações em que evitava de ir à praia, apenas para não ser fotografada. A pressão em frente às câmeras é bizarra. Me libertei disso. Quando quero pintar meu cabelo, faço. Quando quero deixá-lo branco, deixo. Cuido de mim, mas não me deixo entrar nessa competição, nem na repressão estética condicionada pelas câmeras em 4k, que capturam até o poro do nosso rosto – Joana Limaverde

Lançando mão do nome de uma de suas últimas novelas, perguntamos à atriz a quem ela entregaria uma rosa com amor. E ela foi direta: “A todos os trabalhadores da cultura que resistiram bravamente à pandemia. Alguns se foram, mas nós resistimos. Queria fazer uma menção aos técnicos de espetáculo, que é uma galera pouco visualizada quando comparados àqueles que ficam no palco. Não se faz arte sozinho”, disse. Essa nova fase da vida não impede outros voos. Parafraseando a letra de seu pai, esse voar maneiro não foi ninguém que a ensinou. Foi passarinho do olhar – azul – que ela sustenta no alto do rosto.