Jayme Monjardim confirma novela na Band, antecipa detalhes da trama e reativação do núcleo de dramaturgia da TV


Conhecido por seu talento, sensibilidade e gentileza, Jayme Monjardim, revelou detalhes de seus novos projetos. À frente da novela “Romaria”, que será exibida pela Band, ele destaca, em primeira mão, o desafio de produzir a trama, mas assegura: “Há um desejo muito grande nosso de lutar, todo mundo junto, de formarmos uma nova realidade [à emissora]”. Além disso, Monjardim trabalha na série sobre seus antepassados, a “Família Matarazzo”, e no filme sobre Guido Schäffer, o “padre” surfista. “Precisamos falar do Brasil com prazer, falar bem do brasileiro”, afirma o diretor, acrescentando: “Na Band há várias pessoas sonhando com essa volta às novelas”

*por Vítor Antunes

Muitos artistas são conhecidos por seu talento. Outros, por sua sensibilidade. Há ainda aqueles que são conhecidos por sua gentileza. Poucos são os que conseguem reunir todos esses elementos numa só pessoa e, sem dúvida, Jayme Monjardim é assim. Os adjetivos que costumam atribuir ao diretor passam sempre por este perímetro. Nesta entrevista especial, Jayme antecipa informações sobre seu mais novo trabalho, “Romaria“, novela que vai ser exibida pela Band, bem como seus novos projetos: uma série sobre seus antepassados, a “Família Matarazzo“, e um filme sobre o que pode ser o primeiro santo carioca e surfista. Uma obra baseada na biografia de Guido Schäffer (1974-2009), o “padre” Guido.

Sobre a nova novela da Band, Jayme diz que, efetivamente, não é um projeto fácil nem barato, mas que tanto ele como a emissora estão com brilho nos olhos para levantar o projeto. Afinal, a Band não produz nada autoral ou em co-produção desde 2009, com a novela “Água na Boca“. A ida para a Band também é uma tentativa de subir os índices da emissora, que ultimamente tem sido modestos. “Acho super saudável haver concorrência. Quando há, por consequência, acaba por haver uma melhoria do produto levado ao ar. Concorrência é sempre algo muito saudável”, diz Jayme Monjardim.

Não é fácil fazer novela. A gente tem que estar muito bem estruturado, mas existe uma vontade de que isso aconteça. Há um desejo muito grande nosso de lutar todo mundo junto, de formarmos uma nova realidade e de fazê-la acontecer. E na Band há várias pessoas sonhando com essa volta às novelas, principalmente o Johnny [Saad, presidente da Band] e o time da emissora. Estamos na luta com o pessoal do comercial para viabilizar ‘Romaria’. Mas não é num estalar de dedos. É um processo que leva um tempo de arrecadação, inclusive. Mas que ela vai existir, não temos dúvida – Jayme Monjardim

Jayme Monjardim em nova fase da carreira, ferá novela, série e filme para a Band (Foto: Divulgação/Globo)

… EM ROMARIA E PRECE, PAZ NOS DESAVENTOS

Um dos maiores sucessos de Elis Regina, “Romaria” é uma música de Renato Teixeira. Tradutora de um Brasil profundo, a música traz em si uma palavra que não existe para representar a esperança em meio ao desalento: desavento. Há quem diga tratar-se de bem-aventurança. Há quem diga que a palavra é uma contração de desalento com desavença. Mas o Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa diz que esta não é uma palavra. Ou não reconhece aquilo que o sertanejo sente como vocábulo. Talvez Jayme Monjardim seja um que se proponha a isso: traduzir em dramaturgia o sentimento de um Brasil profundo. “Essa novela é sobre um homem que acaba vendendo os filhos, porque ele não tinha condições de cuidar e sua mulher morreu. Os filhos vão parar em cinco regiões diferentes no Brasil. Essa novela se propõe justamente a falar a língua dessas cinco regiões do Brasil e seus sentimentos através dos personagens. O mote da trama vem do fato de que um dos irmãos, o mais velho, promete no leito de morte do pai que vai juntar os irmãos numa Romaria em Aparecida (SP). Não tem história mais brasileira que essa”, frisa.

Jayme ressalta ainda que a novela foi oferecida à Globo, que não executou — expediente semelhante ao adotado pela emissora, que recusou “Pantanal” em 1990, e que viu a Manchete entrar para a história da teledramaturgia, justamente pelo sucesso da trama rejeitada pela líder de audiência. “Com a minha saída na Globo, me comprometi em levar a trama comigo, me assegurando de que a novela era minha e que tratava de um projeto muito pessoal. Só assim pude levá-la para outra emissora. Acho que o público vai ao encontro de uma história boa”. Ainda que tenha uma romaria e Nossa Senhora Aparecida à frente da trama, Jayme diz que a novela não é doutrinária. “Teremos evangélicos, espíritas… Todo o Brasil está ali representado. Não é uma novela católica, em definitivo, mas sim uma novela sobre a fé. Os personagens circularão por suas religiões sem nenhum problema. Não discutimos a qualidade da religião, mas a fé acima da religiosidade”.

E acrescenta: “Ao final de “Romaria” estão planejados depoimentos de histórias da vida real de superação, um pouco do que eu fiz na época das novelas do Maneco. Abordaremos também a questão do câncer de mama e uma campanha para a vida”.

“Acho que estamos precisando falar do Brasil com prazer, falar bem do brasileiro do agro, do interior, da alma brasileira. Sinto falta de projetos que conversem com a alma brasileira” – Jayme Monjardim.

Paulo Gorgulho e Cristiana Oliveira em “Pantanal”. Novela foi rejeitada pela Globo e o maior sucesso da Manchete (Foto: Reprodução)

OUTROS PROJETOS E O FUTURO DA TV

Um dos outros projetos tocados por Monjardim para a Band é a biografia de “padre” Guido. Ainda que ele não tenha sido ordenado padre, é conhecido pelo título, ou por “Santo Surfista”. Nascido no Rio de Janeiro em 1974, Guido pode vir a ser o primeiro santo carioca. Sua vida vai virar filme. “A história dele é linda demais, especialmente por haver se dedicado a cuidar das pessoas mais humildes. Ele não chegou a ser consagrado padre. Surfava, era um cara incrível e tem uma história pouco conhecida”.

Outra história que será resgatada por Jayme é a da sua família, os Matarazzo, que foi uma das mais ricas de São Paulo — e do Brasil. Para se ter uma ideia, estima-se que 6% dos moradores de São Paulo trabalhavam nas indústrias Matarazzo em seu auge. Esta história vai virar série. “Contaremos desde a saída de Francesco Matarazzo (1854-1937) da Itália até os motivos que o levaram a esta decisão e o que ele fez chegar ao Brasil”. É a segunda vez que Jayme fala da própria família. A primeira foi quando levou à TV a vida da sua mãe, a cantora Maysa (1936-1977).

Qual é o desafio de falar da própria família, da própria história com isenção? “Difícil. Fazer a história da minha mãe foi difícil, mas o Manoel Carlos foi muito elegante na sua forma de escrever a série. Não escondeu nada, mas contou tudo de forma muito elegante, com muita delicadeza. A saga da família Matarazzo é bem diferente da história da Maysa. A da família é uma saga de empreendedorismo, de perseverança, e a Maysa era uma mulher contestada, à frente do seu tempo”.

Jayme Monjardim e sua mãe a cantora Maysa (Foto: reprodução)

Monjardim finaliza dizendo que a TV aberta tem sua própria trajetória e nem tão cedo será suplantada, bem como as novelas terão para sempre seu lugar. “Acho que a novela é a grande estrela da televisão, bem como acho a própria TV aberta superimportante e imbatível, capaz de fazer projetos incríveis. Ela tem um perfil próprio, diferente do canal a cabo e do streaming. A missão dela é mudar o país e construir narrativas novas e campanhas sociais importantes sem deixar de emocionar. Sou um apaixonado pela TV aberta, também porque ela constrói um conteúdo de alto padrão através de lindas histórias do nosso Brasil”.

Para Jayme, sua missão enquanto artista é: “Através de um trabalho, através da criação, através do que contar histórias, né? Assim, eu acredito que a minha missão é mudar as pessoas e mudar um pouco aí, de executar novas histórias. A partir dessas histórias, mostrar no Brasil, maravilhoso, mostrar exemplos de pessoas”.

Larissa Maciel deu vida à Maysa e Jayme Matarazzo interpretou seu pai, Jayme Monjardim, na série sobre a cantora (Foto: Divulgação/Globo)

Em sua jornada artística, Jayme Monjardim navega por mares profundos da alma brasileira, trazendo histórias que ressoam com a simplicidade e a força de uma romaria. Seja ao traduzir os anseios de um país por meio de personagens que se perdem e se encontram, ou ao revisitar memórias de sua própria linhagem, Monjardim nos lembra que contar histórias é um ato de fé e resistência. Em um cenário de incertezas, sua obra é uma lufada de delicadeza, pela coragem de retratar o que é genuinamente nosso e, sobretudo, pela capacidade de unir emoção e reflexão. Assim, o artista segue, em prece, oferecendo ao Brasil não apenas entretenimento, mas também inspiração e um retrato honesto de sua própria gente. E paz, nos desaventos.