Jade Mascarenhas, de ‘Elas por Elas’, desabafa sobre depressão e humor na TV: “Erraram a mão no limite”


“Acho que as pessoas mais aparentemente bem humoradas são as que já conhecem bem o fundo do poço, na questão da saúde mental mesmo”, diz a atriz, que fez parte do “Porta dos Fundos”. Ainda que esteja fazendo novela, Jade sente falta de programas humorísticos na TV aberta: “Sinto falta de programas dos anos 2010, que inclusive tiravam sarro com artistas antes tidos como intocáveis. Acho que erraram a mão no limite, o que contribuiu com a extinção desse nicho na TV. Mas a internet hoje está aí pra fazer tudo que a TV não faz e as duas podem coexistir bem”

*por Vítor Antunes

Ainda que a novela das 18h tenha uma atmosfera colorida, divertida e que flerta com a comédia, uma das protagonistas, Natália convive com problemas de saúde mental. Especialmente em razão do trauma da perda de um ente querido. O luto ainda é um assunto pouco discutido. E, em razão do luto, a personagem vivida por Jade Mascarenhas, na juventude, e por Mariana Santos, na maturidade, lida muito profundamente com a angústia e a depressão. Para Jade, a sociedade moderna vive “uma epidemia depressiva. Ainda bem que hoje é mais tolerável falar sobre isso, porque o sistema adoece, mas há pessoas mais vulneráveis que outras”. Coincidentemente, tanto Mariana como Jade são atrizes que trabalharam muito com o humor e têm seus rostos muito vinculados a esse gênero. Jade fez parte do “Porta dos Fundos“, Mariana, do “Zorra Total“. Ainda que esteja fazendo novela, Jade sente falta de programas humorísticos na TV aberta: “Sinto falta de programas dos anos 2010, que inclusive tiravam sarro com artistas antes tidos como intocáveis. Acho que erraram a mão no limite, o que contribuiu com a extinção desse nicho na TV. Mas a internet hoje está aí pra fazer tudo que a TV não faz e as duas podem coexistir bem”.

Namorada do também humorista Ed Gama, Jade fala algo que dialoga com alguns estudos científicos que traçam um paralelo entre o humor profissional e a saúde mental. Não raro, comediantes são pessoas deprimidas.

Acho que as pessoas mais aparentemente bem humoradas são as que já conhecem bem o fundo do poço, na questão da saúde mental mesmo – Jade Mascarenhas

Pesquisadores da Universidade de Oxford publicaram, em 2014, os resultados de um estudo do qual participaram 523 comediantes (404 homens e 119 mulheres) de três países – Inglaterra, Austrália e Estados Unidos. Segundo Gordon Claridge, do Departamento de Psicologia Experimental de Oxford, “Comediantes têm um perfil de personalidade pouco comum e um tanto contraditório (…) Por um lado, eles eram bastante introvertidos, depressivos e, poderíamos dizer, esquisitos. Por outro, eles são bastante extrovertidos e cheios de manias. Talvez a comédia – o lado extrovertido – seja uma forma de lidar com o lado depressivo. Mas, claro, isso não vale para todo comediante”. Sobre o humor em um casal de artistas da comédia, Jade diz que ela e seu namorado transformam “todas as bads em piada ou música. Outro dia ele chorou porque perdeu a chave do carro. Alguns minutos depois eu achei. Já virou piada em breve uma improvisação musical sobre estar tão cansado e estressado que perder a chave do carro faz chorar”.

Além da novela das 18h atualmente em cartaz, Jade poderá ser vista no filme “Homem de Ouro“, de Mauro Lima sobre Mariel Mariscott (1940-1981), conhecido como, justamente, o homem de ouro da Scuderie LeCoq, famoso grupo de extermínio da década de 1970 e do qual paticiparam alguns bicheiros como Castor de Andrade (1926-1997). Coincidentemente, o longa pega carona em projetos recentemente lançados que margeiam essa temática, como as séries “Vale o Escrito” e “Doutor Castor“, da Globoplay. No filme, que deve ser lançado em 2024, Jade vive Soninha, personagem que é confidente de Mariel (Renato Góes), ainda que seja uma adolescente, e que acaba virando sua cúmplice “A gente teve muita troca, eu e o Renato. Soninha é uma adolescente muito sozinha, que não liga pra obediência mas é inteligente e rápida, tanto que o tio sempre volta pra ter ela por perto”, adianta.

Jade Mascarenhas em seu novo filme “Homem de Ouro” (Foto: Divulgação)

 

ELA 

Jade Mascarenhas quer começar 2024 de maneira intensa. Sua vontade, ao fim da novela das 18h é a de “urgentemente voltar pro palco. Em 2020 estava prestes a estrear uma peça quando veio a pandemia. Lançamo-la on-line mesmo, e ainda assim ela ganhou um APCA. Desde então, trabalhei no backstage, como produtora, assistente de direção e até operando som, mas meu sonho mesmo era estar ali em cima do palco. Agora que consegui abrir portas como atriz, graças à internet, pretendo voltar ao meu sonho original que é fazer um espetáculo, juntar toda galera que eu conheço pra trabalhar comigo. Fazer alguns curtas lacradores – como o tribunal da internet chama me permitiram ser conhecida pela maioria das pessoas. Os curtas do youtuber Zel Junior, como “Gay vs Crente” e “Panteras do Lula” foram os que fizeram a atriz tornar-se conhecida.

Conforme dissemos, a questão da saúde mental é um dos temas da personagem Natalia, de “Elas por Elas“. Esse tema é devidamente discutido hoje? Para Jade, “esse é um momento de ebulição global e ainda estamos tendo que lutar pelo básico. Emprego, renda, saúde, moradia e lazer parece uma utopia, mas são políticas públicas e mudanças na cultura do consumo e do marketing que tem poder de fazer uma vida mais acolhedora. Não tirando a individualidade de cada depressão. Natália é um exemplo de como o buraco é bem mais em baixo. Ela ficou tão traumatizada que perdeu a memória e está reconstruindo aos poucos as imagens do dia da morte do irmão gêmeo”. Na atual fase da trama, Natália, na fase adulta, tem conseguido lidar melhor com a morte precoce de Bruno (Luan Argollo).

Jade Mascarenhas e Luan argollo em “Elas por Elas”. Os atores vivem os irmãos Natália e Bruno (Foto: Divulgação)

Quando Jade entrou na novela houve uma grande substituição, que foi a saída da Monica Iozzi, que interpretaria a personagem que ficou com Mariana Santos. Ela conta sobre como foi essa fase, que quase valeu a sua saída da novela “Nessa vida são muitos “nãos”, mas o pior mesmo são os “talvez” porque destrava uma ansiedade antes do desconhecido. Quando a Monica saiu, eu fiquei no “talvez” por uns dias. Quando eu já estava vivendo o luto de perder a Natália e quase entrando em aceitação, afinal a carreira é isso aí mesmo, me ligaram para dizer que eu dividiria ela com a Mariana. Os processos são todos muito intensos”.

Cria da Internet, Jade não acha que a web vai substutuir a televisão “A TV nunca vai parar de existir porque chega em todo e qualquer lugar, é mais fácil deixar a tv da padaria ligada o dia todo num canal que já pensou toda a programação pra você não ter que ficar escolhendo toda hora o que assistir. Claro que diminuiu um pouco a audiência porque tem internet hoje em dia. Mas eu acho muito legal a sensação de esperar algo pra assistir, por exemplo, todo domingo sei que vamos pedir algum lanche e assistir o “Fantástico” à noite. Mas, sinceramente, amo tv, amo internet e amo o palco. Por mim eu estaria em todos um pouquinho”.

O elenco jovem de Elas por Elas (Foto: Divulgação/Globo)