Jacqueline Vargas, vencedora do Emmy, lança filme sobre TPM e comenta episódio envolvendo humorístico do Multishow


Ela assina ‘TPM! Meu Amor’, estrelado por Paloma Bernardi. Responsável por roteiros premiados, como o de ‘Malhação – Viva a Diferença’, vencedor do Emmy Kids Internacional, Jacqueline vai de temas cercados de preconceito, como TPM, saúde mental e menopausa; passando por dramas como a série ‘Sessão de Terapia’, até a escrita para o público infanto-juvenil. Nesta conversa, fala do ofício e reflete sobre desentendimentos entre elenco e roteiristas do humorístico ‘Vai que Cola’, do Multishow, que denunciaram a violência psicológica sofrida nos bastidores. “Muita gente pensa que é fácil escrever, então não existe o pensamento de que profissionais passam meses para levantar um roteiro, e alguém pode achar que no estúdio, em um minuto, vai escrever algo melhor do que o roteirista. Existe uma ideia de que qualquer pessoa vai reescrever em pouquíssimos minutos, de improviso. Existe um subestimar/depreciar o trabalho do roteirista, como se fosse algo banal, e isso é percebido por todos os profissionais de roteiro. Ninguém vai mexer no trabalho do diretor, produtor, ator, mas no trabalho do roteirista todo mundo quer mexer”

*Por Brunna Condini

Roteirista com mais de 20 anos de carreira, Jacqueline Vargas estreia ‘TPM! Meu Amor‘, filme protagonizado por Paloma Bernardi com direção de Eliana Fonseca, que teve pré-estreia ontem. O filme inspirado em ‘A Mulher sem Superego‘, monólogo ainda inédito da dramaturga, aborda a tão mal falada TPM feminina. “Escolhi o tema, porque eu tinha uma TPM medonha e bem violenta. O meu monólogo é justamente isso: uma mulher que tem um burnout, fala tudo que ela pensa pra chefe, é mandada embora e, após esse episódio, não consegue voltar ao que era antes e continua falando tudo que pensa e quer. Eu pensei “Poxa, isso é muito legal. Uma mulher que nunca é agressiva, quando entra na TPM, fica pela primeira vez. E a palavra certa nem é agressiva, mas sim, assertiva, objetiva, decidida”, detalha Jacqueline.

Tendo em seu ‘cardápio’ produções que vão desde a novela infantil ‘Floribella‘, exibida na Band, até o premiado drama ‘Sessão de Terapia‘, sendo também vencedora do Emmy Internacional Kids por ‘Malhação – Viva a Diferença‘, produto Globo, ela comenta, a nosso pedido, o episódio que veio a público nesta terça-feira (22), sobre desentendimentos entre o elenco e roteiristas do humorístico ‘Vai que Cola’, do Multishow, quando os profissionais que escrevem a atração, endereçaram uma carta à diretoria, produção e elenco, na qual denunciam a violência psicológica sofrida por eles nos bastidores. “Eu não estava lá, não vi e não sei como é que é, mas o que se deduz é que, quando você tem um time e um programa que está fazendo muito sucesso e pessoas que gostam muito de improvisar e acham que o programa faz sucesso por causa disso, vão mexer no texto aleatoriamente. Isso acontece, de desrespeitar o texto do roteirista e, às vezes, o ator muda, mas é para o bem, só que muitas vezes o caco altera a história, o tom, e prejudica a narrativa”, opina.

Jacqueline Vargas, vencedora do Emmy Internacional, lança filme sobre TPM e comenta episódio com roteiristas de humorístico (Foto/Divulgação)

Jacqueline Vargas, vencedora do Emmy Internacional, lança filme sobre TPM e comenta episódio com roteiristas de humorístico (Foto/Divulgação)

“Muita gente pensa que é fácil escrever, então não existe o pensamento de que profissionais passam meses para levantar um roteiro, e alguém pode achar que no estúdio, em um minuto, vai escrever algo melhor do que o roteirista. Existe uma ideia de que qualquer pessoa vai reescrever em pouquíssimos minutos, de improviso. Existe um subestimar/depreciar o trabalho do roteirista, como se fosse algo banal, e isso é percebido por todos os profissionais de roteiro. Ninguém vai mexer no trabalho do diretor, produtor, ator, mas no trabalho do roteirista todo mundo quer mexer, porque parece ser algo fácil. Mas é um trabalho primordial, já que sem o texto, nada começa, além de levar mais tempo e ser um trabalho solitário. Deveria ser um pouco mais preservado!

Eu já vivi uma situação dessa, do ator ficar mudando linha por linha, para trocar coisas desnecessárias. Eu não sei se esse é o caso lá, mas eu acho que se a equipe chegou ao ponto de escrever uma carta é porque os integrantes devem estar realmente cansados da atitude – Jacqueline Vargas

Atores do humorístico 'Vai que cola', do Multishow ((Foto: Divulgação/Multishow)

Atores do humorístico ‘Vai que cola’, do Multishow ((Foto: Divulgação/Multishow)

Mulheres no roteiro

Carioca formada em Artes Cênicas e psicanálise, Vargas também fala sobre como encara hoje os desafios da mulher roteirista no audiovisual. “É preciso se posicionar, buscando sempre uma situação igualitária, e nunca deixar de se manifestar quando sofrer algum tipo de assédio, seja ele de qualquer natureza, moral, sexual, salarial. Isso ainda acontece, e já aconteceu comigo de descobrir de um colaborador ganhar mais do que eu ou do que uma pessoa com mais experiência, só por ser homem. Além disso, tem o aspecto do respeito, das pessoas se apropriarem do seu trabalho ou nome, sem ao menos conversarem ou pedirem permissão, como se fossemos apenas peças de um tabuleiro. Já passei muito por isso, mas nos posicionarmos e sermos ouvidas, é um desafio que estamos vencendo.

Essas situações de machismo que enfrentei, foram de assédio moral, quando ocorreram coisas desagradáveis e precisei revidar. Não fui apenas eu, acredito que todas as mulheres já passaram por isso alguma vez, principalmente há algumas décadas, quando acontecia muito, mas isso vem se transformando. Ainda bem – Jacqueline Vargas

"É preciso se posicionar, buscando sempre uma situação igualitária, e nunca deixar de se manifestar quando sofrer algum tipo de assédio, seja ele de qualquer natureza" (Foto: Divulgação)

“É preciso se posicionar, buscando sempre uma situação igualitária, e nunca deixar de se manifestar quando sofrer algum tipo de assédio, seja ele de qualquer natureza” (Foto: Divulgação)

Aquela que cria 

Além do lançamento de ‘TPM! Meu Amor’ em circuito nacional em breve, Jacqueline planeja montar a peça e lançar um livro com o texto na íntegra de ‘A Mulher sem Superego‘. Com outro longa em produção, ‘As Polacas‘, dirigido por João Jardim. Jacqueline também finaliza seu segundo romance para o público infanto-juvenil, ‘A Arte de Cancelar a si Mesmo‘, e comenta sobre a versatilidade, uma marca em sua escrita. “Ir do infanto ao universo adulto é algo meio inexplicável. Você acaba conseguindo, porque se tem vontade de escrever uma história, vai escrever, independente da faixa etária. Gosto de variar. Penso em um público e naquele momento apenas escrevo, sem pensar muito”. E acrescenta: “Não é fácil falar com os jovens, por exemplo. Amo escrever para adolescentes, nesse sentido da sociedade do vazio que vivemos hoje, que é cheia de informação, acesso e telas, mas ao mesmo tempo, a quantidade de jovens que reclamam da falta de perspectiva, baixa autoestima e tudo mais, é alarmante. Até que ponto a falta do contato físico, por causa das relações virtuais, está prejudicando? Falar para o jovem, para essa nova geração com diferentes formas de relação, é algo que me interessa muito”.

Paloma Bernardi e Maria Bopp em 'TPM! Meu Amor', filme assinado por Jacqueline Vargas (Foto: Divulgação)

Paloma Bernardi e Maria Bopp em ‘TPM! Meu Amor’, filme assinado por Jacqueline Vargas (Foto: Divulgação)

Como romancista, também assinou ‘Aquela que não é Mãe‘ e o baseado na série ‘Sessão de Terapia’, que adaptou nas duas primeiras temporadas e assinou nas seguintes, todas originais para o Globoplay. Jacqueline mostra com sua trajetória, o quanto quem trabalha com a escrita pode ser incansável, e que ela, a escrita, sempre vai levá-la além. “Tenho muito interesse em escrever sobre a menopausa, porque eu venho passando por isso. É muito interessante, porque ela também é um tabu, como a TPM. Existe o pensamento de “se a mulher entrou na menopausa, é porque envelheceu, não serve mais, não procria”. Acredito que resgatar essas figuras desse matriarcado, das deusas, do poder feminino que foi deixado para trás, pode ser muito legal. É um tema que gosto muito. Acho que falar de mãe sempre é bom, porque é uma palavra muito poderosa, já que as pessoas colocam muito peso em cima dela, que sempre é vista como uma heroína, uma mulher-maravilha, então a pessoa já dá à luz com uma responsabilidade gigantesca. É muito interessante falar dessa relação entre mãe e filho. E também gosto muito do tema saúde mental. Até escrevi um livro agora e estou procurando uma editora para publicá-lo”.

"Muita gente pensa que é fácil escrever, então não existe o pensamento de que profissionais passam meses para levantar um roteiro" (Foto: Divulgação)

“Muita gente pensa que é fácil escrever, então não existe o pensamento de que profissionais passam meses para levantar um roteiro” (Foto: Divulgação)