Vítimas de seu próprio talento, os Irmãos Andy e Lana Wachowski fazem parte daquele turma que amarga o gosto do seu próprio sucesso original, sem conseguir repeti-lo. Além de consolidar de vez a carreira do hoje meio sumido Keanu Reeves com astro de mega produções de ação, sua trilogia “Matrix” pegou o público pelo pé graças ao seu conceito revolucionário e pela estética peculiar que a tornou imitada em looping, sobretudo na estilização das cenas de luta. Depois disso, a dupla de diretores não conseguiu mais acertar a mão, exagerando em produções como “Speed Racer” (idem, Warner Bros, 2008) e “A Viagem” (Cloud Atlas, Cloud Atlas Productions, 2012). Agora, eles lançam “O Destino de Júpiter” (Jupitert Ascending, Warner Bros e Village Roadshow Pictures, 2015), aventura espacial a qual, se não consegue livrá-los da sua maldição, pelo menos surfa ao sabor de similares que os dois devem ter assistido na telona quando eram garotões e provavelmente diziam: “Quando eu crescer, vou ser o novo George Lucas“.
Para gostar de “O Destino de Júpiter” é preciso comprar o ingresso numa máquina do tempo e encarar o longa-metragem como volta para o futuro: uma deliciosa sessão da tarde em dia sem nada para fazer, quando se liga a TV e se descobre que um sci-fi anos 1980 está reprisando pela enésima vez. Irresistível para quem ama o gênero. Com a diferença que, nesta nova experiência, os efeitos especiais de ponta e o frenético 3D estão ali para mostrar o quanto aqueles clássicos de trinta anos atrás que o espectador considerava bem feitos agora são fichinha perto daquilo que há de mais moderno atualmente. E, como os Wachowski são chegados a um acabamento rocambolesco de Sapucaí, quem pensa em comprar o ingresso pode esperar apoteose visual, é claro. Globeleza perde.
A fórmula é mais ou menos essa: um argumento de ação que não é nenhuma Brastemp (mas dá para o gasto) e certa implicação pseudo-filosófica, somados a uma fortuna gasta com a elaboração de uma civilização cosmopolita e sideral, onde enorme plêiade de tipos alienígenas comparece – parte criada em computação gráfica, parte pelo trabalho de maquiadores de primeiro time –, tudo com cenografia e figurinos tão deslumbrantes quanto exagerados, prontos para garantir o espetáculo. E muita pancadaria sublinhada por efeitos. Quem negaria essa premissa como sendo a essência da explosão sci-fi na década de oitenta, na esteira do sucesso das sagas “Star Wars” e “Star Trek”?
Mas, como agora estamos falando de uma produção do novo milênio, surgida após o frenesi de “Matrix”, esse revival ganha o desejo elevar o nível de vertigem ao máximo, com tomadas de câmera impossíveis para aquela época, aditivado com ritmo mais delirante ainda daquele que já acontecia nos eighties, quando o termo blockbuster passou a fazer todo sentido.
E, para tentar garantir a bilheteria, por que não incluir nessa receita dois componentes responsáveis pela consagração de “Matrix”: coreografias de luta tão exuberantes quanto impossíveis e a presença de um planeta Terra que vive adormecido, com humanidade que desconhece seu real propósito no universo e formando uma espécie de gado de abate?
Mas, à parte (e apesar de) todo esse pensamento oportunista na hora de fazer cinema, até que o resultado final não chega a decepcionar, fazendo o filme funcionar como uma deliciosa reedição daquilo que se fazia num período que trouxe pencas de diretores na aba Lucas, Spielberg, Joe Dante e Chris Columbus, todo mundo querendo tirar uma casquinha. O filme até que dá certinho. E nem importa o fato dele ter chegado às telas após “Guardiões da Galáxia” (Guardians of Galaxy, de James Gunn, Marvel Studios e outros, 2013) produção lançada meses antes e que de cara abocanhou a alcunha de “boa homenagem à aventura espacial oitentista”.
No elenco, um inchado Channing Tatum (deve ter pirado na dose doDurateston e depois relaxou) caracterizado como mercenário espacial tenta se virar como pode, já que é picareta de marca maior. O ator, que estourou como o stripper de “Magic Mike” (idem, de Steven Soderbergh, Iron Horse Entertainment, 2012), precisa descobrir logo – antes que sua carreira naufrague – que é necessário mais mágica nas telas do que um simples Mike para se manter no topo.
Mila Kunis, alçada ao posto de estrela desde “O Cisne Negro” (Black Swan, de Darren Aronofsky, Fox Searchlight Pictures, 2010) procura se virar como mocinha, mas o filme é de um canastríssimo Eddie Redmayne, que não teve medo de assumir verve quase histriônica para dar vazão a um vilão afetadíssimo e mau a dar com o pau. Sem medo de ser feliz, o ator deve ter percebido que uma das características desse tipo de produção é um contraponto aos protagonistas que extrapola o caricato e pode ter passado noites assistindo reprises de novelas mexicanas para dar vida ao seu Lorde Balem, misto de poço de maldade com bee megera-fashionista, quase um amálgama de Darth Vader com Clóvis Bornay. Digno de ser idealizado por um Aguinaldo Silva futurista.
Trailer oficial de “O Destino de Júpiter”
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