“Infelizmente, o preconceito faz com que as pessoas imaginem que quem vem do Norte passou fome”, diz Dira Paes


Em cartaz como a protagonista do filme “Divino Amor” e, na TV, como a Janaína em “Verão 90”, Dira Paes fez um balanço sobre a carreira, falou sobre preconceito e a força do artista

*Com Iron Ferreira

Um dos maiores talentos do Brasil, que encanta o público com o seu trabalho sempre marcado pela forte expressividade em suas atuações, Dira Paes é multifacetada. Viveu a Celeste, na minissérie “Amores Roubados” (2014), já foi a Beatriz em “Velho Chico” (2016), dublou a Janine no filme “Lino – O Filme: Uma Aventura de Sete Vidas“, além de ser uma das mobilizadoras do Projeto Criança Esperança. Atualmente, está na novela das 19h “Verão 90” e no cinema com o elogiado “Divino Amor“. Sim, Dira Paes está no Olimpo das artes brasileiras e todos nós aplaudimos. Envolvida sempre com causas sociais, a atriz, nascida na cidade de Abaetetuba, no Pará, faz uma análise sobre o preconceito ainda latente no país. “Eu tive muita sorte na minha trajetória. Ao contrário do que imaginam, os meus traços são responsáveis por ótimos papéis. Sou brasileira de Norte a Sul do país. Mas, infelizmente, o preconceito faz com que algumas pessoas ainda imaginem que quem vem do Norte é só quem passou fome. Isso é um estereótipo, um preconceito”.

A força e a bela interpretação sempre permearam a trajetória profissional de Dira Paes (Foto: Leo Aversa)

Em uma longa carreira de sucesso, que começou aos 15 anos, são muitos trabalhos e personagens a serem lembrados. Em conversa com o Site Heloisa Tolipan, a artista afirmou que sempre interpretou mulheres de personalidade forte. Para Dira, cada projeto é como se fosse um filho. Agora ela é Janaína, em “Verão 90”, exibida pela Globo e dirigida por Jorge Fernando, e diz que o papel é representativo e homenageia todas as mulheres batalhadoras, que ultrapassam os próprios desejos e limites pelo bem de suas famílias. “Acho que a Janaína é uma mãe universal. Ela reflete muito a realidade da mulher brasileira, da mulher contemporânea, que tem que dar conta de todas as várias mulheres que existem dentro dela. Janaína é essa mãe batalhadora com desejos e sonhos. Acho que o alicerce da nossa sociedade é matriarcal. E, com isso, a Janaína vira uma referência de uma mulher que está tentando sempre ser respeitada, apesar da sobrecarga de responsabilidades que as mulheres têm. Saímos daquele lugar da mãe que não tem vida própria, somos o alicerce da família”, pontua.

No mês passado, Dira estreou nos cinemas nacionais no filme “Divino Amor”, no qual interpreta a protagonista Joana. Ela revelou que a intensidade do projeto a marcou muito por mostrar ao público a sua fé inabalável. “Realizar Joana foi uma composição diferenciada. A personagem não tem apelos emocionais, pois, mesmo quando ela tem uma cena de pico emotivo, a câmera não explora isso. A condução no processo foi compô-la com uma fé inabalável. O espectador não poderia ter dúvidas disso. Foi uma preparação de quatro semanas de exercícios alternando o elenco. Eu estava lá todos os dias como atriz com a possibilidade de fazer um filme que vai me provocar artisticamente, que me levará a mares nunca dantes navegados. Esse é o lugar onde quero estar”, comenta.

Selecionado para o Festival Sundance de Cinema e o Festival Internacional de Cinema de Berlim, o longa, dirigido e roteirizado por Gabriel Mascaro, retrata um Brasil futurista, onde a influência da religião se tornou bastante poderosa. Perguntada sobre a possibilidade da trama ser interpretada como um paralelo com o atual momento político-social, ela respondeu: “Acho que durante a produção do roteiro o Gabriel não imaginava que o tema estaria tão em voga: a externalização da religiosidade fora das fronteiras da própria religião e a discussão sobre o Estado laico democrático. É uma reflexão sobre ser doutrinado. Regras que invadem o comportamento político-social do ser humano dentro do Estado em que ele nasce e vive”.

Embora o cinema nacional venha sendo celebrado com cada vez mais prestígio no exterior, ainda há uma resistência por parte dos brasileiros em relação às produções locais, principalmente as que fogem do gênero da comédia. A atriz acredita na força da sétima arte e no seu poder de combater a desinformação. “O grande desafio do Cinema Brasileiro foi chegar ao grande público, de forma mais democrática. Sendo assim, quanto mais gente assiste a um filme, menos ele fica desinformado. A sétima arte é uma das mais respeitadas e relevantes economicamente falando. Um filme que vai bem em festivais importantes tem um alcance de mercado mundial”, enfatiza.

A atriz enfatiza sempre a valorização das produções cinematográficas nacionais (Foto: Leo Aversa)

Dira Paes também falou sobre a capacidade dos artistas contribuírem para a formação de uma sociedade culturalmente mais instruída e engajada. Para isso, é necessário que todas as vertentes sejam apoiadas pelo incentivo de consumo das obras e através da ajuda financeira daqueles que enxerguem nisso um bom negócio. “Nós, artistas, atravessamos os tempos tentando fazer com que o nosso trabalho seja valorizado. Precisamos entender que a arte é liberdade de expressão. É um momento que você alça voos maiores, inusitados, aqueles que você nunca pensou. Para isso, a gente sempre vai precisar de uma parceria, seja do público e seja daqueles que entendem a arte também como um mercado rentável. O entretenimento é um dos mais potentes do Brasil”.

Emendando um trabalho no outro, Dira comenta os projetos em sequência: “Em agosto, uma nova edição do Criança Esperança. E tenho mais dois filmes a serem lançados, “Veneza”, de Miguel Falabella, e “Pureza”, de Renato Barbieri”.