Ian Braga protagoniza telefilme na Globo e emissora aposta em aprofundar regionalização através do cinema


“Vivo ou Morto”, telefilme que a Globo exibirá hoje, é o primeiro trabalho como protagonista de Ian Braga. O ator já fez alguns projetos na televisão, mas agora não só aparece na Globo como à frente de um dos telefilmes que a emissora líder está produzindo, como forma de estimular as produções regionais. Neste, ele vive um artista que só ganha destaque em sua arte quando é tido como morto. Além deste projeto, Ian poderá ser visto em “O Som do Silêncio”, curta metragem que aborda a questão manicomial no Brasil e um hospital que torturava pessoas sob a prerrogativa de tratar-se de um tratamento psiquiátrico. Para Ian, a livre expressão de ideias da qual dispomos hoje não pode abrir precedente para ações criminosas: “Liberdade de expressão não deve ser confundida com preconceito, xenofobia, racismo e machismo. Mas sim, na expressão de ideias, de pensamentos, da não-violência”

*por Vítor Antunes

Ao menos desde o ano passado, a Globo tem lançado mão de produzir telefilmes que contam um pouco das histórias regionais do Brasil. Em 2023 foi a vez de “Amor ao Quadrado“, sobre Brasília, e “Beleza na Noite“, rodado na Bahia. Hoje, segunda-feira, é a vez de “Vivo ou Morto”, que se passa no Centro-Oeste de Minas Gerais, que estreia na “Tela Quente“. O protagonista do filme é Ian Braga, em seu primeiro grande projeto na televisão. Ian não apenas está à frente do longa, mas tem a sua territorialidade revisitada por ele. Ele é de Minas Gerais. Geralmente, quando se aborda Minas Gerais na televisão ou no cinema, opta-se por uma visão ou caricaturada, ou restrita ao sertão mineiro. Em “Vivo ou Morto“, não. Para Ian, o longa traz o “resgate da mineiridade num lugar muito interessante, pouco explorado no audiovisual”. O filme foi rodado em Itapecerica, cidade distante em quase 200km de Belo Horizonte e retrata um município fictício. “Mesmo sendo mineiro, tive que trabalhar o sotaque para pegar essa história que retrata bem o que é ser mineiro”.

O filme conta a vida de Chico Artesão, personagem de Ian, que vive no interior de Minas e que faz santos em madeira. Com seu talento não reconhecido, Chico está devendo dinheiro para um homem perigoso da cidade e resolve fingir que morreu. Momento em que suas obras sacras passam a receber maior notoriedade e ele passa pelo conflito de revelar-se vivo e desfrutar do sucesso de seu trabalho ou manter a farsa da sua morte. A grande mensagem do filme, ao olhar de Ian, é: “É preciso que os artistas só sejam valorizados após mortos?”. Não custa lembrar que Van Gogh (1853-1890) vendeu apenas um quadro enquanto vivo e que sua obra só foi valorizada depois que ele morreu. “Quando li o roteiro, gostei da história, achei bonita, interessante e divertida”. O ator também ressalta que a Globo pegou artistas mineiros e o sotaque do interior do estado “sem ser caricato, honrando os que moram ali. Trata-se de um filme bonito, de um homem que honra seu ofício, mas que não encontra tempo de vida para viver sua própria arte”.

Para o ator, este movimento de telefilmes da Globo é uma oportunidade de fazer com que “pessoas regionais serem vistas com histórias que possam ser contadas por um público abrangente que assiste TV, já que o cinema não tem o mesmo alcance que a televisão. A própria cidade na qual gravamos não tem cinema. As pessoas assistiram ao filme em praça pública. É legal ver que as pessoas podem assistir à história, vibrando por ela, e o telefilme é uma coisa legal e é uma arte necessária e é bem sucinta. Temos que investir mais nisso”.

Ian Braga é o protagonista de filme que dá destaque ao interior de Minas Gerais. Minas para além do estereótipo (Foto: Fernanda Garcia)

MODERNIDADES

Além do telefilme, Ian poderá ser visto no curta-metragem “O Som do Silêncio“, que vai ser lançado nos festivais ainda neste ano. A obra é inspirada no livro “O Holocausto Brasileiro“. Além da questão manicomial, pois que aborda o abandono de pessoas com distúrbios emocionais e/ou psiquiátricos, o livro – e consequentemente o filme – falam sobre como o Hospital Psiquiátrico de Barbacena foi usado como repositório de presos políticos. Havia pessoas presas ali por injustiça social e nem todos o estavam por questões mentais. “Estima-se que 60 mil pessoas sem diagnóstico de doença mental morreram lá. Muitas delas, torturadas. O filme, ainda que seja ficcional, revela que quando se está num lugar no qual não se é benquisto, pode-se haver a eliminação desta pessoa pela sociedade”.

Já que, durante a Ditadura Militar houve uma grande caça aos “subversivos”, que assim o eram em razão de contestarem o sistema. O que seria contestação hoje? Estaria a liberdade de expressão sendo usada para o cometimento de crimes? Falar o que se quer não deve passar pelo crivo do bom senso? Para Ian, “liberdade de expressão não deve ser confundida com preconceito, xenofobia, racismo e machismo. Mas sim, na expressão de ideias, de pensamentos, da não-violência. No âmbito pessoal, cada um pensa como quiser, mas é preciso diferenciar o que é opinião individual, o que é fato, do que é crime. Estamos num momento bom e as coisas têm melhorado, o dialogo é importante”.

Deve-se levar o questionamento ao público sobre o que é crime e o que é liberdade de expressão. E o cinema brasileiro deu uma guinada nesse debate – Ian Braga

Cria do Grupo Galpão, companhia mineira famosa por seus espetáculos arrojados, Ian estudou na escola do grupo. “Foi um dos primeiros grupos que tive contato ainda criança. Via as peças e creio que o Galpão tenha uma fundamental importância para contar o mundo por meio de histórias e em fazer com que até mesmo Shakespeare (1564-1616) seja entendido por crianças. Através do Galpão eu entendi o meu ofício”. Para este ano, 2024, o ator fará o filme “Saideira”, de comédia, no qual vive o mesmo personagem que Tonico Pereira. O longa ainda será lançado. Além deste, a série “1986”, inteiramente gravada por meio de iPhone e aborda a hiperinflação nos Anos 1980.

Neste projeto, a família do personagem de Ian tem um açougue e, por conta dos problemas relacionados à falta de carne, eles começam a “traficar” o alimento. “Isso me fez pensar de onde vem o jeitinho brasileiro. É o governo que corrompe o homem ou o homem que corrompe a estrutura?”. Em seu primeiro grande projeto na TV, a ambição de Ian é muito clara: O meu desejo como ator hoje é estar no audiovisual e poder contar boas histórias e em boas produções”.

 

Ian Braga: “Liberdade de expressão não ode abrir precedente para crimes” (Foto: Fernanda Garcia)