Ela já foi Bebel, já foi Nina e já foi Marília no cinema. Agora, com o longa-metragem ”Antes Que Eu Me Esqueça”, que tem estreia marcada para esta quinta-feira, 24, Guta Stresser adiciona a bartender e prostituta Joelma para a sua lista cinematográfica. ‘’A Joelma é uma personagem super amorosa, ela é totalmente do bem e generosa. Além disso, não tem muito filtro, papas na língua, fala o que pensa, tudo o que vem à cabeça’’, conta a atriz. A personalidade arretada de Joelma não foi a única coisa que atraiu a atriz. Apaixonada pelo trabalho da falecida atriz italiana Giulietta Masina em ”Noites de Cabíria”, obra de Fellini, Guta enxergou em Joelma a chance de trazer essa referência pessoal para a preparação de uma personagem sua. ‘’Eu adoro a personagem Cabíria, ela é muito especial na minha vida. Eu sempre revi esse filme, então só o fato da Joelma ser prostituta já foi algo muito legal porque eu pude rever e me inspirar em ‘’Noites de Cabíria’’, trazendo um pouco dessa referência para o trabalho’’, conta.
Com direção de Tiago Arakilian e roteiro de Luísa Parnes, o longa explora a trajetória de Polidoro, um juiz aposentado que decide abrir um clube de strip tease ao perceber os primeiros sintomas de Alzheimer. Interpretado por José de Abreu, o juiz não resiste aos encantos da bartender e, no decorrer do filme, vivem altas aventuras, criando uma história de amor incomum. ‘’É um amor incondicional. Eles se amam, são mais do que marido e mulher, mais do que pai e filha, porque é um amor que a gente escolhe. Eles não são parentes, não são familiares, mas escolhem um ao outro de uma maneira muito bonita’’, diz. Por meio dessa relação, assim como outras que são desenvolvidas no filme, a atriz espera que a visão das pessoas em relação às pessoas de terceira idade mude para um sentimento mais empático. ‘’Espero que o filme passe a mensagem do quanto é necessário nos importarmos e cuidarmos da nossa terceira idade. Não é você andar atrás de um velhinho que está mais devagar e pensar ‘ai, mas esse velho está me atrapalhando’, é você oferecer a mão e a ajuda, perguntar se está precisando de alguma coisa’’, afirma.
A relação de cumplicidade entre Polidoro e Joelma vai muito além das páginas do roteiro. Dividindo cenas pela primeira vez, Guta Stresser não faltou com elogios ao amigo José de Abreu. Mesmo com 72 anos, o ator conseguiu encantar a parceira com sua energia durante as gravações. ‘’O Zé é a melhor pessoa. Ele é incrível, tem uma energia de criança, uma coisa muito vibrante. É impressionante quando a gente fica sabendo da idade dele. Como que pode esse cara ser tão forte e vibrante com 72 anos? Pra mim, ele está mentindo a idade. Não é possível’’, brinca.
Afastada da televisão desde 2015, após ter interpretado a rockeira Maria Augusta na série ‘‘Mister Brau”, Guta Stresser também fez o seu retorno às telinhas esse ano como a empregada doméstica Rosália da Paz na nova temporada de Malhação, ”Vidas Brasileiras’‘, marcando a sua primeira personagem em uma novela. Dramática e humilde, a doméstica deixou a filha Maria Alice (Alice Milagres) com a tia no interior de São Paulo ao receber um convite para trabalhar na mansão de Isadora (Ana Beatriz Nogueira) na cidade maravilhosa. Inspirada no filme ‘’Que Horas Ela Volta?’’, de Anna Muylaert, a personagem foi a chance da atriz realizar mais um desejo: participar de Malhação. ‘’Eu sou apaixonada pela série como um projeto. Essa temporada especificamente está muito legal, a cada semana o público pode acompanhar a história de um jovem daquele núcleo. Isso é muito bacana porque a autora consegue explorar várias histórias e questões que afetam a gente com muita leveza e em um ritmo muito bacana’’, conta. Apesar de estar no ar desde 1995, a atriz ainda completou que o projeto ainda é relevante no âmbito da teledramaturgia brasileira. ‘’Eu acho que Malhação é uma formação de público. É ali que muita gente começa a gostar de televisão, de novela, de audiovisual, de ficção. É uma escola para muitos atores, que vão sair dali para o mundo.’’
Com 45 anos e uma longa carreira, Guta não está satisfeita em brilhar somente na frente das câmeras. Além de ter dirigido clipes da banda do marido André Paixão, ‘’Nervoso e Os Calmantes’’, como “Eu Que Não Estou Mais Aqui” e ‘’Peça de Tabuleiros’’, em 2012 ela também estreou na direção teatral com o espetáculo ‘’Medea en Promenade’’, que conta a história da feiticeira grega Medeia. A vontade de dirigir sempre existiu e para ela, apesar de amar a arte de atuar, é o comando da câmera que lhe faz mais feliz. ‘’Eu adoro dirigir. Eu já tive algumas experiências e é uma paixão mesmo. Fico muito feliz, é o meu playground. É um ponto de vista diferente, mas, para quem gosta, assim como eu, acho super válido experimentar’’, disse.
A atriz, junto a Monique Gardenberg, Maria de Médicis, Amora Mautner, Laís Bodanzky, entre outras, representa a baixa porcentagem de diretoras em projetos audiovisuais. Segundo pesquisa realizada pela Agência Nacional de Cinema (Ancine) com mais de 2000 obras em 2016, apenas 17% foram dirigidas por mulheres. Para a atriz, o cenário audiovisual, principalmente o cinematográfico, está modificando aos poucos graças à luta feminista. ‘’As coisas estão mudando. Por exemplo, lá na Globo nós já temos um time de diretoras mulheres muito grande. No cinema, estamos ainda lutando pelo nosso lugar. A predominância ainda é masculina, mas temos grandes nomes já’’, afirma. Guta ainda disse que os desafios enfrentados pelas mulheres vão além do âmbito artístico. ‘’Como em todos os setores, a mulher tem que lutar para ocupar seu espaço e brigar para ganhar igual, para ser tratada de forma justa no mercado de trabalho’’, disse.
O feminismo esteve presente na vida de Guta muito antes dela entrar no mundo artístico. Inspirada pela linhagem de mulheres fortes na família, como a sua tatataravó, ela sempre soube o seu lugar na sociedade. ‘’Eu me sinto feminista. Luto por direitos iguais e não é de hoje. Desde que eu me entendo por gente, eu mando os homens ficarem quietos se eles estão de alguma maneira tentando me dominar. Quem manda sou eu, quem manda no meu nariz sou eu. Meu corpo, minhas regras’’, afirma a atriz.
Feminista de carteirinha, Guta Stresser não faz questão de esconder sua opinião nas redes sociais. Recentemente, ela esteve envolvida na polêmica do ator Caio Blat, na qual foi acusado de ter sido machista ao publicar uma imagem no instagram ao lado de uma mulher que utiliza uma blusa com o escrito ‘’Bruta não, mal domada’’ abaixo do desenho de uma mulher lançando um homem em cima de um cavalo. Assim como as artistas Virginia Cavendish, Guta saiu em defesa do parceiro de profissão, tornando-se alvo de críticas ao comentar que gostaria de ter uma camiseta igual. ‘’Eu entendi totalmente que em um determinado meio, principalmente em um de rodeio, a imagem de uma mulher em cima de um cavalo lançando um homem não me pareceu uma ideia machista. Eu interpretei a frase como indomável. Jamais serei domada, não sou chucra, simplesmente sou impossível de ser domada’’, declara.
Para ela, apesar de achar o debate necessário, a reação agressiva de muitas pessoas na rede social perante a interpretação dela foi prejudicial à luta. ‘’Levei muita porrada de muitos grupos feministas mais radicais, mas acho que tudo isso só afasta as pessoas. Temos que nos unir, eu acredito muito na irmandade e sororidade das mulheres. Só interessa aos homens essa coisa de divisão entre nós, sabe? Enquanto mulheres ficam brigando, os homens ficam mandando. Está na hora de nos unirmos e pararmos de apontar o dedo para a outra porque a gente só tem a ganhar com isso’’, desabafa. Seja como feminista, atriz ou diretora, Guta está bem certa do que faz, não é mesmo?
Artigos relacionados