*Por Vitor Antunes
O carisma de uma mulher que sabe o que quer. Foi assim que Márcia Goldschmidt despontou na televisão. Primeiro na Rede Mulher, depois no SBT, na Gazeta de São Paulo e, finalmente, na Band. Desde 2010, Goldschmidt está fora do ar. Casou-se, mudou-se para Portugal, teve uma gravidez de gêmeas aos 50 anos e hoje mora na Espanha. Ativa na luta pela afirmação feminina, Márcia está em vias de lançar mais um livro sobre esse tema, no qual objetiva dar dicas sobre como envelhecer bem. Pioneira nos programas de relacionamento, como aquele que levava o seu nome, além do “Hora da Verdade” e o “Jogo da Vida”, os shows da apresentadora recebiam críticas impiedosas. Com quase 30 anos de distanciamento, a show-woman fala sobre os adjetivos que recebeu nesta época, além de comentar sobre sua quase contratação pela Globo e nega ter pretensão de voltar à TV, “a não ser que seja algo que vale a pena realmente”.
Sobre sua quase ido à Globo, afirmou: “Nunca fui daquelas que era louca pra trabalhar na Globo. Sempre fui uma mulher com pensamento livre. Penso que só poderia trabalhar em emissoras na qual eu tivesse liberdade de expressão, liberdade de ação”.
MULHER
Desde que deixou a televisão, Márcia Goldschmidt tem se reinventado e dedicado-se a várias frentes criativas. Uma delas é o seu quinto livro, sobre o qual a autora divulgou o tema: o empoderamento e a beleza da mulher madura “Eu estou com o meu próximo livro já está no forno e deve sair em breve. Creio que vá ser uma publicação que a mulherada vai gostar muito. Neste eu vou sair um pouquinho da área dos relacionamentos, tema do qual sempre escrevi, e vou falar sobre beleza, sobre como envelhecer bem”.
Além de seu lançamento literário, Márcia fala sobre haver descoberto mais um talento no qual tem investido: o de palestrante motivacional, vertente que mais tem a feito feliz ultimamente “Este é o trabalho do qual eu mais gosto, o de palestrante motivacional, o de “agent of change”. Busco fazer com que as pessoas descubram o poder que elas têm de mudar a própria história, como elas são autoras e não coadjuvantes, ou apenas as vítimas. Isto é o que mais me motiva”.
Reconheço a mim não como uma coach. Acho que houve um momento em que todo mundo virou coach e virou uma coisa meio fim de feira, algo muito chato. Banalizaram essa atividade – Márcia Goldschmidt
Em razão de ser uma voz ativa e opinativa da questão feminina, Márcia traz sua visão particular sobre como enxerga a questão sexual para as mulheres hoje é complicada, porque pode ser um trunfo e pode ser uma arma. Eu acho que não podemos confundir liberdade com libertinagem. Eu acho que essa confusão tem acontecido bastante em detrimento de a própria mulher estar sendo prejudicada por sua libertinagem. As mulheres usam do argumento ‘Ah, nós estamos livres, temos direitos’, e eu concordo. São livres em direitos, mas também têm deveres, em inteligência. Elas também têm de ter consciência, e de pensar. Sobre se o que elas estão fazendo é bom para elas ou se estão repetindo aquilo, porque todo mundo faz. É importante pensar, por que isto pode trazer consequências extremamente difíceis e dolorosas pra elas mesmas”.
Logo depois de seu afastamento da TV, a comunicadora engravidou das gêmeas Yanne e Victoria, uma gravidez tardia, aos 50 anos, fruto de um tratamento hormonal. Não foi uma gravidez fácil. Inclusive, em razão de ter havido uma pré-eclâmpsia, e por conta de estar grávida de gêmeas, o parto foi antecipado. Goldschmidt fala sobre o assunto: “Uma gestação tardia é sempre complicada sobre vários aspectos. Ainda que prazerosa, porque temos mais maturidade e conseguimos curtir mais, ao mesmo tempo há uma defasagem com as crianças. Hoje, eu tenho 60 anos e as minhas filhas, 10. Daqui a 10 anos, elas vão estar com 20 e eu terei 70”.
Ela prossegue: “Sinto-me extremamente bem, como se tivesse 30 ou 35 anos, no máximo. Mas as meninas têm uma energia, então tudo pesa. Mas é complicado para mulher ter filhos mais tarde, sim”.
Eu não vivo a minha vida baseada no que os outros pensam. Eu vivo a minha vida baseada no que eu penso. Se houve preconceito por eu haver sido mãe madura eu não sei – Márcia Goldschmidt
TELEVISÃO: HORA DA VERDADE
Dezesseis anos nas telas. Vários programas e um grande sucesso de público. Neste ano, quando o SBT anunciou o cancelamento do “Casos de Família” – e depois desistiu da sua suspensão, o nome de Márcia voltou a circular na mídia brasileira como sendo candidata a apresentá-lo. Porém, o show do SBT voltou ao seu format e com mesma apresentadora. Perguntamos à ex-lider do “Hora da Verdade”, se ela tem pretensão de voltar à televisão. Ela disse: “Agora estou mais voltada para as redes sociais mesmo e para o streaming. Eu não sei se ainda acredito na televisão. Tenho tido alguns convites, mas nada que eu ache que vale a pena realmente”.
Desde sua estreia na televisão, em 1994, Goldschmidt foi alvo de críticas impiedosas. O crítico Ricardo Valladares, de Veja, um mês após a estreia do programa “Márcia”, no SBT, classificou-o como um “Show de Insultos”. Ainda naquela época, à Veja, a apresentadora disse que o projeto que capitaneava tratava “de assuntos comportamentais, e é muito importante por que mostra o falso moralismo do brasileiro”. Em 2004, Ricardo Feltrin, adjetivou-o como um “telebarraco”. Perguntamos à comunicadora se essa pecha a incomodava: “Eu acho que, na época, meu programa inaugurou a fase dos telebarracos, digamos assim, na televisão. Me incomodava muito. Hoje não. Hoje, eu acho ótimo”.
O que podemos dizer de um programa como o meu comparado com a internet hoje? Onde as pessoas fazem de tudo pra lacrar, pra viralizar? Naquela época as pessoas se escandalizavam, mas hoje seria café pequeno. As pessoas se mostram na internet e a troco de quê? De viralizar. Não há um objetivo em resolver nada – Márcia Goldschmidt
Durante sua passagem pelo SBT, Márcia apresentou não apenas o programa que levava o seu nome, mas também esteve à frente do “Programa Livre”, quando Serginho Groisman deixou-o para ir para a Globo, e co-liderou o “Fantasia”, game-show assumidamente kitsch que compunha a programação do canal de Sílvio Santos na época. Este último, não consta entre aqueles trabalhos dos quais gostou de fazer: “Eu não gostei de apresentar o programa “Fantasia” porque na época, no contexto em que eu me encontrava, aquilo não tinha nada a ver. Eu não podia ter saído de um programa tão forte, opinativo, um programa de comportamento e migrado para um programa de variedades, um game. Mas, eu me divertia, ria, brincava… Eu tenho um lado muito bem-humorado que nem sempre pôde aparecer nos meus programas, uma vez que a temática comportamental humana era sempre muito mais pesada.
Os índices de audiência do programa em sua primeira temporada foram tão elevados que chamaram a atenção da Globo. Em dezembro de 1997, por exemplo, segundo retratado pela Folha, “Márcia” teve média de 23 pontos de audiência -com picos de 29 – versus 17 da Globo, que exibia o especial “Som Brasil – Tropicália”. O bom desempenho valeu à apresentadora ao menos dois convites para estar no casting da Globo “Fui duas vezes convidada pela TV Globo. Uma pelo Boni e outra, depois, para apresentar o “Você Decide“. Esta última até era uma proposta que teria me interessado bastante, mas eu tive uma proposta melhor da Band e não fui. E tive liberdade na Band, onde eu fui muito feliz, pois eu tinha total autonomia. Cheguei a ser diretora geral do meu programa, fazia tudo exatamente como eu queria e do jeito que eu queria”.
Nunca fui daquelas que era louca pra trabalhar na Globo. Sempre fui uma mulher com pensamento livre. Penso que só poderia trabalhar em emissoras na qual eu tivesse liberdade de expressão, liberdade de ação – Márcia Goldschmidt
Ainda na Band, a apresentadora viveu um dos momentos mais tensos de sua carreira. Um homem armado invadiu os estúdios da televisão, ao vivo. Rendeu a apresentadora e pediu que a TV não saísse do ar. O homem chamava Moacir Camargo Borges e era vendedor de carros, e exigia que sua ex-esposa permitisse a ele ter contato com os filhos. O homem já havia pedido ajuda à TV e não obteve sucesso. Razão pela qual optou por entrar no estúdio da Bandeirantes em posse de uma arma, chamando assim atenção para o seu problema. O caso, grave, ganhou as páginas policiais da época e Moacir foi condenado a dois anos de prisão em regime aberto por posse ilegal de arma, segundo noticiado na ocasião.
Sobre o incidente, Goldschmidt diz que “até hoje gente ainda tem pessoas falando por aí que aquilo foi armado. (…) Eu já nem gosto mais de tocar no assunto. Foi uma experiência extremamente difícil, onde a minha vida e a vida de muitas pessoas esteve em risco e as pessoas são capazes de falar isso. Então são pessoas que são capazes de qualquer coisa e que acabam acusando-nos de fazer o que elas fariam. E acusam a mim, à TV Bandeirantes, à polícia… Uma coisa absurda!”.
INTERNACIONALMENTE BRASILEIRA
Márcia passou grande parte da vida morando fora do Brasil. Antes de apresentar os programas que a fizeram famosa, já havia morado na França e na Suíça. Hoje, reside na Espanha: “Eu estou sempre morando fora. Morei em Paris, morei em Miami, estive em Portugal por 10 anos e, recentemente, na Espanha. Pareço ter algo meio caixeiro viajante”, diz.
Eu acho que quando você sai do país e mora muito tempo fora, ocorre algo muito complicado, porque você depois não é mais brasileiro e no país onde que você mora você também não é uma pessoa local. Ficamos um pouco sem pátria. Eu tenho saudade do Brasil, mas chego ao país e reconheço mais nele. Vou pra Europa, me sinto bem lá mas sinto falta da minha cultura, do Brasil – Márcia Golschmidt
Mesmo morando há anos no estrangeiro ela não perde sua brasilidade: “Ainda bem que eu tenho muitos amigos brasileiros e essa questão de poder falar o seu idioma e se comunicar com pessoas que tem a mesma cultura, pra quem mora fora é muito importante. A língua muda muito a expressão, o sentimento, o comportamento. Então é de muito difícil você contar algo numa outra língua. Acho, inclusive, que o mais difícil é a questão da língua. Por mais que você domine a língua estrangeira a comunicação não é igual porque na sua língua estão as suas raízes, a sua essência”, finaliza.
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