Sem fôlego e com futuro incerto, “Glee” se despede do ensino médio e faz as malas rumo a Nova York!


Com o objetivo de tirar as coreografias da inércia da audiência, o criador da série varre personagens para fora e transfere completamente a ação para a Big Apple!

*Por João Ker

Nesta semana, a FOX exibiu o 101º episódio da série “Glee” – ou a segunda parte do 100º, caso você prefira encarar assim, já que a história de um acaba no outro. Os dois capítulos serviram como uma despedida do ensino médio em grande estilo: com direito a Kristin Chenoweth e Gwyneth Paltrow. Desde a morte do ator Cory Monteith, o destino do seriado era incerto. Além de ser uma das estrelas principais da série, Cory era o namorado de Lea Michele, sem dúvida, a mais talentosa e carismática do elenco. Com seu falecimento, ninguém sabia se Lea seria capaz de continuar vivendo Rachel Berry. Alguns dias após o ocorrido, um anúncio oficial dizia que, por enquanto, eles filmariam apenas até o 3º episódio da 5ª temporada, que seria uma espécie de tributo ao ator (do qual Lea não participou).

Discurso de Lea Michele no Teen Choice Awards

O tempo passou para Rachel Berry e para Lea Michele. Tanto na série, quanto na vida fora dela, a imagem que todos viam era a de que a atriz estava superando o choque aos poucos. Ela até fez um discurso emocionado no Teen Choice Awards e o mundo viu que, apesar do susto, a atriz já estava conseguindo sorrir. Paralelamente, Lea começou a divulgar o primeiro CD de sua carreira solo, Louder”, como um sinal de que existe vida após-Glee. A produção do álbum já havia sido finalizada antes do falecimento de Cory e foi adiada por conta do seu falecimento. Com isso, Lea aproveitou e ainda conseguiu adicionar duas faixas de última hora: Cannonball” (o primeiro single, que fala sobre a superação) e If You Say So” (sobre como ela se sentia uma semana depois do acontecido), ambas escritas com a ajuda de Sia Furler.

Videoclipe de Cannonball

Com toda essa catarsezinha “all star” e o expurgo de Lea através dos videoclipes e depoimentos em premiações, tudo indica que, agora, o caminho está livre para que a série, pós-encosto, volte a fazer o sucesso de antigamente. Ela até perdeu fôlego nos últimos tempos, mas nada que comprometesse uma retomada nos trilhos, ao invés daquilo que aconteceu com outros standards da década passada – como “Lost” e “Heroes” -, cujos produtores perderam a mão e deixaram o bolo solar.  O problema é que a série já estave tendo dificuldades de prender o público desde antes da morte de Cory, como se a treinadora Sue Sylvester (Jane Marie Lynch) houve feito uma uruca básica sobre a atração . Os novos personagens não tinham o mesmo carisma, a história não tinha mais apelo, se repetia e o valor comercial, assim como seu impacto cultural, diminuiu drasticamente – o último “hit” no chart da Billboard foi em 2011.

Então, em uma tentativa de voltar a chamar a atenção do público depois de ter homenageado Cory, o roteirista Ryan Murphy (criador da série) anunciou recentemente que todos os personagens que haviam abandonado a série voltariam para comemorar o 100º episódio. Uma lista oficial começou a circular online para os fãs votarem nas músicas preferidas que já haviam sido apresentadas no seriado, para que elas voltassem nesse capítulo. Óbvio, típico artifício de arregimentar a adesão do público através de ações interativas nas mídias sociais.

Performance de Toxic no 100º episódio de Glee

Performance de Toxic no 100º episódio de Glee (Reprodução)

Muita especulação houve, mas Gwyneth Paltrow, Kristin Chenoweth, Dianna Agron e grande parte dos outros atores secundários estiveram presentes ao longo destas duas partes – infelizmente, Idina Menzel e Ricky Martin fizeram falta. Na trama, o New Directions foi condenado a fechar as portas e, assim justificava-se 0 fato de os personagens estarem voltando para prestar suas últimas homenagens ao coral. Neste episódio duplo, não faltaram muitos números musicais, mais homenagens a Cory – dessa vez Lea participou e,  aparentemente, foi ela e não Rachel Berry quem chorou na cena –, formaturas e até a participação de Chace Crawford. Com isso, o drama de ensino médio acabou. Um fim que demorou, mas que no geral foi digno enquanto durou.

A partir de agora, “Glee” se passará somente em Nova York, com apenas os personagens antigos e originais. Trata-se de um esforço para imprimir novo gás ao programa e ver se, com isso, ele sai da inércia, conseguindo dar um jeté básico em direção ao seu antigo sucesso. Para animar um pouco, foi anunciado que Chris Colfer, o Kurt, escreverá o roteiro do 19º episódio (mais seis semanas de espera, no mínimo). E mais: uma sexta e última temporada já foi confirmada para 2015. Mas o que será da trama agora que tantos personagens foram descartados e a maioria dos casais antigos está de volta? Suflê requentado funciona?

É até compreensível que Ryan Murphy tenha optado pela garantia de voltar com histórias que já haviam cativado o público. Mas será que isso não deixa a série apenas à mercê da audiência, sem nada realmente original daqui para a frente? Há quem diga que o roteirista tenha focado muito em “American Horror Story” para se importar com isso.  Talvez. Mas, até por que o ciclo natural das coisas é que cada pessoa siga seu próprio rumo depois do ensino médio, não parece verossímil que todos os personagens, agora, vivam uma fantasia juntos na Big Apple, como se fossem um grupo de focas amontoadas em uma praia da Nova Inglaterra. Muito menos ainda é realista o fato de alguém passar o resto da sua vida com o mesmo namorado do colegial. Mas, talvez seja essa a intenção de Ryan: dar finalmente o amadurecimento emocional pelo qual os personagens já deveriam estar passando desde a última temporada. E, claro, em uma atração musical em que, de um momento para o outro, os atores para de fazer o que estão fazendo em cena para cantar e dançar não é exatamente a premissa de um conteúdo que valorize o realismo cênico. Pela sua natureza musical, “Glee” por si mesmo já permite o escapismo da realidade.

Kurt trabalhou na Vogue, entrou na melhor escola de artes performáticas do país e mora no maior pólo cultural do mundo, mas ainda assim não conseguiu se envolver com ninguém e manteve um relacionamento a distância com Blaine (Darren Kriss). Conto de fadas? O namorado, nos próximos capítulos, também se mudará para Nova York e a oferta de pretendentes para o bonitão será bem maior do que no interior de Ohio. Será que eles conseguirão continuar firmes? O mesmo vale para Santana e Brittany. A loira, com toda a sua ingenuidade e falta de inteligência, conseguirá sobreviver na cidade grande ou precisará dos cuidados da namorada até para atravessar a rua? E o que será de Sam, que nunca demonstrou nenhum talento além de conseguir tirar a camisa? Já passou da hora de cair a ficha dos não-tão-adolescentes-assim e eles perceberem que a vida não é um arco-íris onde você pode resolver seus problemas cantando.

Quem sabe assim a série não volta a ser interessante e menos boba novamente? E, se for para escolher participações antigas no contexto de Nova York, vai uma dica: seria ótimo ver Sarah Jessica Parker como editora da Vogue mais algumas vezes.

"Glee": como em um tsunami, alguns persoangens serão varridos pelas ondas da audiência (Foto: Divulgação)

“Glee”: como em um tsunami, alguns persoangens serão varridos pelas ondas da audiência (Foto: Divulgação)