*por Vítor Antunes
Mantendo a discrição que lhe é personalíssima, e sua natural elegância, Francisco Cuoco deu uma entrevista exclusiva para o Site Heloisa Tolipan. Afastado das novelas desde que fez “Segundo Sol“, em 2018, o ator diz sentir falta de atuar na teledramaturgia. Próximo de completar 90 anos, afirma haver pouco espaço para os atores mais veteranos na televisão. “Não há um horizonte muito aberto”, pontua ele, que foi protagonista na única trama a obter 100% de audiência na TV, “Selva de Pedra” (1972). Cuoco esteve presente em momentos simbólicos da televisão, inclusive quando inaugurada a transmissão em cores do Brasil.
Diante de uma geração que, cada vez mais, se expõe nas redes sociais e vincula o seu trabalho como ator ao de influenciador digital e compreende ser necessário ser famoso nas redes para ser chamado aos trabalhos, quer na televisão como no teatro ou cinema, Cuoco acredita que há demasiada exposição destes artistas, porém considera que a dosagem entre a hipo e a hiperexposição é algo pessoal. E sobre a onda dos remakes, também não se opõe. Diz que isso apenas prova que as novelas são remontadas em face de seu valor e qualidade.
Sobre seus companheiros de cena, relembrou a parceria com Tarcísio Meira (1935-2021) na fracassada “Os Gigantes“, de 1979, e a bissexta participação da cantora Maysa (1936-1977) nas novelas. Ambos trabalharam em “O Cafona“, importante trama setentista.
ETERNO GALÃ
Conhecido por vários sucessos incontestáveis, como “O Astro” (1977) e “Pecado Capital” (1975), Francisco Cuoco sagrou-se como um dos maiores atores da sua geração, bem como um eterno galã. Protagonizou aquela que é considerada a maior novela da TV brasileira, “Redenção”, da TV Excelsior (1966), além de estar, também, com o principal papel masculino da única trama a obter 100% de audiência na TV, “Selva de Pedra” (1972). Em 2023, o artista completa 90 anos de idade e está há cerca de 66 em atividade. Sua última novela, porém, foi em 2018, “Segundo Sol“, de João Emanuel Carneiro. Há cinco anos fora do ar, afirma Cuoco: “Sinto muita falta [de estar na televisão]”. Ainda segundo ele, o etarismo também é algo presente, pois que os idosos, “sem dúvidas, estão sem nenhum espaço na TV”, disse. Sobre o que o dá prazer hoje, relata que é “ter saúde”, mas quando perguntado sobre quem, ou o que mais sente falta, reitera:
Tenho saudade de realizar obras importantes que possam mudar a humanidade – Francisco Cuoco
Diante das revoluções na comunicação e, especialmente em razão da contínua onda de demissões tanto da Globo, como nas outras emissoras, o ator optou por não dizer se continua ou não vinculado à emissora carioca. Porém acredita que, a contrário do que afirmam os recém despedidos, que relatam haver “um horizonte aberto de possibilidades” fora da TV, Cuoco é categórico: “Na minha opinião não existem possibilidades. Lamento, mas é um fato”. Aproveitando-nos da expressão “horizonte aberto”, falamos sobre “Os Gigantes“, uma novela controversa, difícil, criticada e de baixa audiência, na qual atuara, em 1979, e cuja música de abertura tinha, justamente, esta expressão – horizonte aberto – como título. A novela de Lauro César Muniz, foi um fiasco, diferentemente de “O Astro“, cuja exibição foi concluída o ano anterior, 1978, e foi marcada pela boa audiência. Perguntamos ao ator como ele lida com o dualismo sucesso versus fracasso e ele respondeu: “Tudo tem seu tempo e ambos são importantes”. Porém, sobre a trama malsucedida, relata que sua melhor memória sobre ela foi haver contracenado com Tarcísio Meira.
Ainda sobre a trama setentista, Cuoco e Meira disputavam o amor da personagem Paloma, vivida por Dina Sfat (1938-1989) . Na carreira do ator de primeiríssima há a presença de nomes como Janete Clair (1925-1983) e Bráulio Pedroso (1931-1990), pessoas que são desconhecidas pelos artistas da nova geração. Na perspectiva de Cuoco, a formação artística dos jovens atores “depende da construção que cada profissional iniciante impõe à sua carreira. Quem estuda mais, vence mais!”, afirma.
O ASTRO
Nos anos 1970, quando Francisco Cuoco disputava com Tarcísio Meira e Lima Duarte o protagonismo das novelas, o título daquela que protagonizara em 1977 não lhe parecia mais adequado: O Astro. Especialmente por tratar-se de uma época em que a televisão reinava absoluta na preferência do público. Hoje, com a grande quantidade de plataformas e possibilidades de manifestação artística, são muitos os galãs – ou postulantes a tal função – quer na TV, quer na Internet. Ainda que tenha fundamental importância na história da TV brasileira, Cuoco tem um pouco mais de 100 mil seguidores no Instagram, rede que não atualiza desde janeiro de 2022. Perguntado se acredita haver uma grande exposição por parte da nova geração de atores nas redes sociais, Francisco Cuoco confirmou, mas se absteve de problematizar: “Sim, há muita exposição, mas creio ser uma opção de cada um”. Da mesma forma que optou pela discrição, o artista lançou-se do mesmo expediente para não definir quem seria um novo galã das novelas nacionais: “Temos jovens atores com muito talento”.
Em outubro de 2003, especialmente diante da já famosa rusga entre ele e Carolina Ferraz, protagonistas de “Pecado Capital” (1998), e do fracasso deste remake, baseado na novela homônima de 1975, também protagonizada por Francisco, o ator declarou à Revista Contigo, há 20 anos, que esta novela “foi o único esbarrão na minha carreira”. E, completou falando sobre a beligerante relação entre ele e a atual apresentadora do “Domingo Espetacular“, da RecordTV. Coincidentemente, Ferraz foi a protagonista de “O Astro“, vivendo o papel que coube à Dina Sfat na primeira versão da trama. Esta última, levada ao ar em 2011, foi um sucesso, diferente daquela exibida nos anos 1990. Depois da bem-sucedida remontagem de “Pantanal”, a Globo fará, para o ano que vem, uma nova leitura de “Renascer”. Esta onda de remakes têm gerado acaloradas discussões nas redes sociais e na web de uma modo geral. Cuoco não acredita ser um problema a atualização de obras clássicas, que, em consonância com sua fala, são novelas que “voltam pela capacidade de suas histórias e seus valores indiscutíveis”.
Não que tenha sido o seu primeiro protagonista na Globo, mas o personagem que viveu em “O Cafona“, de 1971, foi icônico. Um dos motivos deveu-se pelo fato de Bráulio Pedroso (1931-1990), ter trazido à tona a discussão sobre os novos-ricos e a “cafonália” oriunda deles ainda nos Anos 1970. E não apenas isto. Os colunistas sociais e os colunáveis participaram da novela. E o society, vendo-se satirizado na trama de Pedroso, ameaçou processar a emissora. Razão pela qual a TV passou a utilizar, nos créditos de encerramento de suas suas novelas a frase “Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas terá sido mera coincidência“.
Como se isto não bastasse no campo da primazia, “O Cafona” foi a primeira novela a ter trilha nacional e internacional, e ambas lançadas pela Som Livre, bem como foi o folhetim que marcou a estreia da cantora Maysa como atriz. Sobre a trama, Cuoco afirmou que ela “retratava temas interessantes e que foi ótimo ter trabalhado com Maysa”. Infelizmente, não há muitos registros audiovisuais sobre esta novela, possivelmente perdidos no incêndio de 1976 da Globo. Favorito de Janete Clair (1925-1983), que fez questão que ele estivesse em sua última novela, Cuoco esteve presente em momentos simbólicos da televisão, inclusive quando inaugurada a transmissão em cores do Brasil. Seu nome se confunde com o da própria existência da TV, pois é um de seus pilares. Parafraseando uma de suas novelas, toda a honra e glória ao gigante Francisco Cuoco.
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