*Por Brunna Condini
Após cinco anos longe dos folhetins, Fabrício Boliveira volta às novelas nesta segunda-feira (30) em ‘ Volta por Cima’. Na nova trama das 19h de Claudia Souto, ele é Jão, que tem forte senso de justiça, e se envolve com Madá, vivida por Jéssica Ellen. Com uma carreira consolidada no audiovisual, o ator celebra seu primeiro protagonista de novela. “Ele é filho dessa mãe solo, tem uma escuta maior para o feminino, por isso sua trama tem a discussão sobre masculinidade. E essa é uma discussão bem contemporânea. Na história também tem uma necessidade social de discutir sobre ética, sobre da onde advém o seu dinheiro. É de corrupção, joguinhos ou do seu trabalho, do seu suor? É um personagem que traz essas discussões muito importantes para o hoje”.
Apaixonado pelo seu ofício, o baiano, que volta a morar no Rio de Janeiro para gravar a novela, fala com entusiasmo de outros trabalhos que tem a estrear. E exatamente por valorizar o seu fazer artístico, ele comenta abertamente a notícia recente de que a Paramount teria cancelado a série ‘Cenas de um Crime‘, que estava prevista para este ano, produção na qual ele é um dos protagonistas ao lado de Débora Nascimento. Segundo divulgado, a produção não seria disponibilizada ao público por conta da crise que a empresa vive. “Como o escritório da Paramount fechou por aqui, ficamos meio ‘órfãos’, sem saber o que vai acontecer. Aliás, essa é uma questão na relação com os streamings hoje, ficamos um pouco perdidos. É como se entregássemos nosso ‘ouro’ para um conglomerado internacional, ficando sem acesso às informações. Estou super sentido por não saber concretamente o destino desse trabalho”.
Precisamos pensar sobre essa regulamentação no streaming, até para nossa segurança. Importante discutirmos sobre qual poder tem uma produtora, um protagonista, principalmente quando essa história é realizada por um streaming internacional. Parece que a gente vende tudo… – Fabricio Boliveira
Sendo uma voz ativa e atuante na conquista dos espaços – inclusive por meio do projeto Elenco Negro, o ator vem mapeando artistas negros com o objetivo de fazer com que produtores de elenco tenham acesso a um grande cadastro – Fabricio divulga suas facetas em outros trabalhos que em breve chegarão ao público. “Estou no filme ‘Jardim do silêncio‘, uma produção ”ítalo-baiana’, dirigida pelo Henrique Dantas, que conta a história de um médico que se depara com perdas profundas num curto espaço de tempo. E tem um filme que dirijo, que acabou de ganhar o prêmio de finalização da Lei Paulo Gustavo, ‘Antígona – não nasci para o ódio, nasci para o amor‘, título que vem de uma frase de Sófocles. É uma adaptação desta peça grega para um cenário baiano pandêmico: um longa filmado em plano de sequência, que ensaiei 2020 e rodei em 2021″, diz Fabrício, que também filmou a versão brasileira de ”Nada a esconder‘ com Debora Lamm, Sheron Mennezes, Gisele Itiê, entre outros, com previsão de estreia no final deste ano.
Liberdade de escolha
Artista respeitado e premiado, Fabrício iniciou a carreira há 20 anos na peça ‘Capitães de Areia’, que o revelou, em Salvador, sua cidade natal, e afirma que está satisfeito com a coerência com qual vem construindo sua carreira, fazendo movimentos com liberdade e sem compromisso com a obviedade. “Estou muito feliz porque dentro da minha história pude fazer escolhas. Essa liberdade faz com que os ‘preços’ que pagamos a partir daí sejam colocados em um lugar de estratégia ou sobre o que você já sabe que vai assumir. As coisas ficam explícitas. Então, se decido fazer uma novela agora, já sei o tamanho de exposição que vou ter. Já me trabalho num ambiente mais seguro, dentro da própria exposição esperada. Trabalho para que eu esteja confortável dentro das situações que desejo estar. Quando não temos a liberdade da escolha, ficamos subjugados ao desejo e ao poder do outro. Ou a desejos e sonhos generalizados, rotulados…aí é o perigo disso tudo”.
Eu, por exemplo, não gostaria de ficar subjugado a fazer personagens que não acrescentem para mim ou socialmente. Fico feliz porque pude escolher bem os papeis e os momentos de fazê-los. É escutar um pouco do que é a necessidade geral, social, e construir um personagem que responda a isso – Fabrício Boliveira
Exercitando uma lucidez constante a respeito das suas escolhas, ele procura permanecer discreto quanto à própria vida, enxergando seu oficio como outro qualquer, que pede dedicação e investimento para ser lapidado. “Abro espaço mais para o diálogo sobre o meu trabalho do que sobre a minha vida pessoal. É isso que me interessa. Acho essa a boa ‘moeda’ de discussão com o público. Não sei sobre a vida dele, porque ele precisa saber da minha? Procuro deixar minha relação mais midiática nesse lugar interessante do trabalho, dos personagens. Isso surte mais espaços de reflexão do que a minha vidinha, só minha, pequena…não faz tanto sentido para todo mundo. Já um personagem, pode abrir discussões interessantes. Mantenho os pés no chão e o foco no trabalho”.
Não tenho tempo de ficar deslumbrado com esse universo da fama e esse nem é um lugar que miro. Não combina com de onde venho, com a relação que tenho familiar, com os meus amigos. Tenho procurado ter uma vida boa, gostosa, com gente querida do meu lado. Busco a simplicidade das coisas em sua base, e ser acessível é uma virtude que desejo carregar comigo sempre – Fabrício Boliveira
Influenciadores e atores
Sobre a tendência do audiovisual no momento, de ‘surfar’ no número de seguidores de atores e influenciadores em busca de audiência, o ator observa, frisando que isso não pode ser o termômetro para escalação de um intérprete para um trabalho. “É preciso que um jovem ator, por exemplo, busque estudar, estudar bastante. Porque só munidos de muitas informações que dizem respeito ao nosso trabalho, conseguimos abrir a boca a respeito. Para discutir, opinar sobre. Acho que o mundo está cheio de gente que fica opinando, sem nenhum tipo de respaldo profissional, não podendo fazer boas escolhas a partir daí”. E completa:
Acho uma bobajada isso de seguidores, isso não faz uma obra de arte. Temos visto isso em números, dentro da televisão e dos streamings. Nosso trabalho não tem nada a ver com número de seguidores. Temos visto até a qualidade de muitos produtos baixando, porque tem muita gente despreparada neles… estudem, levem a sério e só façam, se realmente entenderem que essa é uma vocação. Não façam só para ganhar dinheiro ou porque foi uma vaga que apareceu. É uma profissão, não tire o lugar de outro ator mais preparado somente porque surgiu uma oportunidade. Temos visto histórias horrorosas nesta troca de atores por influenciadores. Se decidiu que deseja se tornar um ator, se prepare – Fabrício Boliveira
Homem de seu tempo
A novela ‘Volta por cima‘ pretende representar o público suburbano na tela no horário das sete. A trama vai mostrar a rotina de quem viaja de ônibus, com foco na diversidade da maior parcela da população carioca, a classe trabalhadora. Fabrício Boliveira é Jão, que se chama Jorge Corrêa, e começa a trabalhar na Viação Formosa muito cedo como trocador de ônibus. Criado apenas pela mãe Neuza (Valdineia Soriano), ele se habituou desde pequeno a ser responsável pela casa. Sua dedicação na empresa o faz subir de posto, chegando ao cargo de fiscal. E, depois do esforço para conquistar o tão sonhado diploma no curso de Administração, passa a almejar um cargo melhor na empresa, mas é preterido pela indicação do melhor amigo da mulher do patrão. “É um cara correto, amigo, batalhador. O que talvez me ‘afaste’ mais na identificação com esse personagem, e talvez seja o ‘Calcanhar de Aquiles’ do Jão, é a sua impulsividade. Isso várias vezes soluciona as questões em que se mete, mas também o coloca amarrado, o faz ‘tropeçar’. Mas meu personagem está em constante transformação., é um homem do seu tempo”.
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