Exclusivo! Politizada na web, Aline Fanju fala ao HT: “O estatuto da família me enoja. A política no nosso país é criminosa”

Não são só os cabelos loiros platinados – parte da caracterização da personagem Maristela em “Totalmente demais” – que chamam atenção na cabeça de Aline Fanju. As ideias da atriz são aplaudidas por mais de trinta mil seguidores nas redes sociais, onde, aliás, ela faz questão de disseminá-las. Causas como o preconceito social e sexual, política e outras tão importantes quanto não passam despercebidas por Aline, que faz questão de expôr – sem medo – sua opinião. A atriz de Ribeirão Preto que se mudou para o Rio de Janeiro aos 17 anos para correr atrás de uma carreira no teatro acumula, desde 1996, prêmios como o de “Melhor Atriz Revelação no Festival de Teatro Amador Do Estado de São Paulo – Tatuí” por sua atuação em “Gota d’Água”, de Chico Buarque e “Melhor Atriz no Festival de Teatro Amador Do Estado de São Paulo – Tatuí” pelo papel em “O Pagador de Promessas”, de Dias Gomes. Ela, que se tornou conhecida do grande público em 2007, quando fez “JK” e “Sítio do Pica-Pau Amarelo” na Rede Globo, hoje vive a espevitada Maristela na trama das 19h da emissora, assinada por Paulo Halm e Rosane Svartman.

Aline Fanju: platinadíssima como Maristela (Foto: Sérgio Baia)

A personagem que vive brigando com o namorado Florisval (Aílton Graça) é parte do núcleo de humor em um horário que já é conhecido por tramas mais leves e Aline confessou: teve receio em cair no pastelão. “Tive muito medo. Primeiro por que eu, por pura ignorância, realmente não conhecia nossos autores. Em segundo, porque essa cultura da novela das 19hs é muito forte. Além disso, esse era um terreno bastante novo para mim. Eu nunca tinha feito comédia na televisão, além da comédia pastelão não ser meu gênero de comédia favorito, eu fiquei com muito medo de fracassar, de não saber fazer, de ficar ruim”, explicou. Agora, colhendo os louros, ela garantiu: “Passei a achar que era preconceito meu achar menor a comédia pastelão. Todos os gêneros são muito ricos, basta serem bem-feitos”.

Aliás, apesar de “Totalmente demais” abordar temas leves, recentemente uma das tramas chamou atenção: o personagem Max, interpretado por Pablo Sanábio, foi espancado por um grupo de pitboys após paquerar um rapaz em uma boate. Depois de sofrer nas mãos do grupo de intolerantes, o drama do personagem tomou as redes sociais. Aline nos disse: “Isso é muito assustador, é um retrocesso sem tamanho! Eu defendo muito essa causa, porque não consigo entender e admitir que algumas pessoas sejam tão cruéis e egoístas a ponto de pregarem que ser diferente do que elas são é uma doença ou uma aberração e até crime, como há pouco tempo era. Não conseguem ser generosos o suficiente a ponto de refletirem sobre seus preconceitos arraigados e herdados em nome da felicidade e da paz de várias pessoas! O estatuto da família me enoja”, declarou.

É com essa e (muitas) outras opiniões fortes, que Aline Fanju bateu um bate-papo sincero com HT. Vem saber tudo!

HT: Aline, você tem uma longa carreira no teatro – onde atua desde 1996. Quando pensa em voltar aos palcos?
Aline Fanju: Terminei a última temporada de “Razões pra ser Bonita” em agosto de 2015, peça com a qual fiquei em cartaz durante três anos e decidi não fazer teatro agora por conta da inconstância da rotina, a dificuldade de adaptar as datas com o roteiro, e porque queria me dedicar à beça para esse personagem da novela. É uma comédia, gênero com o qual não estou acostumada a fazer nesse veículo. Estou com um projeto do meu grupo Plano Coletivo inscrito em alguns editais esperando os resultados. Se chama “Planta Baixa”.

A atriz é cheia de opiniões e não tem medo de expor (Foto: Sérgio Baia)

HT: Depois de interpretar três prostitutas, você está no ar com uma personagem que também tem apelo sensual. Como é a sua relação com isso?
AF: Eu procuro sempre humanizar as personagens e procurar além do que já está dito no texto e na caracterização. Na Maristela essas informações são gritantes, um cabelo platinado, roupas justas e coloridas, cenas de barraco e confusão… Já fica claro, Maristela é uma mulher exuberante, sensual, de sangue quente! E o que mais ela pode ser? Por que essa insegurança toda? Por que tanto ciúme? Por que tanto medo de ser traída? Acho que consegui transformá-la em um personagem vulnerável, também, não só sexual e inconveniente. As pessoas a compreendem, tem carinho por ela! Na Myrna de “Viver a Vida” foi a mesma coisa. Eu já tinha a informação de que ela era uma prostituta, mas não queria sublinhar isso, senão vira uma caricatura. Eu a fiz uma mulher sensual quando estava em serviço, afinal esse era o ofício dela. Mas quando não, ela era uma mulher sensível, carinhosa, silenciosa, educada, amorosa… Fugindo do esteriótipo da garota de programa. Por isso houve tanta empatia, eu acho. Agora, fiz outros personagens, como a Luana, que não era prostituta, de “Acerto de Contas”, série do Multishow que, aí sim, usava e abusava do apelo sexual, por que essa era a história, ela usava o sexo como munição, como forma de manipulação. Quando o nu e o sexo me parecem a serviço da trama, me entrego, quando acho que é abusivo, machista, explorando o meu corpo por explorar, eu questiono.

HT: Você se considera sexy?
AF: Me acho mais sensual do que sexy. E me acho mais charmosa do que sensual, até.

HT: Me fala um pouco da novela. Como surgiu o convite?
AF: Eu estava no Projac assistindo a uma palestra e o produtor de elenco Fabio Zambroni me encontrou e perguntou se eu ficava a fim de fazer um teste pra Maristela. Eu fiz no dia seguinte e pouco tempo depois o nosso diretor, Luiz Henrique Rios, me ligou dizendo que eu tinha passado.

A atriz interpretou três prostitutas nas telinhas, mas não se considera sexy: “Mais charmosa do que sensual” (Foto: Sérgio Baia)

HT: Você integra o núcleo de humor de uma novela das 19h, que já é conhecida por ser uma trama mais leve. No começo teve o receio de cair no humor ‘pastelão’?
AF: Tive. Tive muito. Primeiro por que eu, por pura ignorância, realmente não conhecia a Rosane Svartman e o Paulo Halm, nossos autores. Em segundo, porque essa cultura da novela das 19h é muito forte e, depois, porque esse era um terreno bastante novo para mim. Eu nunca tinha feito comédia na televisão e, além da comédia pastelão não ser meu gênero de comédia favorito, eu fiquei com muito medo de fracassar, de não saber fazer, de ficar ruim. Mas, me surpreendi positivamente para caramba com os nossos autores, apesar de termos feito cena de torta na cara, um clássico do humor pastelão! Ainda assim, a cena era muito bem escrita e muito divertida, a comédia deles não tem a piada pela piada, as situações é que são muito engraçadas e ridículas! E passei a achar que era preconceito meu achar menor a comédia pastelão, Todos os gêneros são muito ricos, basta serem bem-feitos.

HT: A relação com o Florisval é passional demais, a Maristela faz barracos, briga, grita. Como é fazer essas cenas com a Malu Galli (que interpreta a Rosângela) e o Ailton Graça?
AF: Estar com eles é uma benção! São colegas de cena muito generosos, inteligentes, experientes e divertidos. Rimos muito, o tempo todo. Aliás, a equipe toda se diverte no nosso núcleo… é demais, muito astral. Na vida real tenho ciúmes em uma medida normal, eu acho. Se me sinto insegura, chamo o namorado para uma conversa. A gente fantasia muito, então dar vazão a esse sentimento e alimentá-lo é uma armadilha. É legal entender junto o que está acontecendo. E claro, se no fim das contas eu concluir que a pessoa não está me respeitando, mesmo, aí acho que acaba a relação, né? Ou se transforma, né? Não sei (risos). Acho que não tem fórmula, depende do acordo de cada relacionamento.

HT: ‘Totalmente demais” está sendo muito elogiada. Você já tem convites ou projetos para depois da novela?
AF: Está sendo muito elogiada, estamos felizes. Estou produzindo um longa e um espetáculo com o meu grupo Plano Coletivo. Previsão de filmagem para julho de 2016. Para o espetáculo, estamos esperando dinheiro para viabilizá-lo.

HT: Aline, nas suas redes sociais você faz muitas campanhas de conscientização política e social. Me conta um pouco disso. Você é uma pessoa interessada em política?
AF: Sou! O social me interessa muito. Mas, sobretudo, sou interessada no que cada um de nós pode fazer, ou exigir de quem nos representa, que faça pra que o país, pra que a vida das pessoas melhore. O ser humano me interessa. E a gente é muito egoísta e acomodado.

Ela não pretende manter os fios platinados após a novela (Foto: Sérgio Baia)

HT: Vi que você postou uma frase do Ezequiel Teixeira, secretário estadual do Rio de Janeiro de assistência social e direitos humanos em que ele diz que não acredita na cura gay e você acha absurdo. Em outra foto, você veste a camisa de que ninguém precisa ser lésbica para lutar contra a lesbofobia. Na novela vimos uma cena de preconceito com o Max (Pablo Sanábio). Acha importante abordar isso na televisão? Sua causa é a LGBT? Que causas você defende?
AF: Na verdade, ele disse que crê na cura gay, assim como crê na cura do câncer e da Aids. Quer dizer, ele coloca a homossexualidade no patamar de doença a ser curada. E isso é muito assustador, um retrocesso sem tamanho. Eu defendo muito essa causa, porque não consigo entender e admitir que algumas pessoas sejam tão cruéis e egoístas a ponto de pregarem que ser diferente do que elas são é uma doença ou uma aberração e até crime, como há pouco tempo era. Não conseguem ser generosos o suficiente a ponto de refletirem sobre seus preconceitos arraigados e herdados em nome da felicidade e da paz de várias pessoas. O estatuto da família me enoja. Mas essa não é a única causa que me move. A atual ebulição do movimento feminista me comove e me instiga. A campanha #meuprimeiroassédio foi muito reveladora, pois sofri assédio de um vizinho quando tinha 9 anos e ler todos aqueles depoimentos foi surpreendente e acolhedor. Nesse feminino que aflora agora, as mulheres não se calam, exigem seu espaço, denunciam o machismo. E não só os homens têm caído na real se reconhecendo machistas muitas vezes, mas eu mesma e muitas de nós temos percebido de quanto machismo naturalizado já fomos vítimas, desde sempre, e não tínhamos nos dado conta, por que era cultural. E isso tem sido muito importante. O movimento negro tem me interessado muito também. Tenho lido muita coisa, ido a debates, escutado muita gente, por que o racismo, assim como machismo, é naturalizado e arraigado e eu não quero ser agente – nem inconscientemente – de qualquer tipo de preconceito. Quero ser uma pessoa melhor, mais consciente do que acontece ao meu redor, não me fechar na minha vidinha. Quero que a vida das pessoas melhore e, para isso, preciso ser permeável e ter a escuta aberta. Estou me esforçando.

Uma das causas que Aline mais apoia é a LGBT e ela afirma: “O estatuto da família me enoja!” (Foto: Sérgio Baia)

HT: Em outra postagem você diz a fila do SUS é um vandalismo e pede que não confundam a reação do oprimido com a violência do opressor. O que você acha do atual momento do nosso país?
AF: Acho lamentável. A política no nosso país é criminosa. Representantes corruptos, inescrupulosos sem pudores agindo de forma criminosa e dissimulada na nossa cara! O povo não tem seus direitos básicos assegurados, enquanto nossos políticos roubam milhões dos cofres públicos e ao serem pegos ganham prisões especiais e privilegiadas. E aí tentam culpar os menores infratores por todo o caos na segurança desse país. O Estado não nos assegura coisa alguma. O país está em crise por culpa da má administração daqueles em quem confiamos e quem paga o pato somos nós todos. Mas a gente não pode apenas assistir ao ‘Jornal Nacional”, lamentar e ficar de braços cruzados. Há de haver empatia, a gente tem que se importar, se interessar, por que quem elegeu eles, os políticos, somos nós. E somos nós que furamos fila, nós que dirigimos no acostamento, nós. Nós que os elegemos irresponsavelmente. É preciso estar atento.